1. Limitações ao Poder Constituinte Derivado Decorrente Os Estados federados (e o DF) recebem diretamente do Poder Constituinte originário a capacidade de continuar a Constituição dentro de seu território, porém, devem ser obedecidos os princípios estabelecidos pela Constituição Federal. Segundo Uadi Lammêgo Bulos, os limites que os Estados se sujeitam pela imposição da Constituição Federal são chamados de autônomos. São adjetivados de autônomos porque advieram do próprio constituinte originário. Por isso, independem de quaisquer providências legislativas ulteriores das Assembléias Legislativas dos Estados para ser aplicados. [1] Tais limites autônomos incidem sobre a institucionalização e sobre o processo de emenda da Carta Estadual. Esses limites são os princípios sensíveis (ou enumerados), os princípios organizatórios (ou estabelecidos – que podem ser expressos ou implícitos) e os princípios extensíveis. Segundo Bulos, ainda há outros limites que os Estados se sujeitam. São os chamados limites heterônomos, porém, essas restrições são criadas na Constituição Estadual para limitar o poder de emenda estadual. Raul Machado Horta, por sua vez, esclarece que: O constituinte do Estado cria ordenamento constitucional autônomo, mas o processo de criação que ele percorre difere profundamente da originariedade criadora do constituinte federal. A precedência da Constituição Federal sobre a do Estado-Membro é exigência lógica da organização federal, e essa precedência, que confere validez ao sistema federal, imprime a força de matriz originária ao constituinte federal e faz do constituinte estadual um segmento derivado daquele.[2] A doutrina e a jurisprudência seguem indicando quais seriam os princípios que os Estados e o DF deveriam seguir ao utilizar sua capacidade constituinte decorrente[3]. Decisão do STF sobre o tema: O perfil da federação brasileira, redefinido pela constituição de 1988, embora aclamado por atribuir maior grau de autonomia dos Estados-membros, e visto com reserva por alguns doutrinadores, que consideram persistir no Brasil um federalismo ainda afetado por excessiva centralização espacial do poder em torno da União Federal. Se e certo que a nova carta política contempla um elenco menos abrangente de princípios constitucionais sensíveis, a denotar, com isso, a expansão de poderes jurídicos na esfera das coletividades autônomas locais, o mesmo não se pode afirmar quanto aos princípios federais extensíveis e aos princípios constitucionais estabelecidos, os quais, embora disseminados pelo texto constitucional, posto que não é tópica a sua localização, configuram acervo expressivo de limitações dessa autonomia local, cuja identificação – até mesmo pelos efeitos restritivos que deles decorrem – impõe-se realizar. (grifo nosso)[4] 1.1. Princípios Sensíveis, Apontados ou Enumerados São as matérias constantes no art. 34, VII, a a e. São sensíveis por dois motivos, um porque estão expressos[5] e dois porque ao serem violados podem sujeitar o Ente à intervenção federal. Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: (...) VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta. e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. Não cumprir os princípios sensíveis dá ensejo à representação de inconstitucionalidade interventiva, nos termos do art. 36, III, a ser proposta pelo Procurador Geral da República (PGR) e julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). 1.2. Princípios Estabelecidos ou Organizatórios[6] Dividem-se em explícitos, implícitos e decorrentes. 1.2.1. Princípios estabelecidos ou organizatórios explícitos ou expressos Os princípios estabelecidos explícitos correspondem ao conjunto de matérias às quais os Estados deveriam observar compulsoriamente (mandatórios) ou dizem respeito às matérias que os Estados não poderiam tratar (vedatórios) e que a Constituição fez questão de deixar expressamente consignados. A. Princípios organizatórios expressos mandatórios São normas compulsórias ou conhecidas como normas de pré-ordenação dos Estados. As normas de pré-ordenação constitucional determinam que os Estados deverão observar diversas normas inseridas em diversos dispositivos constitucionais, seguem-se exemplos: • Art. 18, §4°: A criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios é matéria que o Estado tem que tratar em sua organização. • Art. 27, §1º, que fixa o mandato dos deputados estaduais em quatro anos. O STF decidiu que: Nos expressos termos do § 1º do art. 27 da CF de 1988, ‘será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais’. A Constituição Federal, no art. 28, fixou em 1º de janeiro a data da posse do Governador e do ViceGovernador eleitos noventa dias antes do término de seus mandatos. Não marcou data para o início das legislaturas estaduais, mas, no art. 25, atribuiu aos Estados o poder de se organizarem e se regerem pelas Constituições e leis que adotarem, observados, porém, os seus próprios princípios (da CF). E o art. 11 do ADCT da CF de 1988 também estabeleceu: ‘cada Assembléia Legislativa, com poderes constituintes, elaborara a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta’. Um desses princípios é o que fixa em quatro anos a duração do mandato dos Deputados Estaduais (§ 1º do art. 27 da CF), que, consequentemente, não pode ser desobedecido por normas estaduais, como a Constituição do Estado e o Regimento Interno de sua Assembléia Legislativa. Não podem tais normas ampliar nem reduzir o prazo de duração dos mandatos de Deputados Estaduais. (grifo nosso)[7]. • Art. 28, §1º e 2º, que estabelecem normas relacionadas ao subsídio e à posse do governador em cargo público. • Art. 31, §1º, que estabelece o controle externo nos Municípios (pela Câmara Municipal) com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver. Com a exceção dos Municípios de São Paulo e Rio de Janeiro que possuem Tribunais de Contas do Município, todos os outros Municípios seguem a regra de ter o controle externo auxiliado pelo Estado-membro. • Arts. 37 a 42, porque a Constituição Federal diz expressamente se aplicar à administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios os princípios ali elencados. Segundo o STF: “(...) o art. 125 da Lei Magna defere aos Estados a competência de organizar a sua própria Justiça, mas não é menos certo que esse mesmo art. 125, caput, junge essa organização aos princípios "estabelecidos" por ela, Carta Maior, neles incluídos os constantes do art. 37, cabeça. (grifo nosso)[8] • Arts. 92 a 97 estabelecem normas de pré-ordenação do Poder Judiciário tanto da União quanto dos Estados. Sobre o tema, o STF decidiu que: Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigo 85 da Constituição do Estado de Rondônia, que elevou para treze o número de Desembargadores do Tribunal de Justiça. Ofensa manifesta ao princípio da iniciativa privativa, para o assunto, do Tribunal de Justiça, consagrada no art. 96, II, b, da Constituição Federal, de observância imperiosa pelo poder constituinte derivado estadual, como previsto no art. 11 do ADCT/88. Procedência da ação, para declarar inconstitucional a expressão "treze" contida no referido dispositivo. (grifo nosso)[9]. • Arts. 98, que determina que os Estados instituirão o juizado especial cível e criminal. • Art. 99, que determina a autonomia dos tribunais (se aplica aos Tribunais de Justiça dos Estados. • Art. 125, §2o, que determina expressamente aos Estados estabelecerem a representação de inconstitucionalidade contra lei ou ato normativo estadual ou municipal que contrariarem a Constituição Estadual. • Arts. 127 a 135, especialmente os arts. 132 e 134§2º, que tratam das funções essenciais à justiça e trazem diversos dispositivos direcionados à pré-ordenação dos Estados. • Arts. 144 IV e V §4° ao 7° e vários outros. Importante salientar que há algumas matérias especiais que o STF entende que não são princípios organizatórios. Os casos seguintes não são princípios organizatórios mandatórios, ou seja, são matérias que o constituinte estadual tem liberdade no seu poder de auto-organização. São exemplos: • Art. 57, §4o, que dispõe sobre eleição das mesas diretoras das casas legislativas do Congresso e veda a recondução dentro da mesma legislatura. O STF entendeu que: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA ESTADUAL: MESA DIRETORA: RECONDUÇÃO PARA O MESMO CARGO. Constituição do Estado de Rondônia, art. 29, inc. I, alínea b, com a redação da Emenda Const. Estadual n. 3/92. C.F., art. 57, § 4º. (...) A norma do § 4º do art. 57 da CF que, cuidando da eleição das Mesas das Casas Legislativas federais, veda a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente, não é de reprodução obrigatória nas Constituições dos Estados-membros, porque não se constitui num princípio constitucional estabelecido. II. - Precedente do STF: Rep 1.245-RN, Oscar Corrêa, RTJ 119/964. (grifo nosso)[10] • Art. 59, V, 62 e 84 XXVI, que se refere à edição de Medidas Provisórias no plano federal. A adoção da espécie normativa Medida Provisória é facultativa no plano dos Estados. Decisão do STF a respeito do Art. 25, §2º[11]: Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 51 e parágrafos da Constituição do Estado de Santa Catarina. Adoção de medida provisória por Estado-membro. Possibilidade. Arts. 62 e 84, XXVI da Constituição Federal. Emenda constitucional 32, de 11.09.2001, que alterou substancialmente a redação do art. 62. Revogação parcial do preceito impugnado por incompatibilidade com o novo texto constitucional. Subsistência do núcleo essencial do comando examinado, presente em seu caput. Aplicabilidade, nos Estados-membros, do processo legislativo previsto na Constituição Federal. Inexistência de vedação expressa quanto às medidas provisórias. Necessidade de previsão no texto da carta estadual e da estrita observância dos princípios e limitações impostas pelo modelo federal. Não obstante a permanência, após o superveniente advento da Emenda Constitucional 32/2001, do comando que confere ao Chefe do Executivo Federal o poder de adotar medidas provisórias com força de lei, tornou-se impossível o cotejo de todo o referido dispositivo da Carta catarinense com o teor da nova redação do art. 62, parâmetro inafastável de aferição da inconstitucionalidade argüida. Ação direta prejudicada em parte. No julgamento da ADI 425,Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 19.12.2003, o Plenário desta Corte já havia reconhecido, por ampla maioria, a constitucionalidade da instituição de medida provisória estadual, desde que, primeiro, esse instrumento esteja expressamente previsto na Constituição do Estado e, segundo, sejam observados os princípios e as limitações impostas pelo modelo adotado pela Constituição Federal, tendo em vista a necessidade da observância simétrica do processo legislativo federal. Outros precedentes: ADI 691, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 19.06.1992 e ADI 812-MC, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 14.05.1993. Entendimento reforçado pela significativa indicação na Constituição Federal, quanto a essa possibilidade, no capítulo referente à organização e à regência dos Estados, da competência desses entes da Federação para ‘explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada à edição de medida provisória para a sua regulamentação’[12] (art. 25, § 2º). Ação direta cujo pedido formulado se julga improcedente.[13] (grifo nosso) • Art. 128, §3º, que trata da escolha do chefe do Ministério Público Estadual – Procurador-Geral de Justiça. Será escolhido pelo chefe do Executivo, dentro de integrantes da carreira, indicados em lista tríplice na forma da lei respectiva, porém, não passa por sabatina no Poder Legislativo.[14] • Art. 131, §1o, que dispõe sobre a escolha do Advogado Geral da União, esse no plano federal, é de livre nomeação e livre exoneração. O STF[15] entendeu que, no plano estadual, os Estados estão livres para estabelecer na Constituição do Estado que o Procurador-Geral do Estado seja escolhido dentre membros da carreira, o que cria uma vinculação diferente quando se compara com a livre escolha do Advogado Geral da União. B. Princípios organizatórios expressos vedatórios (proibições) São os artigos constitucionais que definem, expressamente, o que os Estados não podem fazer. Vejamos: • Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:... Traz um conjunto de matérias vedadas a todos os entes. • Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando: (...) também traz uma vedação, embora não seja absoluta, a vedação está em não intervir nos seus Municípios, exceto nos casos que a própria CF, no mesmo artigo, elenca. • Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. • Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino. 1.2.2. Princípios estabelecidos ou organizatórios implícitos Diz respeito também a um grupo de artigos que, por estabelecerem competências da União ou dos Municípios, veda, implicitamente, a competência organizatória dos Estados. Podem ser vedatórios ou mandatórios. A. Princípios estabelecidos ou organizatórios implícitos vedatórios Correspondem às matérias que foram dadas à União, de forma exclusiva ou privativa, ou aos Municípios e, por isso, são vedadas, implicitamente, aos Estados, vejamos exemplos: • Art. 21 Competência da União, sendo competência da União o artigo veda de forma implícita a participação do Estado no assunto. • Art. 22 Competência privativa da União para legislar, novamente a mesma ideia, ao atribuir a competência para a União, há uma vedação implícita aos Estados. • Art. 30[16], que estabelece a competência dos Municípios, também veda de forma implícita a atuação dos Estados na matéria. • Art. 86, §3º, que atribui imunidade ao Presidente da República em relação às prisões, só podendo ser preso após sentença condenatória. Segundo o STF, tal norma não pode ser estendida aos Governadores, porque seria prerrogativa típica de chefe de estado. Não podem as Constituições estaduais conceder tais imunidades aos Governadores, veja a decisão do STF: O Estado-membro, ainda que em norma constante de sua própria Constituição, não dispõe de competência para outorgar ao Governador a prerrogativa extraordinária da imunidade à prisão em flagrante, a prisão preventiva e à prisão temporária, pois a disciplinação dessas modalidades de prisão cautelar submete-se, com exclusividade, ao poder normativo da União Federal, por efeito de expressa reserva constitucional de competência definida pela Carta da República. A norma constante da Constituição estadual — que impede a prisão do Governador de Estado antes de sua condenação penal definitiva — não se reveste de validade jurídica e, consequentemente, não pode subsistir em face de sua evidente incompatibilidade com o texto da Constituição Federal.[17] B. Princípios estabelecidos ou organizatórios implícitos mandatórios São matérias que estabelecem implicitamente ao Estado algo que deverão fazer, que deverão executar, conforme a prescrição constitucional. Exemplos: • Art. 25. §3° Estabelece que os Estados podem instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, porém, manda, implicitamente que seja conforme os pressupostos indicados na norma. • Art. 27 Estabelece a Assembleia legislativa e, implicitamente, determina que seja o poder legislativo estadual unicameral. • Art. 28 Estabelece o Governador como o chefe do poder executivo estadual, estabelece, implicitamente, a necessidade de seguir o presidencialismo no âmbito estadual, posto que a chefia do executivo tem que ser necessariamente unipessoal. • Art. 155 Traz a possibilidade de os Estados instituírem impostos, porém, implicitamente há a necessidade de seguir diversas normas de pré-ordenação. 1.3. Princípios Extensíveis ou da Simetria Os princípios extensíveis correspondem ao conjunto de matérias que a Suprema Corte entende que deva ser utilizado no âmbito estadual, copiando-se o modelo federal, por simetria. Em outras palavras, o princípio da simetria indica matérias que são estendidas do modelo federal para o modelo de organização estadual. Os princípios extensíveis são também conhecidos como princípio da simetria (ou da homogeneidade), porque são declarados como normas que simetricamente, seguindo o modelo federal, deverão ser adotadas no modelo de organização estadual. Constituem normas de pré-ordenação dos Estados indicadas, caso a caso, pela jurisprudência do STF. Pode-se dizer que os princípios extensíveis integram a estrutura da federação, seriam exemplos: • Art. 58, §3º no que se refere ao quórum de 1/3 para a criação de comissões parlamentares de inquérito (CPIs). • Arts. 61, §1º, que estabelece as iniciativas do Presidente da República deverão ser respeitadas mutatis mutantis para os Governadores de Estado. • Art. 83, que estabelece que o Presidente e o Vice-Presidente não poderão sair do País por período superior a 15 dias sem a anuência do Congresso Nacional, sob pena de perda do cargo. • Em geral o Processo Legislativo, principalmente, suas iniciativas reservadas e o poder de sanção conferido ao governador. Nesse caso, contemplando, inclusive, a proibição ao Poder Constituinte decorrente de incluir na Constituição do Estado a regulação de matérias que seriam de iniciativa privativa do Governador. • Princípio da igualdade dos Entes Federativos. • Não coação de um Ente sobre os outros. • Princípio do Estado Democrático de Direito: Os Estados e DF só podem atuar com respeito à legalidade, moralidade, dignidade da pessoa humana... • Respeito aos direitos fundamentais e suas garantias. • Princípios da ordem econômica e social: valorização do trabalho, da justiça social, saúde e educação como direito de todos e obrigação das entidades estatais. 1.3.2. Decisões do STF sobre o tema da simetria ou homogeneidade A. B. ADI 738 (STF) Afronta os princípios constitucionais da harmonia e independência entre os Poderes e da liberdade de locomoção norma estadual que exige prévia licença da Assembléia Legislativa para que o Governador e o Vice-Governador possam ausentar-se do País por qualquer prazo. Espécie de autorização que, segundo o modelo federal, somente se justifica quando o afastamento exceder a quinze dias. Aplicação do princípio da simetria. C. ADI 425 (STF) Podem os Estados-Membros editar medidas provisórias em face do princípio da simetria, obedecidas as regras básicas do processo legislativo no âmbito da União (CF, artigo 62). Constitui forma de restrição não prevista no vigente sistema constitucional pátrio (CF, § 1º do artigo 25) qualquer limitação imposta às unidades federadas para a edição de medidas provisórias. Legitimidade e facultatividade de sua adoção pelos Estados-Membros, a exemplo da União Federal. D. ADI 3.619 (STF) O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido (...) para declarar inconstitucionais o trecho 'só será submetido à discussão e votação decorridas 24 horas de sua apresentação, e', constante do § 1º do art. 34, e o inciso I do art. 170, ambos da XII Consolidação do Regimento Interno da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo que estabelecem, como requisito à criação de comissão parlamentar de inquérito, a aprovação do respectivo requerimento em Plenário. (...) asseverou-se que os requisitos indispensáveis à criação de comissões parlamentares de inquérito encontram-se dispostos no art. 58, § 3º, da CF, preceito de observância compulsória pelas casas legislativas estaduais (princípio da simetria). Desse modo, entendeu-se que a criação de CPI independe de deliberação plenária, sendo bastante a apresentação do requerimento de 1/3 dos membros da Assembléia Legislativa ao seu Presidente, somada aos demais requisitos constitucionais. E. ADI 2.966 (STF) À luz do princípio da simetria, é de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo estadual as leis que disciplinem o regime jurídico dos militares (art. 61, § 1º, II, f, da CF/1988). Matéria restrita à iniciativa do Poder Executivo não pode ser regulada por emenda constitucional de origem parlamentar. Precedentes." F. RE 223.037 (STF) Tribunal de Contas do Estado de Sergipe. Competência para executar suas próprias decisões: impossibilidade. Norma permissiva contida na Carta estadual. Inconstitucionalidade. As decisões das Cortes de Contas que impõem condenação patrimonial aos responsáveis por irregularidades no uso de bens públicos têm eficácia de título executivo (CF, artigo 71, § 3º). Não podem, contudo, ser executadas por iniciativa do próprio Tribunal de Contas, seja diretamente ou por meio do Ministério Público que atua perante ele. Ausência de titularidade, legitimidade e interesse imediato e concreto. A ação de cobrança somente pode ser proposta pelo ente público beneficiário da condenação imposta pelo Tribunal de Contas, por intermédio de seus procuradores que atuam junto ao órgão jurisdicional competente. Norma inserida na Constituição do Estado de Sergipe, que permite ao Tribunal de Contas local executar suas próprias decisões (CE, artigo 68, XI). Competência não contemplada no modelo federal. Declaração de inconstitucionalidade, incidenter tantum, por violação ao princípio da simetria (CF, artigo 75). G. ADI 452 (STF) A escolha do Procurador-Geral da República deve ser aprovada pelo Senado (CF, artigo 128, § 1º). A nomeação do Procurador-Geral de Justiça dos Estados não está sujeita à aprovação da Assembléia Legislativa. Compete ao Governador nomeá-lo dentre lista tríplice composta de integrantes da carreira (CF, artigo 128, § 3º). Não-aplicação do princípio da simetria. H. ADI 233 (STF) Ação direta de inconstitucionalidade. Estado do Rio de Janeiro. Art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que "anistiou" servidores em geral punidos com pena disciplinar; e art. 30, que anulou sansões disciplinares aplicadas aos servidores civis. Alegada afronta aos arts. 48, VIII, e 142, c/c o 144, par. 6º, da Constituição Federal. Procedência da increpação. O poder de elaborar a carta política do estado, conferido pelo art. 11 do ADCT/88, a assembléia legislativa, não compreende o de inserir no referido diploma normas próprias do poder legislativo ordinário, exercido pelo referido órgão, não de modo exclusivo, mas com observância indispensável ao princípio da colaboração dos demais poderes. Configuração, no presente caso, de flagrante violação ao referido princípio. Procedência da ação. I. RE 153.968 (STF) Processamento e julgamento de crime comum, atribuído ao governador. Art. 107 da Constituição Estadual, que condiciona o respectivo processamento e julgamento a admissão da acusação por 2/3 dos membros da Assembléia Legislativa. Constitucionalidade reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça. Decisão que teria ofendido os arts. 25; 51, I; 86 e 105, I, da Constituição Federal. Alegação descabida. A norma do art. 105, I, a, primeira parte, da Constituição Federal, que prevê a competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar os crimes em referencia, não pode ser interpretada senão em consonância com o principio da autonomia dos Estados-Membros, e, portanto, sem contrariedade ao disposto no art. 25, da mesma Carta, segundo o qual serão eles organizados e regidos pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios estabelecidos no Texto Fundamental Federal, entre os quais figura, desenganadamente, o de que o julgamento do Chefe do Poder Executivo há de ser precedido de manifestação política do Poder Legislativo (art. 51, I), que diga da conveniência, ou não, de que se proceda contra quem exerce a suprema magistratura do Estado, com risco de perda da liberdade e, pois, de destituição indireta de suas funções. J. ADI-MC 2361 (STF) Verificada a reprodução obrigatória pela Carta Estadual (artigos 76, incisos I, II, IV, V e VI) das disposições constantes dos incisos I, II, IV, V e VI do artigo 71 da Constituição Federal, é do STF a competência para julgar a ação. Precedentes. 3. O controle externo das contas do Estadomembro é do Tribunal de Contas, como órgão auxiliar da Assembléia Legislativa, na forma do artigo 71 da Constituição Federal, por força do princípio da simetria. 2. Normas de Reprodução e Normas de Imitação [18] 2.1. Normas Centrais Raul Machado Horta utiliza uma nomenclatura própria para definir os princípios que os Estados se sujeitam na sua auto-organização. Segundo o autor, a Constituição Federal, por ser anterior e superior, estabelece um conjunto de princípios que seriam “normas centrais” que os Estados devem seguir. As normas centrais, na visão do citado autor, seriam: 2.1.1. Princípios sensíveis (Art. 34, VII) Neste caso não há diferença para o que já foi estudado no tópico 7.1. 2.1.2. Princípios estabelecidos (estão dispersos) Definem “a origem, a causa, o começo, o germe, o elemento predominante da Constituição Federal. Os princípios estabelecidos se alojam nas normas constitucionais federais sobre repartição de competência, o sistema tributário, a organização dos Poderes, os direitos políticos, a nacionalidade, os direitos e as garantias individuais, os direitos sociais, a ordem econômica, a educação, a família e a cultura, afinal, na matéria dispersa no texto constitucional federal”.[19] 2.1.3. Regras de preordenação Consagram as normas relativas à auto-organização, porém, já dispostas no texto Constitucional, como por exemplo, normas sobre o Poder Judiciário e sobre o Ministério Público. 2.2. Normas de Reprodução[20] As normas centrais seriam, então, “normas de reprodução”, ou seja, seriam normas que os Estados são obrigados a ter na sua Constituição Estadual pelo fato de já terem sido adotadas na Constituição Federal. (...) as normas de reprodução refletem a expansividade do modelo federal, que atraiu para seu campo matéria anteriormente entregue à revelação originária do constituinte estadual.[21] O STF já se pronunciou[22] sobre a citada doutrina entendendo, quanto ao Preâmbulo da Constituição Federal, que: EMENTA: CONSTITUCIONAL. CONSTITUIÇÃO: PREÂMBULO. NORMAS CENTRAIS. Constituição do Acre. I. - Normas centrais da Constituição Federal: essas normas são de reprodução obrigatória na Constituição do Estado-membro, mesmo porque, reproduzidas, ou não, incidirão sobre a ordem local. Reclamações 370-MT e 383-SP (RTJ 147/404). II. Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa. III. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. (grifo nosso) 2.3. Normas de Imitação O autor cita ainda que os Estados podem, por opção, copiar outras normas de organização do modelo federal para a sua realidade, tais normas copiadas por vontade própria, ou seja, dentro da utilização de sua auto-organização, seriam normas de imitação. As normas de imitam exprimem a cópia de técnicas ou de institutos, por influência de sugestão exercida pelo modelo superior. (...) a norma de imitação traduz a adesão voluntária do constituinte a uma determinada disposição constitucional.[23] (grifo nosso) [1] Uadi Lammêgo Bulos (2007, p. 312). [2] Raul Machado Horta (Direito Constitucional, 4ª ed., p. 69). A maior parte da doutrina utiliza a classificação em Princípios Sensíveis, Princípios Estabelecidos e Princípios Extensíveis, mas também será descrita a ideia de Raul [3] Machado Horta (2003) que fala em Normas Centrais e sua vinculação como Normas de Repetição. [4] ADI-MC 216. Segundo Bulos (2007, p. 312): “Sensível é aquilo que pode ser captado pela intuição, causando ao observador sensações externas. Com efeito, princípio constitucional sensível é o que pode ser facilmente percebido pelos órgãos sensoriais, de modo claro, evidente, translúcido, visível, manifesto, óbvio”. [5] Bulos (2007, p. 313): “O qualificativo ‘estabelecidos’: o qualificativo estabelecido não é o mais apropriado para adjetivá-los, porque nada revela ou esclarece. Em última análise, os princípios sensíveis e extensíveis também são estabelecidos, porquanto – dispostos na Constituição federal – cumprem, em sentido amplo, idênticas tarefas. À luz disso, preferimos denominar os princípios constitucionais estabelecidos princípios constitucionais organizatórios, termo que evita maiores deturpações. Todavia, não devemos abandonar, por completo, o seu uso, nada obstante a impropriedade da qualificação que os doutores lhe atribuem, porque ele já se encontra consagrado entre os publicistas, servindo para veicular a idéia nuclear que preside o assunto”. [6] [7] STF, ADI-MC 1162 [8] STF, ADC 12-MC. [9] STF, ADI 142. [10] ADI 793 / RO. Rel. Min. Carlos Velloso, 03.04.1997. [11] O art. 25, §2º estabelece que: Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada à edição de medida provisória para a sua regulamentação. (Redação da EC n. 05/1995) Perceba, porém, que houve a vedação quanto à utilização de Medida Provisória para a regulamentação de tal atividade. Nesse julgamento o STF deixa claro que os Estados podem adotar Medida Provisória, porque se o art. 25, §2º veda a adoção pelo Estado de Medida Provisória para a regulamentação de gás canalizado é porque permite que tal instrumento seja usado para outras situações. [12] ADI 2.391, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 16.08.2006, DJ de 16.03.2007. No mesmo sentido: ADI 425, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 04.09.2002, DJ de 19.12.2003. [13] Diferentemente do modelo federal em que o Procurador-Geral da República – chefe do Ministério Público da União é escolhido pelo Presidente dentre integrantes da carreira, sem qualquer lista, e deve ter seu nome aprovado pelo Senado Federal. [14] ADI 2581: Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira. [15] Cabe excetuar os incisos VI, VII e IX do art. 30, porque nesses incisos há competências compartilhadas entre Municípios, Estados e União. Portanto, nesses incisos não está vedado implicitamente a participação absoluta dos Estados na matéria. [16] ADI 978, Rel. p/ o ac. Min. Celso de Mello, julgamento em 19.10.1995, DJ de 24.11.1995. [17] [18] Raul Machado Horta (2003, p. 69 a 72). [19] Raul Machado Horta (2003, p. 70). [20] Também conhecidas como normas de reprodução obrigatória. [21] Raul Machado Horta (2003, p. 73) [22] ADI 2076 / AC, Rel. Min. Carlos Velloso. Julg. 15.08.2002. [23] Raul Machado Horta (2003, p. 73)