BELO HORIZONTE E OS MEGAEVENTOS ESPORTIVOS Marcella C. Amaral Scotti.1 RESUMO: A partir do momento em que um país se torna sede de um megaevento esportivo, as cidades se transformam no centro das atenções. Neste sentido, a intenção desse artigo é discorrer sobre alguns temas relacionados às cidades e aos megaeventos, além de fazer uma pesquisa em busca de bibliografias que já estejam discutindo a realização dos megaeventos em Belo Horizonte ou até mesmo em outras cidades. Diante das informações apresentadas é imprescindível realizar um estudo sobre a interface entre impactos, legados, políticas urbanas e o direito à cidade, considerando-se a Região Metropolitana de Belo Horizonte. PALAVRAS-CHAVES: Cidades, Megaeventos, Belo Horizonte. 1. INTRODUÇÃO acontece porque para abrigar um megaevento a cidade preci- A partir do momento em que um país se torna sede de sa contar com equipamentos como centros de convenções e um megaevento esportivo, seja uma copa do mundo de meios de hospedagem, além de uma adequada infraestrutura futebol ou jogos olímpicos, as cidades se transformam por um de transporte que permita a mobilidade dos participantes do determinado período de tempo no centro das atenções em evento. Tem-se que a produção dos impactos está intimamente escala mundial. Esses eventos causam um grande impacto na ligada com a própria conformação do legado, constituindo-se dinamização e reestruturação das cidades, se tornando assim, na fase de todo o processo que vai além da temporalidade dos um agente poderoso de planejamento e mudanças no espaço jogos e se solidifica como permanência tangível e intangível no urbano (MASCARENHAS, 2008). território. (RAEDER, 2008) Segundo Raeder (2008) o ano de 2007 foi marcante na his- Rolnik2 aponta que esse é um momento particular na vida tória do país relacionado aos esportes em função de três acon- urbana do Brasil e explica que no processo de globalização tecimentos – a realização dos Jogos Pan-americanos na cida- que estamos vivendo, existe um componente perverso uma vez de do Rio de Janeiro, a vitória da candidatura do Brasil como que ao derrubar barreiras, abre-se o território do planeta para sede da Copa do Mundo de Futebol em 2014 e a apresenta- que o capital financeiro avalie e decida aonde é melhor investir. ção da candidatura do Rio de Janeiro aos Jogos Olímpicos de Isto é, com o megaevento um investimento local toma uma es- 2016, sendo aceita posteriormente. Esta programação de even- fera global. As cidades, para competir entre si com investimen- tos torna imprescindível um estudo acerca do desenvolvimento tos, passam a criar espaços internacionais que sejam atrativos. urbano que ocorre em função desses eventos, bem como dos Sendo assim, a agenda principal da política no Brasil é prepa- impactos e legados resultantes. rar a cidade para o negócio. Consequentemente, o direito à Ainda de acordo com o autor citado acima, a realização dos cidade está sendo violado e estão ocorrendo desapropriações eventos vem sendo considerada uma das principais estratégias sem o devido debate. A Copa passa a ser a oportunidade de utilizadas pelas cidades em busca de atrair financiamentos e realização de grandes obras, e esse é o aspecto perverso, pois investimentos, o que acaba servindo para aquelas cidades que o evento ganha legitimidade uma vez que o poder de quem desejam se beneficiar e promover mudanças em termos urba- decide se torna maior. nísticos. Esses eventos podem ser das mais diversas naturezas, Neste sentido, a intenção desse artigo é discorrer sobre al- entretanto há um interesse especial nos eventos que geram uma guns temas relacionados às cidades e aos megaeventos, tendo-se repercussão internacional tendo-se em vista a grande divulgação em vista a cidade de Belo Horizonte e região metropolitana, além da imagem da cidade sede. de fazer uma pesquisa em busca de bibliografias que já estejam Os impactos que se dão em função do evento agregam problemas à urbanização dos municípios e podem gerar efei- discutindo a realização dos megaeventos em Belo Horizonte ou até mesmo em outras cidades. tos de natureza variada na vida social, tais como geração de emprego, de renda, de visibilidade para a cidade, de desapro- 2. AS CIDADES priação de famílias, bem como de valorização de áreas. Isso De acordo com Castells e Borja (1996) as cidades estão PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 189 adquirindo cada vez mais um profundo protagonismo, seja no diar os jogos olímpicos que causaria um impacto em seis áreas aspecto político, econômico, social, cultural, assim como nos urbanas. meios de comunicação. Sendo assim, é possível denominar as Essas teorias têm relação com o que Vainer (2003) acredi- cidades como complexos atores sociais. Isso se torna mais cla- ta que todo e qualquer projeto de cidade tem como base uma ro uma vez que a cidade faz uma articulação entre as instituições utopia, ou seja, um modelo ou ideal de cidade. De acordo com públicas e a sociedade civil. Vainer, a primeira e fundamental utopia urbana foi a utopia mé- Observando o exemplo da América Latina, temos que os dica ou higienista, que buscou a medicalização das cidades a processos de democratização política e de descentralização do fim de estabelecer uma ordem urbana na cidade da Revolução Estado provocaram uma revalorização do papel das cidades e Industrial, que apresentava muitos problemas. Posteriormente, a dos governos locais, ao longo dos anos 80. Porém, de acordo utopia sanitarista deu lugar à utopia modernista em que a cidade com os autores “as limitações destes processos e os efeitos so- é pensada como lugar da produção e da reprodução. ciais das políticas de ajuste, acrescentadas às desigualdades E por fim, a ditadura militar levou ao conceito técnico/tec- e marginalidades herdadas, à debilidade da sustentação so- nocrático do planejamento urbano. A utopia tecnocrática parte ciocultural das cidades e aos graves déficits de infraestrutura e do princípio de que os técnicos (planejadores) que possuem o serviços públicos, atrasaram a emergência das cidades como conhecimento e o saber especializado, têm a capacidade de protagonistas, quadro que se alterou sobremaneira na década elaborar diagnóstico e consequentemente propor soluções aos de 90” (CASTELLS e BORJA, 1996, p.154). problemas. A crise dessa utopia ocorreu simultaneamente ao De um lado, a renovação da economia estimulou a execução crescimento dos movimentos urbanos e ao fortalecimento de de projetos urbanos em grande escala, além de dinamizar o setor organizações populares. Porém, ao lado de cada luta específica da construção civil; mas, por outro lado, alguns problemas de agra- (por moradia, saneamento, transportes, entre outros) havia a luta varam como o déficit da infraestrutura física e de comunicações, a para democratizar a cidade, fazendo emergir a utopia da cidade insuficiência de recursos públicos, incapacidade de atuação dos democrática. governos locais, fraca integração social e baixa cooperação entre as esferas públicas e privadas. Juntamente a essa utopia e aproveitando o vazio deixado pela crise do modelo tecnocrático, surgiu um novo modelo, o O crescimento da abertura econômica externa e o estabele- da cidade-empresa ou cidade-mercadoria. A partir do final dos cimento dos processos democráticos internos contribuíram tam- anos 1980 e durante toda a década de 1990 ouviu-se falar que a bém para multiplicar as demandas sociais e ampliar a sensação cidade deve ser competitiva. Um documento do Banco Mundial de crise nas cidades. Tal sensação era provocada pelos pro- oferece uma ideia do que as cidades deveriam fazer: “competir blemas urbanos como congestionamentos, falta de segurança pelo investimento de capital, tecnologia e capacidade empresa- e serviços básicos, entre outros. Por outro lado, as dinâmicas rial; competir para atrair novas indústrias e negócios; ser com- econômicas, sociais e políticas criaram condições para respos- petitivas nos preços e qualidades dos serviços; e competir para tas a esses problemas, como a aprovação de projetos de refor- atrair mão-de-obra qualificada” (WORLD COMPETITIVE CITIES ma política e financeiras em algumas cidades (México, Bogotá e CONGRESS, 1998, p.2, apud VAINER, 2003, p.28). Isto é, a ci- Buenos Aires), reformas na constituição brasileira, início de pla- dade passa a ser pensada como uma empresa, atuando em um nos estratégicos baseados na participação popular, a execução mercado internacional que é bastante competitivo. de grandes projetos urbanos, entre outros. Nesse mesmo caminho, o artigo de Sanchéz (1999) sobre as Em função de todos esses aspectos, as grandes cidades políticas urbanas em renovação discute as mudanças nas políti- da América Latina emergiram nos anos de 1990 como atores cas urbanas pautadas nas ações que perseguem a promoção da políticos e econômicos. Porém, de acordo com os autores, a cidade. Neste sentido, o city marketing e os planos estratégicos consolidação dessa nova função das cidades irá depender do se apresentam como instrumentos importantes do que se chama estímulo que for dado a grandes projetos de cidade que levem de novo planejamento urbano que visa recuperar sua legitimida- em consideração a participação dos agentes públicos e priva- de quanto à intervenção pública na cidade. dos e que, por sua vez alcancem o consenso público amplo. O city marketing se constitui na orientação da política urba- Alguns desse projetos passaram de uma proposta setorial na ao atendimento das necessidades do consumidor (empre- “para uma proposta global de desenvolvimento urbano pactua- sário, turista e cidadão). Já o plano estratégico visa atuações do” (CASTELLS e BORJA, 1996, p. 155). Como exemplo, temos integradas em longo prazo, direcionadas à execução de gran- a proposta da candidatura do Rio de Janeiro em 2004 para se- des projetos que objetivam crescimento econômico e desenvol- 190 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 vimento urbano. relação de forças que visem um outro momento, ou o futuro. Na visão da autora, tais planos estratégicos são uma forma Sánchez comenta inclusive que o termo desenvolvimento tem de obter consenso político para a execução de grandes proje- sido muito utilizado nos discursos, como no caso do legado dos tos, mas são vistos também como “fábricas de imagem”. Neste megaeventos. No caso do direito à cidade, a autora entende sentido, é construída uma “imagem de marca” para a cidade esse aspecto como uma conquista a partir de enfrentamentos com o objetivo de projetá-la no exterior e o marketing é utilizado e de lutas sociais. para promover seus produtos, como o turismo, a cultura e os serviços de ponta. Sendo assim, a crítica aos megaeventos perpassa ao fato de que eles não estão sendo acompanhados de um projeto que O artigo inicialmente situa as políticas de promoção das ci- seja discutido pela sociedade civil, para que se alcance ganhos dades no contexto da transformação dos objetivos e dos instru- sociais nas metrópoles brasileiras que são muito desiguais. Em mentos da política urbana; em um segundo momento Sanchéz relação aos impactos que as intervenções relacionadas aos me- discute o papel dos novos planos estratégicos assim como do gaeventos causam em termos urbanos, Sánchez comenta que “urbanismo-espetáculo”; e por fim a autora propõe uma aproxi- esses impactos agravam as desigualdades nas cidades e aca- mação ao tema da construção do consenso social. bam não provocando melhorias na vida urbana de forma signifi- Para encaminhar toda essa discussão, Sanchéz lança mão cativa em locais que carecem de mais obras de infraestrutura e dos casos de Barcelona e Curitiba, oferecendo exemplos para de transportes. Este último segmento inclusive está sendo pla- ilustrar, principalmente, como os meios de comunicação e as nejado mais em função do bom andamento dos jogos de futebol campanhas publicitárias criam um sentimento de “pertencimen- e olímpicos, em detrimento da definição de uma infraestrutura to” e até mesmo de participação por parte da população em geral de transporte que beneficie e enfrente os problemas de mobili- nessa transformação da cidade, quando na verdade o que se tem dade metropolitana. é uma “manobra” por parte dos gestores para obter a adesão da população e evitar qualquer tipo de manifestação contrária. Para Whitaker4 o crescimento econômico é um processo em que o capital é reproduzido e consequentemente gera lucro, não significando desenvolvimento social. Essa confusão entre os dois 3. OS MEGAEVENTOS termos – crescimento econômico x desenvolvimento – é a ma- As discussões acerca da reestruturação do espaço e a re- neira utilizada pelos megaeventos para legitimar e promover as qualificação de áreas urbanas vêm se intensificando recentemen- intervenções no território. Isso significa que se promete a geração te em função do país se tornar, nos próximos anos, sede de dois do desenvolvimento, quando na verdade gera-se um crescimento grandes eventos esportivos. Neste sentido, torna-se imprescindí- econômico cujo lucro é limitado aos proponentes do projeto. vel compreender as rupturas, os conflitos e os impactos gerados Portanto, esses grandes eventos estão gerando um tipo de pelas grandes intervenções no território, sejam nos âmbitos terri- mistura entre os conceitos de crescimento e desenvolvimento. O toriais, sociais, econômicos, ambientais e políticos. Tais interven- discurso se direciona a importância de receber eventos, ter jo- ções são realizadas no intuito de adequar os espaços para os gos de futebol, ter jogos olímpicos na cidade, uma vez que isso fluxos que se darão em função desses eventos. vai movimentar as atividades econômicas, gera um crescimento Neste contexto, evidencia-se a necessidade de analisar a da rede hoteleira, o que resulta em desenvolvimento. Instala-se, conformação atual da gestão das cidades e os discursos que portanto uma confusão porque esse cenário gera crescimento, são gerados em função de tal cenário. O que se percebe é que mas para setores específicos como o turismo. por trás do conjunto de intervenções no território a serem realiza- No XIV Encontro Nacional da Anpur realizado em maio de das, há um discurso de que a intenção das mesmas é promover 2011 na cidade do Rio de Janeiro, vários artigos contemplaram o bem estar social, porém os megaeventos são a verdadeira jus- os impactos dos megaeventos nas cidades. O artigo de Pereira tificativa para as intervenções. Sendo assim, reivindicações an- (2011) intitulado “As políticas públicas nas favelas cariocas em tigas da população agora têm a chance de se tornar realidade. tempos de megaeventos esportivos na cidade” tem o objetivo Nesse âmbito, Sánchez3 aponta a diferença de entendimen- de compreender, analisar e sistematizar as ações recentes do to entre o discurso oficial e o discurso das lutas sociais no que poder público na cidade do Rio de Janeiro direcionadas para as diz respeito à ideia de desenvolvimento e do direito à cidade. favelas, tais como o Programa de Aceleração do Crescimento Coloca-se que a noção de desenvolvimento é disputada, ou – PAC, as Unidades de Policiamento Pacificadoras – UPPs, a seja, quando se fala em processos sociais, territoriais e em pro- ameaça de remoções em função dos megaeventos esportivos, jetos, tem-se a ideia de um desenvolvimento de um estado de a construção de muros e barreiras sonoras e, por fim o Progra- PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 191 ma Morar Carioca. do Mundo / 2014 e Jogos Olímpicos / 2016”. No final do mês O autor observa que a cidade vive um momento em que de fevereiro ocorreu o I Workshop de Planejamento, evento que várias políticas públicas (complementares e contraditórias) são contou com a participação de pesquisadores do INCT Observa- direcionadas para as favelas, o que envolve uma grande arti- tório das Metrópoles envolvidos no projeto. O objetivo dessa pri- culação e quantidade de recursos dos governos municipal, es- meira oficina foi organizar o cronograma de pesquisa e “afinar” tadual e federal. A questão norteadora do artigo propõe saber o diálogo entre os participantes5. quais seriam as possibilidades para a construção de um futuro Ocorreu também no início do mês de abril deste ano o 2º e de uma cidade mais justa para a maior parte da população e (De)bate-bola6 com a finalidade de fomentar a discussão sobre não somente para uma minoria, tendo-se em vista que a cidade o outro lado da Copa de 2014 – quais as conseqüências das do Rio de Janeiro se prepara para sediar os dois maiores mega- grandes obras para as cidades-sede; quais direitos ficam em eventos esportivos do planeta. segundo plano em nome dos jogos; e quais interesses estão por A autora Silva (2011) cujo trabalho é intitulado “Apropriação trás desses eventos, entre outros. social na política dos Jogos Pan-americanos” apresenta alguns O 2º (De)bate-bola foi realizado na reitoria da UFPR e organi- exemplos de equipamentos que foram construídos para receber os zado pelo Observatório de Políticas Públicas do Paraná e nesta edi- jogos, porém após os mesmo não se verificou um uso social dos ção contou com o apoio do Programa de Pós-Graduação em Ge- equipamentos, como o Estádio Olímpico João Havelange, adminis- ografia da UFPR e do Observatório das Metrópoles / INCT / CNPQ. trado por entidade privada e cujo entorno se encontra abandonado. O grupo de pesquisa está estruturado em um núcleo nacio- A problematização do trabalho gira em torno de quais seriam nal que trata das macroquestões de análise (atuação dos minis- os processos de apropriação social dos equipamentos esportivos térios e organismos internacionais) e 12 núcleos dedicados a na política dos jogos na cidade do Rio de Janeiro. Silva (2011) afir- cada uma das cidades-sede. Os núcleos são divididos em gran- ma que os benefícios foram poucos e que a maioria dos grandes des áreas: infraestrutura, desenvolvimento econômico, direito à empreendimentos não são socialmente apropriados. cidade, moradia e dinâmica urbana e ambiental e, finalmente, O artigo de Bienenstein (2011) com o tema “O espetáculo governança urbana e metropolitana. na cidade e a cidade no espetáculo: grandes projetos, megaeventos e outras histórias” aborda o fato de que atualmente há 4. BELO HORIZONTE E REGIÃO METROPOLITANA uma grande produção de riqueza paralelamente à uma grande A partir do século XVII, a maioria das velhas capitais da produção de miséria e exclusão socioespacial, e a promoção Europa foram sendo remodeladas por seus soberanos, objeti- de espetáculos (os megaeventos são alguns deles) parecer ter vando a sistematização do tecido urbano, inaugurando, assim, assumido importância e centralidade nas discussões urbanas. uma distribuição geométrica baseada nos princípios barrocos Sendo assim, esse artigo visa refletir como esse processo está de articulação do poder através do espaço, como aponta Ma- ocorrendo recentemente nas cidades brasileiras, mas o objeto galhães (1989). Como forma de ilustrar a ruptura entre o Império de estudo é a cidade do Rio de Janeiro. O foco da discussão e a nova República, seria preciso destruir o que antes existia, versa sobre a construção da “Cidade Olímpica”; o autor resgata como comenta Monte-Mór (1994), artifício materializado através a trajetória desse processo, bem como as motivações, discursos da mudança de capital em Minas Gerais. Além das funções pré- e ações do universo de atores políticos e econômicos envolvidos estabelecidas de cidade planejadamente moderna, implicando- com a realização desses eventos. Nas suas considerações, o a num espaço de representação urbana; ansiava-se, sobretudo, autor afirma que essas iniciativas se enquadram nas tendências a distribuição do poder como meio de promover um maior de- que predominam na urbanização contemporânea, baseada na senvolvimento do país, bem como no Estado. chamada “democracia do capital”. Em 1895, iniciou-se a construção da nova capital de mi- Por fim, o artigo de Vainer (2011) com o título “Cidade de nas. Inaugurada em 12 de dezembro de 1897 com o nome exceção: reflexões a partir do Rio de Janeiro” e o artigo de de Cidade de Minas, alterado novamente para Belo Horizonte Oliveira (2011) “Força-de-lei: rupturas e realinhamentos ins- em 1901 (Singer, 1968). Duas características estruturais são titucionais na busca do “sonho olímpico” carioca” tratam do marcantes no projeto da nova capital – a segregação espa- tema das leis que tornam-se passíveis de desrespeito legal cial que diferenciava os ricos (funcionários estaduais e co- para que os megaeventos se realizem de maneira plena. merciantes, entre outros) dos pobres (trabalhadores), através Já o Observatório das Metrópoles iniciou em janeiro de 2011 da diferença de espaços planejados e não planejados, além o projeto “Metropolização e Megaeventos: os impactos da Copa da diferenciação de casas, conforme o status social de seu 192 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 morador; e a perspectiva da classificação dos espaços de acordo com suas funções, como exemplo de moradia, traba- ciam a construção de novos meios de hospedagem. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS lho, comércio, lazer, entre outras (JULIÃO, 1996 apud MEDEI- Diante das informações apresentadas é imprescindível re- ROS, 2001). Então, foi a população trabalhadora, excluída do alizar um estudo sobre a interface entre impactos, legados, po- espaço central da cidade, que de fato determinou a produção líticas urbanas e o direito à cidade, considerando-se a Região da cidade (MONTE-MÓR, 1994). Nascia assim uma cidade Metropolitana de Belo Horizonte. Direciona-se a discussão acer- segregacionista, que proporcionava a discriminação social no ca da ideia de como fazer valer o direito à cidade, que perpassa espaço, uma vez que reservou a zona urbana para uma elite pela organização daqueles que têm direito e da reavaliação das e direcionou a população economicamente mais pobre para estratégias de atuação. Assim, o megaevento teria uma legitimi- a zona suburbana (HORTA, 1994). dade caso vise a consolidação de um legado que seja cidadão, Ao falarmos dos dias atuais, Belo Horizonte se torna muitas, ou seja, aquele composto por bens que gerem as melhorias pois o processo de periferização que esta desenvolve, tornou-se urbanas e a redução das desigualdades sociais. Esse legado um dos indicativos da reorganização espacial atual da cidade, poderia direcionar as políticas urbanas no sentido de ampliar e onde a segregação espacial ao mesmo tempo que afastou as garantir os direitos dos cidadãos. áreas periféricas, encurtou espaços para sua inserção em áreas bastante valorizadas atualmente. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Para os próximos anos, a Região Metropolitana de Belo Horizonte deve enfrentar desafios de crescimento, organização, produção e gestão do espaço, de forma a reduzir as desigualdades socioespaciais, propondo soluções para a mobilidade metropolitana e a habitação, entre outras questões, tendo-se em vista inclusive desafio de se preparar para sediar um Megaevento como a Copa do Mundo de Futebol. Belo Horizonte e região metropolitana passa atualmente por um momento especial de transformações e da recente elaboração do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado, aonde muitas dessas questões vem sendo discutidas. O município de Belo Horizonte possui o Comitê Executivo para a Copa do Mundo de 2014 que já elaborou um planejamento estratégico integrado para o evento e vem liderando os esforços para que as ações sejam efetivadas. A cidade conta também com o apoio da Belotur e da Secopa - Secretaria de Estado Extraordinária da Copa do Mundo. Em eventos recentes realizados em Belo Horizonte, fica claro o discurso de Anais do XIV Encontro Nacional da Anpur realizado em maio de 2011 na cidade do Rio de Janeiro. CASTELLS, M., BORJA, J. As cidades como atores políticos. Novos Estudos nº 45, São Paulo, p.152-166, 1996. HORTA, Célio Augusto da Cunha. Belo Horizonte: a construção de um saber geográfico. Universidade Federal de Santa Catarina, 1994. Florianópolis. Dissertação de Mestrado em Geografia. 373p. MAGALHÃES, Beatriz de Almeida. Belo Horizonte: Um Espaço para a República. UFMG, 1989. MASCARENHAS, Gilmar. Megaeventos esportivos e urbanismo: contextos históricos e legado social. In: RODRIGUES, Rejane Penna, et. al (org.). Legados de Megaeventos Esportivos. Brasília: Ministério do Esporte, 2008. MEDEIROS, Regina (org.), José Márcio Barros...[et al.]. Permanências e mudanças em Belo Horizonte. Belo Horizonte: PUC Minas - Autentica, 2001.144p. que as obras são para a cidade e seus cidadãos e não para a Copa, mas que o evento se torna um importante instrumento para “acelerar as coisas”. Dentre as obras a serem realizadas, as referentes ao Anel Rodoviário, Av. Pedro I e a que atingirá a Vila UFMG para a construção de uma alça de acesso ao Aeroporto da Pam- MONTE-MÓR, Roberto Luís de Melo (coordenador). Belo Horizonte: Espaços e Tempos em Construção. Belo Horizonte: CEDEPLAR / PBH, 1994. 94p.:il – (Coleção BH 100 anos). RAEDER, Sávio. Desenvolvimento Urbano em Sedes de Megaeventos Esportivos. In: pulha, já fazem parte de um conflito em relação ao reassentamento de famílias. Além disso, já existe uma lei em Belo Horizonte que se constitui numa exceção direcionada para a Copa devido ao fato de que se detectou que há uma carência de meios de hospedagem na cidade. Portanto, em 05 de julho do presente ano, por meio da Lei Orgânica Municipal nº 9952 criou-se em função da Copa de 2014 dispositivos que benefi- SÁNCHEZ, Fernanda. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em < http:// www.coopere.net/ppla > Acesso em: 04 de ago. 2010. SANCHÉZ, Fernanda. Políticas urbanas em renovação: uma leitura crítica dos modelos emergentes. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais. n.1. maio/1999.p.115-132. PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785 l 193 SINGER, Paul Israel. Desenvolvimento Econômico e Evolução Urbana: Análise da Evolução Econômica de São Paulo, Blumenau, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife. São Paulo: Editora Nacional e Editora da USP, 1968.378p. VAINER, Carlos B. Utopias urbanas e o desafio democrático. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, 2003. WHITAKER, João. 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SÁNCHEZ, Fernanda. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em <http://www.coopere.net/ppla> Acesso em: 04 de ago. 2010. 4.WHITAKER, João. Entrevista concedida aos organizadores do II Seminário PPLA: economia, sociedade e território. Disponível em <http:// www.coopere.net/ppla> Acesso em: 04 de ago. 2010. 5.http://web.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_co ntent&view=article&id=1585%3Aworkshop-de-planejamento-metropolizacao-e-mega-ventos&catid=43%3Anoticias&Itemid=88&lang=pt 6.http://terradedireitos.org.br/biblioteca/em-nome-dos-megaeventosleis-e-direitos-ficam-no-banco-de-reserva/ 194 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 1/2012 - EDIÇÃO 5 - ISSN 2176 7785