AULA 07
OS MECANISMOS
DE DEFESA, OU A REALIDADE COMO ELA NÃO É
A percepção de um acontecimento, do mundo externo ou do mundo
interno, pode ser algo muito constrangedor, doloroso, desorganizador.
Para evitar este desprazer, a pessoa “deforma” ou suprime a realidade —
deixa de registrar percepções externas, afasta determinados conteúdos
psíquicos, interfere no pensamento.
São vários os mecanismos que o indivíduo pode usar para realizar esta
deformação da realidade, chamados de mecanismos de defesa.
São processos realizados pelo ego e são inconscientes, isto é, ocorrem
independentemente da vontade do indivíduo.
Para Freud, defesa é a operação pela qual o ego exclui da consciência os
conteúdos indesejáveis, protegendo, desta forma, o aparelho psíquico. O
ego — uma instância a serviço da realidade externa e sede dos processos
defensivos — mobiliza estes mecanismos, que suprimem ou dissimulam a
percepção do perigo interno, em função de perigos reais ou imaginários
localizados no mundo exterior.
Estes mecanismos são:
• Recalque: o indivíduo “não vê”, “não ouve” o que ocorre. Existe a
supressão de uma parte da realidade. Este aspecto que não é percebido
pelo indivíduo faz parte de um todo e, ao ficar invisível, altera, deforma o
sentido do todo. E como se, ao ler esta página, uma palavra ou uma das
linhas não estivesse impressa, e isto impedisse a compreensão da frase
ou desse outro sentido ao que está escrito. Um exemplo é quando
entendemos uma proibição como permissão porque não “ouvimos” o
“não”. O recalque, ao suprimir a percepção do que está acontecendo, é o
mais radical dos mecanismos de defesa. Os demais referem-se a
deformações da realidade.
• Formação reativa: o ego procura afastar o desejo que vai em
determinada direção, e, para isto, o indivíduo adota uma atitude oposta a
este desejo. Um bom exemplo são as atitudes exageradas — ternura
excessiva, superproteção — que escondem o seu oposto, no caso, um
desejo agressivo intenso. Aquilo que aparece (a atitude) visa esconder do
próprio indivíduo suas verdadeiras motivações (o desejo), para preserválo de uma descoberta acerca de si mesmo que poderia ser bastante
dolorosa. É o caso da mãe que superprotege o filho, do qual tem muita
raiva porque atribui a ele muitas de suas dificuldades pessoais. Para
muitas destas mães, pode ser aterrador admitir essa agressividade em
relação ao filho.
• Regressão: o indivíduo retorna a etapas anteriores de seu
desenvolvimento; é uma passagem para modos de expressão mais
primitivos. Um exemplo é o da pessoa que enfrenta situações difíceis com
bastante ponderação e, ao ver uma barata, sobe na mesa, aos berros.
Com certeza, não é só a barata que ela vê na barata.
• Projeção: é uma confluência de distorções do mundo externo e interno.
O indivíduo localiza (projeta) algo de si no mundo externo e não percebe
aquilo que foi projetado como algo seu que considera indesejável. É um
mecanismo de uso frequente e observável na vida cotidiana. Um exemplo
é o jovem que critica os colegas por serem extremamente competitivos e
não se dá conta de que também o é, às vezes até mais que os colegas.
• Racionalização: o indivíduo constrói uma argumentação
intelectualmente convincente e aceitável, que justifica os estados
“deformados” da consciência. Isto é, uma defesa que justifica as outras.
Portanto, na racionalização, o ego coloca a razão a serviço do irracional e
utiliza para isto o material fornecido pela cultura, ou mesmo pelo saber
científico. Dois exemplos: o pudor excessivo (formação reativa), justificado
com argumentos morais; e as justificativas ideológicas para os impulsos
destrutivos que eclodem na guerra, no preconceito e na defesa da pena
de morte.
Além destes mecanismos de defesa do ego, existem outros: denegação,
identificação, isolamento, anulação retroativa, inversão e retorno sobre si
mesmo. Todos nós os utilizamos em nossa vida cotidiana, isto é,
deformamos a realidade para nos defender de perigos internos ou
externos, reais ou imaginários. O uso destes mecanismos não é, em si,
patológico, contudo distorce a realidade, e só o seu desvendamento pode
nos fazer superar essa falsa consciência, ou melhor, ver a realidade como
ela é.
APROFUNDANDO O ASSUNTO:
Mecanismos de defesa-A realidade como ela NÃO é .
Todo animal, irracional ou racional, se defende
daquilo que acha que pode lhe prejudicar de
alguma maneira. Quando estamos com medo
nos retraímos ou avançamos, claro que isso
varia de pessoa pra pessoa e depende da
situação, mas todos diante de algo que acham
que pode lhes machucar de alguma maneira,
se protegem, se defendem.
Bem, com a nossa mente acontece o mesmo. Segundo Freud, quando ela
percebe que algo pode nos prejudicar mentalmente (alguma emoção,
atitude, reação...), ela ativa os seus mecanismos de defesa, que seriam
inconscientes e inevitáveis, e atuam sem que percebamos diretamente,
sendo assim um processo natural do ser humano.
""Os, mecanismos de defesa são estratégias (inconscientes) de esquiva
ao enfrentamento de problemas, elas capacitam as pessoas a falsificar e
distorcer o que de outra forma seria doloroso. É uma maneira de maquiar
a realidade para evitar sofrimento, impedindo que esses problemas
cheguem ao consciente. Todas elas envolvem a auto dissimulação e
apresentam um risco: podem impedir a busca e a avaliação de outras
soluções." Linda L.Daviddof
Eles tentam amenizar qualquer situação psicológica que pode colocar em
risco a integridade do ego, pois seria mais difícil pro individuo lidar com
situações que por algum motivo considere ameaçadoras. Eles tem como
base a angústia e a ansiedade, quanto maior o nível desses dois mais forte
será a ação desses mecanismos.
Como eu já disse, eles ocorrem sem que nos percebamos diretamente,
como se fosse espontâneos, como Freud dizia mesmo aquilo que parece
espontâneo, tem uma causa, um sentido, "Há uma causa para cada
pensamento, para cada memória revivida, sentimento ou ação.", pois
cada evento mental é causado pela intenção consciente ou inconsciente e
é determinado pelos fatos que o precedem.
Essas causas geram sempre alguma reação do organismo (como a
ansiedade por exemplo), mas existem alguns fatores que podemos
considerar aqui como principais responsáveis por causar uma angústia
psicológica. A perda ou privação de algo desejado (uma criança que não
convive com o pai, ou a perda de um parente...). A perda de amor, rejeição,
fracasso ou a desaprovação de alguém que lhe importa. Perda de
identidade, é o medo da perda de prestigio, de ser ridicularizado em
público. Perda de autoestima, por exemplo a desaprovação do superego
por alguma atitude que resulte em culpa ou ódio em relação a si mesmo.
Todos esses fatores geram problemas internos, e existem duas formas de
resolver, enfrentando o problema diretamente ou negando e deformando
a realidade através dos mecanismos de defesa, que funcionam também
como formas de adaptação.
Nenhuma pessoa utiliza todos esses mecanismos, mas é feita uma
seleção que vai sempre se repetindo como reação quando necessário.
A filha de Freud, Anna Freud, distinguiu e conceituou vários tipos de
mecanismos de defesa dentre os principais são:

A Repressão: Ocorre quando as pessoas excluem da
consciência motivos, ideias, lembranças que podem gerar ansiedade.
Eles permanecem no subconsciente e não se manifestam para não causar
ansiedade e angustia no individuo, mas mesmo assim, influi no
comportamento. Além de que durante o processo de repressão o indivíduo
tende a ter um otimismo não compatível com a realidade, vendo apenas
o lado bom de coisas desagradáveis para não se machucar. Lembrando
que esse processo é inconsciente e acontece quase que diariamente.
Como exemplo temos uma pessoa em que viu uma cena de assassinato
mas como está em estado de choque não consegue se lembrar do
ocorrido.

A Negação: Quando ocorre algo que nos incomoda profundamente,
há a tendência a não aceitar esse ocorrido, ou lembrá-lo de modo
incorreto. Então negam a realidade, ignoram ou recusam -se a
reconhecer a existência desses aspectos desagradáveis de suas
experiências, apesar de estarem plenamente cientes das mesmas. Esse
método sempre envolve a auto dissimulação, na qual o próprio indivíduo
se engana, como por exemplo, uma pessoa portadora do vírus HIV que ao
receber o resultado diz ao médico que o exame não é dele, que ele se
sente muito bem portanto não está doente.

A Fantasia: É um processo psíquico em que o indivíduo concebe
uma situação em sua mente, quer satisfazer uma necessidade ou
desejo, que talvez não pode ser, na vida real. satisfeito. O
sujeito imagina de orgias e coisas contrarias a sua realidade até por
exemplo as férias tão desejadas, um encontro amoroso ou possíveis
soluções para um problema, fazendo com que as necessidades
fantasiadas sejam de um certo modo supridas.

A Racionalização::Envolve a invenção de razões plausíveis e
aceitáveis para determinadas situações, atos, pensamentos ou impulsos
quando alguém deseja esconder de si próprio as verdadeiras explicações,
é um processo pelo qual o sujeito procura apresentar uma explicação
coerente do ponto de vista lógico, ou aceitável do ponto de vista moral,
para uma atitude, uma ação, uma ideia, um sentimento, cujos motivos
verdadeiros causariam angustia nele e fariam sua mente entrar em conflito
por não irem de acordo com sua moral e realidade. Podemos dar como
exemplo quando o sujeito dá desculpas do tipo "Eu teria passado naquele
exame se o professor não tivesse feito perguntas tão idiotas" que
possibilita ao estudante evitar o seu desespero ou capacidade limitada.

A Formação reativa: É quando as pessoas escondem de si próprias
algum motivo, emoção, atitude, traço da personalidade ou qualquer outra
coisa parecida, expressando o oposto. Como por exemplo o ódio
disfarçado de exagerada exibição de amor, o forte impulso sexual em
excessivo recato, a hostilidade em gentileza. É como se a mente não
quisesse admitir determinado fato e para isso demonstra o oposto,
lembrando que o indivíduo não está representando algo que ele não é,pois
esse é um fenômeno inconsciente.

A Projeção: Manifesta-se quando o Ego não aceita reconhecer um
impulso inaceitável do Id e o atribui a outra pessoa. No sentido
propriamente psicanalítico, operação pela qual o sujeito expulsa de si e
localiza no outro- pessoa ou coisa- qualidades, sentimentos, desejos e
mesmo “objetos” que ele desconhece ou recusa nele. As pessoas que se
utilizam da projeção são muito mais rápidas em observar defeitos nos
outros que muitas vezes elas mesmas possuem (e as vezes até em
maior grau) mas não o "enxergam" em si mesmas. Como exemplo temos,
uma mulher que critica uma conhecida por ser muito gastadeira enquanto
ela mesma o é.

A Identificação: É um processo psíquico no qual o sujeito
assimila uma característica ou comportamento de outra pessoa
e imita essa característica, se identificando. Nós também somos
compostos por várias identificações ao longo da vida. Podemos
exemplificar através de um menino que vê outro ser generoso, admira a
atitude e a repete incorporando-a ao seu comportamento.
Aqui vimos alguns dos principais mecanismos de defesa psicológicos
segundo a psicanálise.
Quando eles não funcionam, o sujeito fica ansioso e angustiado, podendo
causar até mesmo um surto mental. Porém a manifestação mais ocorrente
quando eles não funcionam além de ansiedade é claro, são os conflitos
psicológicos, surgem quando dois ou mais objetivos (necessidades,
ações, emoções, pensamentos) competem um com o outro, pressionando
o sujeito em diferentes direções, e como a escolha por uma opção acarreta
no abandono da outra isso faz com tais conflitos sejam frustrantes e
geradores de ansiedade. Se esses conflitos forem temporários eles são
chamados de transtornos, se forem duradouros são chamados de cargas
crônicas.
AULA 08
PSICANÁLISE: APLICAÇÕES E CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS
A característica essencial do trabalho psicanalítico é o deciframento do
inconsciente e a integração de seus conteúdos na consciência. Isto porque
são estes conteúdos desconhecidos e inconscientes que determinam, em
grande parte, a conduta dos homens e dos grupos — as dificuldades para
viver, o mal-estar, o sofrimento.
A finalidade deste trabalho investigativo é o autoconhecimento, que
possibilita lidar com o sofrimento, criar mecanismos de superação das
dificuldades, dos conflitos e dos submetimentos em direção a uma
produção humana mais autônoma, criativa e gratificante de cada indivíduo,
dos grupos, das instituições.
Nesta tarefa, muitas vezes bastante desejada pelo paciente, é necessário
que o psicanalista ajude a desmontar, pacientemente, as resistências
inconscientes que obstaculizam a passagem dos conteúdos inconscientes
para a consciência.
A representação social (a ideia) da Psicanálise ainda é bastante
estereotipada em nosso meio. Associamos a Psicanálise com o divã, com
o trabalho de consultório excessivamente longo e só possível para as
pessoas de alto poder aquisitivo. Esta ideia correspondeu, durante muito
tempo, à prática nesta área que se restringia, exclusivamente, ao
consultório.
Contudo, há várias décadas é possível constatar a contribuição da
Psicanálise e dos psicanalistas em várias áreas da saúde mental.
Historicamente, é importante lembrar a contribuição do psiquiatra e
psicanalista D. W. Winnicott, cujos programas radiofônicos transmitidos na
Europa, durante a Segunda Guerra Mundial, orientavam os pais na criação
dos filhos, ou a contribuição de Ana Freud
para a Educação e, mais recentemente, as
contribuições de Françoise Dolto e Maud
Mannoni para o trabalho com crianças e
adolescentes em instituições — hospitais,
creches, abrigos.
Atualmente, e inclusive no Brasil, os
psicanalistas estão debatendo o alcance
social da prática clínica visando torná-la
acessível a amplos setores da sociedade.
Eles também estão voltados para a
pesquisa e produção de conhecimentos
que possam ser úteis na compreensão de
fenômenos sociais graves, como o
aumento do envolvimento do adolescente
com a criminalidade, o surgimento de novas (antigas?) formas de
sofrimento produzidas pelo modo de existência no mundo contemporâneo
— as drogadições, a anorexia, a síndrome do pânico, a excessiva
medicalização do sofrimento, a sexualização da infância. Enfim, eles
procuram compreender os novos modos de subjetivação e de existir, as
novas expressões que o sofrimento psíquico assume. A partir desta
compreensão e de suas observações, os psicanalistas tentam criar
modalidades de intervenção no social que visam superar o mal-estar na
civilização.
Aliás, o próprio Freud, em várias de suas obras — O mal-estar na
civilização, Reflexões para o tempo de guerra e morte — coloca questões
sociais, e ainda atuais, como objeto de reflexão, ou seja, nos faz pensar e
ver o que mais nos incomoda: a possibilidade constante de dissociação
dos vínculos sociais.
O método psicanalítico usado para desvendar o real, compreender o
sintoma individual ou social e suas determinações, é o interpretativo.
No caso da análise individual, o material de trabalho do analista são os
sonhos, as associações livres, os atos falhos (os esquecimentos, as
substituições de palavras etc.). Em cada um desses caminhos de acesso
ao inconsciente, o que vale é a história pessoal. Cada palavra, cada
símbolo tem um significado particular para cada indivíduo, o qual só pode
ser apreendido a partir de sua história, que é absolutamente única e
singular.
Por isso é que se diz que, a cada nova situação, realiza-se O sofrimento
humano assume inúmeras expressões. novamente a experiência
inaugurada por Freud, no início do século 20 — a experiência de tentar
descobrir as regiões obscuras da vida psíquica.
AULA 09
RETOMANDO A HISTÓRIA
COMPLEMENTO DA VÍDEO AULA
BREVE HISTÓRIA DA PSICANÁLISE
A Psicanálise, como qualquer outra escola psicológica é ponto de partida
de várias outras teorias. Aquilo que denominamos Psicanálise deve ser
entendida sob pelo menos dois aspectos independentes, mas
complementares. Por um lado como uma teoria explicativa do
funcionamento e do desenvolvimento da mente humana, por outro como
um conjunto de técnicas terapêuticas destinadas ao autoconhecimento ou
ao tratamento de pessoas mentalmente perturbadas.
Como uma teoria do conhecimento da mente humana a Psicanálise deu
uma das mais importantes contribuições à psicologia moderna, inclusive
podendo seu aparecimento ser considerado um dos marcos da criação de
uma efetiva Psicologia como ciência, pois ela definiu de forma marcante
um objeto de estudo e uma metodologia para a Psicologia, permitindo-lhe
o descobrimento de leis básicas: o principio do prazer, o determinismo
psíquico e a proposição da inconsciência, como sendo características
básicas dos processos mentais.
ORIGENS DA PSICANÁLISE
A mente humana e os seus processos foram sempre tão misteriosos e
fascinantes quanto o próprio universo. Através dos tempos, filósofos,
teólogos, psicólogos, médicos, e outros tipos de sábios tentaram
compreender o enigma da mente humana.
O que levava o homem à loucura?
Qual a origem e a finalidade dos sonhos?
Muitos autores costumam situar o início da Psicanálise por volta do século
XIX, com os trabalhos de Pinel e Charcot, dois ilustres psiquiatras.
Podemos, no entanto, localizar as raízes da Psicanálise nos povos
antigos, com no início da filosofia.
A Bíblia, por exemplo, cita os sonhos do faraó e a interpretação de José.
Da mesma forma no Talmude, livro de leis judaicas, encontramos a citação
de que um sonho incompreendido é como uma carta não aberta.
Para os gregos o objetivo da filosofia era fazer a passagem do mito para
a razão. Podemos então localizar os germes da psicanálise, na primeira
tentativa de autoconhecimento dos antigos gregos: 'Conhece-te a ti
mesmo'
aqui
reside
a
máxima
da
psicanálise.
Muitos séculos iriam se passar antes que os progressos de vulto
ocorressem no conhecimento da mente.
Num rápido retrospecto podemos citar como precursores da Psicanálise:
Anton Mesmer (1734 – 1815), místico e médico austríaco, criador do
método de tratamento de “magnetismo animal”, uma forma primitiva de
hipnose e sugestão. De certa forma estas idéias abriram as portas para a
descoberta do hipnotismo e do inconsciente.
Philipe Pinel (1745 – 1836), médico francês, que modificou os métodos de
tratamento dos doentes mentais, libertando-os das celas e das correntes,
sendo o primeiro a demonstrar que a substituição dos métodos brutais por
métodos mais “humanos” era muito mais eficiente. Pinel foi o grande
responsável pela saída das doenças mentais do âmbito da teologia e da
filosofia e sua entrada para a medicina.
Jean Charcot (1825 – 1893), neurologista francês de grande prestígio em
sua época, foi outro nome na escada que levaria até a psicanálise. Na
metade final do século XIX, tal como as ciências físicas e biológicas que
deram grandes passos no sentido da cura de muitas doenças, a neurologia
e a psiquiatria também fizeram seus progressos. Charcot chefiava uma
clínica neurológica na Salpetrière em Paris, para onde afluíam jovens
médicos de vários países na busca dos novos conhecimentos sobre a cura
da histeria e sua relação com o hipnotismo. Entre muitos de seus alunos
se encontrava um jovem médico austríaco chamado Sigmund Freud.
Freud ficou impressionado com o poder da sugestão mental, porém
Charcot não formulou nenhuma teoria sobre o comportamento humano,
pois acreditava que a histeria tivesse uma origem orgânica. Vez por outra,
entretanto, mencionava o conceito de “memórias esquecidas”, que viriam
a ter relevo grande relevo na psicanálise. Ele, também, tinha
conhecimento de problemas sexuais ligados à histeria.
Pierre Janet (1859 – 1947), um dos mais conceituados alunos de Charcot,
continuou seus estudos sobre as neuroses histéricas, mostrando com a
ajuda do hipnotismo, que as manifestações patológicas da histeria
dependiam estritamente de idéias inconscientes fixas.
Muitos outros nomes foram importantes para a descoberta da Psicanálise
por Freud. Entre eles estão: James Braid, um dos inventores do
hipnotismo; Bernheim, estudioso do hipnotismo; Émile Coué, que usou a
sugestão e a autossugestão nos seus estudos.
Do hipnotismo original tiramos dois ensinamentos básicos:
• Algumas alterações somáticas singulares são resultados de influencias
psíquicas;
• A conduta dos pacientes depois do transe hipnótico deixava a nítida
impressão da existência de processos anímicos, que só poderiam ser
oriundos do inconsciente.
Paralelamente, neste período, a Psicologia também passava por grandes
transformações. Em 1860, nascia a Psicologia Experimental, quando
Gustav Fechner (1801 – 1887) publicou sua obra “Elementos de
Psicofísica” em que apresentava métodos psicológicos para medir as
sensações, cujos resultados poderiam ser expressos através de formulas
matemáticas. O sucessor de Fechner foi outro alemão, Wilhelm Wund
(1832 – 1920), que em 1879 fundou na universidade de Leipzig o primeiro
laboratório de Psicologia Experimental. Sob sua influência surgiram nos
Estados Unidos à escola Comportamentalista de Watson e na Alemanha
a escola Gestaltica de Wertheimer, Köhler e Kofka.
Porém, os dois homens que mais influenciaram Freud foram Joseph
Breuer e Pierre Charcot. Freud conheceu Breuer em 1878. Breuer mostrou
a Freud que em pacientes histéricos hipnotizados desapareciam os
sintomas de histeria, se fizesse reaparecer no doente, a lembrança dos
acontecimentos traumáticos, durante o sono hipnótico. Mais tarde Freud e
Breuer se separaram e Freud seguiu seu caminho sozinho.
Na Europa Vitoriana, uma jovem desconhecida de Viena, chamada Anna
O, ajuda a desvendar-se um dos maiores mistérios da mente humana.
Anna adoecera subitamente em 1880, aos 21 anos, enquanto cuidava do
pai agonizante. A mãe de Anna chama seu médico particular, Joseph
Breuer (1842 – 1925), para tratar de sua filha que apresentava paralisias
motoras, inibições e perturbações de consciência. Seguindo uma
indicação da própria paciente, Breuer empregou o hipnotismo, verificando
que em todas as vezes que Anna lhe comunicava as paixões e as idéias
que a dominavam, voltava a um estado psíquico normal. Pela repetição
das sessões o trabalho de Breuer teve êxito. Todavia, o médico se absteve
de levar adiante sua descoberta, mantendo sigilo sobre a mesma durante
sete anos, até o outono de 1886.
Em 1885, Freud vai a Paris estudar com Pierre Charcot. Lá conhece bem
o hipnotismo, a sugestão e os seus efeitos sobre a histeria.
Tudo estava, finalmente, pronto para a entrada no cenário da história, do
verdadeiro criador da Psicanálise, Sigmund Freud.
Sigmund Freud nasceu em 1856, na hoje República Tcheca, chamava-se
Scholomo Sigismund. Estudou medicina em Viena, na Áustria. Casou-se
com Martha Bernays, com quem teve 6 filhos. Freud faleceu em 1939, em
Londres.
Freud é aclamado como o pai da Psicanálise. Ele define em várias
passagens que uma das missões da Psicanálise seria levar o EGO
(nossos processos mentais conscientes) onde está o ID (nossos
processos mentais inconscientes).
Em 1900, Freud lança um dos seus primeiros e mais importantes livros: A
Interpretação dos Sonhos, onde ele começa a abordar o tema do
inconsciente.
Foi a partir do gênio de Sigmund Freud que a Psicanálise tomou a forma
que a define e a distingue de outros tipos de psicoterapia até hoje. A partir
dos seus estudos sobre o inconsciente, os sonhos, a sexualidade infantil,
a transferência, a repressão, as resistências, as psicopatologias como
neuroses obsessivas e histerias puderam ser tratadas de forma
satisfatória, devolvendo qualidade de vida para esses doentes.
Freud escreveu uma vastíssima obra por mais de quarenta anos. Sua obra
engloba estudos de psicologia, sexualidade, antropologia e até mesmo
crítica literária. Como tratou de todos esses assuntos sobre uma ótica
psicanalítica, ele acabou por fundar uma ciência distinta de outras, apesar
de que por mais de cem anos, outras ciências como a psicologia e a
psiquiatria reivindicam a si a primazia sobre a psicanálise. Mas é
importante frisar que a psicanálise é uma ciência livre, com formação
específica para seus profissionais.
Outras escolas psicanalíticas surgiram do berço freudiano, algumas
acrescentando, outras alterando, mas nenhuma rompendo com a obra de
Freud. Mas esse fato não se dá por uma idolatria a obra de Freud, mas
por sua qualidade, que atravessa o tempo e até hoje, conceitos como
inconsciente são utilizados, ainda que com variações, são a base da
psicanálise. Esse aliás é um dos critérios para se diferenciar se uma
psicoterapia é ou não psicanálise - se a psicoterapia tem suas bases na
obra de Freud.
As principais contribuições que seguiram a Freud foram feitas pelas
seguintes escolas:
Melanie Klein - a partir de seus estudos com crianças, Klein fundamentou
a psicanálise infantil, que até hoje permanece a mesma, com pequenas
contribuições de outros autores. Klein também contribuiu para o melhor
entendimento do psiquismo de recém nascidos, ampliando o campo de
atuação da psicanálise, permitindo o tratamento de psicóticos.
Donald Winnicot - a partir de seus trabalhos em pediatria, Winnicot
contribuiu para aprofundamento do entendimento sobre o psiquismo da
criança, em especial a importância que a função materna tem nesse
desenvolvimento.
Jacques Lacan - Importantes contribuições foram feitas por esse
psicanalista, que a partir de uma releitura da obra de Freud, aliada a uma
instigante mistura com Hegel e Heidegger, reformulou muitos dos
fundamentos do mestre, como por exemplo, a constituição como uma
estrutura de linguagem. O seu trabalho aprofundou o entendimento e o
tratamento da mente psicótica.
Existem vários outros autores que contribuíram de forma significativa para
o desenvolvimento e progresso da Psicanálise, como por exemplo W.
Bion, M. Mahler, F. Dolto, W. Reich, e muitos outros.
AULA 10
A DESCOBERTA DA PSICANÁLISE
COMPLEMENTO DA VÍDEO AULA
l — O que o hipnotismo encobria
Freud era ainda um médico muito jovem quando descobriu o método de
cura pela Psicanálise. Empregava ele o hipnotismo, no tratamento das
afecções nervosas, quando começou a notar que as ideias, ou melhor, os
fatos esquecidos pelo paciente, eram perfeitamente relembrados logo que
os enfermos sofriam a ação da força hipnótica.
Uma vez despertados da hipnose, “esqueciam-se”, porém, os doentes, de
tais ocorrências, não tendo assim nenhuma ideia consciente do que se
havia passado. Pois bem. Durante esses tratamentos, principiou a
observar que os seus clientes apresentavam uma certa “resistência” em
confessar as reminiscências “esquecidas”, tornando-se, às vezes, uma
barreira quase intransponível.
Segundo o grau, a extensão de “resistência”, pôde então concluir que as
lembranças desmemoriadas, na vida consciente, se achavam
profundamente cavadas no espírito dos enfermos.
Para que elas se apresentassem, seria preciso, portanto, vencer,
certamente, “alguma coisa” de forte que se opunha tenazmente à
exteriorização das ideias “soterradas”.
Por outro lado, essas deslembranças estavam sempre ligadas a
acontecimentos desagradáveis, penosos, considerados pelo indivíduo
como questões dolorosas ou vergonhosas às aspirações da
personalidade.
O hipnotismo encobria, assim, um jogo de forças que precisava evidenciarse. Freud começou a pensar que todo segredo desse jogo de forças
consistia em dominar a “resistência” dos enfermos.
Mas se essa “resistência” era vencida pelo hipnotismo apenas, isto não
lhe bastava, porque, após o sono hipnótico, ela de novo se apresentava,
impedindo que as ideias viessem à tona da consciência.
Não seria a falta de libertação dessas lembranças, em estado de vigília, a
causa dos distúrbios nervosos de seus pacientes?
2 — A paciente histérica
A pergunta se achava sem resposta, quando um seu colega e amigo, Prof.
Breuer, com quem Freud privava todos os dias, observou na sua clínica,
também de hipnotismo, o seguinte caso:
Submetida ao sono hipnótico uma senhora histérica revelara-lhe certa e
determinada lembrança, esquecida por completo na vida desperta e de
real interesse clínico. Tratava-se uma moça histérica, de 21 anos de
idade, inteligente e culta. Tendo adoecido (a enfermidade durou dois
anos), apresenta inúmeras perturbações físicas e além de muitos outros
fenômenos psíquicos, tinha a mais uma paralisia de ambas as
extremidades do lado direito, com anestesia (insensibilidade), cujo sintoma
se estendia, por vezes, até o lado oposto. Várias outras perturbações
também eram observadas: anormalidade dos movimentos oculares,
dificuldade em manter a cabeça erguida, tosse nervosa, repugnância
alimentar, impossibilidade beber água, apesar da sede martirizante, etc.
Tais distúrbios chegaram a ponto de inibi-la de compreender a língua
materna e tantas outras coisas que alteravam inteiramente a própria
personalidade. Notava-se que no estado de confusão mental, a doente
murmurava palavras que pareciam relacionar-se com males que a
afligiam.
Sujeita ao hipnotismo, a paciente reproduzia fantasias ou devaneios
profundamente tristes, muitas vezes até de real beleza poética. Estas
iniciavam-se, quase sempre, descrevendo a situação de uma jovem à
cabeceira do pai enfermo. Depois de desafogada a fantasia, sentia-se
como que aliviada. Tal estado durava, porém, algumas horas para, ao dia
seguinte voltar de novo. Durante a hipnose os sintomas desapareciam.
Pois bem. Ninguém até então removera por tal meio os sintomas histéricos
de ordem corporal. Pesquisados os síndromes dessa mesma enfermidade
em outros pacientes, pôde Freud realmente chegar à conclusão de que
todos eles se formam à custa de reminiscências afetivas, que valem como
verdadeiros “traumas psíquicos”, cujos sintomas se relacionam com as
cenas traumáticas que os produzem.
Assim,
todos
os
distúrbios
da
doente
não
passavam
de impressões penosas, fixadas durante o tempo em que ela se dedicava
ao pai enfermo.
3 — As ideias soterradas
Certa noite, velava o pai, em estado de superexcitação nervosa, pois se
esperava de Viena um cirurgião que haveria de operá-lo. Ausente sua
mãe, sentada à cabeceira do doente, passou a filha o braço sobre o
espaldar da cadeira e, num semi-sonho, viu, como que se viesse da
parede, uma cobra que rastejava, em direção ao leito do pai, para mordêlo. (Provavelmente — diz Freud — no quintal da casa existiam cobras,
assustando anteriormente a moça e fornecendo agora o material da
alucinação.).
Nessa alucinação pretendeu ela afastar o animal, mas estava como que
paralisada, o braço direito (estendido no espaldar da cadeira) ficara
adormecido. Quando o contemplou, seus dedos transformaram-se em
cobrinhas, cujas cabeças eram caveiras (as unhas). A anestesia do braço
associou-se assim à alucinação da serpente. Quis em seguida rezar, mas
não achou palavras em idioma algum.
Com a reconstituição desta cena durante a hipnose, foi removida a
paralisia do braço que existia desde o começo da moléstia e a paciente
curou-se.
Todos os sintomas, como as perturbações visuais, a sede, etc., etc.,
achavam-se ligados aos cuidados da moça ao leito do pai e são
minuciosamente esclarecidos por Freud. Para nós, entretanto, é suficiente
o presente resumo, o qual nos dá, perfeitamente, uma ideia do caso
histórico que levou Freud a descobrir a Psicanálise.
Quando, depois, começou ele a empregar o mesmo critério nos seus
enfermos, pôde confirmar a veracidade do fenômeno ocorrido neste caso
clínico. Se antes o hipnotismo era empregado para os fins comuns a que
ele se destina, já agora lhe servia como um método “catártico”. Isto é, o
doente “vomitava” os seus desejos inconfessáveis, através da hipnose,
assegurando, assim, o diagnóstico de suas perturbações e, ao mesmo
tempo, libertando-se de seus males, quer físicos, quer psíquicos, uma vez
dissolvidos os sentimentos profundos inconfessáveis.
Ora, até então, a todos os cientistas, inclusive Charcot repugnava a
concepção psicológica da histeria, justamente porque, não raro, ela
também se manifesta com sintomas igualmente orgânicos (paralisias,
etc.). Diante, porém, desse caso já não havia mais dúvida de que tais
sintomas emocionais procuravam outras vias de exteriorização, refletindose na trama nervosa.
Tudo não passava de uma conversão (os males psíquicos são convertidos
no físico), como assim chamou o mestre, discordando, portanto, das
opiniões correntes.
O fato provocou as mais sérias controvérsias entre professores e
discípulos, pois demonstrava cabalmente que a histeria podia manifestarse em homens, derrubando uma velha teoria de que a neurose era
fundamentalmente feminina, de onde até lhe veio o nome clássico
hysteron, útero.
4 — A revelação
Freud já podia ter a certeza de que os sintomas nervosos, apresentados
na sua clínica, eram movidos por essas lembranças dolorosas,
adormecidas no fundo do espírito e das quais não tinha a consciência, até
então, nenhuma ideia. Valiam elas como verdadeiros traumas na alma
humana, desconhecidos por completo dos enfermos, porque eles o
haviam esquecido. Entretanto, desde que esses traumas viessem a ser
desmascarados à luz da consciência, analisados friamente por esta, todos
os sintomas cessavam.
Assim, os pacientes de Freud tinham também que “saber” o que lhe era
acessível na hipnose, trazendo ao âmago da consciência todo o
“esquecido” mórbido de suas vidas.
“O processo empregado, diz Freud, havia de ser mais trabalhoso, porém
mais elucidativo. Abandonei o hipnotismo e só conservei dele a maneira
de colocar o meu cliente em decúbito supino, sobre um divã, ficando eu
por trás dele, de forma a não ser visto.”
E com esse novo processo, a que deu o nome de PSICANÁLISE, Freud
pôde concluir, então, depois de infinitas experiências, que o homem não
vive apenas a vida do seu psiquismo consciente e que uma outra vida
palpita nas esconsas camadas do espírito humano. E é precisamente essa
vida interior, profunda, indevassável, até hoje, que a Psicanálise estudou,
estuda e continua observando.
Através dessa vida interior, a ciência de Freud sai do campo restrito da
Medicina para ganhar o domínio do inconsciente.
Psicanálise é, portanto, a Ciência do Inconsciente.
Psicanálise seria tal e qual o nome indica, a análise do psiquismo. Por isso
é comum falar-se de psicanálise em outras esferas de pesquisas mentais.
Desde que Freud, porém, lhe deu uma acepção mais profunda e
perfeitamente definida, ninguém mais deve aplicar o nome de psicanálise
a outras investigações que não estejam de acordo com os problemas do
inconsciente.
A Psicanálise, como vimos, nasceu de uma experiência clínica e,
inicialmente, só foi aplicada como processo terapêutico no tratamento das
neuroses.
Revolvendo, porém, a vida inconsciente dos pacientes, esta região do
espírito abriu-se, na ciência, como um novo panorama, desconhecido até
então, esclarecendo infinitas concepções errôneas, tidas e havidas como
certas, na órbita do Conhecimento.
AULA 11
Jean Charcot
COMPLEMENTO DA VÍDEO AULA
Jean-Martin Charcot (1825 - 1893), cientista francês nascido em Paris, e
falecido em Morvan, França, alcançou fama no terreno da psiquiatria na
França, na segunda metade do século XIX. Foi, um dos maiores clínicos
e professores de Medicina da França e juntamente, com Guillaume
Duchenne, o fundador da moderna neurologia.
Começou seus estudos médicos em 1844 e foi nomeado residente médico
dos Hospitais de Paris em 1848 e chefe de Clínica em 1853. Sua tese de
doutorado estabeleceu a diferença fundamento entre a gota e o
reumatismo articular ou nodoso. Realizou estudos pioneiros sobre o
sangue descobrindo as plaquetas que levam o seu nome, e descobriu
também a gênese da claudicação intermitente. Foi professor
na Universidade de Parispor 33 anos (1860-93). A partir de 1862 e até o
fim da sua vida trabalhou no hospital da Salpêtrière, do qual foi diretor.
Atraiu discípulos de toda a Europa, alguns deles, como Sigmund Freud,
se tornariam famosos mais tarde. Orientou sua própria pesquisa sobre as
doenças mentais para o campo da neurologia, criando uma clínica
neurológica na Salpêtrière, que foi a primeira da Europa. É considerado o
fundador da neurologia moderna.
Em 1867 publicou Leçons cliniques sur les maladies des veillards et les
maladies chroniques e em 1877 o seu manual Leçons sur les maladies du
foie, des voies biliaires et des reins ("Lições sobre as doenças do fígado,
das vias biliares e dos rins")
Charcot tornou-se um hábil hipnotizador, e utilizava essa técnica para
induzir no paciente as manifestações próprias da histeria, uma doença
mental com variada sintomatologia psíquica, acompanhada de
manifestações físicas como enrijecimento do corpo característico da
doença. Charcot demonstrava para sua audiência de médicos e
estudantes que ele podia usar a hipnose para criar em uma pessoa sadia
sintomas como tremores, paralisia, insensibilidade à dor, e vários outros
sinais próprios da histeria (um caso avançado de hipocondria e depressão)
e que podia igualmente aliviar os sintomas dos pacientes histéricos
mediante sugestão hipnótica.
En 1882 criou na Salpêtrière, o que viria a ser a maior clínica neurológica
da época, na Europa, centrando seus estudos sobre a histeria, epilepsia e
outras desordens neurológicas.
Descobriu numerosas enfermidades e síndromes neurológicos como o da
esclerose lateral amiotrófica, - que diferenciou da atrofia muscular
progressiva de Aran-Duchenne -, a neuropatia de Charcot-Marie-Tooth, a
esclerose múltipla (EM) , da qual fez a primeira descrição histológica
completa das lesões da EM e estabeleceu muitas características
importantes da mesma, como a perda de mielina e a proliferação de fibras
e núcleos gliais. No seu estudo de atrofia muscular, Charcot descreveu os
sintomas da ataxia locomotora, uma degeneração da medula espinhal e
dos feixes nervosos dos sentidos. Ele foi também o primeiro a descrever
a desintegração dos ligamentos e das superfícies das juntas (Síndrome de
Charcot ou "junta de Charcot"; artropatías dos joelhos, pélvis e outras
articulações) causado por ataxia locomotora e outras doenças e
ferimentos relacionados. Ele conduziu pesquisa pioneira de localização
dos centros cerebrais responsáveis por funções nervosas específicas, e
descobriu os aneurismas miliaria (dilatação das pequenas artérias que
alimentam o cérebro), demonstrando sua importância na hemorragia
cerebral. Criou o Museu Anatomopatológico de La Salpêtriére, os
laboratórios fotográfico, anatômico e fisiológico. Dois dos seus trabalhos
mais conhecidos foram Leçons sur les maladies du système nerveux, em
5 vol., publicados de 1872 a 1883; ("Lições sobre as doenças do sistema
nervoso") eIconographie de Ia Salpêtrière, de 1876 a 1880. Em muitas de
suas experiências apresentou BlancheWittmann, conhecida como "a
rainha das histéricas", descrita como uma jovem bonita, autoritária e
caprichosa.
Charcot acreditava que a histeria resultava de um sistema neurológico
fraco e era uma doença hereditária. Podia se instalar após a pessoa sofrer
um acidente, era progressiva e irreversível. Um professor de extraordinária
competência, ele atraiu estudantes de todas as partes do mundo. Um de
seus estudantes em 1885 foi Sigmund Freud, e foi o emprego da hipnose
feito por Charcot's na tentativa de descobrir a origem orgânica da histeria
que estimulou o interesse de Freud pela origem psicológica das neuroses.
Foram seus alunos, além de Freud, também os psicólogos Alfred
Binet e Pierre Janet.
AULA 12
O caso Ana
COMPLEMENTO DA VÍDEO AULA
O Caso de Anna O.
O médico Josef Breuer (1842-1925), que ganhou notoriedade com o
estudo sobre a respiração e o funcionamento dos canais semicirculares do
ouvido, ajudou o jovem Freud.
O bem-sucedido e sofisticado Bruer aconselhava Freud, emprestava-lhe
dinheiro e aparentemente o considerava como um irmão mais novo
precoce. Para Freud, Breuer tinha a figura de um pai. Os dois muitas
vezes discutiam a respeito dos pacientes de Breuer, inclusive da paciente
de 21 anos, Anna O., cujo caso se tornou fundamental no
desenvolvimento da psicanálise.
Inteligente e atraente, Anna O. apresentava sintomas profundos de
histeria, incluindo paralisia, perda de memória, deteriorização mental,
náuseas e distúrbios visuais e orais. Os primeiros sintomas apareceram
quando ele cuidava do pai, que sempre a mimara e estava morrendo.
Dizem que ela nutria por ele uma espécie de paixão (Ellenberger, 1972, p.
274).
Breuer começou o tratamento de Anna O. usando a hipnose. Ele
pensava que, enquanto estivesse hipnotizada, ela se lembraria de
experiências específicas que pudessem ter originado alguns dos sintomas.
Ao falar sobe as experiências durante a hipnose, freqüentemente ele se
sentia
aliviada
dos
sintomas.
Durante
mais
de
um
ano, Breuer atendia Anna O. diariamente. Ela relatava os incidentes
perturbadores ocorridos durante o dia e, depois de falar, algumas vezes
alegava sentir-se aliviada dos sintomas. Ela se referia as conversas como
uma limpeza de chaminé ou o que chamou de cura da palavra. Conforme
prosseguiam as sessões, Breuerpercebia (assim ele disse a Freud) que
os incidentes de que Anna O. se lembrava estavam relacionados com
pensamentos ou eventos que ele repudiava. Revivendo as experiências
perturbadoras durante a sessão de hipnose, os sintomas eram reduzidos
ou eliminados.
A esposa de Breuer começou a ficar com ciúmes da relação emocional
muito próxima criada entre os dois. A jovem Anna O. exibia o que se
tornou conhecida como *transferência positiva para Breuer. Em outras
palavras, ela estava transferindo o amor que sentia pelo pai para o
terapeuta. Essa transferência fora incentivada pela semelhança física
entre o pai e Breuer. Além disso, talvez Breuer também estivesse nutrindo
uma ligação emocional com a paciente. Um historiador observou: "os seus
dotes joviais, o charmoso ar de desamparo e até mesmo o seu nome (...)
despertaram em Breuer os desejos edipianos adormecidos que ele sentia
pela própria mãe" (Gay, 1988, p. 68). Breuer acabou sentindo-se
ameaçado com a situação e disse aAnna O. que não podia mais tratar
dela. Dali a poucas horas, Anna O. foi acometida de dores histéricas
comparáveis às de um parto. Breuer acabou com essa condição usando
a hipnose. Assim, reza a lenda que ele teria viajado com a esposa para
Veneza em uma espécie de segunda lua-de-mel, durante a qual ela teria
engravidado.
Essa história se transformou em um mito perpetuado por diversas
gerações de psicanalistas e historiadores. Ela ilustra mais um exemplo de
dado histórico distorcido. Nesse caso, a história persistiu durante mais de
100 anos. Breuer e a esposa realmente viajaram para Veneza, mas a data
de nascimento dos seus filhos revela que nenhum deles foi concebido
naquela época (Ellenberger, 1972).
Análises posteriores dos registros históricos revelaram que Anna O.
(cujo nome real era Bertha Pappenheim) não foi curada com os
tratamentos catárticos de Breuer. Depois que ele deixou de vê-la, foi
internada e passava horas diante da foto do pai, dizendo que ia visitar seu
túmulo. Ela teve alucinações e convulsões, neuralgia facial e dificuldades
recorrentes na fala e também se viciou em morfina; Breuer prescrevera a
droga para aliviar a dor facial (Webster, 1995).
Breuer disse a Freud que Bertha enlouquecera; acreditava que ela
sofreria até morrer. Não se sabe bem ao certo como Bertha Pappenheim
superou os problemas emocionais, mas ela acabou se tornando assistente
social e feminista, apoiando a educação feminina. Publicou vários contos,
escreveu uma peça sobre os direitos da mulher e acabou sendo
homenageada com a criação de um selo postal alemão (Shepherd,1993).
O relato de Breuer acerca do caso de Anna O. foi importante para o
desenvolvimento da psicanálise por ter apresentado a Freud o método
catártico, a chamada cura por meio da conversa, que mais tarde viria a
figurar com destaque em seus trabalhos.
*Transferência: processo pelo qual um paciente responde ao terapeuta
como se ele fosse uma pessoa importante (como pai ou mãe) em sua vida.
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aula 07 os mecanismos de defesa, ou a realidade como ela não é