Polícia Militar do Estado de Roraima Curso de Formação de Soldado PM – 3013 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Prof. Vilmar Antônio da Silva AULAS 26 e 27 ______________________________________________________________ CONFLITO DAS LEIS NO TEMPO Material adaptado da obra Gonçalves, Carlos Roberto. Direito civil : parte geral. 18. ed., São Paulo : Saraiva, 2011. – (Coleção sinopses jurídicas. v. 1) As leis são feitas para, em geral, valer para o futuro. Quando a lei é modificada por outra e já haviam se formado relações jurídicas na vigência da lei anterior, pode instaurar-se o conflito das leis no tempo. A dúvida dirá respeito à aplicação ou não da lei nova às situações anteriormente constituídas. Para solucionar tal questão, são utilizados dois critérios: o das disposições transitórias e o da irretroatividade das normas. Disposições transitórias são elaboradas pelo legislador, no próprio texto normativo, destinadas a evitar e a solucionar conflitos que poderão emergir do confronto da nova lei com a antiga, tendo vigência temporária. Irretroativa é a lei que não se aplica às situações constituídas anteriormente. É um princípio que objetiva assegurar a certeza, a segurança e a estabilidade do ordenamento jurídico-positivo, preservando as situações consolidadas em que o interesse individual prevalece. Entretanto, não se tem dado a ele caráter absoluto, pois razões de política legislativa podem recomendar que, em determinada situação, a lei seja retroativa, atingindo os efeitos de atos jurídicos praticados sob o império da norma revogada. A Constituição Federal de 1988 (art. 5º, XXXVI) e a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, afinadas com a tendência contemporânea, adotaram o princípio da irretroatividade das leis como regra, e o da retroatividade como exceção. Acolheu-se a teoria de Gabba1, de completo respeito ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa 1 Em nosso ordenamento observamos influência da supracitada teoria na seguinte assertiva:" (...) ou condição preestabelecida inalterável ao arbítrio de outrem "(parte final do § 2º do artigo 6º da LICC). Desse modo, adotamos a TEORIA DE GABBA em sua essência, qual seja a impossibilidade de alteração ou supressão do direito adquirido, ainda que esse o titular desse direito não se tenha manifestado interesse em garanti-lo, eis que já o possuía independentemente de prévia manifestação de vontade. Aulas 26 a 27 ............................................................................................................. Página 1 de 5 Polícia Militar do Estado de Roraima Curso de Formação de Soldado PM – 3013 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Prof. Vilmar Antônio da Silva AULAS 26 e 27 ______________________________________________________________ julgada. Assim, como regra, aplica-se a lei nova aos casos pendentes e aos futuros, só podendo ser retroativa (atingir fatos pretéritos) quando: a) não ofender o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada; b) quando o legislador, expressamente, mandar aplicá-la a casos pretéritos, mesmo que a palavra “retroatividade” não seja usada. Na doutrina, diz-se que é justa a retroatividade quando não se depara, na sua aplicação, qualquer ofensa ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada; e injusta, quando ocorre tal ofensa. Entre a retroatividade e a irretroatividade existe uma situação intermediária: a da aplicabilidade imediata da lei nova a relações que, nascidas embora sob a vigência da lei antiga, ainda não se aperfeiçoaram, não se consumaram. A imediata e geral aplicação deve também respeitar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. O art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil preceitua que a lei em vigor “terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”. Ato jurídico perfeito é o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou (§ 1º). Prescreve o artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil; “A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitando o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.” No seu parágrafo 1º, está elencado que; “ Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.’ Deve, este parágrafo, ser entendido como se referindo aos elementos necessários à existência do ato, e não às execução ou aos seus efeitos materiais. O ato jurídico perfeito é aquele já realizado, acabado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou, pois já satisfez todos os requisitos formais para gerar a plenitude dos seus efeitos, tornando-se portanto completo ou aperfeiçoado. Exemplo 1 A lei prevê que o prazo para se contestar uma ação é de 15 dias. Posteriormente surge uma lei dizendo que o prazo é de 5 dias, mas o ato que já foi praticado na lei vigente de 15 dias não será afetado. Exemplo 2 Aulas 26 a 27 ............................................................................................................. Página 2 de 5 Polícia Militar do Estado de Roraima Curso de Formação de Soldado PM – 3013 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Prof. Vilmar Antônio da Silva AULAS 26 e 27 ______________________________________________________________ Um indivíduo se aposenta em janeiro de 2008, com 35 anos de serviço, passando a vigir, em fevereiro, uma lei que estabeleça um tempo de serviço de 40 anos necessário à aposentadoria. Além de ser um direito adquirido do indivíduo, sua aposentadoria é um ato jurídico perfeito. Ainda nesse sentido, pode-se afirmar que um indivíduo que iria se aposentar em março de 2008, de acordo com a lei antiga, terá de trabalhar por mais 5 anos para obter os benefícios da aposentadoria2. Direito adquirido é o que já se incorporou definitivamente ao patrimônio e à personalidade de seu titular. É o direito que seu titular pode exercer, ou alguém por ele. Vantagem jurídica, líquida, lícita e concreta que alguém adquire de acordo com a lei vigente na ocasião e incorpora definitivamente, sem contestação, ao seu patrimônio. Os Direitos Adquiridos na vigência de uma Constituição anterior, por força de uma norma formalmente constitucional, não são extintos, desde que a Constituição nova consagre o mesmo conceito de direito adquirido. Se materialmente constitucional são revogados pela Constituição nova se expressamente mencionar a matéria. Só se fala em direito adquirido em normas formais. Observação: normas materiais: ex.: idade para votar; formais: ex.: usucapião rural Direito adquirido 3 é aquele que a lei considera definitivamente integrado ao patrimônio de seu titular. Assim, quando alguém, na vigência de uma lei determinada, adquire um direito relacionado a esta, referido direito se incorpora ao patrimônio do titular, mesmo que este não o exercite, de tal modo que o advento de uma nova lei, revogadora da 2 Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ato_jur%C3%ADdico_perfeito 3 ONGARATTO, Vinícius. Ato jurídico perfeito, coisa julgada e direito adquirido. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIII, n. 81, out 2010. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8805&revista_caderno=2>. Acesso em ago 2013. Aulas 26 a 27 ............................................................................................................. Página 3 de 5 Polícia Militar do Estado de Roraima Curso de Formação de Soldado PM – 3013 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Prof. Vilmar Antônio da Silva AULAS 26 e 27 ______________________________________________________________ anterior relacionada ao direito, não ofende o status conquistado, embora não tenha este sido exercido ou utilizado; por exemplo, o funcionário público que, após trinta anos de serviço, adquire direito à aposentadoria, conforme a lei vigente, não podendo ser prejudicado por eventual lei posterior que venha ampliar o prazo para a aquisição do direito à aposentadoria. O não exercício do direito não implica a perda do direito adquirido na vigência da lei anterior, mesmo que ele não seja exercitado. Ao completar, na vigência da lei anterior, trinta anos de serviço, o titular do direito adquiriu o direito subjetivo de requerer sua aposentadoria em qualquer época, independentemente de alteração do prazo aquisitivo por lei posterior. É preciso, contudo, não confundir direito adquirido com expectativa de direito, pois esta não passa de mera possibilidade de efetivação de direito sujeito à realização de evento futuro. Se este não ocorre, o direito não se consolida, por exemplo, a herança somente se consolida com a morte daquele que é seu autor. Enquanto esta não se realiza, o herdeiro tem mera expectativa de direito sobre os bens do autor da herança. Coisa julgada é a imutabilidade dos efeitos da sentença, não mais sujeita a recursos. Ocorre quando a sentença judicial se torna irrecorrível, ou seja, não admite mais a interposição de qualquer recurso. Tem como objetivo dar segurança jurídica às decisões judiciais e evitar que os conflitos se perpetuem no tempo. A coisa julgada pode ser formal, quando a sentença não pode ser alterada dentro do mesmo processo, porém poderá ser discutida em outra ação, ou material, quando a sentença não pode ser alterada em nenhum outro processo4. 4 http://www.direitonet.com.br/dicionario/exibir/84/Coisa-julgada Aulas 26 a 27 ............................................................................................................. Página 4 de 5 Polícia Militar do Estado de Roraima Curso de Formação de Soldado PM – 3013 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Prof. Vilmar Antônio da Silva AULAS 26 e 27 ______________________________________________________________ Art. 6º - A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, direito adquirido e a coisa julgada. § 1º - Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. § 2º - Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. § 3º - Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso. (Alterado pela L-003.238-1957) Exemplo de efeito imediato das leis é o que se dá sobre a capacidade das pessoas, pois alcança todos aqueles por ela abrangidos. Se a lei reduzir o limite da maioridade civil para dezesseis anos, tornará automaticamente maiores todos os que já tenham atingido essa idade. Por outro lado, se a lei aumentar o limite para vinte e dois anos, verbi gratia, será respeitada a maioridade dos que já haviam completado dezoito anos na data da sua entrada em vigor. No entanto, os que ainda não haviam atingido a idade de dezoito anos terão de aguardar o momento em que completarem vinte e dois anos. Aulas 26 a 27 ............................................................................................................. Página 5 de 5