SEMINÁRIO RIO CAPITAL DA ENERGIA – GÁS NATURAL 28 DE NOVEMBRO DE 2012 ABERTURA JULIO BUENO – SECRETÁRIO ESTADUAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO “Nunca tivemos condições macroeconômicas tão fortes para crescer e tropeçamos nas próprias pernas” Esse seminário sublinha a preocupação que temos, aqui no Rio, com o setor de energia no Brasil. Na verdade, o Rio de Janeiro tem o setor de energia como principal vetor de crescimento e desenvolvimento. E esse setor está hoje, na minha visão, numa transição absolutamente complicada no País. Não há leilões da ANP desde 2008. Eu faço uma conta, uma regra de três simples, só para que todos possam entender o que significa a não realização desses leilões, levando em consideração um crescimento do PIB entre 1,4% e 1,5% em 2012. Imaginem o seguinte: um terço do Pré-Sal já foi concedido, o que representa cerca de US$ 600 bilhões em investimentos. Dois terços restantes representam, portanto, US$ 1,2 trilhão e é isso que está parado, com o Brasil crescendo não mais que 1,5%. Mais ainda: o congelamento do preço da gasolina tem tirado o fôlego do principal player da economia brasileira no setor de energia, que é a Petrobras, diminuindo a velocidade dos seus investimentos. Isso tem um impacto direto na economia brasileira e na economia do Rio de Janeiro. Além disso, há vários projetos congelados de etanol por causa de preços, a estimativa da Firjan é que existam, hoje, 30 projetos parados. Afinal, ninguém vai colocar dinheiro nesse setor com o preço do etanol não sendo considerado viável. Há também a questão da energia elétrica. Eu, pessoalmente, quero dizer a vocês que entendo absolutamente o que o governo está fazendo, aliás, concordo com isso, do ponto de vista da economicidade. Agora, eu não concordo, e essa também é uma questão importante que é preciso colocar, com a forma como isso foi feito. A gente saiu da posição um para a posição mil em um segundo, gerando, portanto, um desconforto para todas as empresas do setor, que tem se refletido na bolsa de valores. E por fim, mas não menos importante, está a questão do gás natural. É importante dizer que o cenário da energia no mundo está mudando celeremente, como pessoalmente eu nunca pensei que pudesse acontecer. O Shale Gas nos Estados Unidos, o gás de xisto, está surpreendendo pela forma absolutamente rápida com que está sendo colocado no mercado, transformando, outra vez, o cenário de energia. Não sei se vocês viram a The Economist da semana passada, na qual há um artigo falando sobre as projeções da Agência Internacional de Energia, que aponta que o maior produtor de petróleo do mundo em 2020 será os Estados Unidos. Isso terá um impressionante impacto geopolítico, econômico, e a gente aqui discutindo royalties de petróleo. Tudo isso ocorre em meio a um quadro em que o País cresce 1,5%, em que temos as condições macroeconômicas para o crescimento , em que o maior problema da economia brasileira ao longo da história está equacionado, que é a questão da balança de transações correntes. Ou seja, nunca tivemos condições macroeconômicas tão fortes para crescer e tropeçamos nas próprias pernas. O setor de energia é o símbolo desse tropeção que estamos dando. O gás natural nos Estados Unidos hoje custa US$ 3 o milhão de BTU e aqui, US$ 11. Vocês acham que a petroquímica vai investir onde, aqui ou nos Estados Unidos? Como é que se precifica gás natural no Brasil? Como é que o agente dominante – disso isso com tranquilidade porque tenho 35 anos de Petrobras, ninguém defende tanto e tem tanta estima pela companhia quanto eu -, monopolista, não pode estabelecer preços? Temos aqui o pior dos mundos, um monopólio com preço livre. Essas questões são absolutamente fundamentais e essenciais para a discussão da sociedade nesse momento. Precisamos entender que essa questão, principalmente o preço do gás natural, é central para a economia brasileira. Evidentemente que estamos no calor da luta, principalmente dos royalties, o que nos torna mais vigorosos no debate. O governador Sérgio Cabral viria aqui, para prestigiar o seminário e o nosso programa mas, também para assinar um projeto de lei. Infelizmente, não pôde vir. Mas quero informar que o governador está enviando à Assembléia Legislativa uma mensagem para o deputado Paulo Melo, que aqui está, estabelecendo uma política para gás natural renovável no Estado do Rio de Janeiro. Ele assinará hoje esse projeto, que tem a ver com os aterros sanitários. A intenção é que tenhamos gás de aterro sanitário e que a nossa companhia distribuidora compre esse gás. É o primeiro projeto desse tipo no Brasil, importante do ponto de vista ambiental, dos próprios aterros sanitários. Gostaria também de dizer para vocês que o presidente do Fórum de Secretários de Energia, José Anibal, estaria aqui mas também não pôde comparecer, porque tem um evento hoje em São Paulo. Mas ele está absolutamente inocentado, porque hoje o Estadão, na primeira página, traz o governo paulista apoiando a causa dos royalties do Rio de Janeiro. Tenho certeza que as discussões aqui serão muito importantes para que possamos entender melhor esse grave momento pelo qual o setor de energia vem passando no Brasil. ORLANDO DINIZ – PRESIDENTE DA FECOMERCIO “Estamos somando forças para que possamos, nos próximos anos, continuar a garantir o desenvolvimento econômico, sustentável, com melhoria da qualidade de vida no Estado e a atração de novos eventos e investimentos” Não vou me atrever a falar sobre matriz energética e sobre gás porque os senhores entendem mais desse assunto do que eu, mas me sinto na obrigação e no dever de falar sobre algumas palavras que estão logo ali, na Logo do Estado: Somando Forças. Durante esse ano de 2012 eu tenho visitado vários Estados do País e, conversando com empresários do comércio, ouço sempre a mesma pergunta: o que está acontecendo no Rio de Janeiro? Respondo que não é nada demais, estamos somando forças e fazendo parcerias, esse é o segredo. Explico, com um pouco mais de detalhes, aquilo que nós levamos anos para conseguir, tão simples e tão difícil: o Executivo, o Legislativo e as forças da sociedade caminhando numa única direção. Não por acaso, nós aqui do Sistema Fecomercio também adotamos, desde 2009, uma palavra também muito simples - transformação. Somando a esse movimento que é muito mais importante, ainda, que o Rio Capital da Energia, que na verdade é um dos resultados da soma de esforços. Fugindo bem rapidamente do tema, na semana passada assinamos aqui um convênio com a Secretaria de Administração Penitenciária. Começamos a desenvolver uma ação de formação profissional com as detentas de Bangu. E a equipe da Fecomercio/Senac voltou dessa visita completamente emocionada com a transformação que foi feita no sistema penitenciário do Estado, dando condições humanas e dignas às pessoas que estão ali. Muitas vezes a sociedade do Estado e do Brasil não sabe dessa transformação que vem acontecendo, dando dignidade a quem precisa de dignidade. Esse é um trabalho do governo do Estado do Rio em parceria com diversos setores da sociedade. Estamos somando forças para que possamos, nos próximos anos, continuar a garantir o desenvolvimento econômico, sustentável, com melhoria da qualidade de vida no Estado e a atração de novos eventos e investimentos. Para isso, nesse momento, é fundamental que o direito adquirido com relação aos royalties e os contratos já assinados de petróleo seja respeitado. Não somente por conta do petróleo, mas para que a sociedade brasileira e a comunidade internacional continuem respeitando o nosso País como um lugar onde vale aquilo que está escrito e assinado. Nós empresários do comércio somos o setor da economia que está mais junto da sociedade no dia a dia e percebemos bem a angústia, assim como os movimentos positivos que acontecem na recuperação de áreas degradadas nessa cidade , onde foram feitos os investimentos através, inicialmente, das UPPs e onde nós, empresários e sociedade fluminense, também devemos estar presentes . Nós temos um desafio, estamos somando forças e precisamos que os nossos parceiros continuem conosco nesse processo de entregar à sociedade fluminense o que ela precisa e merece. É com essa visão e essa ação que reafirmamos a nossa parceria com o governo do Estado e a Alerj, assim como o compromisso do Sistema Fecomercio e dos empresários do comércio de bens, serviços e turismo desse Estado, nas mais variadas frentes onde se fizer necessária a nossa presença, sempre com esse espírito de somar forças e transformar a vida das pessoas, das empresas, do nosso Estado. GEOBERTO ESPÍRITO SANTO – VICE-PRESIDENTE DO FÓRUM NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE ENERGIA (Representando o presidente do Fórum, José Aníbal) “No Fórum temos percebido que passamos por um momento de um risco regulatório muito grande, não só no setor de petróleo e gás, mas também de energia elétrica” Secretário Julio Bueno, você nas suas palavras iniciais já conseguir somar todas as forças para que possamos desenvolver cada vez mais o gás natural no Brasil, essa fonte de energia que precisamos colocar mais no mercado, para desenvolvê-lo e, obviamente, sermos mais competitivos. Todos nós estamos precisando dessa parceria entre o Executivo e o Legislativo. No Fórum temos percebido que passamos por um momento de um risco regulatório muito grande, não só no setor de petróleo e gás, mas também de energia elétrica. Estamos aqui juntos, o setor governamental e produtivo, para que possamos dar uma visão para o segmento de gás natural no Brasil. LUIZ DOMENECH – PRESIDENTE DA ABEGÁS E DA COMGÁS “Falta uma visão compartilhada, que permita uma união de forças entre governo e setor privado em toda a cadeia de gás” O gás natural é o combustível do século 21. Estivemos em um congresso mundial de gás em Kuala Lumpur e ficou clara essa importância, sobretudo depois do fenômeno do Shale Gas nos Estados Unidos e do fato de que esse combustível está tendo um papel fundamental no Japão após o tsunami naquele país. No Brasil ainda não temos uma visão compartilhada sobre que papel o gás natural tem a cumprir no País. Estou convencido de que o papel do gás aqui é fundamental, hoje no Brasil a Petrobras está entregando acima de 40 milhões de metros cúbicos/dia só para a geração elétrica. As distribuidoras que nós temos na Abegás entregam outros 40 milhões de metros cúbicos/dia. Ou seja, hoje no Brasil estão sendo distribuídos quase 90 milhões de metros cúbicos/dia de gás e ninguém sabe disso. Falta uma visão compartilhada, que permita uma união de forças entre governo e setor privado em toda a cadeia de gás. Há necessidade de políticas claras para todos os players da indústria de gás no País, começando pelo upstream, disponibilizando mais áreas para incrementar a produção. Não há Rodadas de Licitação para novas áreas de exploração e produção. Estamos trabalhando junto ao governo federal o PMAT, para expandir a malha de transporte. Todas as distribuidoras estão trabalhando fortemente para expandir a malha de distribuição, mas ainda falta uma visão compartilhada, políticas públicas que ajudem a multiplicar esses esforços em toda a cadeia de gás natural. Sem essa visão compartilhada, essa política pública, continuaremos avançando sem rumo. Gosto do Somando Forças, gostei muito disso, as forças estão aqui, sentadas nessa mesa e acho que o debate de hoje será importante para tentar construir essa visão compartilhada. SYMONE CHRISTINE DE SANTANA ARAÚJO - DIRETORA DO DEPARTAMENTO DE GÁS NATURAL DO MINISTÉRIO DAS MINAS E ENERGIA “O gás natural é um infante com problemas de adulto” O que percebo desde que comecei a trabalhar na área de gás do Ministério das Minas e Energia em 2003, há exatos 10 anos, é que passamos nesse período por inúmeras transformações e há ainda muito o que fazer. Eu costumo usar uma analogia quase bruta de que o gás natural é um infante com problemas de adulto. Ou seja, ele lida com setores absolutamente maduros, sendo que é um energético cuja história no Brasil começa em 1999, com o advento do Gasbol. Para uma indústria de energia, esse tempo, de 13 anos, é nada. No entanto, não podemos nos apoiar nesse aparente álibi, há muito o que fazer, o gás natural é certamente o combustível do século 21. Em função do nosso arranjo constitucional, das próprias características dessa indústria, das escolhas do legislador, da forma como se organiza a agenda, especialmente do Executivo e do Legislativo, essa indústria só vai crescer usando aquela chamada que está ali colocada, é somando forças. O gás natural tem uma característica bem brasileira, somos uma Federação, cada um de nós tem um pouco de uma dupla identificação. Como o gás, que é nacional, mas, no momento em que atravessa as fronteiras do Estado, é local. O gás é da competência dos Estados. É preciso que esses dois entes – União e Estados - tenham grande sabedoria para juntos conseguirem, efetivamente, desenvolver uma indústria sólida e que, no caso brasileiro, possa concretizar essa ideia de que é um energético especial e de grande valor. Será um dia muito produtivo. Para nós, especialmente, que ficamos em Brasília, é muito muito importante esse contato com a indústria. Eu li recentemente uma matéria da qual discordo completamente, que falava que essa intensa conversa com a indústria não é interessante. Eu percebo que, ainda que tenhamos pontos de vista ou visões diferentes, não há em nenhum momento o interesse de não fazer algo juntos. O poder concedente enxerga de um jeito, a agência reguladora talvez tenha um olhar um pouco diferente, o Estado vê de um outro modo, assim como as distribuidoras, os consumidores, os produtores, mas existe algo que nos une: todos nós desejamos construir uma indústria sólida de gás natural, tornar o nosso marco regulatório vivo, específico e adequado ao desenvolvimento da indústria. Acho que encontros como esse respondem claramente a esse desafio. DEPUTADO PAULO MELO PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (ALERJ) “Fico a vontade de me comprometer em aprovar o projeto de lei do aterro sanitário o mais rapidamente possível, ouvindo toda a sociedade civil organizada, os empresários. O nosso compromisso final é com o consumidor” Quero falar da minha admiração pelo trabalho do secretário Julio Bueno, não como presidente de uma Assembleia, mas como participante de um governo inovador, que oferece perspectivas para o Rio de Janeiro. E gostaria de dizer, em poucas palavras, da minha satisfação em presidir o Parlamento em um Estado que busca encontrar o seu rumo. Todos aqui citaram o slogan do governo do Estado do Rio de Janeiro, Somando Forças. O Estado tem demonstrado isso nas suas ações, de forma permanente. Nós temos interagido com a sociedade, em todos os projetos governamentais e aqueles que são inseridos pela sociedade organizada. A Assembleia Legislativa, Symone, só para você ter uma ideia, levou 18 dias para votar todo o projeto de consolidação da desestatização das empresas públicas. Às vezes cometemos o erro da lentidão de 96 horas para aprovar alguns projetos do governo do Estado, projetos importantes. Eu hoje fui chamado aqui porque o governador vai enviar à Alerj uma matéria que é extremamente importante, até porque aprovamos, há uma semana, o direito de se consorciar aterros sanitários, tentando uma política de austeridade para colocar fim nos lixões que nós ainda temos espalhados pelo nosso Estado. O projeto de lei que tende a regularizar essa situação, com o governo dando rumo e a Agenersa, a agência de regulação de serviços, fiscalizando. Quero me colocar, como presidente da Assembleia, à inteira disposição. Quero dizer que tenho orgulho do Rio respeitar todos os contratos e é isso que o Rio de Janeiro espera hoje. O presidente Lula se notabilizou e levou o Brasil ao respeito que adquiriu pela consolidação do respeito pleno aos contratos firmados. No caso específico da energia elétrica, acho que os métodos estão errados, mas os ativos já foram devidamente remunerados. Acho que a redução da tarifa de energia elétrica deve ocorrer, desde que seja feita de uma forma paulatina, que ela permita um entendimento e não a perda exacerbada de todos os Estados. O Rio de Janeiro perde alguns milhões, ainda que, é claro, os consumidores sejam o nosso objetivo final. No caso dos royalties do petróleo, falamos tanto em Constituição, esperamos que ela seja respeitada, especialmente no que diz respeito à compensação. No que diz respeito ao projeto de lei que será enviado hoje, terá todo o apoio da Assembleia Legislativa. Fico a vontade de me comprometer em aprovar o projeto de lei do aterro sanitário o mais rapidamente possível, ouvindo toda a sociedade civil organizada, os empresários. O nosso compromisso final é com o consumidor. APRESENTAÇÃO – POLÍTICA NACIONAL DE GÁS NATURAL SYMONE CHRISTINE DE SANTANA ARAÚJO DIRETORA DO DEPARTAMENTO DE GÁS NATURAL DO MINISTÉRIO DAS MINAS E ENERGIA “O primeiro desafio da indústria do gás natural é, obviamente, o da oferta de gás. Ou seja, não existe uma indústria do gás sem o seu principal energético, sem a sua razão de ser” A ideia dessa apresentação é discutir um pouco com vocês como nós, no Ministério, enxergamos o gás natural no Brasil e, à medida que essa apresentação prossegue, vasculhar um pouco o que foi a consolidação do gás natural nesses 13 anos, os avanços trazidos pela Lei do Gás, o plano de expansão da malha de transporte e um conjunto de desafios que, em grande medida, refletem essas discussões que já iniciamos nesta manhã. O primeiro desafio da indústria do gás natural é, obviamente, o da oferta de gás. Ou seja, não existe uma indústria do gás sem o seu principal energético, sem a sua razão de ser. E, portanto, hoje esse é um grande desafio. Existe uma grande preocupação com a competitividade do gás e o seu uso, ou seja, no seu consumo na geração termelétrica, na indústria, no que se refere a preço. Mas não existem aparentes estímulos para que os novos produtores coloquem o gás no mercado. Os produtores tendem, na grande maioria das vezes, a vender o gás para outro produtor com melhor estrutura, ou verticalizar. Precisamos de um olhar especial nessa direção. Do lado da demanda, o que preocupa o produtor? Ter um mercado firme, uma remuneração adequada e que ele tenha um lastro, um respaldo para oferecer ao mercado esse energético. Isso significa que precisamos também olhar com muito cuidado a demanda, visto que ela também tem que ser competitiva. Nos Estados Unidos, se vocês olharem historicamente, há registros de que até 2010, 2011, havia cerca de 1.300 sondas destinadas à exploração e produção de gás não convencional e, hoje, há menos de 200 delas. E onde essa intensidade da produção continua? Na direção das locações que têm líquidos. Ou seja, muito provavelmente esse preço sustentado hoje nos EUA de uma forma artificial não induz o ingresso permanente de agentes na exploração e produção do gás. Não dá para olhar os fenômenos de forma isolada. No entanto, a gente não pode deixar de ver a importância do que o gás não convencional fez, especialmente no que se refere à transformação dos Estados Unidos em um país tipicamente exportador, que hoje deixa obsoletos seus terminais de GNL o que,de algum modo, traz uma grande preocupação, considerando que o nosso mercado, tanto energético quanto no fluxo de produtos, é mundial. Portanto, uma eventual revolução no país mais importante de algum modo se reflete para nós. A infraestrutura não é um mero liga pontos, ela é certamente um instrumento de desenvolvimento e, claramente, a forma como o poder concedente, nesse caso representado pelo Ministério de Minas e Energia, torna claras as suas intenções, como ele enxerga o desenvolvimento desse mercado. Considerando tudo isso, podemos passar a entender agora o que aconteceu no gás, o que a Lei do Gás trouxe para nós e qual é a nossa visão do futuro. Segundo dados de julho, hoje há 16 trilhões de pés cúbicos de reservas e, só considerando o modo como a ANP enxerga as questões, a gente poderia ter em torno de 200 TCF agregados quando olhamos o gás não convencional. Basicamente esses dados refletem a média de 2012 e em julho ainda não estávamos com essa intensidade que estamos hoje do despacho de térmicas. Hoje o mercado está oscilando entre 70 e 90 milhões de metros cúbicos/dia, com o gás vindo da Bolívia no total e os terminais de GNL usando toda a sua capacidade disponível e a malha completamente ocupada. Eu já vi de tudo na área de gás nesses 10 anos, vi o teste das térmicas, chuva carregar gasoduto, problemas com os índios bolivianos, convivi com escassez, vi a bolha do gás acontecer no advento do Pré-Sal e agora vejo uma série de desafios que precisam ser respondidos. A despeito de precisarmos andar muito, muito foi feito nos últimos anos. Mas não podemos nos acomodar em tudo o que conseguimos construir. Em 2008, o melhor ano recente da economia, a participação do gás era de 10,3% na matriz energética brasileira. Este ano de 2012 possivelmente chegará a algo em torno de 10,5% a 11%, mas isso não muda muito em relação às situações de 2010 e 2011 (ambos 10,3%). Em 2030, a expectativa é que a participação do gás na matriz energética seja de 15%, segundo o Plano Nacional de Energia, sendo que essa participação não considerou os recursos não convencionais. À medida que essa indústria efetivamente vier a ser desenvolvida, possivelmente esse cenário mudará. Para a indústria do gás, é importante que prevaleça a produção em mar, o que confirma a importância do Rio nesse cenário. Obviamente faremos um esforço grande de colocação de novas concessões e um estímulo para produção dessas concessões em mar. No entanto, especialmente se olharmos o fenômeno americano, vemos que o gás não pode dar as costas para a terra, que é muito importante para o desenvolvimento da indústria. Como diria Milton Nascimento, “o Brasil não é só litoral”. Nesse aspecto temos inúmeras reservas, extremamente promissoras, em terra. Isso não deixando de considerar que a produção em mar continuará tendo um papel absolutamente relevante nessa produção. Mas a produção em terra é fundamentalmente importante para o desenvolvimento da indústria porque chega mais cedo, requer menor infraestrutura de escoamento e em grande medida, se olharmos, por exemplo, a Bacia do Paraná, ou do Recôncavo, ou mesmo do São Francisco – que pode ser talvez o nosso grande fenômeno esperado -, está praticamente dentro dos grandes mercados consumidores. Foi feito um esforço intenso pela agência reguladora e isso é algo no qual pretendemos investir e instrumentalizar de forma mais forte. No ano de 2009, que foi atípico para o mercado de gás – que chegou a ter fatia de apenas 8,7% na matriz energética do País – chegamos a ter uma queima de gás da ordem de 10 milhões de metros cúbicos/dia, o que acendeu um sinal amarelo, já que não havia geração de energia. Então a ANP olhou para essa questão e criou o Programa de Ajuste para Redução de Queima de Gás Natural (Parc), que já está fazendo efeito. Hoje estamos em patamares razoavelmente aceitáveis. Estamos estudando há quase dois anos a proposição de um conjunto de diretrizes que venham restringir de forma sustentável a queima do gás, o que não tem nada a ver com redução de produção, muito pelo contrário. Também a concretização do Plangás, junto com a redução da queima de gás, mostra como mudou a nossa relação entre o gás produzido no Brasil e o importado. A participação do gás nacional no mercado brasileiro vem crescendo, hoje é de 55%, 60%. É preciso criar condições necessárias para que essa participação do gás nacional se mantenha sustentável e agregue novas reservas e novos produtores. E para onde iremos? No futuro residem nossas preocupações. Quando olhamos a situação, vemos que começa a aparecer uma luz no fim do túnel, uma eventual sobra que poderia ser colocada no mercado, mas ainda não pode ser considerada estrutural. No que diz respeito à infraestrutura, foram instalados dois terminais de GNL nos últimos anos. Além disso, a malha de gasodutos evoluiu muito, mas há prevalência dessa malha no litoral, o que significa que há um grande Brasil central a atender. Esse conjunto de bacias em terra, especialmente aquelas vocacionadas ao gás não convencional, parece em grande medida responder a esse anseio de trazer para o centro do Brasil um atendimento à semelhança do que a gente tem no litoral. Sobre a Lei do Gás, é um pouco da república do possível e reflete um cenário de aparente escassez de gás em 2006 e 2007, tem elementos modernos e deixou coisas de fora. Não é uma tarefa fácil, mas nunca vai se tornar viva de verdade sem que a gente enxergue nosso arranjo federativo. Para que essa indústria se desenvolva e todos os elos da cadeia sejam beneficiados, os Estados e a União vão ter que se dar as mãos, sobretudo na regulamentação de três figuras novas trazidas pela Lei do Gás, o autoprodutor, o autoimportador e o consumidor livre, que têm sido um grande desafio. Se não houver essa harmonização, teremos uma situação nos moldes da guerra fiscal, passaremos da guerra fiscal à guerra do gás e não queremos isso. O que desejamos é que qualquer cidadão possa implantar sua indústria com condições similares entre os Estados, ressalvadas obviamente as diferenças. Será preciso um tratamento harmônico que respeite essas diferenças entre os Estados. Estamos construindo nossa legislação e regulamentação em busca de consensos. Acredito que essa lei é a base para expansão do mercado e ao final pode propiciar um ciclo virtuoso. Os fundamentos da Lei do Gás são o fortalecimento do Ministério das Minas e Energia e da ANP e a preservação dos contratos já assinados. A Lei prevê o futuro, mas também cria regras de transição. Do ponto de vista do Ministério, hoje estamos na conclusão dos estudos de expansão da malha para publicação do PMAT. Estamos fechando as informações. No primeiro trimestre de 2013 deverá ser lançado o primeiro PMAT. O ciclo do que seria o PMAT 2022 já está andando. No que diz respeito aos desafios, hoje há um mundo ávido, que aparenta se sustentar, mas a oferta parece não se concretizar a primeira vista. Há incertezas intrínsecas à própria atividade, como ,por exemplo, sobre o volume de gás natural disponível no Pré-Sal e sobre a quantidade de gás que será reinjetado para a produção de óleo. Há expectativa sobre definições e confirmação dos potenciais em bacias terrestres tais como a Bacia do São Francisco, Parnaíba e Paraná. Queremos olhar para frente e pensar em uma série de ações estruturantes, como a implementação da Lei do Gás, elaboração do PMAT, a formulação de uma política restritiva para a queima do gás – o que em grande medida está ligado à ampliação da oferta de gás - e, sobretudo, realização de estudos e iniciativas para ampliar a oferta de gás natural. Vemos o PMAT como um instrumento de planejamento, que identifica a nossa visão do futuro e os meios e mecanismos que temos para torná-lo realidade. O primeiro elemento é a formulação de uma política restritiva para queima de gás que não traga prejuízo ao produtor, não queremos fazer um cerco ao produtor, mas dar a ele condições para colocar o gás no mercado. O segundo elemento essencial é uma publicação do zoneamento nacional dos recursos de óleo e gás, um mapa sobre nossos potenciais e que deve ser publicado no início do próximo ano. Se olharmos para onde cresce a oferta e a demanda, a princípio isso está equilibrado e, a despeito de uma grande ansiedade, no curto prazo não vemos alteração significativa do preço do gás, exceto se houver forte aumento da oferta. Quero ressaltar várias vezes que é preciso haver colaboração entre os entes federativos. O MME está trabalhando em ações estruturantes que permitam a concretização do ciclo virtuoso para a indústria de gás no Brasil. 1º PAINEL – POLÍTICA DE PREÇOS DO GÁS NATURAL – PRESENTE E FUTURO EM DEBATE MEDIADOR: FLÁVIA OLIVEIRA, COLUNISTA DO JORNAL O GLOBO MARCO TAVARES, PRESIDENTE DA GAS ENERGY “O desenvolvimento do mercado de gás depende da criação de uma competição gás-gás. Não temos um mercado de gás, mas um agente dominante, com monopólio da comercialização e dos contratos de transporte” Esse tema da oferta resume tudo. O desenvolvimento do mercado de gás depende da criação de uma competição gás-gás. Não temos um mercado de gás, mas um agente dominante, com monopólio da comercialização e dos contratos de transporte. Olhando nos próximos 10 anos, podemos enxergar um volume substancial de gás. Trabalhamos para produtores e indústria, há um monte de produtores para trazer muito gás ao mercado, há um mercado ávido pela expansão do consumo, mas não há ligação entre quem quer produzir e quem quer consumir. Essa estrutura do mercado brasileiro poderia ser resolvida de duas formas. Em 2004, com crise no setor elétrico, houve mudança estrutural grande que criou comunicação entre produtores e mercado. E conseguimos construir 60 GW novos de potencial, com a criação de uma condição regulatória. O setor de gás é a mesma coisa. Há novo gás já descoberto que as empresas não têm condições de trazer a mercado, enquanto a indústria sofre com a falta de um gás competitivo. Todos os setores intensivos em gás natural hoje estão ou migrando para fora ou sofrendo forte concorrência de produtos acabados importados. Precisamos encontrar mecanismos de mercado e regulatórios que possibilite essa comunicação entre quem quer produzir e quem quer consumir. BRUNO ARMBRUST – DIRETOR DA ABEGÁS E PRESIDENTE DA CEG “Se a gente discute um plano pensando que o mercado vai se desenvolver de certa maneira e isso não ocorre, há efeitos nocivos mais a frente sobre a tarifa” Há duas ou três semanas vi um artigo na revista Exame comparando China e Brasil. O título era “A China do Futuro e o Futuro do Brasil”. Dois dos principais motivos para se equivocar é não saber exatamente o que queremos e não se planejar bem. Pesquisei qual era, em janeiro de 2010, o preço do gás na Europa, nos Estados Unidos e na Ásia e percebi que o preço hoje é inferior àquela época. E, se olharmos o Brent, estava naquela época pouco mais de US$ 80, hoje está pouco acima de US$ 100. No Brasil, onde não há um mercado líquido de gás, o preço subiu. Quer dizer, é louvável a política de descontos que a Petrobras vem praticando, mas vejo que o Brasil tem uma situação muito particular, com vários entes da federação fazendo política. Aqui no Rio a gente discute a cada cinco anos com a Secretaria o plano de investimentos. Se a gente discute um plano pensando que o mercado vai se desenvolver de certa maneira e isso não ocorre, há efeitos nocivos mais a frente sobre a tarifa. Se há dois anos um industrial estivesse procurando onde instalar uma indústria e estivesse escolhendo entre Rio, São Paulo, Nordeste ou Sul, seguramente ia optar pelo Sul ou por São Paulo porque o gás da Bolívia era 30% mais barato. Imagina se esse industrial que tivesse feito todo o seu planejamento construísse essa indústria e fosse colocar em serviço agora: o gás hoje estaria 15% mais caro nesses lugares. Isso mostra que é difícil fazer um planejamento. O Ministério das Minas e Energia está tentando fazer um trabalho excelente, mas essa visão de longo prazo num negócio regulado, que necessita de infraestruturas, é vital. E a gente vê, hoje, essas ações acontecendo mas, no passado, foram um pouco carentes. O mercado convencional está pagando uma parcela fixa que foi instruída na nova política de preços, atribuída para remunerar o investimento. Nos últimos cinco anos, o mercado convencional cresceu metade do PIB brasileiro. Se expurgarmos Minas e Espírito Santo, que tiveram novas infraestruturas e aumento da oferta, o crescimento foi de 1%. Quer dizer, o mercado convencional cresceu muito pouco nesse período e está pagando uma infraestrutura que foi construída em grande parte para atender o mercado termelétrico. Então, é preciso reorganizar esse setor com visão futura e de planejamento. Para isso, a visão compartilhada é muito importante. Acho que há um trabalho muito bem feito para o futuro, mas preciso olhar para os erros do passado para que tenhamos um futuro mais promissor. PAULO PEDROSA – PRESIDENTE DA ABRACE “O novo momento da economia brasileira tem que estar refletido nas bases regulatórias do setor. Não podemos ter regras que cristalizem situações que não refletem mais as condições do Brasil” Represento hoje um grande projeto chamado Mais Gás Brasil (www.maisgasbrasil.com.br) , para discutir questões de energia incluindo também o consumidor. O que queremos dizer em nome da indústria é que não dá para esperar cinco, 10 anos. A indústria precisa ampliar a produção, ter gás competitivo, inovar, trazer novas tecnologias, ganhar escala para poder competir no futuro. Gás barato e abundante no futuro pode encontrar a economia brasileira desestruturada e, portanto, sem espaço para o consumo. O modelo de gás do Brasil foi consolidado em um cenário do passado, no qual o País era importador de gás e havia uma enorme escassez de capitais. Nós migramos agora para um cenário em que vai haver oferta de gás e as previsões da ANP inclusive são mais otimistas do que as nossas da Abrace, o que muito nos anima, mas para que esse gás possa fluir na economia ele precisa encontrar um patamar de preços que equilibre demanda e oferta e permita que o mercado se desenvolva. Quer dizer, o novo momento da economia brasileira tem que estar refletido nas bases regulatórias do setor. Não podemos ter regras que cristalizem situações que não refletem mais as condições do Brasil. Todo esse processo precisa ser empreendido sobre uma base técnica. Não há uma solução única para o gás, daí o desafio de juntar forças. Temos que trabalhar o desenvolvimento de novas reservas, o gás não convencional, o transporte, a comercialização eficiente, todas essas frentes. Precisamos ter a convicção de que o gás é um elemento de desenvolvimento para o País. A questão do royalty é muito importante, mas se a população do Rio tivesse clareza do efeito do desenvolvimento do gás barato, lutaria por ele. O gás barato e competitivo de forma sustentável é muito mais importante para o desenvolvimento do Estado do Rio. FÁTIMA GIOVANA FERREIRA – DIRETORA DA ABIQUIM “Não podemos ficar reféns de produtos químicos importados, é preciso uma política para que a indústria química volte a operar no Brasil de forma competitiva e aproveite as oportunidades geradas pelo crescimento do País.” Está ocorrendo um boom de investimentos na petroquímica nos Estados Unidos. Eu até compararia o Brasil de hoje com os Estados Unidos de 10 anos atrás, quando a indústria química vinha em trajetória descendente, com inúmeras fábricas fechando por falta de competitividade. Hoje no Brasil há ociosidade elevada, fábricas paralisando produção, algumas desativando unidades, enquanto as importações não param de crescer. O déficit da indústria química no ano passado foi de quase US$ 26 bilhões. Este ano teremos um recorde de importação de produtos que o Brasil poderia facilmente produzir. Num passado recente, quando o Brasil era importador de matérias-primas, a indústria química se desenvolveu porque tinha mercado. E tem mercado, que é a nossa maior riqueza. Não podemos ficar reféns de produtos químicos importados, é preciso uma política para que a indústria química volte a operar no Brasil de forma competitiva e aproveite as oportunidades geradas pelo crescimento do País. Sou otimista de que o Brasil pode mudar as regras e se tornar um player importante. Mas a indústria química é intensiva em capital e leva de três a quatro anos para maturar investimentos, que precisam ser decididos hoje. E, hoje, a situação não é de atração de investimentos. Precisamos voltar a operar as unidades em um nível seguro e atrair novos investimentos para agregar valor, gerar empregos e impostos. Não há país desenvolvido no mundo sem uma indústria química forte. CARLOS AUGUSTO ARENTZ - GERENTE GERAL DE MARKETING DE GAS E ENERGIA DA PETROBRAS “O gás natural no Brasil não é caro. É um energético combustível que tem competitividade garantida em relação ao substituto energético dele, particularmente para a indústria” Se é pra começar a polêmica e eu já sei que vão bater em mim mesmo, então vou iniciar dizendo para vocês que o gás natural no Brasil não é caro. É um energético combustível que tem competitividade garantida em relação ao substituto energético dele, particularmente para a indústria. Esse é um dos motivos da aplicação do desconto. O secretário me perdoe, também vou recusar a pecha de agente monopolista, senão eu estaria cobrando GNL de todo mundo, porque é a última molécula que estou trazendo. Quando a gente vendeu o gás para as distribuidoras, depois da mudança da lei, o contrato foi negociado com eles, a forma do contrato foi estabelecida com eles. É bom esclarecer também que a parcela fixa não é infraestrutura, foi negociada com distribuidores. A infraestrutura está sendo contemplada sim, no conjunto da obra. O gás no Brasil não é caro porque 75% do gás nacional vem offshore. Independente da questão do Milton Nascimento, que eu acho que ele até tem alguma razão, da maioria das plataformas da Petrobras a gente não vê o litoral. Isso significa que esse gás está vindo a 40 km de distância para mais. Sem mencionar 2.000 metros para baixo, que é um pequeno detalhe. Acho que estamos fazendo um excelente trabalho, estamos trazendo 52 milhões de metros cúbicos de gás do exterior. Não está faltando energia elétrica. Há um custo embutido nisso, mas isso está no risco dos negócios que nós assumimos. Hoje 57% do suprimento de gás no Brasil, nesse segundo semestre, é gás importado. A competição gás-gás só ocorre em dois lugares do mundo, nos Estados Unidos e na Inglaterra. Na Europa e na Ásia, por exemplo, o preço é indexado ao óleo combustível ou petróleo. Temos uma lógica formada de acordo com o substituto do nosso principal consumidor, que é a indústria, que usa como substituto energético o óleo combustível. Temos procurado incluir o consumidor no debate. Compreendemos que é como Papai Noel, você pode pedir a ele qualquer coisa, se ele vai te dar é que são elas, como dizia o meu pai. Agora, no momento em que há preocupação com os preços dos derivados, com a rentabilidade de energia elétrica, há que se preocupar com a rentabilidade e atração econômica da indústria de gás. Consideramos difícil a competição gás-gás hoje no Brasil, e também no médio prazo. Gostaríamos sim, e aí não estou falando como Petrobras, mas como brasileiro, que outros agentes viessem, mas os que encontrarem qualquer outra fonte de gás terão que investir na infraestrutura. FLÁVIA OLIVEIRA: - o principal fornecedor diz que o preço não está alto, mas o consumidor diz que sim e isso está tirando competitividade das indústrias. Vou deixar o Paulo fazer as suas considerações e depois quero introduzir uma pitada de macroeconomia, pois acho que essa questão tem a ver com decisões de governo, em relação, por exemplo, à inflação e afins. Paulo, está caro ou barato? PAULO PEDROSA - Está caro. Não falei em falta de diálogo pontual com a Petrobras sobre detalhes de um processo, mas em um grande diálogo nacional, do qual a empresa é uma parte e no qual o consumidor deve estar presente de forma qualificada. Em relação ao preço, eu queria pontuar que para nós está caro, e a referência do óleo, essa verdade de que o óleo também é o grande competidor, não é bem assim. Temos indústrias consumindo energia de biomassa em substituição ao óleo e ao gás. Ou seja, a própria biomassa vem se colocando como referência , então temos que fazer uma comparação considerando uma amplitude maior. Até por questões ambientais, o óleo não é sempre uma opção. Não há donos da verdade nesse momento, seria uma posição arrogante, mas queremos pautar a discussão dizendo que o óleo combustível não é referência única. BRUNO ARMBRUST - Eu só gostaria de me estender um pouco na questão do custo do transporte. Antes da nova política de preços, existia claramente o custo do transporte e o custo do gás, definidos nos contratos. Para que esse mercado seja competitivo mais a frente, haja concorrência, esses dois elos da cadeia – transporte e distribuição – devem ter tarifas muito bem definidas e critérios de acesso. Deveriam ficar claros o custo do transporte e as regras de acesso. Como o cliente final se beneficia dessa concorrência se esses dois elos não são claros? Aqui no Rio qualquer cliente, concordando ou não, sabe qual é a sua tarifa de distribuição e, a cada cinco anos, participa de audiências públicas. FÁTIMA GIOAVANA FERREIRA - Eu acho o gás caro no Brasil. Para a indústria química que opera gás como matéria-prima é impraticável. Se for olhar no curto prazo o preço começa a fazer algum sentido, mas não é possível rodar uma fábrica de produtos químicos com o gás comprado no curto prazo de leilão. A gente precisa de uma política que dê aquele horizonte de longo prazo para a indústria. Vale lembrar que o gás em alguns casos entra no custo com peso de 70%. A Abiquim vem lutando, trabalhando ativamente junto ao governo federal para que se cumpra o que está na Lei do Gás, que prevê competitividade para a indústria química instalada no Brasil. E hoje, para dar competitividade, é preciso olhar o mercado americano. Eu sei que não dá para aplicar aqui no Brasil o preço americano, mas esse preço, com algum fator de ajuste às condições brasileiras, tem que ser avaliado. E se essa opção não é possível, por alguma razão, então vamos olhar de onde o Brasil está trazendo produtos derivados do gás. Quem são os nossos concorrentes, com quem vamos competir? Com que países competimos na indústria química? Se tivermos que adotar uma cesta de gases, que seja uma cesta de países com os quais a gente compete na química. Hoje o Brasil está disputando projetos de empresas brasileiras que estão preferindo levar investimentos para o mercado americano. Há “n” casos dentro da Abiquim, sem contar os megaplayers da química que estão retornando ao mercado americano. Esse é um risco que vemos para o curtíssimo prazo e precisamos fazer alguma coisa mas, mais uma vez, a Abiquim não espera que a Petrobras faça política, a entidade está muito consciente de que quem deve fazer política é o governo, o CNPE. MARCO TAVARES - Eu queria pontuar algumas coisas que considero importantes. É normal que o produtor que tem a comercialização ache que o seu gás está com preço adequado. Assim como também é normal que os consumidores não concordem com isso porque as fábricas estão parando, as distribuidoras estão perdendo mercado. Nos últimos meses vários projetos trocaram gás por biomassa, teve fábrica química que parou aqui no Rio de Janeiro. Há coisas com as quais nos acostumamos com o tempo e sobre as quais não pensamos, como, por exemplo, a questão da discussão de preço entre a distribuidora e o produtor. Na verdade isso no mundo todo é feito por tomada de preços, aqui não existe uma negociação direta . Temos que acreditar que, no futuro, podemos mudar essa situação. Se continuarmos importando gás a esse preço a nossa indústria vai fechar, não temos valor agregado, ainda, para competir com o Japão. Temos que pensar que se daqui a 10 anos vamos ter 25% da oferta nas mãos de outros produtores, como faremos para essa oferta chegar ao mercado? Se não houver essa resposta, a tendência é entregar para a Petrobras, a única que tem a infraestrutura e o mercado. Será que isso pode ser acelerado? Nós achamos que sim, que além desses 25%, poderemos chegar ao dobro disso, porque temos outras descobertas que serão feitas. Há muitas outras possibilidades para desenvolvermos um modelo virtuoso para frente, é preciso uma política de País. FLAVIA OLIVEIRA - É exatamente nesse ponto que eu queria tocar. Pelo discurso de vocês, parece que falta realmente uma política de preços. Há muitas interrogações do lado da oferta e, de acordo com a colocação de vocês, nenhuma política de preços. Talvez o governo tenha aberto mão dessa prerrogativa de pactuar uma política levando em conta oferta e demanda em benefício da grande produtora, da única ofertante (Petrobras). O mercado não está concentrado demais nas mãos de um único ofertante e deixando a demanda de lado? CARLOS ARENTZ - De novo, a gente não determinou regras, a gente discutiu, até porque o contrato boliviano é de repasse da molécula. O mercado está aberto no momento em que outros agentes venham ao mercado produzir. No momento em que produzam, eles podem ofertar. Agora, vários deles consideraram fazer investimentos em infraestrutura e não fizeram por causa da pouca atratividade. Ou seja, eles estão dizendo que o preço, que a gente pratica negociado, não está remunerando os investimentos. Não considero o preço do gás caro, mas não o considero adequado – se fosse eu mesmo estaria ofertando mais gás e outros também. Eu concordo que quem compra acha que está caro e quem vende não. Mas se estivesse adequado, não haveria boa parte dessa discussão que estamos tendo. O gás não convencional é uma excelente oportunidade para o País, mas também vai exigir investimentos em infraestrutura, que tem que ser remunerados, senão não ocorrem. FLÁVIA OLIVEIRA - Então, qual é o nó, por que o mercado de gás brasileiro não remunera o investidor adequadamente para que a oferta seja suficiente? CARLOS ARENTZ - Como disse a Simone, somos uma indústria infante. De 2007 para cá a Petrobras implantou mais quase 4.000 quilômetros de tubulação e isso ainda está sendo amortizado. O nosso marco regulatório pode não ser o ideal, mas é o melhor que pudemos fazer e partir dele vamos crescer, aprender. Enquanto todos os agentes – do produtor ao distribuidor – não começarem a entender o seu papel, o mercado não se estabelece. Eu ser acusado de ser o principal agente do mercado dá até orgulho, porque temos sustentado esse mercado. FLAVIA OLIVEIRA - Paulo, foi um erro estimular talvez excessivamente a demanda no Brasil, como se houvesse uma oferta infinita, que aparentemente não se confirmou? O que aconteceu, o Brasil estimulou cedo demais a demanda por uma indústria que é infante? PAULO PEDROSA - Seria como perguntar se foi um erro estimular o desenvolvimento do País e a pergunta cabe bem nesse momento em que nós estamos vendo resultados de PIB como os atuais. Se há uma coisa certa é estimular o desenvolvimento da indústria nesse momento, porque ele gera emprego, desenvolvimento, divisas. O Brasil hoje importa duas vezes a quantidade de gás que importa na forma de moléculas nos produtos e serviços que consome do exterior. É isso que nós precisamos reverter para que o gás seja produzido no Brasil, ampliar a produção nacional e trazer o desenvolvimento. Portanto, a resposta está no estímulo à indústria do gás. Há um espaço em que certamente vamos encontrar um ponto de equilíbrio que seja sustentável e positivo para todos. FLAVIA OLIVEIRA - Marcos, como faz para trazer investimentos? MARCO TAVARES - Eu discordo totalmente do Carlos de que os outros produtores não trazem mais gás ao mercado porque não é rentável com os preços atuais. Isso é uma afirmação que não tem lógica, não tem sentido, hoje trabalhamos para todos os produtores novos que descobriram gás e é evidente que existe possibilidade de monetizar gás de forma muito rentável como mostraram os produtores que entraram recentemente, como a própria MPX. Os produtores não chegam porque não há estrutura de mercado para chegar. A estrutura de mercado, as barreiras explícitas e não explícitas no mercado fazem com que os produtores não consigam ofertar esse gás. E, do outro lado, o consumidor também quer comprar mais gás e não consegue. Os incentivos no passado ocorreram porque houve um programa prioritário de termoeletricidade que não saiu, ficamos com excesso de gás sobrando e tivemos que ofertar ao mercado, por indução do próprio o Ministério das Minas e Energia, naquele momento sob o comando da então ministra Dilma Rousseff. Depois, descobriu-se em 2007 que o gás era essencial para as térmicas e sem ela iríamos para outro racionamento. Então, viemos de erros e erros sem planejamento, o que é normal para uma indústria infante, em desenvolvimento. Temos claramente aqui um problema de oferta. Temos que dar um choque na oferta e fazer competição. Não acredito que devemos desconsiderar que os Estados Unidos e a Inglaterra, que é a porta da Europa, têm um mercado de gás competitivo. Há uma série de outros mercados que têm a competição gás-gás instalada. Nós, por sorte, temos potencial de ter mais oferta de gás. Não é verdade que todo o gás do Pré-Sal estará voltado para o petróleo, isso não seria tecnicamente viável, será necessário trazer esse gás para a costa. É preciso que sejamos inteligentes para criar esse choque de oferta, não com política de preços, mas uma política para a indústria de gás natural, que é muito mais ampla. Vamos regular um pouco esse período transitório. No meu entender uma política de preços tende a dar errado, é preciso criar um modelo para daqui a seis anos, com período de disposições transitórias, porque a indústria está quebrando, alguma coisa está errada. FLÁVIA OLIVEIRA - Em defesa da Symone, ela não falou que todo o gás do Pré-Sal seria reinjetado, mas que não há certeza sobre quanto vai a mercado. Fátima, fale dessa tentativa de diálogo com o governo. FÁTIMA FERREIRA - Na verdade concordo com o Marco, o Brasil precisa de um choque de oferta que no futuro acaba implicando em preços, não pode ser o contrário. Mas no caso da química, a gente precisa ter uma política para dar condições que a indústria volte a operar com competitividade. É isso que a Lei do Gás prevê, ela não fala em preço, mas em política de competitividade. Mas a competitividade hoje passa por um preço justo. Estamos lutando para que sejam dadas condições para que as empresas instaladas hoje possam produzir e, para isso, precisamos de preços competitivos. E, no futuro, para atrair projetos estruturantes, será preciso um choque de oferta, leilões de gás para a indústria se programar. FLAVIA OLIVEIRA - É viável, Carlos? CARLOS ARENTZ - Vamos falar de coerência, já que eu fui citado. Vocês estão falando em choque de oferta e da grande oferta hoje nos Estados Unidos onde, citando a Fátima, há 10 anos a indústria química estava fechando as portas. Se há necessidade de preço, eu falo também como produtor: se o preço não for atraente, não haverá produtor para investir em qualquer forma de gás. Mas se o preço for atraente para o produtor, não será para o consumidor. Há necessidade de política? Para ser menos polêmico, vou concordar. Mas ao falar em política de preços, vamos olhar para a Argentina. Sou só um agentezinho de mercado e hoje nem coloco no Brasil todo o gás que o País consome. A Petrobras está assumindo riscos comerciais que ninguém quis assumir e ninguém está querendo assumir ainda. Já propusemos a agentes que usem a nossa malha. Mas isso tem um custo – fazer de graça é fácil. Estou cansado de apanhar. Não fazem gasoduto porque não há atratividade na venda final com os preços de hoje. Não precisa acreditar em mim, por favor pergunte ao Google. BRUNO ARMBRUST - Acho que é preciso buscar exemplos positivos em outros países. Em muitas reuniões que temos com a Symone cito um exemplo muito interessante que acontecia em alguns países nos quais os reguladores, ou os ministérios, anualmente fazem um livro, uma publicação falando sobre o que as medidas tomadas no passado geraram em termos de aumento da oferta e de competitividade e, a partir daí, são discutidos os aperfeiçoamentos necessários. Quer dizer, a Lei do Gás foi um marco importante, antes dela era difícil se falar em futuro desse setor. Acho que é importante essa reavaliação do que funcionou ou não e discutir isso nos distintos âmbitos, federal, estadual, regulador. No negócio regulado os investimentos, para serem eficientes, dependem de uma visão de longo prazo, não adianta fazer gasoduto com risco de ficar ocioso. É preciso que o mercado e a oferta estejam casados, senão os gasodutos vão ficar ociosos e isso terá um efeito nocivo no mercado. Passado um tempo da vigência da Lei do Gás, vale a pena discutir o que funcionou ou não, o que pode melhorar. Dentro da associação existe um debate grande sobre a questão da simetria regulatória entre os Estados, são coisas que temos que discutir com os Estados, eles tem que estar no debate. Cada elo da cadeia deve fazer um esforço. FLAVIA OLIVEIRA - O que é que deu certo? MARCO TAVARES - Conseguimos atender um crescimento da demanda, mas na verdade a participação do setor na matriz energética está estabilizada e alguns setores como o industrial estão com perda de mercado. Há gás a diferentes níveis de preços em diferentes regiões do País. Deixa eu fazer uma brincadeira aqui. Nós, no passado, numa das discussões com a então ministra Dilma, questionamos sobre por que não se criava uma Gasbras, separando gás do petróleo. Temos que pensar um pouco como podemos ajudar e facilitar esse choque de oferta. Um dos mecanismos que estamos discutindo com vários agentes são os leilões de gás, criar um mecanismo de projetos estruturantes que possam fazer a infraestrutura dos novos produtores na costa ou na Bacia de São Francisco. Essa é uma proposta que pode criar uma aceleração nessa nova oferta. Isso funcionou no setor elétrico e no setor de gás em outros países. Podemos criar uma sistemática de leilão que possa dar um planejamento de cinco anos para que os produtores possam atuar no sentido de trazer maior oferta e os consumidores possam fazer seus investimentos com segurança de ter um contrato de longo prazo. A gente não sabe se isso vai funcionar, mas seria bom testar, deixar o mercado responder. Outra brincadeira que posso fazer aqui é que nesse momento em que a Petrobras está em desinvestimento, talvez as redes de gasoduto, já que é um mercado tão ruim, possam ser uma oportunidade de desinvestimento da empresa em prol do mercado, que compraria essa capacidade. Isso ocorreu na Espanha, que fez uma redistribuição da capacidade de transporte e dos ativos para todos os agentes. CARLOS ARENTZ - Olha só, talvez eu até queira vender os gasodutos mas, como ele citou que ocorreu na Espanha, depois que estiverem depreciados. Eu tenho outro exemplo de um país que fez isso, a Argentina . O mercado que compra isso tem que pagar a depreciação e fazer o investimento de recompor. Então tudo bem, assim que tiver a minha depreciação feita e o meu dinheiro retornado – afinal, os meus acionistas, que são vocês, têm direito a ter o seu dinheiro de volta -, isso pode ser feito. O desinvestimento até na distribuição é uma possibilidade sim, mas respeitando todos os agentes da cadeia, inclusive os acionistas da empresa. Mas pergunto, se esse desinvestimento for feito, quem vai vir comprar? Porque há houve vários desinvestimentos na distribuição no País de vários agentes que nem todo mundo veio comprar. Nós consideramos sim isso no conjunto, até porque nessa posição a gente voltaria a se colocar não como um agente dominante na cadeia, mas como um ofertador. Nada me impede de fazer isso. Mas nessa hora, eu também vou querer desinvestir nas termelétricas, possivelmente. Há toda uma dinâmica a ser considerada. PAULO PEDROSA - A diversidade é que vai produzir a mudança do setor. É essa inteligência que vai produzir as mudanças. É preciso jogar a discussão para a sociedade brasileira, em múltiplos polos. BRUNO ARMBRUST - Há muito poucos domicílios com gás canalizado no Brasil, 3% do total, muito pouco no comparativo ao resto do mundo, na Europa chega a 80%, como na Argentina. O nosso grupo tem interesse em concessões, dependendo das condições e do preço. Seria muito importante para a eficiência que as distribuidoras pudessem ter concessões de empresas com know how. Nós temos interesse e acho que outros grupos também tem. MARCO TAVARES - Se houver oportunidade de investimento, haverá interesse. FLAVIA OLIVEIRA - Eu não queria deixar de tocar na questão da diferença tarifária por setores. É natural essa segmentação de preços? FATIMA FERREIRA - Hoje falei aqui do gás como matéria-prima na indústria química. O gás tradicionalmente tem dois usos: o energético, que é o que a gente mais discute e como matéria-prima, através do qual o gás fica no processo, agrega valor e depois vira bem de consumo final – fertilizantes, combustíveis, resinas, móveis. . E é para esse uso do gás que a Abiquim está apoiada na Lei do Gás, para definir uma política como matéria-prima. Quando estamos falando na política para o gás como matéria-prima, estamos falando do metano contido no gás e não nos outros líquidos que o gás também tem, como etano, propano, butano, que também são usados na petroquímica, mas tem referência internacional, uma política diferenciada de compra. Hoje estamos falando de um consumo de metano no Brasil da ordem de 2 milhões de metros cúbicos/dia,o que é relativamente baixo em relação ao potencial. E vale lembrar que a grande usuária de gás como matéria-prima no Brasil é a Petrobras, nas unidades de fertilizantes, mas aí é outra condição, não passa por distribuidor. CARLOS ARENTZ - A Petrobras não diferencia consumidor. O que está se falando das termelétricas é que existia um programa específico, com preço estabelecido. Com relação aos segmentos, a margem tem que ser diferenciada. O domicílio é prioritário e é o que não tem opção, a indústria é um indutor da economia, então é justo que receba uma margem menor. Eu, Petrobras, entrego para a distribuidora o preço independente do consumidor. A potencial diferenciação ocorre quando houver o consumidor livre e ele vier a comprar de um outro produtor. BRUNO ARMBRUST - Apesar de todo o debate, temos que reconhecer que, como frutos de decisões do passado, esse mercado de gás, que tinha peso de menos de 3% na matriz energética, hoje tem 10%. A questão é que nos últimos cinco anos foi dada uma atenção muito grande para o mercado de geração e se esqueceu um pouco o mercado convencional. O consumo de gás em São Paulo e no Rio caiu nos últimos cinco anos, cometemos alguns erros nesse período. Ficamos satisfeitos com os descontos que a Petrobras está dando. Os leilões tiveram seu benefício pós-crise, mas hoje têm um impacto muito marginal. A gente tem pendente a regulamentação do papel do comercializador. Houve avanços nesses últimos anos, ninguém duvida do papel importante da Petrobras em toda essa história do crescimento do gás, mas temos que olhar para frente. Há muito que fazer e todos os agentes devem discutir como construir o futuro. PAULO PEDROSA - Hoje houve uma quase convergência em muitos pontos, sendo que a principal delas é que tudo parte de uma política de gás para o País, que pode incluir uma política industrial, de uma forma transparente e explicitando para a sociedade os custos e benefícios. Essa política, para ser efetiva, deve ser bastante abrangente e incluir a oferta de gás, a retomada dos leilões, a viabilização das áreas já concedidas de gás não associado. Tem que partir para alternativas críveis para expansão da oferta e demanda. Há espaço de sinergia e diálogo entre o setor elétrico e o de gás. A decisão deve ser pautada pelo ângulo do desenvolvimento. Se outros países avançam no gás e nós não, estamos em queda livre para a indústria nacional. O gás é o combustível do desenvolvimento. MARCO TAVARES - O mercado de gás é amplo, o Brasil tem participação do gás na matriz muito inferior do que poderia ter. É preciso ter uma visão de futuro, de matriz energética, é importante como o MME está se capacitando, debatendo muito com todos os agentes, para criar uma pauta para os próximos 10 anos. Precisamos ter uma meta. No setor de óleo e gás o óleo está bem representado e o gás está precisando dessa visão. CARLOS ARENTZ- A Petrobras tem se colocado como empresa de energia, esse é um desafio muito grande e temos muita consciência do nosso papel como País e sociedade. FLAVIA OLIVEIRA - O gás precisa de “gás”, o resumo da ópera é esse. Não há saída fácil. Todo mundo aqui quer a mesma coisa: produzir mais gás, contribuir para o desenvolvimento brasileiro, produzir mais e melhor para um preço competitivo, é uma mensagem positiva, isso não é pouco, não é trivial. 2º PAINEL – MERCADO SECUNDÁRIO SOB AS ÓTICAS DO PRODUTOR E DA INDÚSTRIA Mediação: Maria Paula Martins – coordenadora do Programa Rio Capital da Energia CYNTHIA SILVEIRA – DIRETORA DO IBP “A oferta é fundamental para o desenvolvimento do mercado. Há grandes perspectivas com o Pré-Sal, mas também grandes incertezas sobre a quantidade que será reinjetada, o conteúdo de CO2 que existe nas reservas, como se dará o escoamento do gás” O IBP reúne toda a cadeia de gás, exceto os distribuidores, representados pela Abegás. Queria ressaltar a importância do mercado primário de gás, que é muito importante para desenvolver o mercado secundário. Afinal, toda a cadeia produtiva tem que ser remunerada e sustentada pelo mercado primário. Quero também sublinhar a importância do Rio de Janeiro, que é pioneiro no uso do gás natural desde 1954, com iluminação pelo gás natural. A oferta é fundamental para o desenvolvimento do mercado. Há grandes perspectivas com o Pré-Sal, mas também grandes incertezas sobre a quantidade que será reinjetada, o conteúdo de CO2 que existe nas reservas, como se dará o escoamento do gás. E em relação à demanda, o gás do Pré-Sal é gás associado, que precisa de demanda firme, que possa viabilizar a produção de petróleo. As termelétricas não viabilizariam isso, então precisamos ampliar o mercado primário de gás. O preço baixo praticado pelo segmento termelétrico e a incerteza do consumo acabam desestimulando projetos para gás associado. O IBP prepara, anualmente, um balanço da oferta e demanda de gás, construído a partir de dados da Petrobras e outros produtores. Olhando para o Estado do Rio, observamos que, de 1999 a 2012, houve o termo de compromisso assinado pela Petrobras para as suas térmicas e o despacho diário das térmicas, onde se observa que o mercado secundário do Rio de Janeiro poderia ser em torno de 17 milhões de metros cúbicos por dia. A Petrobras conseguiu instalar um terminal de regaseificação com 14 milhões de metros cúbicos/dia para importação de GNL, o que acaba minimizando esse espaço de mercado secundário, que no Estado está em torno de 3 milhões de metros cúbicos/dia. Quais as características necessárias para desenvolver o mercado secundário? Via segmentos de consumo com backup de energia , como GNV e outras indústrias como cerâmica vermelha, siderúrgica, cimenteira. Mas será necessário um preço competitivo. Antes temos que ampliar o mercado primário. O gás natural não tem mais como tomar espaço do óleo combustível, mas sim do carvão, coque de petróleo, se nosso objetivo é uma matriz energética mais limpa. No Rio de Janeiro, a cerâmica e o ferro gusa ainda têm alto consumo de lenha e há espaço, nesses segmentos, para fazer um esforço e verificar como seria competitivo o uso do gás natural nesses segmentos. Sobre o potencial do mercado de GNV no Rio, hoje é de 3 milhões de metros cúbicos/dia, sendo que, no cenário do IBP, até 2005 pode chegar a 5 milhões de metros cúbicos diários. Uma sugestão criativa para o governo do Estado seria desenvolver outras maneiras de otimizar a rede de distribuição de gás. A sugestão do IBP para o governo do Rio de Janeiro é avaliar o potencial do GNV como mercado secundário, avaliar mecanismos de incentivo para a conversão de gás em outros segmentos industriais que utilizam ainda lenha e carvão e explorar a variação do fluxo diário para consumos específicos, como ônibus. MARIA PAULA MARTINS - O GNV já vem cumprindo um grande papel no Estado e existe um projeto do governo estadual de ônibus diesel-gás. A CEG se propõe a instalar terminais de abastecimento nas garagens. O objetivo é que, em 2015, esses ônibus representem 60% da frota dos intermunicipais, sobre os quais o Estado atua. Em 2020, pode chegar a 80%. Mas o GNV não é muito bem visto pelo governo federal, em muitos momentos houve desestímulo à frota. O Rio de Janeiro é o Estado com maior número de veículos com gás natural da América do Sul. Isso foi mantido na contramão da orientação do Ministério das Minas e Energia, que necessitava de gás para as termelétricas. Existem dois mercados secundários nos quais a Petrobras tem atuado, a empresa pode fazer essa diferenciação. Carlos Augusto, fale sobre o mercado secundário em curto e médio prazo. CARLOS AUGUSTO ARENTZ - GERENTE GERAL DE MARKETING DE GAS E ENERGIA DA PETROBRAS “A gente sabe o que vai acontecer com o gás firme, para as distribuidoras, mas com a termelétrica isso muda toda semana” O que é mercado secundário de gás no exterior? Eu sou um agente, normalmente consumidor, e tenho a previsão. Compro o contrato por um período e, desse modo, eu comprei o gás. Na Europa, a cada cinco agentes que compram e vendem gás, só dois usam o gás, os demais só revendem papel. Nos Estados Unidos, por exemplo, o mercado secundário é um grande mercado financeiro. O mercado secundário lá fora é o de revenda de compromissos contratuais. Aqui isso ainda não existe. A Petrobras tem compromissos firmes com distribuidoras e termelétricas e uma demanda determinada, toda semana, pelo ONS. A demanda vai de 4 milhões de metros cúbicos a 32 milhões de metros cúbicos/dia. A gente sabe o que vai acontecer com o gás firme, para as distribuidoras, mas com a termelétrica isso muda toda semana. Tenho duas flexibilidades na compra: uma parte do contrato boliviano, que posso deixar de comprar, e o GNL, sendo que nesse caso muitas vezes eu compro hoje para receber em 30, 60 dias. O mercado secundário para nós surgiu nesse cenário, com determinada freqüência do sistema termelétrico, que está muito elevado. Nossa versão do mercado secundário é nossa forma de nos ajudar a gerenciar o balanço na falta de estoque. MARIA PAULA MARTINS- Pergunto ao dr. Armando, na visão da indústria esse gás que entrou a partir de 2009, no auge da crise, surtiu efeito bom para a indústria que se mantém, os leilões de curto prazo contribuem? ARMANDO GUEDES COELHO – PRESIDENTE DO CONSELHO DE ENERGIA DA FIRJAN “Na minha leitura, falta ao governo uma política estratégica, de longo prazo, para elevar a participação do gás na matriz energética. No mundo, a tendência é que o gás venha a ter mais participação que o petróleo, o Brasil tem que acompanhar” A Firjan tem uma posição muito clara de que devemos ter uma política nacional de gás. As soluções que têm surgido são pontuais, falta um planejamento estruturado para elevar a participação do gás na matriz mais expressiva do que hoje. Na década de 80, ninguém considerava o gás no projeto da Petrobras. Estamos precisando criar uma cultura em relação ao gás, o que em geral ocorre no mundo inteiro. No Brasil não temos um volume de gás expressivo a ponto de influir no gerenciamento. O País demorou 20 anos para criar um ativo de álcool e hoje se tornou importador. O Brasil tem hoje uma matriz energética fora de propósito em torno do diesel, são 40% de participação. Assim, é preciso investir muito em unidades complexas e caras para tentar equilibrar essa matriz e o crescimento previsto é muito grande. A dificuldade de atender esse mercado é brutal, o Brasil hoje importa 20% do diesel que consome. Então, o gás natural com certeza seria uma espetacular alternativa ao óleo diesel. Em termos ambientais, então, nem se fala. Seria bom para todos, já que existe a possibilidade de usar diesel-gás, como existe a mistura de gasolina e álcool. Se olharmos onde já existe gás – Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro – seria um tremendo passo que daríamos adiante. O gás como matéria-prima para a indústria química tem poder multiplicador de quatro a cinco vezes em relação ao preço base. No entanto, a importação da indústria química está crescendo. Hoje o Brasil importa 70% do fertilizante que consome e, por isso, há três projetos em andamento para produzir esse combustível, é uma decisão de natureza política e estratégica. Na minha leitura, falta ao governo uma política estratégica, de longo prazo, para elevar a participação do gás na matriz energética. No mundo, a tendência é que o gás venha a ter mais participação que o petróleo, o Brasil tem que acompanhar. Não acredito em mudança drástica no preço do gás no Brasil. É preciso realizar mais leilões, para ampliar o número de produtores. É preciso também buscar uma interiorização do consumo do gás no País. Insisto no gás como alternativa ao diesel. MARIA PAULA - Compartilho essa visão. Os dois setores, gás e energia elétrica, estão umbilicalmente ligados, o despacho das térmicas é definido em oito dias. A ligação entre os dois setores acaba trazendo problemas para o desenvolvimento de ambos. O mercado secundário parece não ter o espaço adequado para funcionar, exceto em função das térmicas. Queria uma opinião da Cynthia sobre como ela vê essa questão. CYNTHIA SILVEIRA - No que diz respeito à questão das térmicas, hoje a cada leilão as regras mudam, então o produtor não tem previsibilidade para definir investimentos. Para os outros produtores, que não a Petrobras, que não têm condições de suprir o sistema termelétrico, o mercado secundário não existe. Quero ressaltar o que o dr. Armando falou do uso em frotas e lembrar que o Rio sempre foi inovador em energia, sempre esteve na vanguarda do gás natural. Então incentivar e ver qual a maneira de atingir novos mercados é de fundamental importância para o setor. MARIA PAULA MARTINS- Aqui no Rio de Janeiro a frota de GNV está bem desenvolvida, mas para veículos pesados que circulam no Brasil todo teria que haver postos de GNV em todo o País. Há um conjunto de distribuidores ainda não implantados em várias capitais, que dirá nas estradas. Então teria que haver uma política de governo, federal, para isso ocorrer. CYNTHIA SILVEIRA - Mas pode haver na frota municipal, na frota intermunicipal, entre Rio e São Paulo, aqui no Sudeste seria possível desenvolver isso. Quero voltar à questão do setor elétrico, o IBP está fazendo trabalho para mostrar o que dificulta a participação de outros produtores nos leilões das termelétricas. MARIA PAULA MARTINS - Gostaria que a Petrobras fizesse comentários. Será que a empresa vê como interessante fazer parceria com outros produtores, como em terminais de importação e exportação, nos gasodutos? O acesso aos gasodutos é difícil, é complicada a quebra do monopólio de fato, e não de direito, pela própria infraestrutura. A Petrobras assumiu para si, porque tem a sobra do gás, a função de fazer um mercado secundário, que as distribuidoras não ocupam porque não têm oportunidade. CARLOS ARENTZ - Compare com uma companhia aérea. Para o avião levantar vôo, é necessário garantir um mínimo de retorno de capital para continuar provendo o serviço. Às vezes um lugar é vendido por R$ 1 porque ele já está pago. Nós valorizamos muito o nosso mercado, o consumidor final, há muita responsabilidade na garantia do atendimento. A garantia do suprimento é o mais importante que podemos oferecer e, para isso, a capacidade logística é muito importante. Você pode pedir à companhia aérea que te venda uma passagem que talvez você não use, mas aí ela vai te vender com o preço cheio. Sabemos que há razões econômicas das sobras momentâneas serem negociadas, acredito que isso vai acontecer no futuro. Temos interesse, mas precisamos garantir nossos compromissos. O PMAT pode trazer novas possibilidades de parcerias, mas há necessidade de coordenação maior. CYNTHIA SILVEIRA - Para poder dinamizar o mercado secundário, é preciso ter oferta. Por isso a bandeira do IBP é a volta de leilões exploratórios, para mais oferta de gás, novos produtores, inclusive em terra. A Total tem uma ótima parceria com a Petrobras no Bolívia-Brasil, que é o pulmão da região Sudeste. Parcerias são fundamentais e esse é um exemplo. ARMANDO GUEDES - Eu defendo o uso do GNV para os ônibus. Acho que tem uma lógica gritante nesse projeto, e vai ajudar o País, a própria Petrobras, seria um caminho extremamente interessante. 3º PAINEL – O FUTURO DO GÁS NATURAL E DO GÁS NÃO CONVENCIONAL NO BRASIL Mediação: Maria Paula Martins HELDER QUEIROZ PINTO – DIRETOR DA ANP “Estamos fazendo um esforço significativo para que as Rodadas aconteçam, um ano sem investimentos exploratórios é um ano perdido para o setor. A ANP tem o objetivo de diversificar áreas de exploração e está pronta para a realização dos leilões” De um tempo pra cá todos acabamos nos interessando mais pelo gás não convencional, no Brasil e no mundo todo. Isso é justificado pela velocidade e êxito dos resultados nos Estados Unidos. Há cinco anos os EUA estavam preocupados com a importação de GNL e agora já estão reduzindo drasticamente sua dependência e se qualificando para se tornarem exportadores, com queda do preço no mundo. A questão a se formular é: consideramos possível replicar o sucesso do modelo americano, em termos de celeridade do processo? O Brasil e o mundo inteiro estão levantando essa questão. Aqui no Brasil, várias projeções indicam oportunidades interessantes nas Bacias Paraná, São Francisco, Recôncavo e Parecis, mas não é possível transformar recursos potenciais em reservas rapidamente. A gente tem sinalização importante em Parecis. Mas falta muito para chegarmos a um conhecimento muito maior, como os americanos, do ponto de vista da geologia, das bacias sedimentares. Estamos fazendo um esforço significativo para que as Rodadas aconteçam, um ano sem investimentos exploratórios é um ano perdido para o setor. A ANP tem o objetivo de diversificar áreas de exploração e está pronta para a realização dos leilões. Temos posição firme de como o processo de retomada dos leilões sinaliza cada vez mais as oportunidades em terra. Pretendemos intensificar esses investimentos em exploração em terra, que são fundamentais. Nesse processo é fundamental ter oportunidades novas de exploração de gás e a ANP está firmemente empenhada nisso. EDMAR DE ALMEIDA – PROFESSOR DA UFRJ “Acredito que o gás possa assumir relevância muito mais importante na matriz energética, mas para isso precisamos criar não uma indústria do gás, mas um negócio do gás” Vi que o título da sessão é o futuro do gás natural e acho que não haverá futuro do gás não convencional se não houver futuro do gás natural. Avançamos enormemente nos últimos 10, 15 anos, hoje há uma indústria do gás. Acredito que o gás possa assumir relevância muito mais importante na matriz energética, mas para isso precisamos criar não uma indústria do gás, mas um negócio do gás. E para desenvolver esse negócio é necessária uma política e regulação orientadas nesse sentido. A agenda precisa viabilizar a exploração e a perspectiva do gás não convencional vai atrair muitos agentes para pesquisar em terra no Brasil. Aí é uma questão de redução de barreiras à entrada desses investidores e, para isso, é necessário muita vontade política e regulação. Não é fácil, porque para chegar aonde chegamos tivemos que dotar Petrobras de capacidade para dominar o mercado. Mas agora será preciso repensar o papel da Petrobras na indústria. É uma agenda complicada. Se o gás tiver futuro no Brasil, o gás não convencional pode ter futuro, mas não está garantido. Será necessária uma inovação de negócios, trazer o que existe nos Estados Unidos, que é onde o modelo funciona, para outro país exigirá uma dose enorme de inovação, inclusive tecnológica. O fato de ser difícil não significa que não é possível ou que vai demorar, nos EUA foi rápido. SYMONE CHRISTINE DE SANTANA ARAÚJO – DIRETORA DO DEPARTAMENTO DE GÁS NATURAL DO MME “O nosso marco regulatório como está é absolutamente compatível para a concessão de áreas não convencionais. Talvez exija algumas avaliações e revisões, em termos ambientais ou duração de períodos exploratórios” No Brasil, os estudos da ANP nas Bacias Parecis, Parnaíba e Recôncavo, mostram que há um potencial impressionante, de cerca de 200 TCF. Isso sem considerar o nosso Eldorado, que é o São Francisco, localizado no meio do Brasil. Em que pese termos poucas chances de reproduzir o modelo americano e temos motivos para não fazê-lo, a nossa própria lógica, nossa tropicalização mostra perspectivas interessantes. O gás não convencional terá desafios aqui como teve nos Estados Unidos. No Brasil há desafios importantes a vencer, no âmbito ambiental, na indústria de bens e serviços – o olhar tem que se voltar para as bacias terrestres – e, sobretudo, é preciso enxergar as coisas como elas são: o que produziu o fenômeno americano do Shale Gas? Esse valor do gás não convencional nos EUA com certeza não remunera o produtor, é menor que os custos de produção. Isso se explica que, a despeito da enorme malha de transporte, ela não liga todas as regiões produtoras às consumidoras, isso cria pressão para algumas regiões que deprimem o preço. Em grande medida, nos Estados Unidos muita gente já perfurou, fraturou, porque é uma indústria que passa e é uma concessão, um bloco que produz muito rápido. Em grande medida essas áreas já estão amortizadas e o que resta ao produtor é colocar o produto no mercado. No que diz respeito a restrição à exportação de gás, é algo que não sabemos quanto vai durar por lá, que a regulação americana não resolveu. Nos próximos cinco anos, dificilmente esse cenário americano vai mudar. A chance de reproduzirmos esse modelo dos Estados Unidos é nenhuma, temos que olhar esse mercado de gás não convencional no Brasil, o que ele vai ser, qual o seu papel, pensando nele como potencial elemento de choque de oferta. As respostas devem vir com os esforços em áreas terrestres. Nós não estamos esperando que as mudanças ocorram por si só, está havendo esforço da ANP em identificar as oportunidades. O nosso marco regulatório como está é absolutamente compatível para a concessão de áreas não convencionais. Talvez exija algumas avaliações e revisões, em termos ambientais ou duração de períodos exploratórios. De toda sorte, o desafio está lançado. WINSTON FRITSCH – PRESIDENTE DA PETRA ENERGIA “Quando olhamos para o futuro previsível, nos próximos oito anos, a forma firme de aumentar a oferta de gás no curto prazo é incentivar a exploração terrestre. Há seis anos essa afirmação seria considerada uma piada, mas hoje essa exploração em terra já é uma realidade” Se existe alguma coisa que acho que aprendemos nos painéis anteriores e que nos permite sintetizar em uma frase o problema do gás no Brasil, que é do preço alto, é que no mundo em que a Petrobras não vai ser Papai Noel, porque tem ações em bolsa, a única forma de resolver o problema é o aumento da oferta eficiente de gás. Quando olhamos para o futuro previsível, nos próximos oito anos, a forma firme de aumentar a oferta de gás no curto prazo é incentivar a exploração terrestre. Há seis anos essa afirmação seria considerada uma piada, mas hoje essa exploração em terra já é uma realidade. Não é a toa que a ANP está pensando seriamente – e isso é muito auspicioso - em acelerar os leilões terrestres, essa é a política correta do regulador. Há mais o que fazer, a regulação tem que ser acabada, mas o fundamental são as moléculas, não há mercado sem molécula. A Petra tem 70.000 km2 de área da Bacia do São Francisco, mais ou menos o tamanho da Irlanda. Isso é importante porque o gás não convencional precisa de grandes extensões. O problema de explorar aqui, antes de todos os desafios, é que quando iniciamos a exploração não havia estudos. Os Estados Unidos estudam o subsolo desde o século 19, nós há apenas quatro décadas. Tivemos que fazer um estudo de sísmica de 21.000 km. Isso é sem precedentes. A Petra investiu enormemente desde 2010, trazendo tecnologia nova em sísmica para o Brasil. Nos Estados Unidos, o problema era exclusivamente tirar o gás em subsolo já conhecido, lá o problema era apenas tirar o gás lá de baixo. O equipamento onshore no Brasil estava sucateado, há anos ninguém olhava nada onshore. O primeiro poço que perfuramos, tivemos que usar o equipamento que existia, com bombas romenas e chinesas sem sobressalente. Agora usamos sondas de última geração. Temos investido US$ 300 milhões/ano nessa área e continuaremos fazendo isso. Por causa dos investimentos em sísmica, a taxa de acerto foi muito alta. Está provada a existência de gás, o desafio agora é tirar o gás de lá, checar o volume. Vamos entrar na fase de fraturamento hidráulico, para definir os volumes. Os testes iniciais serão no primeiro semestre do ano que vem, em quatro áreas selecionadas, que serão fraturadas e estudadas e se tudo correr bem, poderemos declarar a comercialidade no final de 2014.. Até agora os resultados tem sido muito bons, embora haja muitos “se”. Pode ser que daqui venha o primeiro choque de oferta de gás no Brasil. Se der certo, será bom para todo mundo. Se houver sucesso no ano que vem, poderá ser o começo de uma possível revolução. É uma área localizada perto de grandes centros consumidores e será possível achar gás em vários lugares. É um programa exploratório de longo prazo, mas pode haver boas notícias no ano que vem. JOSÉ MAURO FERREIRA COELHO – ASSESSOR DA DIRETORIA DE ESTUDOS DE PETRÓLEO, GÁS E BIOCOMBUSTÍVEIS DA EPE “Acreditamos que o gás natural está crescendo na matriz energética brasileira e esse crescimento deve se acelerar. Vemos com bons olhos a exploração do gás não convencional no Brasil” Gostei muito da colocação do professor Edmar, de que temos que pensar no gás não convencional para o futuro, mas no convencional no curto prazo. Vou falar um pouco sobre o que a EPE projeta nos próximos 10 anos para o gás natural no Brasil, no seu PDE nacional, para o gás natural no Brasil e também sobre o que pensamos sobre o não convencional. A EPE vê no seu PDE, como fontes de oferta de gás natural, o de produção nacional, o importado através do Gasbol e o GNL que chega por terminais de regaseificação. A previsão nacional leva em conta os campos já em produção, as estimativas de produção dos recursos descobertos em fase de avaliação (contingentes) e as perspectivas de produção provenientes de recursos não descobertos. A EPE projeta no seu PDE 2021, para o ano de 2021, uma oferta de gás natural de produção nacional para a malha integrada, de 112 milhões de metros cúbicos/dia, sendo que a produção de gás associado responde por grande parte disso, ou 72%. Se analisarmos o crescimento da oferta de gás natural nesses 10 anos, A EPE prevê um aumento de 140% na oferta de gás natural de produção nacional. É importante esclarecer que já iniciamos os estudos para o novo ciclo do PDE 2022 e até agora os estudos nos mostram que, para esse novo ciclo do PDE, a oferta possivelmente deverá ser menor. Quando estávamos no PDE 2021 trabalhamos sobre uma base de dados de 2010, início de 2011. Com a nova base de dados que temos obviamente temos condição de fazer um novo estudo da oferta, e o que estou dizendo é que, na verdade, essa oferta será provavelmente menor do que no PDE 2021. Além do gás natural de produção nacional, contamos também, até 2021, com a importação de 30 milhões de metros cúbicos de gás/dia da Bolívia no Gasbol. Além do gás boliviano, prevemos também, para 2021, a importação de 41 milhões de metros cúbicos/dia de GNL. Dessa forma, se analisarmos a oferta nacional mais importações, teríamos uma oferta de gás, em 2021, de cerca de 183 milhões de metros cúbicos/dia. Em relação ao gás não convencional, os estudos da EPE estão se iniciando. Vemos perspectivas importantes nas Bacias do Paraná, Parecis, São Francisco, Recôncavo e Parnaíba, que já têm potencial reconhecido. É importante salientar que a produção de Shale Gas ainda depende de regulamentação específica, sobretudo em relação ao meio ambiente. Acreditamos que o gás não convencional será importante para a expansão de pontos de oferta de gás, ampliando a malha e a infraestrutura de transporte de gás no país. Em relação à demanda, há destaque para regiões Sudeste e Sul, com consumo das termelétricas e refinarias. E, para finalizar, quero dizer que acreditamos que o gás natural está crescendo na matriz energética brasileira e esse crescimento deve se acelerar. Vemos com bons olhos a exploração do gás não convencional no Brasil. MARIA PAULA MARTINS - Helder, gostaria de saber se serão necessárias adaptações no programa mínimo exploratório para o gás não convencional, se exige uma outra modalidade de concessão, se a ANP pensa em fazer leilões específicos, distintos para áreas de não convencional. HELDER QUEIROZ JUNIR - Fico até assustado quando se fala em mudança de modelo, por causa da nossa experiência recente. Se alguém soubesse que ficaríamos quatro anos sem leilões talvez as coisas fossem ponderadas de outra forma, já que qualquer ano perdido é realmente jogado fora. Não se trata de forma alguma de ter novo regime para o gás não convencional. É claro que quando uma empresa tem um bloco exploratório, pode se deparar com gás convencional ou não convencional. O que talvez seja necessário é refletir sobre algumas das condições que permitam adequar o perfil da atividade do gás não convencional – já que de fato ocorre um encurtamento das fases de exploração, perfuração e produção em relação aos hidrocarbonetos convencionais -, então alguns dispositivos podem ser adequados. Já começamos a estudar isso na Agência, mas hoje não vejo alteração de forma nenhuma no modelo. Vamos precisar é de ter, num horizonte mais longo, uma quantidade de áreas de exploração e produção de gás maior e a ANP está pronta para fazer esse papel. Veio para ficar o processo de diversificação das áreas e estímulos a investimentos em terra. Nosso objetivo é ampliar a oferta de gás, seja convencional ou não. MARIA PAULA MARTINS - Edmar, gostaria de aproveitar a sua experiência de realizar vários estudos, como economista, e saber como você está vendo essa questão da oferta e demanda, porque temos demanda reprimida com oferta oscilando entre disponível e restritiva. EDMAR DE ALMEIDA - Há algum tempo o mercado brasileiro não é vendedor. Quando a Petrobras encheu o gasoduto, ela retorna a uma lógica de negócio na qual o negócio do gás tem muito pouca autonomia, inclusive financeira. Não imagino como a Petrobras avalia os seus projetos de gás, mas em situação normal eles não seriam os primeiros da fila. Então, a partir do momento que enchemos o gasoduto, a lógica do negócio deixou de vendedora. Daí pode passar por essa situação de elevação do preço do gás. Na verdade falta gás hoje. E no médio prazo, a EPE continua enxergando esse problema. Não haverá abundância de gás enquanto essas amarras estiverem aí. Para vencer essas amarras serão necessários novos produtores. Agora é acender as velas e ver o que vai acontecer no São Francisco, no Parnaíba. Há várias questões em aberto e hoje a situação do mercado é difícil. Serão muitos os investimentos necessários e o não convencional não é para amanhã. E mesmo que tenhamos esse gás em 2015 não será uma explosão de uma hora para outra, pois serão muitos os investimentos necessários. A abundância virá de somatório de forças na área da oferta e, no médio prazo, a Petrobras manterá a liderança e sua política vai definir muito do que acontecerá no gás no Brasil nos próximos cinco anos. MARIA PAULA MARTINS - Symone, vamos tentar agora falar um pouco do PMAT. SYMONE DE SANTANA ARAÚJO - Nos últimos anos conseguimos aproximar as projeções do PDE aos planos de desenvolvimento das áreas e o conjunto de informações hoje colocadas na ANP. Ou seja, os PDEs dos últimos dois anos e o PMAT quando vier a público vão refletir essa aproximação. Ocorre que, quando enxergamos essas expectativas de oferta e a expansão da malha, vemos que estão bem aquém do que a Petra apresentou aqui, por exemplo. O estudo não reflete ainda essas expectativas tão otimistas. E esse é um dilema para nós que estamos planejando a malha, já que temos que atuar sobre bases sólidas. E ainda há muito que avançar. É certo que as projeções que a EPE fez, nos estudos de expansão da malha, em grande medida refletem as concessões que já foram feitas no São Francisco. Mas obviamente não refletem, ainda, eventuais expectativas promissoras que venham a se confirmar a partir da intensificação desse trabalho que vier a ser feito de 2013 a 2015. O PMAT não refletirá totalmente essa expectativa, em especial, do São Francisco. No PMAT nós vemos que tivemos uma expansão robusta de dutos nos últimos anos, praticamente a mesma malha da Argentina, que é um mercado mais maduro. É possível que o próximo ciclo de expansão não mostre uma expansão tão intensa, exceto se houver uma grande descoberta. O que vemos hoje é uma expansão modesta. WINSTON FRITSCH - Nossa visão de médio e longo prazo do mercado de gás no Brasil, supondo que a regulação evolua, é que vamos ter, nesse período, uma transição suave para um mercado mais competitivo. Nesse cenário otimista do ponto de vista regulatório, se todas as nossas melhores previsões confirmarem, haverá expansão da oferta e esse conceito de escassez de gás tem que ser visto com cuidado. Não existe escassez quando o sistema de preços é livre. A escassez é uma ideia de economia planificada. Quando o preço é livre, que é o cenário com o qual trabalhamos, é preciso saber qual vai ser o preço de equilíbrio. Eu acredito que o preço não vai cair muito porque o efeito substituição é brutal e haverá demandas que vão ocorrer que são muito grandes. O gás vai ser crescentemente importante na matriz energética. A indústria de mineração no Brasil tem potencial brutal e está parada e muito disso se deve ao custo da energia. Há demandas deprimidas de gás no Brasil que vão manter o preço elevado. O choque de oferta possível talvez não reduza tanto o preço assim, porque haverá outras demandas que vão mantê-lo. Quer dizer, se você não for alguém que pode pagar caro pelo gás, vai continuar pedindo Papai Noel. JOSÉ MAURO COELHO – O que vislumbramos nos próximos 10 anos é que devemos ter mais ou menos a mesma situação que temos hoje em relação ao gás, mas acreditamos que haverá aumento de oferta, ditado especialmente pelo aumento da demanda e isso vai, com certeza, resultar em maiores volumes de gás produzidos, importados, comercializados. 4º PAINEL – DESAFIOS DO AUTOPRODUTOR, AUTOIMPORTADOR E CONSUMIDOR LIVRE Mediação: George Vidor – Colunista do jornal O Globo HUGO REPSOLD - GERENTE EXECUTIVO DE GAS E ENERGIA CORPORATIVO DA PETROBRAS “O que todos queremos é gás abundante e barato, mas temos que ver que há dificuldades e complexidade para chegar nesse mercado maduro” Vimos aqui hoje, em todos os debates, certa expectativa de que o amanhã tenha um outro perfil, com características diferentes, ofertas diferentes, outras formas de gás sendo produzidas. Há uma expectativa muito positiva e acho que houve aqui um razoável consenso de que esse amanhã é melhor do que hoje, com mais gás, em um mercado mais maduro. Hoje chegamos a um patamar muito melhor do que o estágio inicial da indústria, com uma malha de escoamento densa, capacidade de tratamento na costa, há porte para um mercado considerável. Vários eventos levaram ao desenvolvimento desse mercado e chegamos hoje em um patamar que é muito melhor do que o primeiro momento da indústria, mas está longe de ser aquele estágio maduro que esperamos. O Estado do Rio de Janeiro fez o dever de casa depois da Lei do Gás, com grande debate no Estado. A decisão foi se construindo de forma coletiva, por todos os agentes, o que leva a uma visão de futuro de que teremos um grande mercado de gás. O que todos queremos é gás abundante e barato, mas temos que ver que há dificuldades e complexidade para chegar nesse mercado maduro. A Lei do Gás é um grande avanço e faz parte desse amadurecimento, trouxe figuras importantes que trazem uma contribuição para que se alcance o futuro que queremos. EDSON REAL – GERENTE DE NOVOS NEGÓCIOS DA MPX “Em termos de desafios, a questão agora é fazer uma regulação que seja moderna, permita a atração de novas indústrias não só consumidoras, mas também produtoras, e o desenvolvimento da figura do comercializador” Concordo com a visão de que o gás era o patinho feio da indústria de óleo e gás no Brasil no passado e se olharmos bem o histórico, o cronograma de desenvolvimento dessa indústria, vamos ver dois pontos de inflexão bem marcantes. O primeiro ponto de inflexão foi a construção do Brasil-Bolívia, que tratava o gás como produto, com visão de longo prazo. O segundo ponto foi o PPT, o Programa Prioritário de Termelétricas, que mostrou um novo mercado adicional e acelerou muito o desenvolvimento da indústria. A Lei do Gás foi um avanço, conseguiu traduzir a migração de um sistema incipiente, provisório, para a fundação de uma indústria robusta, com base e regras. A criação das figuras do autoprodutor, autoimportador e consumidor livre pode levar, entre outras coisas, a um novo ponto de inflexão no mercado de gás, do ponto de vista da demanda. Claro que as questões de oferta tem que ser equacionadas mas, se houver demanda por gás, ele efetivamente vai chegar. A figura dos autoprodutores, autoimportadores e consumidores livres traz uma modernização e transparência para a indústria do gás que será muito benéfica, não só para o consumidor, mas também para o produtor e o próprio Estado. Hoje, vários Estados já trabalham para regular essas figuras nas suas concessões e os que avançarem e fizerem uma regulação mais moderna vão ser mais competitivos em termos de atração de indústrias que consumam gás do que outros. Porque essas figuras basicamente trazem flexibilidade para o consumidor, que pode gerenciar seu suprimento de gás, trazem uma otimização tributária, proporcionam agilidade no crescimento da rede e também uma maior transparência na indústria, porque você vê efetivamente quais são os fatores de custo da cadeia de suprimento de gás. Em termos de desafios, a questão agora é fazer uma regulação que seja moderna, permita a atração de novas indústrias não só consumidoras, mas também produtoras, e o desenvolvimento da figura do comercializador. CLAUDIO DE FARIA MULLER - SUPERINTENDENTE DA ARSESP “Esperamos o choque de oferta para que o mercado evolua para um estágio mais avançado” A empresa faz fiscalização e regulação do gás canalizado, saneamento básico e energia elétrica no Estado de São Paulo. Temos cerca de 1,2 milhão de consumidores de gás canalizado no Estado, através de três concessionárias. Atendemos cerca de 125 municípios, menos de 20% dos municípios do Estado são atendidos por redes de distribuição de gás natural. Especificamente sobre o assunto de autoprodutores, autoimportadores e consumidores livres, a Agência tem regulação estabelecida desde maio de 2011, quando foram editadas duas portarias (230 e 231), que estabelecem toda a regulação para esses agentes. Desde maio de 2011 já poderíamos ter autoprodutores. autoimportadores e consumidores livres na área de concessão da Comgás. Não temos nenhum. Passado um ano e meio desse prazo, não temos nenhuma manifestação expressa de algum consumidor que queira se declarar livre. Então, há reflexões que tem que ser feitas para entender o motivo disso. A primeira razão que logo vem a baila é que se coloca um único produtor de gás e, fazendo um paralelo com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, na qual há 2.000 agentes, sendo 700 consumidores livres, esse mercado evoluiu, mas também a partir de um início parecido com esse estágio no qual está hoje a área do gás. No Estado de São Paulo, na área da Comgás, há 212 potenciais consumidores livres – que consomem acima de 10.000 metros cúbicos de gás/dia e cinco comercializadores autorizados, mas apenas um produtor de gás. Esperamos o choque de oferta para que o mercado evolua para um estágio mais avançado. RICARDO MENDES – DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE ENERGIA DA VALE “O nosso grande desejo é que possamos ter uma discussão ampla com todos os agentes envolvidos na cadeia, desde o consumo até a produção, passando pela comercialização, pelo transporte, pela distribuição, envolvendo também os Estados” A Vale é uma empresa que participa da Abrace e patrocina o Mais Gás. No contexto mundial da indústria, hoje temos percebido que a indústria brasileira enfrenta um desafio muito grande de competitividade. Quando olhamos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Oriente Médio, Africa, são países que estão se tornando ricos em gás, o que será fundamental para a competitividade. Hoje vemos outras áreas que estão consumindo gás, como a própria Europa, Coréia e Japão, e realmente, se olharmos o preço do gás internacional – e aí vem o primeiro desafio da importação -, ele é um preço relativamente alto para essa competitividade comparado com esses outros países. A Arábia Saudita está fazendo política de uso de gás e de incentivo para a indústria. Como nos comportamos em relação a isso? Não queremos um preço aqui de US$ 2 se não há condições, mas temos que fazer um trabalho de definir quais são as alterações do mercado que temos que buscar para se conseguir o preço mais competitivo possível. Ou seja, temos a responsabilidade de fazer o nosso dever de casa e buscar esse equilíbrio. Acreditamos, pelo estudo que fizemos, que o preço pode ser mais baixo do que está hoje. Acho que não é questão de ter um culpado ou um problema, na verdade o que temos que fazer – que foi feito no setor elétrico – é colocar numa mesa todos os agentes da cadeia para fazer um debate e buscar alternativas para mudar a dinâmica do mercado e alcançar nossos objetivos. A Lei do Gás foi um avanço e é extremamente importante. O leilão de transporte do gás, do gasoduto, tem a mesma lógica da expansão do sistema de transmissão, que foi muito bem sucedido. O nosso grande desejo é que possamos ter uma discussão ampla com todos os agentes envolvidos na cadeia, desde o consumo até a produção, passando pela comercialização, pelo transporte, pela distribuição, envolvendo também os Estados. . MARCO ANTONIO FIDELIS – ESPECIALISTA EM REGULAÇÃO DA ANP “A ANP tem se empenhado em regulamentar a Lei do Gás e torná-la operacional” Com relação ao autoimportador, autoprodutor e consumidor livre, é um assunto que suscita muitas dúvidas. A ANP tem se empenhado em regulamentar a Lei do Gás e torná-la operacional e acho que é importante lembrar qual a origem dessas figuras. Há quatro anos houve um acordo entre várias entidades que viabilizou a continuidade da Lei do Gás e incluiu justamente esses três conceitos – autoprodutor, autoimportador e consumidor livre. A ANP não assinou o acordo por considerar alguns artigos discriminatórios, mas de qualquer maneira aprova a iniciativa dos agentes e tenta fazer cumprir a lei. O acordo é bem específico nos pontos que dele determina. Estamos sempre a vontade para discutir o assunto, regulamos a parte do autoimportador e autoprodutor. MOACYR ALMEIDA FONSECA – CONSELHEIRO DA AGENERSA “Para que existe a Lei do Gás, se o consumidor livre espera que ocorra alguma coisa? Todo mundo espera a Petrobras dar o primeiro passo, o risco comercial sempre é da Petrobras” O gás já foi desprezado e mesmo que o gás hoje seja desejado, almejado, na Petrobras está no final da fila, o que é natural. Isso pelo peso que ele tem dentro da empresa, não é que não seja importante. Sempre que vem esse assunto do autoprodutor, autoimportador e consumidor livre, lembro dos três sobrinhos do Pato Donald, Zezinho, Huguinho e Luizinho. Os três estão sempre andando juntos, como se o mundo fosse ser resolvido com a criação desses três agentes. A Lei do Gás veio com uma série de modernidades, mas começou a nascer junto com o Gasbol, que foi o começo de tudo. E logo depois começou a discussão que era preciso ter uma lei para organizar isso. A lei tem pedaços que faziam sentido em 1997, 2002, 2005 e foi caminhando, até que se chegou a um grande acordo para termos a lei possível, que melhora muito a questão reguladora. A Lei do Gás vem do passado, vai juntando pontos e hoje ela tem canções, poesias de várias épocas. Tenho dúvida até quanto ao título do painel, desafios. Parece que a gente invadiu os Estados Unidos, conquistou e não sabemos o que fazer. Agora temos os três agentes e parece que não sabemos o que fazer. No Estado do Rio já existe, há quase quatro anos, a deliberação do consumidor livre e só temos, quatro anos depois, um consumidor livre no Estado. Em São Paulo há zero. Para que existe a Lei do Gás, se o consumidor livre espera que ocorra alguma coisa? Todo mundo espera a Petrobras dar o primeiro passo, o risco comercial sempre é da Petrobras. O mercado precisa exercer o seu papel, não adianta ter Lei do Gás se não fizer isso. Não adianta pensar em regulação se os agentes não exercerem o seu papel, se forem apenas teóricos. Que cada um possa agir com o papel que lhe é devido. Conclamo a todos os agentes que exerçam o seu papel, esse é o grande desafio. GEORGE VIDOR – Hoje temos na presidência da Petrobras a ex Diretora de Gás e Energia, o que naturalmente coloca o segmento mais importante na empresa, as pessoas sempre passam a ter um carinho com as áreas que gerenciam. Repsold, o que a Petrobras deseja do gás? HUGO REPSOLD – Não é totalmente justo dizer que o gás não é importante para a Petrobras. É muito importante. E também não é justo pensar que não é priorizado, porque não é nem uma questão de escolha, a regulamentação não dá alternativas, o contrato de concessão tem regras. A Bolívia entrou com 30 milhões de metros cúbicos e assim ficou, um gás que é importantíssimo para o crescimento do País. O setor de gás é muito importante para o Brasil e para a Petrobras. Hoje a Petrobras completa o mercado com 20 milhões de metros cúbicos/dia de GNL que a gente regasifica. Hoje temos um mercado de 100 milhões de metros cúbicos/dia que ainda não está maduro, há muito potencial de crescimento. Além do gás ser importante, tem muito espaço para ser cada vez mais importante. E as regras dos contratos de concessão, hoje, são favoráveis. Acho que há uma questão de expectativas. Quem consome gás gostaria de ter contratos de 30 anos. Hoje, se colocarmos que precisamos de oito, 10 anos para desenvolver um campo de gás e o contrato tem 25 anos, eu só consigo planejar 15 anos. Já temos aí um desafio para discutir aqui. Hoje entendo que o prazo para desenvolver uma acumulação de gás, o que a Petrobras aprendeu a fazer com maestria, é um modelo vencedor. Uma garantia para o concessionário de que teria os 25 anos do contrato e mais 15 anos é um desafio importante- olhar aquilo que o mercado espera e proporcionar ao produtor aquilo que ele necessita para planejar com prazo de 30 anos. O aumento da oferta teve números chineses, chegamos a 17% de crescimento ao ano da oferta de gás no Brasil. Não se pode dizer que nada foi feito, que o produtor usou o seu monopólio e não fez nada. A Petrobras fez muitos investimentos, elevou a oferta, ampliou a malha de transporte. Vamos fazer mais porque o gás é importante, está dentro do portfólio, os projetos tem recebido prioridade. A Petrobras é grande porque em determinado momento, sem reservas e sem petróleo, se voltou para o mercado. Hoje a empresa continua sendo grande e forte porque está comprometida com esse mercado. Pode ser que a molécula do gás no Brasil não tenha o valor que deveria ter, é barato demais o gás aqui. E por que é barato? Porque cada molécula produzida aqui desloca uma molécula de GNL importado, que hoje é US$ 17 por milhão de BTU. A Petrobras não repassa o custo para o mercado. Embora para nós o custo marginal seja o que define o desembolso, a diferença, o ganho, a gente faz para o mercado o custo médio e tenta trabalhar compensando. MOACYR ALMEIDA FONSECA – Não acho que a Petrobras fez muito pouco. Pelo contrário, ela fez muito. Conclamo a maioria a não deixar a Petrobras fazer sozinha, ela é a única que se arrisca, é o único ofertante não porque quer, mas porque os outros não aparecem. Precisam aparecer outros ofertantes. CLAUDIO DE FARIA – A Lei do Gás foi importante, mas tem que continuar, há coisas ainda a serem exploradas, a questão da interconexão estadual, a regulamentação do condicionamento de gás. A regulação tem que se adiantar e estabelecer regras que permitam investimentos. Acredito que regulação do autoprodutor, autoimportador e consumidor livre não tem aplicação imediata, depende ainda de alguns outros condicionantes, tem que ser discutida para permitir que produtores de gás tenham as regras claras, definidas, para que possam investir na exploração e produção. A discussão tem que continuar e todos tem que participar. GEORGE VIDOR – Edson Real, vai sobrar gás para mais alguém? EDSON REAL – Bom, isso sempre depende do programa de exploração que está em curso. Mas eu queria complementar uma questão que o Claudio e o Hugo falaram, porque se falou muito aqui em choque de oferta e eu vejo que a indústria de gás sempre foi gerenciada como administração de crises e a gente vai construindo remendos. Acredito que temos oportunidade agora, com a Lei do Gás, de fazer um choque de regulação, antes do choque de oferta. Porque, como o Hugo falou, são 10 anos para ter, efetivamente, uma produção de gás. O principal mercado para o gás natural no Brasil, que é a geração termelétrica, tem leilões. A gente não pode esperar chegar lá, daqui a três, cinco anos, não vai funcionar. Eu concordo que a figura do autoprodutor, autoimportador e consumidor livre são muito importantes, mas o gás tem que chegar até eles. Então, é preciso regulamentar a questão de acesso, tem que haver uma integração melhor ou maior entre o setor elétrico e o setor de gás. GEORGE VIDOR – Ricardo, parecia que a Vale entraria a todo vapor no setor de óleo e gás, mas a sensação que temos hoje é de que a empresa vai vender tudo. Houve decepção? RICARDO MENDES – O principal fator é o momento da empresa, que mudou dramaticamente de lá pra cá, falando especificamente da atuação da Vale nesse setor. Estávamos com diretriz de diversificação e hoje a diretriz é foco e estamos avaliando as alternativas nesse mercado. Os desafios são mais ou menos os mesmos para todos os agentes. Há blocos em que somos parceiros da Petrobras, que foram licitados em 2006 no Espírito Santo e até hoje não conseguimos fazer poço. Então, é preciso pensar no desafio ambiental quando falamos em aumento de oferta. Além disso, para importar gás tem que ter escala mínima e esse é outro desafio. Fora isso, os preços de GNL não estão baixos. Falando no autoprodutor, se há uma descoberta, o desafio de escala e de timing se repete. A sensação que temos é que cada um está fazendo o seu melhor, mas não há harmonia no conjunto para levar ao desenvolvimento e é isso que precisamos buscar. Temos que olhar os problemas que temos e como resolvê-los. A gente tem que fazer um exercício de planejamento, todos juntos. Precisamos ter um ter um modelo do setor de gás, que olhe a cadeia toda. ENCERRAMENTO JULIO BUENO - SECRETÁRIO ESTADUAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO “O resumo desse seminário, a síntese é: choque de oferta” Agradeço a todos a vinda aqui, a resistência a um dia de trabalho. Vou tentar fazer uma conclusão despretensiosa, uma síntese. No seu programa na televisão, Vidor, você sempre diz para falar uma palavra que resuma a conversa. Para mim, aqui, esse termo é choque de oferta, é o resumo do seminário. Mas reconheço que há algo acima do choque de oferta, sobre o qual conversamos aqui o tempo todo. Está faltando uma política concatenada de gás natural no Brasil, que diga respeito à questão do preço – há uma deformação no modelo capitalista na questão do gás natural no Brasil, porque o agente dominante produz 100% do gás e não pode ter preço livre. Isso faz mal à Petrobras e ao mercado. Eu participei de vários planejamentos estratégicos da Petrobras. O grande risco da empresa nunca foi a competição, a empresa sempre cresceu na competição, mas sim se tornar monopolista, com um governo liberal que queira vender ativos. O mercado tem que gostar da Petrobras, os nossos clientes precisam gostar da empresa. Precisamos discutir a questão do preço com uma perspectiva de liberalização, com mais players no mercado, com mais gente ofertando. Tenho que reconhecer que é essencial discutir a infraestrutura, remunerando corretamente. Não há Papai Noel aqui. É absolutamente inaceitável doar qualquer coisa da Petrobras, de quem somos acionistas, a um agente privado. Não estou falando disso, mas sim de uma postura de País que disponibiliza a infraestrutura para o mercado. Mas isso deve estar submetido a uma política concatenada de gás natural para o Brasil e que tenha como resumo, homenageando o Vidor, o choque de oferta.