A Escola Itinerante Paulo Freire
no 5º Congresso do MST
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Expediente
Produção: Instituto Técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo - ITAC
Coletivo de Elaboração: Márcia Ramos, Maria Cristina Vargas, Alessandro Mariano,
Karine Mourão, Carol Bahniuk, Edna Araújo, Izabel Grein , Rosana Fernandes,
Ana Chã, Flávia Tereza da Silva
Revisão: Nina Fideles
Fotos: Leonardo Melgarejo, Carlos Ruggi, Vagner Carneiro, Douglas Mansur,
Joka Madruga, Tamara Menezes, Juan Reardon, Bia Pasqualino, Nathan Kamlliot
Projeto Gráfico, diagramação e capa: Fábio Carvalho
Tiragem: 2.000 exemplares
Convênio: ITAC/UNICEF/Nº. BRZA – 004/07
Todos os direitos desta edição reservados para:
Instituto Técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo - ITAC
Setor Comercial Sul
Quadra 06, Bloco A, Ed. Arnaldo Villares, sala 211
Fone: 4063-8293
CEP: 70306-000
Correio eletrônico: [email protected]
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Índice
Antes de mais nada... ------------------------------------------------------------------- 4
Introdução
Uma escola diferente ---------------------------------------------------------------- 6
Desde o início... ------------------------------------------------------------------------- 8
A criança Sem Terrinha -------------------------------------------------------------- 10
O lugar da infância no MST -------------------------------------------------------- 12
O desafio do Congresso ------------------------------------------------------------- 14
A Escola Itinerante Paulo Freire no 5° Congresso do MST -------------- 16
Uma escola com mística, organização e embelezamento ---------------- 19
As atividades: o dia-a-dia e a participação no
conjunto do congresso -------------------------------------------------------------- 31
A dimensão do brincar ---------------------------------------------------------- 31
A participação na grande plenária --------------------------------------------- 33
Marcha no Congresso ------------------------------------------------------------- 34
Audiência pública ----------------------------------------------------------------- 35
Festa Junina ------------------------------------------------------------------------- 36
De volta para casa ---------------------------------------------------------------- 37
Um marco em nossa história --------------------------------------------------------- 40
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Antes de mais nada...
Este é mais um caderno da coleção Fazendo Escola
que mostra uma prática desenvolvida com a
participação de todos e todas que do MST fazem parte.
Este material demonstra, principalmente,
a alegria de educar e se educar
com as crianças que no movimento vivem
sua infância e nele re-significam
a palavra escola...
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Escola
Uma escola
Sem lixo no chão
E que o povo tenha educação
Uma escola
Com luta sem brigas
Onde as crianças
sejam todas amigas
Uma escola
Que diga a verdade
E que ensine
Usar nossa dignidade
Uma escola
Que não tenha que ir a pé
E não me proíbam
de usar o nosso boné
Uma escola
Bem maneira
Que me deixe levar
A nossa bandeira
Uma escola
Genial
Que o meu professor
Seja bem legal
Pedro Ernesto – MST/MG
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Introdução
“A ciranda rodava no meio do mundo,
No meio do mundo a ciranda rodava.
E quando a ciranda parava um segundo,
Um grilo, sozinho no mundo, cantava.”
Mário Quintana
Uma escola diferente
Iremos contar a história de uma escola diferente. Porém, para
iniciarmos, é preciso entender o que queremos dizer quando falamos
em Ciranda Infantil, Escola Itinerante e Congresso do MST. Vejamos:
A Ciranda Infantil é o nome criado pelo Movimento Sem Terra, a
partir das experiências de educadores e educadoras infantis, para
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identificar o espaço de educação infantil. E compreendendo esse
espaço como um lugar prazeroso, criativo, belo, atraente e que
traz presente a cultura popular, as brincadeiras, a cooperação com
o coletivo e o ser criança.
A Escola Itinerante é aquela que nasce junto com um
acampamento Sem Terra e vai com ele pra onde ele for. Em cada
ocupação, em cada atividade de mobilização e marcha, lá está a
escola. Para que as crianças e adolescentes que estão com suas
famílias na luta não fiquem sem estudar.
O Congresso é um espaço nacional de decisões políticas
que o MST tem no seu jeito de organizar o povo na luta pela
terra. Na história do MST, que vai completar 25 anos em janeiro
de 2009, já foram realizados cinco congressos. Eles acontecem
mais ou menos a cada cinco anos. O último foi o 5° Congresso
que aconteceu no período de 11 a 15 de junho de 2007, com a
participação de 18 mil Sem Terra. Neste Congresso foi definida
a palavra de ordem que orientará o Movimento nos próximos
anos: “Reforma Agrária: Por Justiça Social e Soberania Popular”.
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Desde o início...
Para chegar a construir um acampamento é preciso,
primeiramente, tomar a decisão de ir para um, não é mesmo?
Assim também foi na história que estamos iniciando
a contar. Antes de montar o barraco da Escola
Itinerante, tivemos que tomar uma
decisão. Essa decisão nasceu de
uma preocupação que é
de entender que a
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criança sempre esteve presente no MST - desde o primeiro
acampamento - e garantir escola para ela é fundamental
para manter as famílias organizadas. Se o Estado não
viabiliza, o coletivo do MST, com os seus educadores, faz
acontecer a escolarização das crianças. Embora, na maioria
das vezes, o Estado não reconheça esse trabalho, o fazer é a
forma que o Movimento encontra de pressionar para
garantir este direito.
Sendo assim, a infância no MST, desde a sua origem,
tem participado ativamente das ações. Ocupações da terra
juntamente com seus pais, mobilizações e marchas e na luta
pela escola do acampamento e assentamento. Estar junto à
sua família é o primeiro direito conquistado pelas crianças
Sem Terra. Essas ações permitiram que a identidade das
crianças Sem Terra criasse o seu nome próprio, os Sem
Terrinha.
Mesmo com todo este esforço, a criança no
Movimento ainda era prioritariamente uma preocupação
da família, mais especificamente das mães. A participação
das mulheres na luta e no trabalho do Movimento trouxe a
necessidade de ter um espaço para as crianças se
reconhecerem enquanto sujeitos da história. Esta criança
só era percebida a partir da necessidade do outro, do adulto.
O fato é que os educadores que se dedicavam às cirandas
infantis foram dando conta da situação em que viviam as
crianças dos acampamentos e assentamentos e isso
proporcionou um avanço na reflexão e na prática do espaço
criado para as crianças Sem Terra.
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A criança Sem Terrinha
Houve um momento em que foi necessário que o conjunto do MST
percebesse esse desafio. Esse momento se deu com a realização da Marcha
Nacional pela Reforma Agrária, em maio de 2005, que reuniu doze mil
Sem Terra - trabalhadores/as vindos dos 24 Estados onde o MST está
organizado. A marcha percorreu 230 km de Goiânia (GO) a Brasília (DF) e
tinha como objetivo exigir do governo o assentamento de todas as famílias
acampadas, realizando a Reforma Agrária - única forma de melhorar as
condições de vida do povo brasileiro que vive no e do campo.
Mas os objetivos da marcha foram muito além. O grande avanço
desta atividade foi dado na vida do Movimento, ou seja, na sua
organicidade, no jeito como se organiza. Dentro deste aspecto um dos
grandes espaços que gerou reflexão e amadurecimento político foi a
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organização da Ciranda Infantil. Os educadores/as observaram a
situação em que as crianças chegavam. As noites e manhãs eram muito
frias e muitas crianças vinham descalças e sem agasalhos. Muitas, pela
situação social, desnutridas e com sinais de violência da própria família.
Essa situação levou a uma discussão e reflexão do conjunto do MST,
cuja organicidade tem como princípio valorizar e cuidar do seu maior
patrimônio: as pessoas, seus militantes e neste caso, as crianças.
Após a marcha, durante a realização da Reunião da Coordenação
Nacional do MST, em julho do mesmo ano, a infância foi tema de reflexão.
Não a partir da necessidade do outro, mas por ser um importante sujeito
do MST - a Criança Sem Terra. Nessa discussão o MST Nacional
reconheceu a importância da Infância na formação do ser humano e seu
papel na capacidade de se autogerir, propor, organizar e liderar.
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O lugar da infância no MST
Uma das ações propostas nessa reunião foi a realização do 1º Seminário Nacional: O lugar da infância no MST.
A atividade aconteceu entre os dias 09 e 11 de maio de
2007, na Escola Nacional Florestan Fernandes, com a
participação de 72 pessoas - dirigentes de todos
os setores. Como fruto desse seminário estamos
avançando na concepção de infância e de
criança no próprio Movimento, reafirmando o entendimento de que a
criança é sujeito agora, nesta fase
de sua existência. É necessário
dar visibilidade às crianças que
estão na luta pela terra com
suas famílias e para isso é
necessário criar nos acampamentos, assentamentos, cursos,
mobilizações, enfim, em todos
os espaços de luta, lugares de
vivência e convivência para
as crianças, ampliando as experiências das Cirandas Infantis
permanentes e itinerantes.
É preciso também valorizar
os educadores infantis, garantindo sua formação específica,
bem como alargar o imaginário
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de nossa organização sobre a Infância.
Enfim, podemos afirmar que o lugar da infância
do MST é o próprio Movimento.
Esta é uma tarefa de toda a organização e não apenas de um
setor. Para dar funcionalidade ao trabalho foi necessário constituir
um coletivo intersetorial, formado pelos vários setores que o
Movimento tem organizado, para estudar, refletir e propor
ações para a infância no e do MST.
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O desafio do Congresso
Após essas reflexões, o momento era de avançar em todas as ações
do Movimento para potencializar os espaços já conquistados. Neste
sentido, o Congresso foi um momento privilegiado para avançar na
prática esta concepção. A preocupação era grande, porque o conjunto
do Movimento Sem Terra começou a entender melhor o cuidado que
devemos ter com os bebês, com as crianças e adolescentes. Por isso,
quando foi feita a lista de tarefas, logo foi colocada a tarefa de organizar
a Ciranda Infantil e a Escola Itinerante.
No início, eram duas equipes diferentes: a Ciranda era para
atender as crianças pequeninas, de zero a seis anos; e a equipe da Escola
era para os maiores, acima de sete anos de idade. Mas, a partir do diálogo
entre as pessoas responsáveis pelas duas tarefas, chegou-se à conclusão
que deveríamos ter apenas uma escola que atendesse todas as faixas
etárias, compreendendo a especificidade de cada uma. O interessante
também foi que essa tarefa não ficou apenas sob a responsabilidade do
setor de educação, mas os companheiros e companheiras de outros
setores se envolveram pra valer na organização da Escola. Acreditamos
que um dos motivadores para esse envolvimento todo foi a participação
no 1º Seminário Nacional sobre a Infância.
Para dar conta dessa grandiosa tarefa houve a necessidade de se
fazer um planejamento com um coletivo de educadores/as vindos de
todos os estados e dos diferentes setores. Para isso, no período de 12 a 15
de maio de 2007, encontraram-se na Escola Nacional Florestan Fernandes
aproximadamente 50 militantes que seriam os/a coordenadores/as gerais
da Escola Itinerante. Foi realizada uma Oficina de Capacitação
Pedagógica, tendo como principais objetivos o planejamento das
atividades políticas e pedagógicas e a distribuição das tarefas. Esses
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educadores/as teriam a responsabilidade de multiplicar esse processo
de formação também nos Estados com os/as educadores/as que estariam
contribuindo com a Escola no Congresso. Foi durante essa capacitação
que o nome da escola foi escolhido. Homenageamos o educador Paulo
Freire pela sua contribuição ao método de educação popular. Em 2007,
completaram-se 10 anos de sua morte.
Esperamos que este início da história da Escola Itinerante Paulo
Freire motive a leitura e a compreensão do significado de uma valorosa
experiência que não poderia ficar esquecida na história do Movimento
Sem Terra.
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A Escola Itinerante Paulo Freire
no 5° Congresso do MST
“Lá vai o menino rodando e cantando
Cantigas que façam o mundo mais manso
Cantigas que façam a vida mais justa
Cantigas que façam os homens mais crianças.”
Thiago de Melo
O dia esperado chegou. O grande encontro de cerca de 18 mil Sem
Terra de todo o Brasil. Espaço de muita energia, mística e expectativa. A
Escola Itinerante Paulo Freire teve a preocupação de envolver as crianças
da Educação Básica na participação do 5°Congresso juntamente com suas
famílias. Uma das preocupações da Escola foi desenvolver atividades
pedagógicas com as crianças em várias dimensões conforme a realidade
vivenciada por elas. Para tanto, foram pensadas atividades que colocassem
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em movimento algumas matrizes pedagógicas, a pedagogia do
Movimento Sem Terra, na perspectiva da formação humana, tais como: a
matriz da organização coletiva, da luta social, da cultura e do brincar. Foi
necessário pensar em atividades pedagógicas levando em conta as
temporalidades da vida e ainda as realidades das crianças. Pois cada
criança tem maneiras diferentes de manifestar as culturas e costumes que
vivenciam nos seus estados de origem. A prática pedagógica desenvolvida
preocupou-se com alguns tempos da criança, tais como o tempo do
brincar, do cantar, do imaginar, da fantasia, do escrever, do ler,
desenvolvendo as várias dimensões do ser criança.
Pensar as crianças e suas especificidades com certeza não é tarefa
fácil, tendo em vista que são vários os fatores que caracterizam as
diferentes infâncias. Mas, a partir do momento em que a referência é
pensar as crianças como sujeitos participativos, levando em consideração
seus saberes, seus conhecimentos, sua cultura, sua classe social e o que
é próprio da infância, são produzidos, certamente, conhecimentos que
legitimam uma Pedagogia da Infância.
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A Escola Itinerante perdeu a sua centralidade da sala de aula,
mas ganhou na sua coletividade. A organização da Escola considerou o
processo de formação humana para pensar o planejamento pedagógico,
tendo presente os diferentes aprendizados que compõem esse processo.
O ambiente educativo da Escola caracterizou-se como um local de
encontro das crianças onde elas despertam para a criação, aprendendo
a compartilhar o lápis, o brinquedo, o lanche, os saberes, construindo,
assim, sua identidade de Sem Terrinha.
As práticas pedagógicas construídas no processo cotidiano por
meio das brincadeiras, das cantigas de rodas, do ninar, das oficinas de
teatro, dos passeios, trouxeram reflexões sobre a produção do
conhecimento a partir da realidade da criança e suas relações com a
coletividade. Dessa maneira, vivenciando a luta pela terra e valores como
a solidariedade e o companheirismo, sem perder a dimensão do SER
CRIANÇA.
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Uma escola com mística, organização
e embelezamento
O movimento da Escola e a Escola em Movimento permitem que
os detalhes da ornamentação, a localização da escola e o jeito pedagógico
da sua orientação seja observado por todos e todas. Foi assim que a
Escola Itinerante Paulo Freire foi pensada. Com base no princípio da
auto-organização, sendo concebida como um espaço com o jeito místico
do MST. Um ambiente educativo que permitisse o prazer de estar nele,
brincando, estudando e interagindo com o conjunto do 5° Congresso.
Esse espaço - organizado pelo coletivo de educadores e
educadoras de diferentes estados - desafiou-se a construir toda a infra19
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estrutura e embelezamento do local e organização de equipes.
Entendendo que a construção da Escola é feita por todas as equipes,
núcleos e espaços que se dão no processo coletivo. A Escola foi pensada
para também ser um exercício daquilo que se quer construir em uma
escola diferente, em uma sociedade diferente. Sem pensar o ideal, mas
provar daquilo que é possível ser vivenciado. Nesta Escola elas
vivenciam o diferente e percebem as várias possibilidades de mudança
na sua comunidade.
Muitas mãos nessa construção. Diferentes sujeitos nesse processo.
Em tarefas diferenciadas nos diversos espaços. Vejamos como aconteceu
o protagonismo dentro de nossa bela escola:
a) As educadoras e educadores.
A acolhida foi feita pelos dirigentes do MST, num gesto de
comprometimento e respeito à tarefa com a infância Sem Terra e
reconhecendo também o desafio de ser responsável por mil Sem Terrinha,
trazendo presente na escola, o exemplo de educador Paulo Freire.
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Os trezentos educadores e educadoras do MST e amigos
voluntários que participaram do processo de formação em cada estado,
contribuíram na construção do planejamento. Distribuindo-se para
acompanhar as crianças de acordo com as idades.
Foram dias de muito diálogo, revisão de planejamento, avaliação
e paciência. Foram precisos minutos de conversa com as crianças para
transformar em confiança os momentos iniciais de insegurança, por não
conhecerem os educadores e por estarem no meio de tantas outras
crianças que elas nunca tinham visto.
b) As crianças Sem Terrinha.
As boas-vindas às crianças foram bem movimentadas! Elas
cantaram, contribuíram no embelezamento do espaço onde estavam,
conversaram sobre a Escola Itinerante Paulo Freire e sua organicidade.
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Escolheram os nomes dos espaços nos quais estavam inseridos.
Todas as manhãs, as crianças, de mochila nas costas, chegavam à
escola com seus pais, amigos ou responsáveis do seu estado de origem.
A mistura do sul, sudeste, centro-oeste, nordeste e região amazônica
permitiram que a Escola estivesse ligada à cultura, costumes e sotaques
de todo o Brasil.
c) Os núcleos infantis.
A Escola foi organizada por núcleos de base - uma prática do
Movimento nos acampamentos e assentamentos. As famílias se
organizam em grupos para discutirem a vida do seu espaço e assim
também foi o nosso ambiente educativo. Nos núcleos de base das
crianças foram feitas várias conversas sobre a Escola Itinerante Paulo
Freire, sua organicidade coletiva, foi feita a escolha dos coordenadores
e coordenadoras infantis da Escola e as avaliações das atividades.
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Pablo, 10 anos, do Assentamento Carlos Marighela
do Pará, avaliou que poderia ter tido mais oficinas de
capoeira e afirmou seu desejo em estudar na escola do
assentamento, pois lá tem rio e não é abafado como nas
escolas de Marabá; além disso, coloca a sua preferência
pela escola no assentamento.
Ana Beatriz, 08 anos, do Mato Grosso, assim
justificou sua proposta de nome para o núcleo de base da
qual fazia parte: “Eu sei que é um escritor (...) que gostava
do MST. Assim, eu também gosto muito dele e acho que
não tem outro nome pro nosso núcleo de base: é Paulo
Freire”. Justificativa essa, que conseguiu convencer os
outros Sem Terrinha a votarem nessa proposta. “Sementes
para a vida” e “Che Guevara” foram outros nomes
escolhidos para outros núcleos de base.
Os Sem Terrinha mostraram que a infância pode ter
sentidos diversos daquele que predomina na atitude dos
adultos em relação às crianças, ou seja, a infância como
aquele que não fala. Durante todo o funcionamento da
Escola Itinerante, mostraram que são sujeitos críticos da
realidade nas quais estão inseridos. Nas reuniões onde
debateram diferentes assuntos ligados ao tema do
Congresso e a situação da educação do campo, não
deixaram de fazer suas críticas e falar em seu próprio nome.
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A organização das Equipes foi fundamental para a implementação
do Projeto Político-Pedagógico da Escola. A integração dos setores numa
intervenção de participação-ação, contemplando os vários olhares e as
várias linguagens praticadas na Escola. As/os Educadoras/es das
diferentes equipes se dedicaram permanentemente na tarefa construída
em coletivo:
a) A Infra-estrutura.
Esta foi uma das equipes que chegou uma semana antes do
Congresso e construiu a grande cidade de lona dos Sem Terra e dos Sem
Terrinha. Composta por militantes de diferentes setores do MST, a equipe
garantiu com seu trabalho o planejamento realizado para o
desenvolvimento das atividades pedagógicas da Escola, bem como o
abastecimento de água em cada espaço proposto. Foi uma equipe que não
só ensinou como também aprendeu muito, pois o planejamento do local
da Escola exigiu um estudo sobre as características e função da Escola.
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b) A Cozinha.
Militantes de acampamentos e assentamentos, com a participação
do setor de saúde, prepararam com muita responsabilidade os lanches
na escola. Pensaram o cardápio com qualidade e a higienização dos
alimentos que vieram dos assentamentos de Reforma Agrária.
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c) A Secretaria da Escola.
A Secretaria da Escola envolveu uma equipe responsável –
substituir por militantes responsáveis - pela organização dos materiais.
Esta equipe trabalhou durante uma semana para a acolhida ao
Congresso. Muitos materiais, como produtos higiênicos e materiais
didáticos foram conseguidos por meio de uma campanha de
solidariedade. Mais especificamente, a Secretaria da Escola cumpriu a
tarefa de organizar as fichas de inscrições, centralizar as informações,
realizar o credenciamento dos educadores e educandos e distribuir os
materiais didático-pedagógicos. Também ficou responsável pela
elaboração da memória escrita e fotográfica das atividades, e, pela
organização de murais-varais de informações durante as atividades.
Vale destacar a importância dos educadores e educadoras
populares do Setor de Saúde que participaram de todo o processo de
organização da escola, garantindo outra forma de conceber a saúde. Saúde
não como a cura das doenças, mas sim como bem-estar, lazer, brincar.
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A parte cultural da Escola foi organizada
por educadores do Setor de Cultura do
Movimento e por educadores que se identificaram
com esta tarefa. Toda a programação das
atividades culturais foi pensada desde a
preparação dos educadores e o planejamento. Na
Barraca do Cinema da Terra - espaço de acesso
comum do 5° Congresso - foi exibido filmes
infantis. As oficinas de arte-educação, como
também as apresentações de teatro, música e
outras linguagens artísticas, foram trabalhadas no
espaço da Escola todas as tardes. A cultura foi um
espaço que aglutinou educadores amigos do MST.
A Escola Itinerante Paulo Freire exercitou o que é
uma Escola que tem uma preocupação com as
várias linguagens culturais.
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d) O Setor de Comunicação.
O Setor de Comunicação do MST esteve organizado em várias
frentes de trabalho: filmagem, imprensa, rádio-poste e também registro
fotográfico de todas as atividades do Congresso. Essa equipe também
proporcionou o envolvimento da Escola Itinerante neste conjunto de
atividades. Incorporou a participação de vários Sem Terrinha nos programas
diários de rádio que foram realizados pelas crianças com a colaboração
do setor, bem como na articulação das crianças para falar com a imprensa.
Todos os espaços foram carregados de mística, vontade e
afinidade na intencionalidade do trabalho. As ações organizadas na
Escola foram de muita responsabilidade, capacidade e afetividade com
o fazer brincando. Desde as oficinas de danças, músicas e outras. Foram
tantas as novidades que vivenciaram as crianças e educadores que em
palavras não é possível explicar o sentimento sentido por cada um.
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As atividades: o dia-a-dia e a participação
no conjunto do congresso
A dimensão do brincar
As brincadeiras foram uma das atividades mais ricas. Cada
criança trouxe em sua bagagem as culturas infantis do seu estado e isso
possibilitou uma grande socialização de experiências, tanto para as
crianças, como também para as educadoras e educadores.
A programação garantiu o espaço para as brincadeiras e jogos
livres, que aconteceram nos núcleos de base formado pelas crianças. A
intencionalidade das brincadeiras e oficinas permitiu que as educadoras
e educadores observassem as crianças com um olhar mais atento na sua
participação, possibilitando para as crianças e para si, novas descobertas.
31
Inventando e reinventando as brincadeiras, construindo
assim, novas regras entre as crianças e entre os núcleos.
Nesta perspectiva foi muito importante ter organizado
os espaços físicos e os tempos das brincadeiras
garantindo um equilíbrio entre as atividades dirigidas e
as livres, individuais e as coletivas. Também foi preciso
levar em consideração a estrutura física que a Escola
apresentava e a estrutura das brincadeiras infantis no
planejamento, considerando os sujeitos envolvidos, para
que estas atividades fossem adequadas e prazerosas.
As brincadeiras trazem na sua vivência valores
como o companheirismo, solidariedade, coletividade,
etc. O brincar é um direito da criança, uma dimensão
humana em que a criança exercita sua capacidade de
inventar, sentir, decidir, arquitetar, reinventar, aventurar,
agir, para superar os desafios das brincadeiras. Por meio
delas, a criança se apropria da realidade e expressa de
forma simbólica os seus desejos, medos, sentimentos,
agressividade, sexualidade, suas impressões e opiniões
sobre o mundo que a cerca.
Também fizeram parte desta dimensão do lúdico,
atividades que envolvem maior concentração, como os
jogos de tabuleiro: a dama, o xadrez, a trilha, o botão, e
outros. Estes exercícios exigiam movimentos de atenção
e memória. Podemos fazer dos nossos assentamentos e
acampamentos espaços para as crianças brincarem de
“bola de meia, bola de gude/acreditando que não deixarão de
existir/amizade, palavra, respeito/caráter, bondade alegria e
amor” (Milton Nascimento).
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A participação na grande plenária
O 5° Congresso proporcionou a interação da Escola no conjunto
das atividades, reafirmando a possibilidade do caminho que está sendo
construído protagonizado pelos sujeitos de sua própria história.
No penúltimo dia do Congresso, na plenária grande, onde os
adultos se encontravam para estudar durante toda a manhã, foi
anunciada a chegada de alguém muito especial. Realmente muito
especial! Muitos chegaram a pensar em autoridades importantes, no
Presidente, governadores ou na filha do Chê. Mas não. Enfim, a entrada
dos sujeitos esperados! As crianças Sem Terra tomaram conta do Ginásio
Nilson Nelson com pernas de pau, palhaços, balões, bolas, bonecas e
toda a infra-estrutura brincante. Eram tantas crianças em marcha que
não paravam de entrar. A música trazia a alegria de estar ali, dançando
e cantando. E numa grande ciranda de emoção, lágrimas, sonhos e luta,
33
os Sem Terrinha ocuparam o “lugar da Infância Sem Terra”, reafirmando
naquele momento o compromisso do conjunto do MST. Os Sem
Terrinha, fazendo a sua história, participaram do 5° Congresso e
deliberaram ações que norteiam a vida do Movimento.
Marcha no Congresso
Na tarde do terceiro dia, as crianças se juntaram aos mais de 18
mil Sem Terra que marcharam do ginásio Nilson Nelson até a Praça dos
Três Poderes como forma de protesto contra o agronegócio, o
imperialismo e a não realização da Reforma Agrária.
As crianças marcharam junto com os adultos, pois a escola era parte
desse grande Congresso. O cuidado com as crianças foi de todos: acertando
o ritmo da caminhada pelos passos dos mais pequenos, ou carregandoos nos braços quando era preciso. Tudo isso é um aprendizado que se fez
e que se faz nesta expressão de luta que é a “marcha”.
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Audiência pública
No último dia do Congresso, quase no finalzinho
daquele grandioso momento, tivemos uma audiência
com o Ministro da Educação, Fernando Haddad. A
audiência foi pública, com a presença dos mil Sem
Terrinha, dos educadores e educadoras e alguns
dirigentes do MST. As crianças foram protagonistas e
conduziram todo o processo de negociação. Em meio a
muitos gritos de ordem como “Brilha no céu, a estrela
do Che. Nós somos Sem Terrinha do MST”. A equipe
de negociação das crianças apresentou a pauta sobre a
necessidade de garantir o direito educacional para as
crianças, jovens e adultos camponeses. Algumas
crianças deram depoimentos sobre a sua realidade
escolar, falando do horário que o transporte escolar os
busca nos assentamentos e acampamentos e a hora que
retornam. São muitas horas dentro dos ônibus que, na
maioria das vezes, não possuem condições para fazer
o trajeto, colocando em risco a vida de cada um. Além
da má condição das estradas, falta de estrutura das
escolas do campo e a falta de educadores. O Ministro
ouviu atentamente e apresentou algumas propostas que
o Ministério de Educação estará desenvolvendo com
relação à Educação do Campo.
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Festa Junina
Ao final da audiência as crianças convidaram o
ministro para uma grande festa junina que foi organizada
com a produção vinda dos assentamentos. A ornamentação
foi uma mistura de cada região, deixando um cenário muito
lindo, com muitas bandeirolas e balões de papel colorido.
Foi bonito de ver também a preocupação das crianças em
estarem arrumadas, enfeitadas e bem bonitas para irem à
festa. Com a colaboração dos educadores e educadoras
todas ficaram charmosas e lindas! Lá dançaram quadrilha,
comeram pipoca e festejaram muito.
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De volta para casa
Os Sem Terrinha viajaram de ônibus de vários lugares do Brasil
até a capital federal. Construíram a Escola Itinerante, construíram o 5°
Congresso do MST e por meio da luta pela terra, pela escola, pela
moradia e saúde, direitos básicos de uma sociedade, elas fazem o
Movimento. E junto com a família e comunidade pautam o direito de
poder falar, propor e construir.
Muitas vezes temos dificuldades de potencializar o protagonismo das crianças na organicidade
do MST. Parece que somos um Movimento de adultos e nossa organicidade não é compatível
à este sujeito, mas a experiência do Congresso demonstrou que é possível termos,
no conjunto do Movimento,
o cuidado em pensar a participação desta fase da vida.
Nos estados e regiões, os Encontros Infanto-juvenis construídos no
MST foram direcionando - por meio das
marchas realizadas nas capitais - os debates que dialogam com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a elaboração das
pautas de reivindicação e negociação
com as Secretarias de Estado da
Educação. Esse espaço permitiu a construção do nome
e da identidade “Sem Terrinha”
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37
que ganha presença e espaço nacional por meio da organização das
crianças Sem Terra.
Por isso, os Encontros são processos que precisam ser
estimulados, pois pensar a infância no MST é possibilitar a criança a se
reconhecer como classe e superar o pensamento de que o espaço é
construído apenas pelo adulto. Os Sem Terrinha fazem parte da vida,
da construção e intervenção social. Da mesma forma que os adultos se
organizam e propõem, as crianças fazem suas articulações, exigem os
direitos que às vezes passam despercebidos pelo conjunto e pensam
sobre a sua comunidade.
Igualmente nos assentamentos e acampamentos, deve ser
incentivada a criação de Núcleos de Sem Terrinha como processo de
organização das crianças. Se elas lutam por escola, devem também pensar
que a sua comunidade precisa do espaço da criança, das brincadeiras,
da arte, das vivências do teatro da música, dos contos, etc.
O envolvimento dos vários setores na Escola Itinerante foi
igualmente uma grande experiência e apontou vários desafios para o
Movimento. Listamos algumas que vão já ganhando força no dia-a-dia
da luta:
a) Jornal das Crianças Sem Terrinha
O encarte do jornal das crianças Sem Terrinha no Jornal Sem Terra
é uma conquista do acúmulo que tivemos a partir do seminário e do
Congresso. Trata-se de uma ferramenta das crianças, para que elas
dialoguem e construam nos espaços educativos a cultura da leitura de
jornal. O jornal tem por objetivo: fortalecer o trabalho com as crianças
Sem Terrinha nos acampamentos e assentamentos; potencializar as
nossas escolas; ser um espaço de diálogo com a comunidade; valorizar
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a criatividade, a arte e a produção das crianças em uma linguagem que
represente o MST em nível nacional e no seu caráter político pedagógico.
Tendo presente a mística que o jornal já representa para as crianças
Sem Terrinha, toda a produção realizada por elas é fundamental que
esteja à disposição deste espaço ocupado e conquistado pelo povo Sem
Terra, no seu enfrentamento a mais este latifúndio: o da comunicação.
b) Programas nas Rádios Comunitárias
Os programas nas Rádios Comunitárias que o MST tem
organizado. Precisamos priorizar programas para a criança e incentivála a fazer a locução e contribuir com o planejamento, trazendo suas
produções e ajudando na reflexão desse instrumento de comunicação
que é tão importante para a organização.
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Um marco em nossa história
O cotidiano da Escola Itinerante ficou marcado na
memória de todos os Sem Terrinha e dos adultos Sem Terra que
viveram com essas crianças durante uma semana, especialmente
os educadores e educadoras. Após esses dias, muitas perguntas
ficam no desenho da história como a seguinte: o que faz as
crianças Sem Terrinha gostarem tanto desse espaço com tão
poucas condições estruturais? A pergunta feita não será
respondida teoricamente, mas na prática ela é vivenciada
permanentemente a cada dia que se protagoniza o direito de
estar junto as suas famílias.
A escola no congresso deve representar um aprendizado
para todo o MST. Dar voz as crianças é ouvir o próprio
movimento naquilo que é de mais grandioso em sua história, o
resultado de se fazer educação
no cotidiano de luta. É o movimento que educa as crianças
os jovens e os adultos no
fazer de suas vidas a
possibilidade de construir
uma sociedade melhor
para todos os trabalhadores
e trabalhadoras.
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Arquivo em PDF - Dados e textos sobre a Luta pela Terra e a