BEM-ESTAR ANIMAL NA CADEIA PRODUTIVA BOVINA: DA PROPRIEDADE RURAL AO ABATE [email protected] APRESENTACAO ORAL-Economia e Gestão no Agronegócio JULIANA FATIMA DE MORAES HERNANDES; LUCIANE DA SILVA RUBIN; MATHEUS DHEIN DILL; SUELLEN MOREIRA DE OLIVEIRA; TÂNIA NUNES DA SILVA. UFRGS, PORTO ALEGRE - RS - BRASIL. BEM-ESTAR ANIMAL NA CADEIA PRODUTIVA BOVINA: DA PROPRIEDADE RURAL AO ABATE ANIMAL WELFARE IN CATTLE PRODUCTION CHAIN: FROM FARM TO SLAUGHTER Grupo de Pesquisa: Economia e Gestão no Agronegócio Resumo: O bem-estar animal tem sido preocupação crescente entre os consumidores de todo o mundo que passaram a exigir uma conduta humanitária no tratamento dos animais, no que diz respeito à produção, transporte e abate. O preço não é mais o único fator determinante na escolha do consumidor. As novas variáveis e preocupações dos consumidores devem ser consideradas em todo o processo produtivo da cadeia, a fim de que sejam satisfeitas essas novas exigências. Desta forma, o presente trabalho tem o objetivo de analisar os diversos métodos da prática do bem-estar animal na propriedade rural, transporte e frigorífico. Realizaram-se entrevistas com produtores do Rio Grande do Sul, bem como uma visita técnica ao Frigorífico Mercosul e à Fazenda Guatambu, onde foram identificadas ações referentes ao bem-estar animal e melhorias significativas no manejo e criação dos bovinos o que resultou em agregação de valor ao produto. Palavras chave: bem-estar animal, qualidade, estratégia. Abstract: Animal welfare has been increasing concern among consumers around the world now require a conduct humanitarian treatment of animals, as regards the production, transport and slaughter. The price is not the only determining factor in consumer choice and the new variables and these concerns should be considered throughout the production process chain in order to meet these new requirements. Thus, this paper aims to examine the various methods of practice for animal welfare in rural property, transport and in the animals slaughter. There were interviews with Rio Grande do Sul producers and a technical visit to the Mercosul 1 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Fridge and the Farm Guatambu, where actions for animal welfare have been identified and also significant improvements in the management and creation of cattle, adding, by that one, value to the product. Key-words: animal welfare, quality, strategy. 1. INTRODUÇÃO A produção mundial de proteína de origem animal vem crescendo constantemente, ao mesmo passo que as exigências dos consumidores por produtos que satisfaçam suas necessidades e desejos. Os países importadores de proteína animal, principalmente os países com maior capital, em especial a União Européia, seguido pelo Canadá e Estados Unidos da América, também estão exigindo melhores condições de produção, transportes e abate, a fim promover o bem-estar animal (ZANELLA, 2007). Assim é de fundamental importância o entendimento dos benefícios a serem alcançados com a introdução de programas que visam o bem-estar animal (BEA) na cadeia produtiva bovina, pois os produtores, transportadores e os frigoríficos poderão usufruir dos melhoramentos deste sistema. Os benefícios da prática de BEA são mútuos para os integrantes da cadeia da carne bovina devido à diminuição de perdas na produtividade da pecuária. De acordo com Amaro (2003), atualmente, é entendido que o BEA exerce impacto direto e indireto na segurança e qualidade dos alimentos, tendo como exemplo deste fato, o transporte animal, da propriedade rural ao frigorífico, que, uma vez conduzido segundo práticas de BEA, diminui seus problemas referentes ao stress animal, hematomas e fraturas, proporcionando ao frigorífico um produto com qualidade e ainda fortalecendo a imagem de seus produtos. Estes fatores diminuem problemas referentes a barreiras não-tarifárias comerciais de exportação e promovem o aumento do markchair da indústria em âmbito nacional e internacional, estabelecendo vantagem competitiva em relação aos outros mercados concorrentes. Os benefícios para os consumidores são estabelecidos por meio de um produto com um novo padrão de qualidade, no qual o requisito é a qualidade de vida do animal. Entende-se que estas reivindicações quanto ao BEA, por parte do consumidor final, são exigências intimamente relacionadas às suas preocupações com o animal. Neste contexto o fator preço, muitas vezes, não é o mais preponderante na escolha do produto a ser comprado. Com isso emergem novas variáveis que devem ser incorporadas para a análise e reestruturação da cadeia produtiva, com o intuito de adaptar-se às novas exigências a fim de aumentar ou manter consumidores. Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo analisar os diversos métodos de BEA na produção dentro da propriedade rural, no transporte e no frigorífico. Foi realizada uma visita técnica ao Frigorífico Mercosul, localizado na região de Bagé, no Rio Grande do Sul, onde foram identificadas ações referentes ao tema central deste trabalho. Também realizou-se uma visita técnica na propriedade Guatambu, localizada na mesma região, a qual adota práticas de BEA e comercializa seus animais diretamente com o frigorífico Mercosul. O trabalho contou também com entrevistas a produtores gaúchos a fim de verificar como o tema de BEA tem sido tratado em suas propriedades. 1.2. REVISÃO DA LITERATURA 2 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural É necessária uma conceituação precisa do termo “bem-estar”, para fins científicos, a fim de que seja medido ou comparado em diferentes situações de forma objetiva. Broom (1986) define bem-estar de um indivíduo como o estado em que este se encontra em relação às suas tentativas de adaptar-se ao seu ambiente e o quão bem o indivíduo está passando em determinada fase de sua vida. O bem-estar animal está relacionado diretamente com o conforto físico e mental do animal, sendo possível identificar por meio de análises técnicas, se o animal está sofrendo. Devido à complexidade do assunto é difícil evidenciar certos desconfortos e conforme Hölzel & Machado Filho (2004) o animal pode estar em ótimas condições físicas, estar saudável e bem nutrido, mas com desconforto mental. Os autores Broom & Johson (1993) definem critérios de avaliação e indicadores do bem-estar. Os critérios de avaliação seriam medidos por testes de esquiva e preferência, e demonstrariam o grau em que os animais têm de conviver com situações ou estímulos dos quais preferem esquivar-se e a disponibilidade para conviver com aquilo que é preferido. Colocam, ainda, que ao considerar como avaliar o bem-estar de um indivíduo, é necessário haver um bom conhecimento da biologia do animal para chegar ao conhecimento mais acertado do grau de bem-estar. Broom & Molento (2004) verificaram que alguns sinais de bem-estar precário podem ser evidenciados por mensurações fisiológicas, por meio da observação do aumento de freqüência cardíaca e da atividade adrenal, por exemplo. Comportamentos anormais, tais como automutilação e excessiva agressividade, entre outros, bem como doença, ferimento, dificuldades locomotoras e anormalidades de crescimento, podem indicar que há um baixo grau de bem-estar. A prática do bem-estar animal é estabelecida a partir do seu nascimento até o seu abate, sendo necessárias normas que indiquem como proceder, desde as instalações da criação, seguidas pela alimentação, manejo adequado, aspectos sanitários, genéticos, transporte e abate, proporcionando assim, aos animais, melhor qualidade de vida. O estresse pode ser uma característica importante para avaliar se o animal está em condições favoráveis em termos do seu bem-estar. Neste contexto Hölzel & Machado Filho (2004) constatam que o animal em um estado de estresse provoca a liberação de hormônio prejudicial à qualidade de sua carne. Pode-se citar como exemplo a situação em que aparece um predador e desencadeia-se o mecanismo “luta e fuga”, sendo que esse mecanismo envolve o sistema simpático adrenal e a secreção de hormônios tais como: catecolaminas, adrenalina e noradrenalina (noraepinefrina e epinefrina). O estresse não é uma causa e sim uma conseqüência do organismo em reação à ameaça do ambiente. Assim, faz-se necessário estabelecer princípios da prática do bem-estar, a partir da criação do animal na propriedade rural, que possam ser repassados à toda a cadeia produtiva. Devido à alta competitividade do setor produtivo bovino, onde a competição é marcada por meio da diminuição dos custos, a produção intensiva adotada deve resultar em maior interação entre homem e animal, entendido que o ser humano é responsável pela saúde dos animais, alimentação, entre outras atuações. Assim, uma interação mal sucedida pode gerar perdas econômicas, se a realização de tais ações não estiverem de acordo com o BEA. O manejo dos animais dentro da propriedade é de grande importância para assegurar o BEA, e essa prática pode promover ganhos diretos e indiretos na produtividade, devido à 3 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural forma cautelosa, tranqüila e rotineira de trabalho que pode estabelecer a docilidade dos animais e diminuição dos riscos de acidentes (PARANHOS DA COSTA et al., 1998). Para a efetiva criação dos animais segundo as premissas do bem-estar, os criadores devem entender e saber diagnosticar os estímulos integrantes entre o animal e o homem, e assim tomar as devidas medidas visando atender todas as necessidades do animal. Um manejo inadequado do transporte dos animais, que inicia no embarque e vai até o desembarque, também pode ser fator gerador de estresse e sofrimento dos animais e de grandes perdas na qualidade da carne e do couro. Entre os problemas de manejo inadequado relativo ao transporte, destaca-se a falta de preparo e de conhecimento dos responsáveis pelo manejo (produtor, peão, motorista), privações de alimento e água, alta umidade, direção perigosa e densidade de animais. As longas distâncias percorridas até chegar ao destino, a falta de qualidade das estradas, o formato e manutenção das carrocerias, a falta de proteções contra o vento, sol e chuvas, também são fatores que interferem na qualidade do BEA. A mistura de lotes de animais, sem o tempo necessário de adaptação, é, do mesmo modo, fator predisponente ao estresse animal, ocasionando brigas e conseqüentemente lesões. Outro fator importante é a inadequação das rampas, freqüentemente escorregadias, muito inclinadas e sem grades de proteção laterais (AMARAL, 2008). O veículo de transporte pode não oferecer segurança adequada, como piso escorregadio ou quebrado ou com proteções laterais comprometidas. Fatores como estes conduzem a acidentes como contusões graves, luxações de articulações ou até fraturas dos membros. O efeito da distância do transporte rodoviário de bovinos no metabolismo post mortem, foi verificado por Batista de Deus, Silva & Soares (1999). Os autores avaliaram este efeito por meio da análise de pH, Valor R (IMP/ATP)1 e lactato no músculo, em três distâncias distintas, entre os municípios Pedro Osório (46Km), Dom Pedrito (240Km) e Quarai (468 km) até o Frigorífico Extremo Sul S/A, situado no município de Capão do Leão/RS2. Os principais resultados revelaram que houve diferenças significativas entre a distância percorrida e o aumento do pH e diminuição do lactato nos músculos dos animais analisados, após 24 horas post mortem. Para os autores, o estresse causado pela maior distância de transporte em bovinos está associado ao aumento do tempo de jejum e da redução da concentração de ácido lático no plasma, nas 24 horas do post mortem. Os autores recomendam que os frigoríficos busquem animais mais próximos possíveis de sua planta e intensifiquem o controle sobre o mecanismo: transporte-estresse-jejum, considerando suas implicações na qualidade final da carne. O processo de abate de bovinos representa um elevado grau de estresse ao animal. Desta forma, é oportuno o desenvolvimento de diretrizes que proporcionem ao animal um menor índice de estresse. Dentre estas diretrizes configuram-se melhorias no deslocamento, 1 Razão entre Quantidade de Monofosfato de Inosina (IMP) e Trifosfato de Adenosina (ATP). No Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RIISPOA), artigo 110, diz que os bovinos devem permanecer em descanso, jejum e dieta hídrica nos currais, por 24 horas, podendo esse tempo ser reduzido em função da distância percorrida, pois animais cansados originam carne com menor tempo de conservação em virtude do desenvolvimento incompleto da acidez muscular e conseqüente invasão precoce da flora microbiana. Essa carne mostra-se escura e pouco brilhante, devido às alterações fisico-químicas do músculo e decréscimo da oxigenação da hemoglobina (Batista de Deus, Silva e Soares,1999). 2 4 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural carregamento ou descarregadas dos animais e separação por grupos sociais, idade e sexo (BORGES & ALMEIDA, 2008). Diante dessas considerações, ratifica-se a importância do BEA para o abate. Sob esta perspectiva Hölzel & Machado Filho (2004) constataram que a liberação de hormônios durante o estresse gerado no processo de “luta e fuga” diminuem a qualidade da carne. Não somente na fase do abate mas em todo o processo produtivo é essencial que haja premissas para diminuir a dor, ferimentos e doença, por meio da proteção animal a fim de evitar os possíveis sofrimentos. Na fase do abate, segundo Borges & Almeida (2008), são importantes mecanismos que venham estabelecer uma morte rápida e livre de sofrimentos prolongados. Desta forma, é essencial a preocupação, por parte dos profissionais da cadeia produtiva bovina, com a prática do bem-estar animal, pois além de proporcionar uma diminuição dos sofrimentos do animal, terá um produto de qualidade e com isto poderá obter um diferencial competitivo em relação aos produtores que não seguem esta gestão. Também poderão aumentar sua parcela de marketchair em âmbito nacional e internacional, pois conforme Ferreira e Barcelos (2008), a razão do declínio do consumo de carne bovina está associada à perspectiva do consumidor sobre a dieta, política de produção sustentável, bem-estar animal e saúde. Assim, é importante ressaltar que algum tipo de alteração do estado fisiológico ou comportamental do animal poderá comprometer o seu bem-estar e prejudicar toda a cadeia produtiva por meio de desagregação de qualidade da carne ao consumidor final (MOLENTO, 2005). A fim de definir as normas de bem-estar na fase do abate, foi estabelecido o termo “abate humanitário” que consiste em um conjugado de diretrizes e normas técnicas que visam garantir o bem-estar no abatedouro até a etapa da sangria (FILHO& SILVA, 2004). 2. MATERIAIS E MÉTODOS Para atingir o propósito deste trabalho, realizou-se uma pesquisa de caráter qualitativo, exploratório e descritivo. Conforme Minayo (1998) a pesquisa qualitativa desenvolve-se no universo das ações humanas, trabalhando com valores, motivos e atitudes envolvidas em um processo, que não podem ser reduzidas à operacionalização de variáveis estatísticas. Por sua vez a pesquisa exploratória, de acordo com Vergara (1998), realiza-se quando há conhecimento do assunto, porém busca-se um aprofundamento. Ainda este autor conceitua a pesquisa descritiva como sendo utilizada quando já se tem algum conhecimento do assunto e pretende-se descrever o fenômeno. Tem-se assim, que estas modalidades de pesquisa são oportunas para avaliar e interpretar as ações na incorporação do bem-estar animal, não apenas para atender as exigências de mercado e/ou pelo caráter normativo, mas ainda, porque pode auxiliar na conscientização de práticas de gestão ética por parte da empresa. A pesquisa consistiu em três etapas e usou dados primários e secundários. A primeira etapa consistiu em estudo bibliográfico a fim de procurar explicação para um problema a partir de referências teóricas publicadas em documentos” (CERVO & BERVIAN, 5 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural 2000, p.65). Nesta primeira parte os dados usados foram secundários, buscados no referencial teórico disponível sobre o tema. Na segunda etapa realizou-se uma pesquisa de campo com a finalidade de conseguir informações ou conhecimento do problema abordado. (LAKATOS & MARCONI, 1996). A pesquisa de campo foi realizada em duas empresas do estado do Rio Grande do Sul, sendo uma do setor frigorífico, Frigorífico Mercosul, localizado na cidade de Bagé, e a outra a empresa rural Guatambu, localizada em Dom Pedrito. Nas duas empresas fez-se uso de entrevistas para a coleta de dados. As entrevistas foram aplicadas no dia 23 e 24 de outubro de 2008. A terceira etapa da pesquisa consistiu em entrevistas semi-estruturadas com proprietários rurais a fim de verificar se as práticas de BEA eram adotadas em suas propriedades. Realizaram-se quatro entrevistas, sendo dois proprietários da região Sul do Estado, onde localizam-se o Frigorífico Mercosul e a Fazenda Guatambu, e outros dois de Canoas e Capela Santana, região da Grande Porto Alegre, capital do Estado. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO O frigorífico entrevistado inseriu a prática do BEA devido à exigência de seus clientes por uma carne de qualidade e pelos benefícios trazidos por esta prática. Esta empresa vem incentivando os seus fornecedores a usarem esta técnica, desde a criação até a entrega dos animais ao frigorífico. A empresa tem como critério de pagamento, cálculos de rendimento e qualidade da carcaça. Assim, o animal que apresentar maior índice de perda de qualidade, devido a hematomas e lesões, proporcionados por técnicas rudimentares, irá proporcionar perdas financeiras ao produtor. Atualmente, o frigorífico vem abatendo em sua planta industrial 600 animais/dia ou animais/hora, sendo que sua capacidade máxima compreende o total 800 animais/dia. Utiliza em seus piquetes de descanso, lotação de 2,5m² por animal, cocho com água e, no verão, oferece aos bovinos duchas diária de água para amenizar o calor, assim como sombra para os animais. Já, no aspecto do transporte, é realizada a separação entre 14 a 18 animais no embarque do caminhão até o frigorífico e os funcionários têm a responsabilidade de agrupálos por idade, produtor, raça e sexo, e posteriormente direcionado o lote com base no critério de agrupamento descrito anteriormente. Conforme entrevista concedida por uma estagiária do frigorífico, a empresa proporciona aos seus funcionários e criadores palestras e treinamentos sobre bem-estar animal, nas quais os participantes aprendem técnicas para desempenhar suas práticas de criação dentro dos parâmetros estabelecidos pelo tema. Uma providência tomada pelo frigorífico foi a substituição de ferramentas de trabalho que venham proporcionar algum tipo de dor e estresse ao animal, como a inserção de chocalho ao invés do uso de guinchos, pois o uso deste instrumento desencadeia estresse ao animal antes do seu abate . Logo, no processo de abate animal, a empresa vem utilizando o “abate humanitário” para proporcionar uma morte rápida e sem sofrimento ao animal. Porém, para que este frigorífico continue a prática do BEA, é essencial que todos os seus fornecedores utilizem a mesma técnica em sua produção. 6 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural A empresa rural entrevistada, a Fazenda Guatambu, é um dos fornecedores do frigorífico Mercosul. Esta empresa vem utilizado o BEA devido ao aumento da rentabilidade econômica, melhora na qualidade da carcaça e para corresponder às exigências do frigorífico. Atualmente, a Fazenda Guatambu possui um plantel de 8.000 bovinos da raça Hereford e Braford, e ciclo produtivo completo. Além disso, a empresa rural tem como uma de suas estratégias a integração da agricultura com a pecuária e desempenha a inserção de um sistema pastoril intenso, melhoramento genético, seleção por produção com fator delta G. Em relação aos aspectos de pastagem, são compostos por consórcios entre várzea, com rotação de 1 a 2 anos; arroz, de 3 a 4 anos; coxilhas, 1 ano; soja ou sorgo, de 4 a 8 anos; e milho, semente de forrageiro e leguminosa, no período de 2 anos, para posteriormente ser colocado a pastagem para a pecuária de corte. Com esta estratégia, a empresa consegue agregar valor nutritivo à pastagem do animal e do solo, obtendo resultados benéficos para manter sua produção e a qualidade da carne bovina para a comercialização. A empresa vem adotando a prática do BEA animal devido a sua capacidade de obter melhores rendimentos, sendo que o empresário teve o primeiro contato com esta gestão em eventos da cadeia produtiva da carne bovina e, posteriormente, por meio de uma reunião com o frigorífico Mercosul. A empresa adota as técnicas de BEA com seus funcionários, porém uma das maiores dificuldades encontradas pelos funcionários foi entender que as novas técnicas são mais eficientes que as ditas tradicionais, passadas ao longo das gerações, e que estas novas técnicas melhorariam a qualidade da carne, através da diminuição dos acidentes providos do mau manejo. Desta forma, a empresa passou por uma série de treinamentos com os funcionários e mudou alguns aspectos em suas instalações, como o aumento dos bretes para evitar a superlotação. Outro ponto que passou por reestruturação foi a inserção de chocalhos para tocar os animais, também foi introduzido piso antiderrapante no transporte e a separação de animais por lotes segundo sexo, idade e raça. Após as mudanças a empresa constatou ganhos significantes no que se refere à diminuição de acidentes no transporte de animais e ainda o couro apresentou qualidade superior devido à diminuição de arranhões e cortes. Os proprietários rurais entrevistados, criadores de bovinos, responderam que adotam as práticas de bem-estar animal em suas propriedades. Quanto às melhorias observadas na propriedade desde a adoção destas práticas, foram citadas: a) Animais visivelmente mais calmos b) Facilidade e rapidez de manejo c) Melhora na carcaça Diante da interrogativa sobre a iniciativa de adotar as práticas de bem-estar animal foi unânime a resposta de que foi própria e de que os frigoríficos, aos quais entregam o gado, não exigiram a adoção destas práticas. 7 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Quanto ao incentivo dos frigoríficos apenas o entrevistado da região de Canoas revelou não ter contato com incentivos. Neste aspecto destaca-se a citação dos proprietários de Bagé e Dom Pedrito, que entregam os animais ao frigorífico Mercosul, de que este frigorífico sempre os incentivou nas práticas de bem-estar. Os entrevistados de Capela Santana e Dom Pedrito relataram dificuldades para que as práticas de BEA sejam aplicadas por seus funcionários, dentre as quais: a) Dificuldade com o transporte dos animais até o abatedouro, pois as estradas não estão em boas condições; b) Consciência do profissional que dirige o caminhão de transporte. Um dos entrevistados já teve animal que chegou sem vida no abatedouro devido ao excesso de velocidade do motorista do caminhão e, conseqüentemente, aos choques a que os animais estão sujeito dentro do veículo; c) Consciência do profissional no campo, que valoriza mais a prática do trabalho do que a qualidade do trabalho em si. Em uma das propriedades em que o guizo foi trocado por bandeirinha, o proprietário percebeu que na ponta da bandeirinha havia um pequeno guizo, que continuava sendo usado para conduzir o gado; d) Pressa do profissional do campo em conduzir o gado ao caminhão, o que dificulta o tratamento humanitário com o animal. Quanto ao treinamento dos funcionários sobre as práticas de BEA os proprietários de Dom Pedrito e Bagé proporcionaram a um dos funcionários responsáveis pela entrega do gado ao frigorífico, uma aula oferecida pelo Sindicato Rural de suas regiões sobre o BEA. Os entrevistados, da região da Grande Porto Alegre, colocaram que não houve treinamento oficial mas que os proprietários ensinaram e estimulam os funcionários às práticas do BEA. Dentre as práticas estimuladas foram citadas: a) Tratar os animais com calma; b) Não gritar; c) Dar atenção especial ao rebanho de cria (evita-se manejar um alto número de ventres prenhes - superlotação - a fim de evitar abortos e perdas reprodutivas; d) Proibição do uso de guizos. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os animais devem ser criados o mais próximo possível de suas características naturais, proporcionando-lhes equilíbrio e harmonia em seu habitat natural, pois os animais possuem sentimentos, emoções e preferências. Devem dispor de espaços amplos que permitam sua movimentação, um abrigo que proporcione conforto térmico, água e alimentação de qualidade que satisfaçam suas necessidades fisiológicas. Uma vez que o bem-estar animal, na cadeia de produção de bovinos, contribui para a melhoria do produto final, o tema em questão tem ocupado espaço de destaque entre as instituições e empresas, as quais estão cada vez mais interessadas em satisfazer as necessidades e exigências dos consumidores. Nas visitas técnicas ao frigorífico Mercosul e à Fazenda Guatambu foram identificadas ações que permeiam a utilização dos conceitos de bem-estar animal, revelando que ambas estão adotando a prática do BEA, proporcionando vantagens econômicas e competitivas. 8 Campo Grande, 25 a 28 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural Referencias AMARAL, J.B. do Bioética na experimentação científica e na exploração econômica de bovinos. 2008. Disponível em: http://www.infobibos.com. 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