Vozes de resistência: sobre práticas educativas nos tempos e espaços ocupados pelo MST Universidade Estadual do Centro-Oeste Guarapuava - Irati - Paraná - Brasil Fone (42) 3621 1019 www.unicentro.br Marlene Lucia Siebert Sapelli (org.) Ana Cristina Hammel Caroline Bahniuk Clésio Acilino Antonio Ernesta Zamboni Fernando José Martins Marcos Gehrke Marizete Lucini Natacha Eugênia Janata Noeli Valentina Weschenfelde Vozes de resistência: sobre práticas educativas nos tempos e espaços ocupados pelo MST UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE UNICENTRO Reitor: Vitor Hugo Zanette Vice-Reitor: Aldo Nelson Bona Editora UNICENTRO Direção: Beatriz Anselmo Olinto Assessoria Técnica: Andréa do Rio Conselho Editorial Presidente: Mário Takao Inoue Beatriz Anselmo Olinto Carlos de Bortoli Hélio Sochodolak Oliveira e Waldemar Feller Divisão de Editoração: Renata Daletese Ivan de Souza Dutra Jeanette Beber de Souza Diagramadores: Anna Júlia Minieri, Jorge Luiz Favaro Eduardo Alexandre Santos de Luiz Gilberto Bertotti Oliveira e Josiane Ferreira, Marcio Maria José de P. Castanho Fraga de Oliveira Márcio R. Santos Fernandes Diagramação: Eduardo Alexandre Maria Regiane Trincaus Santos de Oliveira Raquel Doringan de Matos Capa: Lucas Gomes Thimóteo Ricardo Celeste Correção: Maria Cleci Venturini e Rosanna Rita Silva Raquel Terezinha Rodrigues Ruth Rieth Leonhardt Alvares, Carlos de Bortoli, Oséias de Sidnei Osmar Jadoski Impressão: Gráfica UNICENTRO Ficha Catalográfica Catalogação na Publicação Regiane de Souza Martins -CRB9/1372 V977 Vozes de resistência: sobre práticas educativas nos tempos e espaços ocupados pelo MST/ Organização de Marlene Lucia Siebert Sapelli. – – Guarapuava: Unicentro, 2010. 220 p.: il. Bibliografia Diversos autores ISBN 978-85-7891-046-4 1. Educação. 2. Educação – Brasil. 3. Escolas Itinerantes. 4. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) – Educação. I. Autores. II. Título. CDD 370.981 Copyright © 2010 Editora UNICENTRO Nota: O conteúdo desta obra é de exclusiva responsabilidade de seus autores. É permitida a reprodução desde que indicada a autoria. Não dá para educar na perspectiva da naturalização do sistema ou da proposição de reforma do mesmo. Conta uma fábula que um escorpião pedia carona ao sapo para atravessar o rio. O sapo, preocupado, disse que não se sentia seguro em lhe dar carona, pois desconfiava que no meio do caminho iria matá-lo. O escorpião tentou convencê-lo que isso não aconteceria e insistiu. Acabou convencendo o sapo que o levou até a outra margem. Quando lá chegaram o escorpião cravou seu ferrão no pobre sapo e o matou. Quando estava dando o último suspiro o sapo perguntou por que o escorpião havia feito aquilo. E ele respondeu que essa era sua natureza. Isso nos faz pensar qual é a natureza do capitalismo e se é possível modificá-la, se é possível modificar a posição do trabalhador nessa sociabilidade, se é possível extinguir a luta de classes, ou se é necessário construir outra sociabilidade. Os artigos apresentados nessa obra contribuem para refletirmos sobre essas questões, pois, carregam consigo a marca de classe, não de qualquer uma, mas da classe trabalhadora, que luta, que se contrapõe, que não aceita tudo passivamente, que se organiza e que até morre nesse processo, ao contrário do que querem fazer parecer alguns articuladores da imprensa, da igreja e da própria escola. Essa luta, na maioria das vezes, fica relativizada e ocultada. Cabe, nesse contexto, perguntar: qual é o papel da escola? A serviço de quem ela está? Seria a escola espaço de contradição ou apenas de reprodução? A escola organizada nos espaços do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra vem chamando a atenção, pois tenta ir além do proposto em algumas tendências pedagógicas, no sentido de rever apenas A presentação os conteúdos disciplinares da escola. Tem chamado a atenção não só para o conteúdo, mas também para a forma, portanto, apresenta elementos de superação nas proposições. A forma também educa! Apesar disso, muito se tem a avançar, uma vez que a precariedade estrutural e de formação dos educadores compromete imensamente a implementação do que se propõe. Por outro lado, as reflexões provocadas pelo Movimento nos fazem ir além da forma escola quando a questão é educação. Que espaços, que tempos e que relações educam? Há uma complexidade nessa questão, pois estamos acostumados a pensar educação na escola. Entendemos que estamos vivendo num momento de crise da educação, que é resultado de uma crise estrutural. Mészáros lembra que a educação está profundamente integrada à totalidade dos processos sociais e que é preciso refletir sobre o tipo de mediação que é a educação. Nesse sentido, podemos afirmar que se tornou, em geral, um processo que contribui para a alienação, para a interiorização da lógica da sociedade capitalista e não de contraposição, de explicitação crítica da realidade, de formação para subverter a ordem. Os artigos apresentados nessa obra tem a intenção de provocar a refletir sobre esses aspectos e sugerem a necessidade de construir, coletiva e organizadamente, estratégias educacionais que se constituam como instrumentos de luta, mas que sejam forjados não só dentro das salas de aula, mas que estejam para além desse espaço tão limitador, tão pequeno diante das necessidades da classe trabalhadora. A escola não mudará a sociedade, com certeza, mas pode, sim, ser espaço de explicitação do que ela é, espaço de construção da crítica. Boa leitura! Marlene L. S. Sapelli Currículo e escola itinerante: pressupostos, conteúdo, vivências geradoras e avaliação............15 Clésio Acilino Antonio Marcos Gehrke Marlene Lucia Siebert Sapelli História e memória como elementos de formação da identidade Sem Terra........................67 Marizete Lucini Ernesta Zamboni Escolas itinerantes dos acampamentos do MST: aproximações e distanciamentos entre escola e vida................................................................101 Caroline Bahniuk Formação de educadores do campo: a experiência educativa na organização dos estágios desde a Pedagogia do Movimento..........133 Ana Cristina Hammel Natacha Eugênia Janata Gestão democrática e ocupação da escola: limites e possibilidades da gestão das escolas em acampamentos e assentamentos do MST......165 Fernando José Martins Memórias de infância e de escola: vozes de educadores e educadoras do curso Pedagogia do Campo do Paraná...............................................191 Noeli Valentina Weschenfelder S umário Muito presente na história da educação brasileira são as questões relacionadas à Educação do Campo, porém, é a partir dos anos 1990 que elas ganham maior visibilidade. Isso decorre, principalmente, do empenho dos movimentos sociais em provocar o debate acerca do projeto social que dá sustentação aos diferentes projetos de educação do campo. Um desses movimentos é o dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Um dos principais mitos que deve ser superado quando se propõe a discussão sobre a Educação do Campo é “que se trata de uma única perspectiva”. Muitos que se posicionam em relação à questão o fazem colocando todas as propostas no mesmo pacote. Há diferenças imensas sobre as propostas que compõem a Educação do Campo, especialmente no que se refere às concepções de homem e sociedade que lhes dão sustentação. Assim, nesse trabalho, temos por objetivo contribuir para que as pessoas possam conhecer a proposta educacional do Movimento e também para que se avance na implementação da mesma, no sentido de superar seus próprios limites. Nesse conjunto de artigos, reunimos vários pesquisadores, de diferentes Universidades e da Educação Básica, unidos pelo respeito e compromisso com o MST e por uma temática em comum, ou seja, a educação que ocorre nos tempos-espaços ocupados pelo mesmo. Apesar da diferença de concepção dos autores, as discussões são riquíssimas e trazem vozes de vários lugares, permitindo-nos perceber vários aspectos da proposta: currículo, gestão, construção de identidade e formação de professores. A coletânea é composta de seis artigos: I ntrodução a) O primeiro, intitulado Currículo e Escola Itinerante: pressupostos, conteúdo, vivências geradoras e avaliação, que tem como autores Clésio Acilino Antonio, Marcos Gehrke e Marlene Lucia Siebert Sapelli, apresenta reflexões sobre o currículo das escolas itinerantes no Paraná e discute sobre a seleção, organização e distribuição dos conhecimentos escolares, enfatizando a questão da avaliação e da definição das vivências geradoras. b) O segundo, intitulado História e memória como elementos de formação da identidade Sem Terra, que tem como autoras Marizete Lucini e Ernesta Zamboni, nos leva a refletir sobre “como a narrativa histórica e as práticas de memória atuam na produção de uma identidade Sem Terra, configurando-se como resistência aos processos homogeneizadores e homogeneizantes das identidades sociais”. As autoras problematizam o papel do Estado e da sociedade civil no processo de luta por direitos. c) O terceiro, intitulado Escolas itinerantes dos acampamentos do MST: aproximações e distanciamentos entre escola e vida, que tem como autora Caroline������������������� Bahniuk, tem como objetivo “����������������������������������������� analisar a relação entre escola e vida a partir de uma experiência concreta – a Escola Itinerante Sementes do Amanhã pertencente ao Acampamento Chico Mendes, localizado no município de Matelândia – na região Oeste do Estado do Paraná”. A autora faz a discussão a partir dos estudos de Pistrak que entende que “a escola precisa conectar-se a seu tempo, à vida dos 12 sujeitos que a compõem, a seu entorno articulado, à totalidade das relações sociais”. d) O quarto, intitulado Formação de educadores do campo: a experiência educativa na organização dos estágios desde a Pedagogia do Movimento, que tem como autoras Ana Cristina Hammel e Natacha Eugênia Janata, resulta da pesquisa feita no Colégio Estadual Iraci Salete Strozak, uma escola pública do campo, localizada no Assentamento Marcos Freire, assentamento de reforma agrária do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no município de Rio Bonito do Iguaçu, Paraná e tem como objetivo “problematizar as experiências vividas no Curso de Formação de Docentes em nível médio”, especialmente aquelas relacionadas com os estágios. e) O quinto, intitulado Gestão democrática e ocupação da escola: limites e possibilidades da gestão das escolas em acampamentos e Assentamentos do MST, que tem como autor Fernando José Martins, apresenta o resultado de uma pesquisa realizada junto às escolas - Escola Iraci Salete Strozake, em Jardim Alegre, Escola Municipal Rural Chico Mendes e Escola Estadual Centrão, em Querência do Norte - e tem por objetivo apresentar elementos que nos ajudem a compreender como se consolida a gestão democrática da escola. O autor considera que o sistema da participação comunitária realizado na escola pública, nesse caso, nas escolas dos assentamentos e acampamentos, “resgata seu 13 sentido de público popular, pois é inegável que a participação reacende o sentimento de pertença da população frente à ‘coisa’ pública”. f) O sexto e último capítulo, intitulado Memórias de infância e de escola: vozes de educadores e educadoras do curso Pedagogia do Campo do Paraná, que tem como autora Noeli Valentina Weschenfelder, busca �������������������������������� compreender, a partir das narrativas dos educadores, como as diferentes instituições e as práticas educativas foram e são atravessadas por marcadores identitários. A autora considera que para o “grupo pesquisado as questões de classe social são mais visíveis e vêm à tona nas narrativas pessoais, canções, cursos de formação e nas produções didáticas desde o início da luta pela terra, uma vez que são camponeses sem terra”. 14