Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Direito
Trabalho de Conclusão de Curso
A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA O
AJUIZAMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA NA DEFESA DE
INTERESSES COLETIVOS STRICTO SENSU, DIFUSOS E
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Autor: Morgana Souza Militão
Orientador: Paulo Henrique Perna Cordeiro
Brasília - DF
2013
MORGANA SOUZA MILITÃO
A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA O AJUIZAMENTO DA
AÇÃO CIVIL PÚBLICA NA DEFESA DE INTERESSES COLETIVOS STRICTO
SENSU, DIFUSOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Direito da Universidade
Católica de Brasília, como requisito parcial
para obtenção do Título de Bacharel em
Direito.
Orientador:
Paulo
Cordeiro - especialista
Brasília
2013
Henrique
Perna
Monografia de autoria de Morgana Souza Militão, intitulada “A LEGITIMIDADE
DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
NA DEFESA DE INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS STRICTO SENSU E
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS”, apresentada como requisito parcial para obtenção
do grau de Bacharel em Direito da Universidade Católica de Brasília, em (data de
aprovação), defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:
_____________________________________________
Prof. (especialista). (Paulo Henrique Perna Cordeiro)
Orientador
(Direito/Graduação) – (UCB)
______________________________________
Prof. (titulação)
(Curso/Programa) – (sigla da instituição)
___________________________________
Prof. (titulação)
(Curso/Programa) – (sigla da instituição)
Brasília
2013
AGRADECIMENTO
Venho, muito respeitosamente, agradecer à Universidade Católica de Brasília,
pela contribuição na realização desse trabalho, uma vez que me propiciou parte
fundamental dos conhecimentos necessários, através de sua força material e
humana.
Agradeço à Defensoria Pública da União no Distrito Federal de 1ª Categoria,
pela oportunidade de crescimento jurídico e pessoal, expresso de forma mínima
nesta pesquisa.
Agradeço ainda, aos meus pais e amigos, que com as conversas do dia a dia,
e o esforço empenhado em prol do meu amadurecimento, contribuíram com esta
monografia.
RESUMO
MILITÃO, Morgana Souza. A legitimidade da Defensoria Pública para o ajuizamento
da Ação Civil Pública na defesa de interesses coletivos stricto sensu, difusos e
individuais homogêneos. 2013. 71 folhas. Processual. Constitucional (Direito) –
Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2013.
O presente trabalho analisa a legitimidade da Defensoria Pública para defender
direitos coletivos stricto sensu, difusos e individuais homogêneos de quaisquer
espécies, sob o enfoque do microssistema de tutela coletiva, atribuindo aos ramos
processual e constitucional a função de instrumentalização dos direitos contidos na
Constituição Federal, sobretudo o direito ao acesso à justiça. Busca-se a
demonstração de que os parâmetros utilizados para negar a legitimidade à
Defensoria Pública, não mais se sustentam, em razão da processualística coletiva
de caráter eminentemente constitucional. E nesse sentido reconhece-se a
necessidade de expansão do conceito de “necessitados”, contido na Constituição
Federal e em outras leis, bem como da urgência em se amoldar o processo aos
novos direitos de cunho transindividuais. Sendo essa a relação entre o acesso à
justiça
e
a
legitimidade
da
Defensoria
Pública
poder
defender
direitos
metaindividuais, reconhecendo-se que aquele direito depende dessa legitimação.
Por fim, o trabalho conclui ser a Defensoria Pública legitimada à propositura da Ação
Civil Pública para proteger quaisquer direitos, individuais ou coletivos.
Palavras-chave: Acesso à justiça. Necessitados. Defensoria Pública.
ABSTRACT
The presente text analizes the legitimacy of Public Defense to defend collective strict
sense, diffuse and individuals homogeneous rights of any species, under the
microsystem of collective tutelage, attributing in the procedural and constitucional
branch the function of the instrument of rights contained in the federal constitution,
especially the right of justice acess. Its looked the demonstration the parameters
used for that who denying the recount legitimacy to the Public Defense not more selfsupport, in reason of collective processualism of nature eminent constitucional. And
in this sense it is recognized the necessity of expanding of the needy concept
contained in the constitution and the laws, as well as of urgency in to mold the
process in the news rights of stamps transindividual rights, being recognized to that
depend of that legitimacy. Finally the reseach conclude, in fact, to be the Public
Defense legitimate entity to propose the Public Civil Action of any rights, individual or
collectives.
Keywords: Justice acess. Needy. Public Defense.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 6
2 DIREITOS E INTERESSES TUTELADOS pela AÇÃO CIVIL PÚBLICA ............................ 9
2.1 GERAÇÕES DE DIREITOS ............................................................................................. 9
2.1.1 DOS DIREITOS SUBJETIVOS PÚBLICOS DE 1ª GERAÇÃO ...................................................... 9
2.1.1.1 Dos direitos subjetivos públicos de 2ª Geração ........................................................ 11
2.1.1.1.1 Dos direitos subjetivos públicos de 3ª Geração ..................................................... 14
2.2 MICROSSISTEMA DE TUTELA COLETIVA ................................................................... 16
2.2.1 DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS .......................................................................................... 19
2.2.1.1 Direitos difusos ........................................................................................................ 20
2.2.1.1.1 Direitos coletivos stricto sensu .............................................................................. 21
2.2.1.1.1.1 Direitos individuais homogêneos ........................................................................ 21
3 AÇÃO CIVIL PÚBLICA .................................................................................................... 23
3.1 LEGITIMIDADE, LITISCONSÓRCIO E INTERVENÇÃO DE TERCEIROS ..................... 24
3.2 COMPETÊNCIA ............................................................................................................. 27
3.3 PROCEDIMENTO .......................................................................................................... 29
3.4 RECURSOS CABÍVEIS E OUTROS MEIOS DE IMPUGNAÇÃO .................................... 33
3.5 COISA JULGADA........................................................................................................... 35
3.5.1 QUANTO AOS DIREITOS DIFUSOS (ART. 103, I, DO CDC) .................................................. 36
3.5.2 QUANTO AOS DIREITOS COLETIVOS EM SENTIDO ESTRITO (ART. 103, II, DO CDC) ............. 37
3.5.3 QUANTO AOS DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS (ART. 103, III, DO CDC) ..................... 38
3.6 EXECUÇÃO ................................................................................................................... 39
3.7 SUCUMBÊNCIA E LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ .................................................................... 39
3.8 AÇÃO CIVIL PÚBLICA E CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ........................... 39
4 DA DEFENSORIA PÚBLICA ........................................................................................... 41
5 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO
CIVIL PÚBLICA................................................................................................................... 48
5.1 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA
NA DEFESA DE DIREITOS COLETIVOS STRICTO SENSU ............................................... 59
5.2 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA
NA DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS ................................................................................. 59
5.3 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA
NA DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS................................................. 61
6 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 63
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 65
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como tema, a abordagem acerca dos entes
legitimados a defender em juízo, direitos transindividuais. Tema aquele que
está delimitado ao instrumento de tutela coletiva, denominado Ação Civil
Pública (ACP), quando proposta por uma entidade específica, qual seja, a
Defensoria Pública, na defesa de direitos coletivos, difusos e individuais
homogêneos.
A pesquisa tem como objetivo geral fundamentar a afirmação de que a
Defensoria Pública deve ser tida como uma entidade legitimada à propositura
da Ação Civil Pública na proteção de interesses coletivos, difusos e individuais
homogêneos, mediante a amplificação do conceito de “necessitados”,
expressão contida no artigo 134 da Constituição Federal de 1988 (CF/88), bem
como a interpretação que deve ser dada ao art. 5º, inciso LXXIV também da Lei
Maior, primordialmente em razão da evolução dos direitos e do contexto social.
Para defender o posicionamento acima referido, foi escolhido o método
monográfico e delineados objetivos específicos, como a seleção de
jurisprudências, a pesquisa em livros, artigos e dissertações.
O tema escolhido surgiu em virtude de uma experiência pessoal da
estudante, enquanto estagiária da Defensoria Pública da União. Chegou até o
Ofício em que aquela atua o processo nº 0017027-44.2008.4.01.3300
(2008.33.00.017031-9), em que a Defensoria Pública ajuizara uma Ação Civil
Pública em favor de uma coletividade de mulheres que haviam sido aprovadas
em concurso público na primeira fase, mas que quando da segunda etapa, que
compreendia o teste físico, foram eliminadas em virtude de situações
relacionadas à maternidade.
Houve um interesse grande na causa, pois, constatou-se que o processo
chegou ao Superior Tribunal de Justiça sem se discutir o mérito, mas tão
somente se a Defensoria Pública era ou não um ente legitimado para a
propositura da ação intentada.
O tema é de grande importância jurídica, já que visa aumentar as
atribuições de uma entidade constitucionalmente prevista, bem como expandir
o conceito de hipossuficiência. Além de ser útil à solução de problemas
vivenciados pelo Poder Judiciário, como a morosidade.
A pesquisa possui impacto social, já que mais uma entidade pública
legitimada a fazer a defesa da sociedade em causas que envolvem interesses
coletivos e individuais homogêneos, aumentaria o acesso à justiça, logo, a
efetivação dos direitos.
Ademais, a pesquisa busca demonstrar a imprescindibilidade de
resguardar ainda mais os necessitados em sentido amplo, para colocar ao lado
dos estritamente pobres de recursos financeiros, os hipervulneráveis.
Quanto à metodologia utilizada, primeiramente vamos nos ater ao tipo
de pesquisa, que abrange quatro aspectos: a pesquisa do ponto de vista dos
objetivos, da sua natureza, da forma de abordagem do problema, e dos
procedimentos técnicos.
A pesquisa é do ponto de vista de seus objetivos, explicativa, pois visa
demonstrar por que a Defensoria Pública é legitimada para ajuizar a ACP.Do
ponto de vista da sua natureza, a pesquisa é aplicada, já que almeja aumentar
os conhecimentos acerca de processo coletivo e acesso à justiça, tendentes à
solução de problema específico. Envolve verdades e interesses locais, isto é,
adstritos à legislação brasileira.
Sob o prisma da forma de abordagem do problema, a pesquisa é
qualitativa, pois busca apreciar o fenômeno analisado, com base em estudos já
existentes.
O procedimento técnico adotado é o bibliográfico e documental.
O método de abordagem é o dialético, pois confronta os argumentos que
negam a legitimidade da Defensoria, propondo novas interpretações dos fatos
sociais e da lei para se chegar a uma compreensão da realidade, em que caiba
a Defensoria como ente legitimado a propositura da Ação Civil Pública.
O método de procedimento ou auxiliar utilizado é o histórico e o
tipológico, já que para se entender a problemática adotada, faz-se necessário
trilhar pela evolução dos direitos fundamentais, chegando-se ao Estado póssocial que aborda novos direitos de cunho coletivo. O método é histórico ainda,
por fazer-se necessário alocar o papel das instituições no seu contexto
histórico social.
O trabalho está dividido em seis capítulos, que estruturam o trabalho e
convergem todos para o supracitado desiderato, sendo o de nº I destinado a
essa introdução, o II a tratar de direitos coletivos, difusos e individuais
homogêneos, tanto de forma técnica como histórica, o III abrange o instituto da
ação civil pública, o IV discorre acerca da instituição Defensoria Pública,
explicando suas raízes conceituais, previsão constitucional regulamentação por
lei complementar e parâmetros de atuação, o V cuida precipuamente do tema
em tela, servindo os capítulos anteriores de subsídio para orientar o leitor e
fundamentar a problemática, e um VI capítulo com as conclusões da estudante.
9
2 DIREITOS E INTERESSES TUTELADOS PELA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Para uma compreensão mais exata do que se almeja expor com esse
trabalho, impende examinar os direitos coletivos, difusos e individuais
homogêneos, de acordo com sua natureza e origem, bem como o
microssistema de tutela coletiva em que estão inseridos.
2.1 GERAÇÕES DE DIREITOS
Valério de Oliveira Mazzuoli (2007, p. 676) ensina que:
Costuma-se normalmente dividir os direitos humanos
fundamentais em três gerações ou categorias, com base no
decorrer dos momentos históricos que inspiraram a sua
criação. Alguns autores falam em dimensões de direitos
humanos, partindo da idéia [sic] de que a expressão gerações
poderia dar a falsa idéia [sic] de que uma categoria de direitos
substitui outra que lhe é anterior.
Apesar disso, utilizaremos o termo geração.
2.1.1 Dos direitos subjetivos públicos de 1ª Geração
Os direitos subjetivos públicos, isso é, a possibilidade de se exigir algo,
em razão do ordenamento jurídico, estão divididos em gerações.
Os direitos subjetivos públicos de 1ª Geração originam-se no chamado
Estado Liberal, que se desenvolveu na França e nos Estados Unidos, na
segunda metade do século XVIII, com a ascensão da burguesia e do
liberalismo, em detrimento das monarquias absolutistas. Houve nesse
momento uma separação entre os interesses públicos e privados.
A doutrina liberal, pensada pelos filósofos iluministas, sobretudo por
Adam Smith, responsável pela Teoria do Liberalismo (ALGO SOBRE 2013) , vê
o Estado com um “mal necessário”, no sentido de que ele deve intervir o menos
possível nos interesses privados dos seus cidadãos, devendo apenas fazer o
seu papel de manter a ordem jurídica interna, e defender o país no plano
internacional.
Para tanto, fez-se necessária a criação de um sistema de freios e
contrapesos, o que se deu por meio da tripartição dos poderes. Ressalte-se,
porém, sobre o ponto de vista defendido nesta pesquisa, que o apego cego à
tripartição de funções, pode culminar na mecanização do papel do jurista, a
quem caberia tão somente aplicar as normas, sem valorá-las de acordo com
fundamentos políticos e sociais.
10
O Estado Liberal tem como objetivo, basicamente, a racionalização e o
limite do poder. E é por isso que se diz que ele era um “estado negativo”. É que
o Estado liberal estava preocupado em limitar o poder estatal, consagrando
direitos, liberdades e garantias do cidadão perante o Estado. Pois só assim a
ideologia burguesa poderia existir, já que tinha como premissas a autonomia
privada, economia de mercado, valores fundamentais do individualismo
possessivo etc.
As pessoas, isto é, os burgueses não queriam que o Estado interferisse
na sua propriedade e negócios. Eles queriam um Estado que assegurasse a
eles poder usufruir dos seus bens, sem incômodos.
O liberalismo construiu a base política da ciência do direito nos séculos
XIX e XX, orientando as construções teóricas produzidas, logo, a prática dos
juristas. Dessa forma, a atenção das leis estava voltada, primordialmente, para
a propriedade privada e suas garantias.
O liberalismo centra suas atenções no indivíduo, tem-se, pois, uma visão
individualista da sociedade. Para Norberto Bobbio (2005, p. 45/46), “o
liberalismo considera o Estado como um conjunto de indivíduos e como
resultado da atividade deles e das relações por eles estabelecidas entre si”.
Ainda segundo o mencionado autor,
o liberalismo é uma doutrina do Estado limitado tanto com
respeito aos seus poderes quanto às suas funções. A noção
corrente que serve para representar o primeiro é Estado de
direito; a noção corrente para representar o segundo é Estado
mínimo. (BOBBIO, 2005, p. 17).
Assim, os direitos subjetivos públicos, ou hodiernamente, direitos
fundamentais de 1ª geração, que advém desse período, são os civis e os
políticos.
Os direitos civis são justamente aqueles que visam à proteção da
pessoa individual contra os possíveis excessos do Poder Público, e os direitos
políticos por sua vez, são consequência da derrubada das monarquias, que
aumentou a participação dos cidadãos no governo e no Estado.
Esses direitos estão previstos na Declaração Universal dos Direitos do
Homem (ONU, 2013), e foram acolhidos pelo ordenamento jurídico brasileiro,
pelo que constam nos artigos. 5º e 14, respectivamente, da Constituição
Federal. (BRASIL, 1988)
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Estão entre aqueles, no plano dos direitos civis, o direito à vida; à
liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade, etc, e no plano dos direitos
políticos referem-se ao direito de eleger e ser eleito, de votar etc.
2.1.1.1 Dos direitos subjetivos públicos de 2ª Geração
Os direitos subjetivos públicos de 2ª Geração, ou simplesmente direitos
sociais, têm início no Estado Social também conhecido como Welfare State,
Estado do Bem Estar Social, Estado Prestacional, etc.
Na segunda metade do século XIX e início do século XX, alguns fatos
históricos, alteraram significativamente o contexto social da época, entre eles
estão: A Segunda Revolução Industrial e a Revolução Russa, o avanço das
ideias socialistas de Marx e Engels, e a Primeira Guerra Mundial.
Com o advento da indústria, os sacrifícios e o sofrimento pelos quais
passavam as populações nas fábricas poderia levar o mundo desenvolvido a
uma segunda Revolução Francesa.
Na obra Manifesto do Partido Comunista, Marx e Engels (1848, p. 45/52)
descrevem, embora de forma não imparcial, esse momento como a sucessão
da sociedade feudal pela burguesa. Sociedade burguesa essa, que não pôs
termo às diferenças sociais, mas criou uma nova forma de opressão, dividindo
a sociedade em dois polos inimigos, um pertencente à burguesia e outro ao
proletariado. Veja-se:
A moderna sociedade burguesa, surgida das ruínas da
sociedade feudal, não eliminou os antagonismos entre as
classes. Apenas estabeleceu novas classes, novas condições
de opressão, novas formas de luta em lugar das antigas. A
nossa época, a época da burguesia, caracteriza-se, entretanto,
por ter simplificado os antagonismos de classe. A sociedade
inteira vai-se dividindo cada vez mais em dois grandes campos
inimigos, em duas grandes classes diretamente opostas entre
si: burguesia e proletariado [...] a própria burguesia moderna é
o produto de um longo processo de desenvolvimento, de uma
série de revoluções nos modos de produção e de troca [...] o
poder político do Estado moderno nada mais é do que um
comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe
burguesa [...] a burguesia rasgou o véu de comovente
sentimentalismo que envolvia as relações familiares e as
reduziu a meras relações monetárias [...] a contínua revolução
da produção, o abalo constante de todas as condições sociais,
a incerteza e a agitação eternas distinguem a época burguesa
de todas as precedentes. Todas as relações fixas e
cristalizadas, com seu séquito de crenças e opiniões tornadas
veneráveis pelo tempo, são dissolvidas, e as novas
envelhecem antes mesmo de se consolidarem. Tudo o que é
sólido e estável se volatiliza, tudo o que é sagrado é profanado,
e os homens são finalmente obrigados a encarar com
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sobriedade e sem ilusões sua posição na vida, suas relações
recíprocas [...] a necessidade de mercados cada vez mais
extensos para seus produtos impele a burguesia para rodo [sic]
o globo terrestre. Ela deve estabelecer-se em toda parte,
instalar-se em toda parte, criar vínculos em toda parte [...] em
lugar da antiga auto-suficiência e do antigo isolamento local e
nacional, desenvolve-se em todas as direções um intercâmbio
universal, uma universal interdependência das nações. E isso
tanto na produção material quanto na intelectual. Os produtos
intelectuais de cada nação tornam-se patrimônio comum [...] a
burguesia suprime cada vez mais a dispersão dos meios de
produção, da propriedade e da população. Aglomerou a
população, centralizou os meios de produção e concentrou a
propriedade em poucas mãos. A consequência necessária
disso foi a centralização política. Províncias independentes,
ligadas entre si quase que só por lações confederativos, com
interesses, leis, governos e tarifas aduaneiras diferentes, foram
reunidas em uma só nação, com um só governo, uma só
legislação, um só interesse nacional de classe, uma só barreira
alfandegária [...] quanto menos habilidade e força exige o
trabalho manual, quer dizer, quanto mais a indústria moderna
se desenvolve, mais o trabalho dos homens é suplantado pelo
das mulheres e crianças. As diferenças de sexo e idade não
têm mais valor social para a classe operária. Ficam apenas
instrumentos de trabalho, cujo custo varia conforme a idade e o
sexo.
A própria burguesia advém de um longo processo de desenvolvimento e
de revoluções, no que diz respeito aos modos de produção e troca.
O poder estatal, nesse momento, servia tão somente para administrar e
cuidar dos negócios e patrimônio da classe burguesa.
A burguesia foi também responsável por profundas transformações nas
relações sociais e familiares, já que o homem tem de se voltar cada vez mais
para um mercado extremamente exigente.
As relações de mercado alastram-se por todo o mundo, instalando-se
em toda parte, tornando as nações cada vez mais interdependentes. E
acentua-se, as diferenças entre pobres e abastados, com as riquezas cada vez
mais centralizadas nas mãos de poucos.
Desse modo, tornou-se insustentável o abuso das classes mais ricas
sobre a classe operária. Uns com tanto e outros em estado de miséria e
exploração.
Nesse momento, a sociedade passa a exigir/implorar do Estado que
tome providências capazes de melhorar a vida das pessoas.
Quando do estudo dos direitos sociais e de como se deu sua conquista,
vemos a pertinência do pensamento de Norberto Bobbio, para quem os direitos
do homem são históricos, ainda que eminentemente fundamentais, pois
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nascem em dados momentos, marcados por lutas e indignações contra
poderes estabelecidos, na busca por reconhecimentos. E não nascem de forma
rápida, mas lenta, além de que não se esgotam, mas estão sempre em
transformação.
Do ponto de vista teórico, sempre defendi – e continuo a
defender, fortalecido por novos argumentos – que os direitos
do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos
históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias,
caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra
velhos poderes, e nascidos de forma gradual, não todos de
uma vez e nem de uma vez por todas. (BOBBIO, 1909 p. 25).
Surge, então, o chamado Estado Social, no qual o Poder público antes
inerte passa a atuar de forma positiva, agindo de maneira a diminuir as tensões
sociais e as desigualdades.
Nesse contexto, foram promulgadas a Constituição do México de 1917 e
a Constituição de Weimar de 1919, pequena cidade alemã, onde os
constituintes se reuniram com vistas a minimizar os conflitos vividos em Berlim.
(PINHEIRO, 2005).
Constrói-se assim, uma nova concepção do Estado, como intermediador
das relações sociais. O Estado serviria a todas as classes, conciliando e
pacificando os conflitos sociais, tornando possível a convivência entre capital e
trabalho.
Os direitos fundamentais de 2ª geração são ditos direitos positivos,
porque se caracterizam como prestações do Estado, que podem ser exigidas
pelas pessoas, essas detém um crédito com o Poder Público.
Conforme ensina José Afonso da Silva (1998, P. 289), direitos sociais
são,
prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou
indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que
possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos,
direitos que tendem a realizar a igualização de situações
sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito
de igualdade.
Os direitos sociais foram acolhidos pela Constituição brasileira no seu
art. 6º, em que se estabelece que “são direitos sociais a educação, a saúde, a
alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social,
a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”
(BRASIL, 1988).
14
2.1.1.1.1 Dos direitos subjetivos públicos de 3ª Geração
Os direitos fundamentais de 3ª geração, por sua vez, que são o foco do
presente capítulo, são também chamados de direitos de solidariedade ou de
fraternidade.
Nesse sentido leciona Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1999, p. 15):
[...] a doutrina dos direitos fundamentais revelou uma grande
capacidade de incorporar desafios. Sua primeira geração
enfrentou o problema do arbítrio governamental, com as
liberdades públicas, a segunda os extremos desníveis sociais,
com os direitos econômicos e sociais, a terceira, hoje, luta
contra a deteriorização da qualidade de vida humana e outras
mazelas, com os direitos de solidariedade. (grifo nosso).
Esses
direitos
decorrem
dos
efeitos
da
globalização
e
da
internacionalização, em que se admite ser o indivíduo parte de uma
coletividade.
Os direitos de solidariedade não se restringem à satisfação de um único
indivíduo, mas de muitos. Exigem, portanto, que haja uma cooperação
internacional para a sua implementação, requer o empenho de toda a
comunidade global para efetivá-los.
Os direitos de 3ª geração estão ligados a toda uma comunidade ou
coletividade, e são chamados de direitos coletivos e difusos, tanto por conta da
natureza dos novos direitos, como pela consideração dos indivíduos enquanto
seres pertencentes a determinados contextos sociais.
Bobbio (1909, p. 21 e 83) descreve os direitos do homem como sendo
um “fenômeno social”, que pode ser examinado de forma multidisciplinar. E é,
sobretudo, pelo enfoque da sociologia jurídica que o autor explica a passagem
histórico-social que trouxe a sociedade até os “novos direitos”.
Também os direitos do homem são, indubitavelmente um
fenômeno social: e, entre os vários pontos de vista de onde
podem ser examinados (filosófico, jurídico, econômico, etc.), há
lugar para o sociológico, precisamente o da sociologia jurídica.
Essa multiplicação (ia dizendo “proliferação”) ocorreu de três
modos: a) porque aumentou a quantidade de bens
considerados merecedores de tutela; b) porque foi estendida a
titularidade de alguns direitos típicos a sujeitos diversos do
homem; c) porque o próprio homem não é mais visto na
especificidade ou na concreticidade de suas diversas maneira
de ser em sociedade, como criança, velho, doente, etc. Em
substância: mais bens, mais sujeitos, mais status do indivíduo.
É supérfluo notar que, entre esses três processos, existem
relações de interdependência: o reconhecimento de novos
direitos de (onde “de” indica sujeito) implica quase sempre o
aumento de direitos a (onde “a” indica o objeto). Ainda mais
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supérfluo é observar, o que importa para nossos fins, que todas
as três causas dessa multiplicação cada vez mais acelerada
dos direitos do homem revelam, de modo cada vez mais
evidente e explícito a necessidade de fazer referência a um
contexto social determinado. Com relação ao primeiro
processo, ocorreu a passagem dos direitos de liberdade – das
chamadas liberdades negativas, de religião, de opinião, de
imprensa, etc. – para os direitos políticos e sociais, que
requerem uma intervenção direta do Estado. Com relação ao
segundo, ocorreu a passagem da consideração do indivíduo
humano uti singulus, que foi o primeiro sujeito ao qual se
atribuíram direitos naturais (ou morais) – em outras palavras,
da “pessoa” - , para sujeitos diferentes do indivíduo, como a
família, as minorias étnicas e religiosas, toda a humanidade em
seu conjunto (como no atual debate, entre filósofos da moral,
sobre o direito dos pósteros à sobrevivência); e, além dos
indivíduos humanos considerados singularmente ou nas
diversas comunidades reais ou ideais que os representam, até
mesmo para sujeitos diferentes dos homens, como os animais.
Nos movimentos ecológicos, está emergindo quase que um
direito da natureza a ser respeitada ou não explorada, onde as
palavras “respeito” e “exploração” são exatamente as mesmas
usadas tradicionalmente na definição e justificação dos direitos
dos homens. Com relação ao terceiro processo, a passagem
ocorreu do homem genérico – do homem enquanto homem –
para o homem específico, ou tomado na diversidade de seus
diversos status sociais, com base em diferentes critérios de
diferenciação (o sexo, a idade, as condições físicas), cada um
dos quais revela diferenças específicas, que não permitem
igual tratamento e igual proteção. A mulher é diferente do
homem; a criança, do adulto; o adulto do velho; o sadio, do
doente; o doente temporário, do doente crônico; o doente
metal, dos outros doentes; os fisicamente normais, dos
deficientes, etc. Basta examinar as cartas de direitos que se
sucederam no âmbito internacional, nestes últimos quarenta
anos, para perceber esse fenômeno: 1952, a Convenção sobre
os Direitos Políticos da Mulher; em 1959, a Declaração da
Criança; em 1971, a Declaração dos Direitos dos Deficientes
Físicos; em 1982, a primeira Assembléia Mundial, em Viena,
sobre os direitos dos anciãos, que propôs um plano de ação
aprovado por uma resolução da Assembléia da ONU, em 3 de
dezembro.
O jusfilósofo explica que a multiplicação de direitos ocorreu de três
modos, primeiro porque aumentaram os bens dignos de proteção, segundo
porque essa proteção de alguns direitos típicos passou a abranger sujeitos
outros que não o homem, e terceiro, porque o homem passou a ser
considerado em suas diversas formas de ser em sociedade.
Bobbio (1909) explica, que os três processos acima mencionados são
interdependentes, pois o aumento de bens aumenta os sujeitos detentores de
direitos, e consequentemente os status do indivíduo.
O autor expõe ainda, que as três causas que embasaram a proliferação
de direitos, estão ligadas a um “contexto social determinado”.
16
Assim, no que diz respeito ao terceiro processo, BOBBIO diz que
ocorreu uma passagem do “homem genérico”, para o “homem específico”, isto
é, considerado nos diversos status sociais que ocupa, ou seja, do homem tido
com base no que o diferencia dos demais, com o objetivo de dar igual
tratamento e proteção aos sujeitos, a fim de que igualados, tenham as mesmas
condições.
Em nossa atual Constituição (CF/88), o postulado da igualdade recebeu
status de garantia fundamental, na forma do caput do art. 5º da Constituição
Federal, que assim preceitua: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade [...]”. (BRASIL, 1988).
2.2 MICROSSISTEMA DE TUTELA COLETIVA
O ordenamento jurídico brasileiro foi sensível às mudanças de
paradigmas históricos sociais e passou a tutelar os direitos transindividuais, de
forma significativa, com a Lei da Ação Civil Pública, para depois agregar ao seu
conjunto normativo, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90),
nascendo dessa forma um dos temas mais estudados e debatidos pelos
grandes estudiosos do direito: o processo civil coletivo. Veja-se:
O problema do acesso à justiça alcançou um ponto crucial com
o surgimento dos conflitos de massa, resultantes dos próprios
avanços sociais e do estágio alcançado pela economia no
mundo globalizado. Percebeu-se a inviabilidade da resolução
de conflitos meramente individuais, especialmente quando há
interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos
envolvidos. No Brasil, houve significativo avanço legislativo nos
últimos 45 anos, a partir da edição da Lei de Ação Popular
(1965), da Lei Ação Civil Pública (1985), bem como do Código
de Proteção e Defesa do Consumidor (1990). (CAMBI;
DAMASCENO, 2011, p. 29).
Os processos coletivos se diferenciam do processo tradicional, por
trazerem eu seu contexto aspectos eminentemente democráticos. Sabe-se que
o direito processual é uno, uma vez que é regido por uma teoria geral. No
entanto, os conflitos que advieram dos avanços sociais ultrapassam a esfera
do indivíduo, e assim “deram ensejo à construção de um novo ramo dentro da
ciência processual” (CAMBI; DAMASCENO, 2011, p. 37).
O processo coletivo possui escopo constitucional, isto é, o processo
coletivo pertence à processualística constitucional, podendo ser chamado de
17
um “direito processual constitucional” (ALMEIDA, 2003, p. 17 apud CAMBI;
DAMASCENO, 2011, p. 37) em razão de sua conotação social.
Isso porque o processo coletivo visa solucionar pretensões que
envolvem direitos dispersos no meio social, sob a titularidade
de grupos de indivíduos não identificáveis ou identificáveis,
com uma natureza comum ou uma relação jurídica básica
comum, bem como veicular pretensões de cunho individual,
mas oportunamente tuteladas de forma comum. [...] o processo
coletivo traz, por sua própria natureza, resultados sociais
impactantes no seio da sociedade, não se podendo restringir
os mecanismos processuais que permitam a participação
democrática dos cidadãos na efetivação dos direitos
socialmente relevantes [...] O processo coletivo é, por sua vez,
expressão democrática e pluralista, porque configura
importante instrumento de tutela jurisdicional de interesses
transindividuais
e
individuais
homogêneos.
(CAMBI;
DAMASCENO, 2011, p. 37 e 32 – grifo nosso).
Como já dito, o processo coletivo não foge a principiologia da teoria
geral do processo, no entanto, possui outros princípios que lhe são próprios.
O professor Tiago Feinsterseifer, Defensor Público no estado de São
Paulo, em sua aula sobre Teoria Geral da Ação Civil Pública, para o Programa
Saber
Direito,
discorreu
acerca
daqueles
princípios,
são
eles:
(FEINSTERSEIFER, 2013).
1) Princípio do Acesso à Justiça, que abrange três aspectos, de acordo
com as três ondas renovatórias de Mauro Cappelletti, a) o acesso à
justiça das pessoas necessitadas; b) caracterização dos direitos
coletivos e difusos – o processo civil tem que criar mecanismos para
trabalhar esses direitos; c) a própria questão da efetividade do processo.
2) Princípio da Universalização da Jurisdição;
3) Princípio da Participação Popular ou Social no Processo Coletivo;
4) Princípio do Impulso Oficial, que possui relação com o ativismo judicial,
isto
é,
superação
do
juiz
exegeta,
que
não
detinha
grande
responsabilidade social. O juiz, de acordo com esse princípio, deve estar
vinculado à Constituição Federal, isto é, aos direitos fundamentais,
buscando a resolução dos conflitos.
5) Princípio da Economia Processual, este princípio está associado à
segurança jurídica, pois visa evitar a multiplicação de entendimento
diversos acerca do mesmo assunto, traz maior previsibilidade das
decisões judiciais.
18
6) Princípio da Instrumentalidade das Formas, o processo tem que estar à
serviço do direito material, possibilitando a efetivação desses direitos.
7) Princípio da Não-taxatividade dos objetos e dos meios – art. 1º da ação
civil pública, “entre outros”, art. 5º, § 2º da Constituição Federal (abertura
do catálogo de direitos fundamentais), art. 129, III da CF (atuação do
Ministério Público na tutela coletiva).
8) Princípio da Adequada Representação. 9) Princípio do Critério Dinâmico
da Distribuição da Prova (art. 6º, VIII do CDC – inversão do ônus da
prova).
É importante, dessa forma, que se compreenda que existe, embora de
maneira não codificada, um microssistema de tutela coletiva, sendo que uma
lei
faz
referência
à
outra,
expressamente,
havendo
assim,
uma
complementação de conceitos. (LIMA, 2011).
Assim, a LACP não é o único diploma normativo disciplinador das
demandas coletivas. Temos de um lado a Lei nº 7.347/85, e do outro o Código
de Defesa do Consumidor (CDC), essas duas leis têm aplicabilidade em toda e
qualquer demanda coletiva, formando um verdadeiro “ordenamento processual
geral” (GIDI, 1995. p. 77), de processo coletivo, tendo em vista as normas
remissivas que contém.
Assim, veja-se o quanto determina a Lei da Ação Civil Pública, no seu
artigo 21: “aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e
individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da Lei que instituiu o
Código de Defesa do Consumidor”. (BRASIL, 1985).
E o Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 90, dispõe que:
aplicam-se às ações previstas neste título as normas do
Código de Processo Civil e da Lei nº 7.347, de 24 de julho de
1985, inclusive no que respeita ao inquérito civil, naquilo que
não contrariar suas disposições. (BRASIL, 1990).
Temos, pois, que uma norma se aplica de forma complementar à outra:
as disposições do CDC a respeito do processo coletivo
aplicam-se à ação civil pública e também às diversas ações
coletivas propostas em defesa de direitos difusos, coletivos em
sentido estrito e individuais homogêneos, constituindo, assim,
um microssistema processual coletivo.(CERQUEIRA, 2007, p.
58 apud DONIZETTI, 2010, p. 209).
Dessa forma, há um conjunto de leis que tratam das ações coletivas e
que fazem referências recíprocas entre si.
19
Uma das principais finalidades do processo coletivo é a racionalização
das demandas multitudinárias, evitando-se a proliferação de processos
autônomos, e permitindo-se que em um único processo sejam decididas, a um
só tempo, questão idêntica que interessam a muitas pessoas. Tornando os
trabalhos do Poder Judiciário mais eficiente, além de evitar decisões
contraditórias proferidas por diversos juízos.
Esse é o entendimento de José Antônio Savaris (2008, p. 122):
Não parece nem um pouco racional condicionar a restauração
do ordenamento jurídico em tese violado pela Administração
Previdenciária ao ajuizamento de demandas individuais,
quando uma única ação coletiva seria suficiente. Imagine-se o
insondável volume de inútil trabalho a que tem sido o Judiciário
chamado a realizar [...] quantas vigílias, quantos mutirões,
quanta falsa expectativa gerada, quanta distração na verdade.
Assim, existe de fato, um microssistema de tutela coletiva que se
comunica, e autoriza que todo e qualquer direito coletivo stricto sensu, difuso
ou individual homogêneo seja pleiteado por meio da Ação Civil Pública.
2.2.1 Direitos transindividuais
Verifica-se que o CDC, no seu art. 81, parágrafo único, definiu as
seguintes espécies de direitos coletivos:
I – interesses ou direitos difusos, entendidos como
transindividuais de natureza indivisível, de que sejam titulares
pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II – interesses ou direitos em sentido estrito, assim entendidos
os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular
grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com
a parte contrária por uma relação jurídica base;
III – interesses ou direitos individuais homogêneos, que, apesar
de essencialmente individuais, são tratados coletivamente, em
virtude da sua origem comum. (BRASIL, 1990).
Soma-se a essa definição, três critérios básicos que considera
essenciais para definir um direito transindividual como sendo difuso, coletivo
em sentido estrito ou individual homogêneo, são eles: a titularidade,
divisibilidade e origem. (DONIZETTI, 2010).
A titularidade é o critério utilizado para determinar a quem o direito se
estende, isto é, quem são os seus titulares. Se o direito pertence a uma
comunidade (direitos difusos), coletividade (direitos coletivos em sentido estrito)
ou um grupo de indivíduos tidos de forma homogênea (direitos individuais
homogêneos).
20
A divisibilidade, por sua vez, busca aferir se o direito em questão pode
ser dividido por entre seus titulares (direitos individuais homogêneos) ou não
(direitos difusos e coletivos em sentido estrito).
O critério da origem busca a raiz pela qual os titulares de um direito
estão ligados, se for por uma mesma situação de fato, estar-se-á diante de
direitos difusos e individuais homogêneos, se por uma relação jurídica base, se
está a tratar de direitos coletivos em sentido estrito.
Pois bem, entendidas essas considerações preliminares, iremos
adentrar no tema desse capítulo.
2.2.1.1 Direitos difusos
Os direitos difusos, considerados subjetivamente, se caracterizam pela
indeterminação absoluta dos titulares, assim, não possuem titular individual, e a
ligação entre os demais titulares do direito considerado, se dá por mera
circunstância de fato. Já sobre o prisma objetivo são indivisíveis, ou seja, o
direito em questão, uma vez satisfeito ou lesado atinge a todos os titulares,
exemplo é o direito ao meio ambiente presente na Constituição Federal em seu
art. 225, caput:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988).
Em razão de sua natureza, os direitos difusos não podem integrar o
patrimônio individual de alguém, são insuscetíveis de transmissão, renúncia ou
transação. Sendo esses direitos, por essência, extrapatrimoniais.
Assim
sendo,
a
característica
marcante
e
identificadora
da
transindividualidade presente tanto nos direitos difusos como coletivos stricto
sensu, é a multiplicidade indeterminada de sujeitos que aspiram uma mesma
pretensão individual.
Quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 163231-3/SP, o
Ministro Maurício Corrêa, então relator, salientou no seu voto a antiguidade do
termo difuso, que tem sua origem na doutrina romanística.
Como se sabe o termo difuso, já do domínio público nos dias
de hoje, não foi criado modernamente, visto que tem a sua
origem na doutrina romanística. Vittorio Scialoja já se referia ao
conceito de difuso, no século passado, ao mencionar que
‘direitos difusos, que não se concentram no povo considerado
21
como entidade, mas que tem por próprio titular realmente cada
um dos participantes da comunidade’ (Procedura Civile
Romana, Anonima Romana Edtoriale, Roma 1932, parágrafo
69, pág. 345). Àquela ocasião, todavia, não se havia
estabelecido a diferença entre direitos difusos e coletivos, não
obstante alguns desses direitos sendo coletivos fossem
rotulados implicitamente como difusos. Por isso mesmo
Massimo Villone já houvesse concebido que interesse difuso é
‘uma personagem absolutamente misteriosa’. (La Colocazzione
Instituzionale dell’interesse difuso in La Tutela Degli Interessi
Difusi nel Dirito Comparato, Giufré, Milão, 1976, pág. 73).
2.2.1.1.1 Direitos coletivos stricto sensu
Diferentemente do que ocorre nos direitos difusos em que a ligação dos
indivíduos se dá por uma circunstância de fato, os direitos coletivos stricto
sensu, apesar de também serem indivisíveis, agregam os seus titulares por
meio de uma relação jurídica base, permitindo a identificação dos grupos, mas
não a individualização dos sujeitos pertencentes a eles. Elton Venturi (2007, p.
57) lembra de forma simples que “não podem as pretensões genuinamente
coletivas ser identificáveis em relação a apenas alguns dos membros da
classe, pois são comuns a toda uma categoria, grupo ou classe social”.
Assim, se uma coletividade de advogados está a pleitear um
determinado direito, identificamos um grupo que se apresenta como tal, e não
como advogados individualmente considerados.
Ensina Rodolfo de Camargo Mancuso (2000, p. 147) que:
Não há propriamente uma diferença de essência ou de
natureza entre esses dois tipos de interesses: ambos integram
o gênero ‘meta-individual’: a particularidade está em que um
interesse difuso pode torna-se ‘coletivo’ se e quando estiver
revestido do grau de definição, coesão e organização desses
últimos.
Note-se, a propósito, que a relação jurídica base, disposto no inciso II do
já mencionado art. 81 do CDC, é o liame existente entre os titulares dos direitos
coletivos, dessa forma, deve preexistir à lesão.
2.2.1.1.1.1 Direitos individuais homogêneos
Os direitos individuais homogêneos por sua vez, não possuem o caráter
de transindividualidade que caracterizam os difusos e coletivos stricto sensu,
tampouco a indivisibilidade do objeto material, aqui os direitos individuais
existem antes da sua postulação conjunta, são, portanto, quaisquer direitos e
não decorrem de uma circunstância de fato, ou de uma relação jurídica base,
mas são direitos que advém de uma origem comum.
22
Assim, conforme explica Teori Albino Zavascki (2009, p. 34/35)
Há, é certo nessa compreensão uma pluralidade de titulares,
como
ocorre
nos
direitos
transindividuais;
porém,
diferentemente desses (que são indivisíveis e seus titulares são
indeterminados), a pluralidade, nos direitos individuais
homogêneos não é somente dos sujeitos (que são indivíduos
determinados), mas também do objeto material, que é divisível
e pode ser decomposto em unidades autônomas com
titularidade própria. [...] quando se fala, pois, em “defesa
coletiva” ou em “tutela coletiva” de direitos homogêneos, o que
se está qualificando como coletivo não é o direito material
tutelado, mas sim o modo de tutelá-lo, o instrumento de sua
defesa.
Então, no que diz respeito aos direitos individuais homogêneos, o que se
têm é uma verdadeira tutela coletiva de direitos, os direitos individuais aqui
considerados, têm maior chance de efetivação, se pleiteados de forma
homogênea, além de tornar a prestação jurisdicional mais célere e racional.
É que alguns direitos, muito embora essenciais, encontram entraves
sociais, econômicos e políticos, quando se busca a sua apreciação pelo Poder
Judiciário, sendo diretamente atingidos pela morosidade.
Como bem diz Elton Venturi (2007, p. 69),
[...] quando da análise do novo modelo de proteção dos direitos
individuais homogêneos [...] excepcionalmente concebida pelo
sistema processual para incentivar a justiçabilidade de tais
pretensões, que não fosse a via coletiva, jamais ou dificilmente
seriam sequer levadas à apreciação jurisdicional. (p. 69).
Basta que se imagine um consumidor lesado, que depois de várias
tentativas de resolver o seu problema, busca uma resposta do Judiciário; ora a
sua pretensão é de caráter ínfimo, se considerarmos a magnitude de processos
e lides que abarrotam o Judiciário. Se, no entanto, estivermos diante de uma
ação movida de forma homogênea por centenas ou milhares de consumidores
lesados, certamente ao Código de Defesa do Consumidor será dada maior
efetividade.
23
3 AÇÃO CIVIL PÚBLICA
A Ação Civil Pública é espécie do gênero Ações Coletivas. E como
lembra Maria Fátima Vaquero Ramalho Leyser (2004), difícil é a conceituação
dessa modalidade de ação, já que quando se trata delas, se está diante de um
tema peculiar, uma vez que estão inseridas em um microssistema próprio, cujo
fim é propiciar acesso à Justiça.
Teresa Arruda Alvim (1994, p. 273 apud LEYSER, 2004, p. 19)
preleciona que ações coletivas “são aquelas por meio das quais se defendem
direitos coletivos lato sensu, ou seja, direitos difusos, coletivos em sentido
estrito, e individuais homogêneos”.
LEYSER (2004) esclarece que houve uma evolução das ações coletivas
no Brasil, sendo a primeira delas a Ação Popular, regulada pela Lei nº 4.717,
de 29 de junho de 1965, que permitiu aos cidadãos buscar o Judiciário para
fazer cessar atos lesivos ou potencialmente lesivos da Administração Pública.
Conforme ensina Alcides A. Munhoz da Cunha (1995, p. 227 apud
LEYSER, 2004, p. 227) no trabalho intitulado “Evolução das Ações Coletivas no
Brasil”:
A ação popular, todavia, “a despeito de representar a vanguarda da
proteção dos interesses metaindividuais, hoje qualificados como
difusos e coletivos, em sentido estrito, não era suficiente para
assegurar uma efetiva tutela dos interesses metaindividuais, diante da
complexidade e multiplicidade cada vez mais crescente das relações
sociais. Objetivamente, a insuficiência da ação popular se manifestava,
porque tradicionalmente, através dela, somente os interesses
metaindividuais pertinentes à preservação do patrimônio público seriam
passíveis de tutela, pelo menos até o advento da Constituição de 1988.
Não ficavam abrangidos pela ação popular os interesses
metaindividuais de membros de grupos ou coletividades pertinentes à
proteção da infância e juventude, consumidores, classe de
trabalhadores etc, havendo surgido dúvidas se era possível incluir no
conceito de patrimônio público a defesa de interesses pertinentes à
saúde pública, segurança pública, meio ambiente etc.”.
Assim, antes da edição da Lei da Ação Civil Pública, não se tinha
instrumentos suficientes para a demanda de interesses difusos e coletivos.
A Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, “disciplina a ação civil pública de
responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a
bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, e paisagístico (...)”.
(BRASIL, 1985).
Porém, como explica Elpídio Donizetti (2010, p. 208):
24
esse rol de direitos passíveis de tutela pela via da ação civil
pública foi ampliado por outras leis a fim de abranger qualquer
interesse difuso ou coletivo (incisos I a VI do art. 1º da Lei nº
7.347/85), de maneira que, hoje, pode-se dizer que a ação civil
pública é a demanda coletiva de maior importância no
ordenamento jurídico brasileiro.
A LACP no seu artigo 5º (BRASIL, 1985), com o fito de ampliar não
somente os direitos que podem ser tutelados pela via da referida ação, mas
também o objeto da mesma, com a redação que lhe foi conferida pela Lei nº
11.448, de 15 de janeiro de 2007, expandiu ainda, o rol dos entes legitimados a
propositura da ACP. Assim, são legitimados à propositura da ação principal e
da ação cautelar, visando à proteção de interesses coletivos e difusos, o
Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios, a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de
economia mista, e a associação que atender aos requisitos da lei.
3.1 LEGITIMIDADE, LITISCONSÓRCIO E INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
A legitimidade para o ajuizamento da ação civil pública é, conforme
explicitado no item anterior, atribuída, por força do art. 5º da LACP: I – ao
Ministério Público; II – à Defensoria Pública; III – à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios; IV – a autarquia, empresa pública, fundação
ou sociedade de economia mista; e, por último, V – à associação que,
concomitantemente, esteja constituída há pelo menos um ano nos termos da lei
civil e inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio
ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao
patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Dessa forma, as
associações devem demonstrar o requisito da pertinência temática. (BRASIL,
1985).
O § 4º do referido dispositivo de lei, diz que o magistrado pode afastar o
requisito da pré-constituição, em favor do “manifesto interesse social” ou pela
“relevância do bem jurídico a ser protegido”. In verbis:
O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz,
quando haja manifesto interesse social, evidenciado pela
dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem
jurídico a ser protegido. (BRASIL, 1985).
Pode ser acrescentada a esse rol, a Ordem dos Advogados do Brasil,
especificamente no que diz respeito aos interesses coletivos dos advogados,
com fundamento no art. 54, II, da Lei nº 8.906/94, bem como as entidades e os
25
órgãos da administração pública, direta e indireta, ainda que despersonificadas,
na defesa exclusiva dos interesses e direitos previstos no CDC (art. 82, III, do
CDC). (DONIZETTI, 2010).
Muito se discute na doutrina qual a natureza jurídica da legitimidade
para as ações coletivas, prevalecendo a posição que aduz tratar-se de
legitimação extraordinária, isso é, propor em nome próprio direito alheio.
Dispõe o art. 6º do Código de Processo Civil que “ninguém poderá pleitear, em
nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei”. (BRASIL, 1973,
grifo nosso).
Elpídio Donizetti (2010, p. 212) esclarece que:
Entendem alguns, todavia, que pode haver legitimação
ordinária, caso a entidade atue na defesa de seus interesses
institucionais, como a proteção ao meio ambiente, aos
consumidores, entre outros. Para essa corrente, portanto,
deve-se verificar a finalidade da atuação da entidade em
concreto: caso se dirija aos seus interesses ou funções
institucionais, a hipótese será de legitimação ordinária;
diversamente, se a entidade agir no interesse de alguns de
seus filiados, que não esteja compreendido entre os interesses
da instituição, aí haverá legitimação extraordinária.
Existe ainda, uma terceira corrente, que traz uma espécie autônoma de
legitimidade para as ações coletivas em geral. Veja-se esse posicionamento:
Natureza da legitimação ativa [para a ação civil pública]. Para
as ações coletivas na tutela de direitos difusos e coletivos,
trata-se de legitimação autônoma para a condução do
processo, ordinária. Quando a ação coletiva for para a tutela de
direitos
individuais
homogêneos,
haverá
substituição
processual, isto é, legitimação extraordinária. A norma
comentada [art. 5º da LACP] encerra legitimação concorrente e
disjuntiva, e o litisconsórcio ativo que pode ser formado entre
os colegitimados é facultativo. (DONIZETTI, 2010, p. 212)
A Ação Civil Pública pode ser ajuizada por uma ou mais entidades, que
podem atuar conjunta ou isoladamente na defesa de um determinado interesse
coletivo. Por essa razão, entende-se que a legitimidade para a ACP é
concorrente e disjuntiva. Isto é, vários são os entes que podem propor a ação,
e essa pode ser em conjunto ou não.
No caso de desistência infundada ou abandono da ação, o Ministério
Público ou outro ente legitimado deverá assumir a titularidade ativa. E, de toda
sorte o Ministério Público atuará na ação, se não como parte, obrigatoriamente
como fiscal da lei. Essa determinação está expressa no art. 5º LACP (BRASIL,
1985), veja-se:
26
Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação
cautelar: [...] § 1º O Ministério Público, se não intervier no
processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da
lei. [...] Em caso de desistência infundada ou abandono a ação
por associação ou outro legitimado assumirá a titularidade
ativa.
No que diz respeito ao polo passivo, qualquer pessoa, física ou jurídica
pode atuar como ré na ação civil pública.
O litisconsórcio na Ação Civil Pública, por força do § 2º do art. 5º da
LACP, é possível tanto no polo ativo, quanto no passivo. Tal dispositivo da lei
determina que fica facultado ao Poder Público e as outras associações
legitimadas, habilitarem-se como litisconsortes de qualquer das partes.
O Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 103, § 2º, inciso III
(BRASIL, 1990), diz que em caso de improcedência do pedido, os interessados
que não fizeram parte no processo como litisconsortes poderão ajuizar ação de
indenização a título individual.
Donizetti (2010) salienta ainda, a admissibilidade do litisconsórcio
facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos
Estados na tutela de interesses e direitos coletivos, com fulcro no art. 5º, § 5º,
da LACP. Embora ressalte que parte da doutrina aponte esse dispositivo como
inconstitucional, em face do pacto federativo, que fixa a competência do
Ministério Público da União ao âmbito da Justiça Federal e a do Ministério
Público estadual no da Justiça Estadual, traz julgado do STJ, que decidiu no
sentido da possibilidade. Veja-se:
PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA –
LIITISCONSÓRCIO FACULTATIVO ENTRE MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL E ESTADUAL – POSSIBILIDADE - § 5º
DO ART. 5º DA LEI 7.347/85 – INOCORRÊNCIA DE VETO –
PLENO VIGOR.
O veto presidencial aos arts. 82, § 3º, e 92, parágrafo único, do
CDC, não atingiu o § 5º do art. 5º da Lei da Ação Civil Pública.
Não há veto implícito.
Ainda que o dispositivo não estivesse em vigor, o litisconsórcio
facultativo seria possível sempre que as circunstâncias do caso
recomendassem (CPC, art. 46). O litisconsórcio é instrumento
de Economia Processual.
O Ministério Público é órgão uno e indivisível; antes de ser
evitada, a atuação conjunta deve ser estimulada. As divisões
existentes na Instituição não obstam trabalhos coligados.
É possível o litisconsórcio facultativo entre órgãos do Ministério
Público federal e estadual/distrital.
Recurso provido (STJ, 1ª Turma, REsp 382659/RS, Rel. Min.
Humberto Gomes de Barros, j. em 2/12/2003, DJ 19/12/2003,
p. 322).
27
3.2 COMPETÊNCIA
A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) traz de forma
expressa quais são as matérias que estão afetas à competência da Justiça
especializada, e não estando a ação civil pública nesse rol, conclui-se que a
competência para apreciar a ACP, é da Justiça comum.
O art. 2º da LACP estabelece que as ações civis públicas “serão
propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência
funcional para processar e julgar a causa”. As causas de competência da
Justiça comum podem ser propostas tanto na seara Federal quanto na
estadual.
Vê-se assim, que o legislador optou pelo critério territorial de repartição
de competências, lhe atribuindo, no entanto, natureza absoluta, isto é,
“funcional”, preferindo o lugar em detrimento da natureza da matéria em debate
e a qualidade das partes.
Isso se dá por razões práticas, uma vez que o juízo da ocorrência do
fato danoso terá maior mobilidade e acesso às provas necessárias a instrução
do processo.
Donizetti (2010) explica que, embora a competência da ação civil pública
seja funcional, ou territorial absoluta, deve-se atentar para o quanto dispõe a
Constituição da República no seu art. 109, inciso I, que determina caber aos
juízes federais processar e julgar:
as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa
pública federal forem interessadas na condições de autoras,
rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de
acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à
Justiça do Trabalho. (BRASIL, 1988).
O referido autor esclarece que esse dispositivo constitucional determina
a competência em razão da pessoa, que também é absoluta. Assim, parte da
doutrina recomenda a leitura conjunta do art. 2º da LACP e do art. 109 da
Constituição, aplicando-se o disposto nos §§ 2º e 3º desse último artigo.
Tais parágrafos determinam, respectivamente, que:
As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na
seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde
houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou
onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.
Serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do
domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que
forem parte instituição de previdência social e segurado,
sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal,
28
e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras
causas sejam também processadas e julgadas pela justiça
estadual. (BRASIL, 1988)
Dessa forma, num primeiro momento, as ações civis públicas devem ser
ajuizadas na seção judiciária que detenha a competência territorial do local do
dano; em não havendo vara federal na localidade do fato, será competente o
juiz de direito para processar e julgar a causa, cabendo, no entanto, recurso de
seus atos para o Tribunal Regional Federal.
Elpídio Donizetti ( 2010) explica, que do art. 2º, caput, da Lei nº
7.347/1985, in verbis: “as ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do
local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar
e julgar a causa” (BRASIL, 1985), não pode se inferir que tal dispositivo tenha
trazido hipótese de atribuição de competência da Justiça federal para juízo
estadual, já que para tanto, deveria haver expressa disposição legal.
Dessa forma, nesse ponto, que diz respeito a competência no âmbito da
ACP, deve-se utilizar o art. 93 do CDC, o que como já visto, é autorizado pelo
art. 21 da LACP. Tal dispositivo do Código de Defesa do Consumidor
determina que:
Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente
para a causa a Justiça local: I – no foro do lugar onde ocorreu
ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local; II – no foro da
Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de
âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código
de Processo Civil aos casos de competência concorrente.
(BRASIL, 1990).
Assim, em resumo, a regra que se aplica a competência para a ação civil
pública, é a da leitura conjunta do art. 2º da LACP e do art. 93 do CDC,
devendo a ação ser proposta no lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano,
ressalvada a competência da Justiça federal. E, acrescente-se que se os danos
forem de âmbito nacional ou regional, a competência territorial – absoluta, será
a do foro da capital do Estado ou no do Distrito Federal.
O autor lembra, que tal como na ação popular (art. 5º, § 3º, da LAP), o
legislador quis que o juízo inicialmente competente para apreciar a ação civil
pública, servisse também para todos os casos de conexão. O parágrafo único
do art. 2º, da LACP estabelece que: “a propositura da ação prevenirá a
jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam
a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto”.
29
Se duas causas forem propostas em face dos mesmos réus, com
idênticos pedidos e causa de pedir, haverá litispendência, mesmo que as
entidades autoras de uma e de outra ação sejam distintas. O autor explica que
isso se dá porque a legitimação para esse tipo de ação é extraordinária,
havendo substituição processual. Assim, para que se incorra em litispendência,
é dispensável que as partes no polo ativo sejam diversas. (DONIZETTI, 2010)
Donizetti (2010, p. 216) chega a seguinte conclusão, ao analisar os
institutos supra mencionados:
Ora, se na ação civil pública a entidade atua como substituta
processual, não há dificuldade alguma em se perceber que o
mesmo ocorre quanto ao cidadão na ação popular, motivo pelo
qual, como ambas as demandas podem eventualmente ter os
mesmos fundamentos e objeto (ex.: proteção do meio ambiente
em razão de atividade poluente), é possível cogitar de
litispendência entre ação civil pública e ação popular.
O autor, atenta ainda para o fato de que será difícil haver entre tais
demandas identidade de partes no polo passivo, pois que na ação popular, por
exemplo, o litisconsórcio passivo é necessário, o que via de regra não ocorre
na ação civil pública. Mesmo assim, ele traz a conclusão de Ada Pellegrini
Grinover sobre o tema,
Basta a parcial coincidência de partes no polo passivo para se
inferir a litispendência entre ação popular e ação civil pública
com identidade de causa de pedir e pedido, ante a possiblidade
de coisas julgadas inconciliáveis e incompatíveis. (GRINOVER
apud DONIZETTI).
3.3 PROCEDIMENTO
O procedimento da ação civil pública é o comum ordinário previsto no
Código de Processo Civil, com algumas especificidades previstas na legislação
própria.
Dá-se início aos atos processuais da ação civil pública por provocação
de qualquer dos entes legitimados, por meio de petição inicial, cujos requisitos
constam no art. 282 do CPC. (BRASIL, 1973).
Tendo em vista a qualidade do direito que a Lei nº 7347/85 visa
resguardar, direitos indisponíveis, essa lei traz vários mecanismos que auxiliam
o proponente da ação civil pública a instruir de forma mais fidedigna o
processo.
Assim, “o interessado poderá requerer às autoridades competentes as
certidões e informações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo
30
de 15 (quinze) dias” (art. 8º, caput, da LACP). E, o art. 10 da LACP, criminaliza
a conduta de recusa, retardamento ou omissão de dados técnicos
indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério
Público. Mesmo quando a lei impuser sigilo, e for legítima a recusa de certidão
ou informação, “a ação poderá ser proposta desacompanhada daqueles
documentos, cabendo ao juiz requisitá-los” (art. 8º, § 2º, da LACP).
O § 6º do artigo 5º da Lei da Ação Civil Pública estabelece a seguinte
faculdade: “os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados
compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante
cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial”. (BRASIL, 1985)
Tal “ajustamento de conduta”, segundo a doutrina, equivale a uma
modalidade de transação, o que ante a já mencionada indisponibilidade do
direito tutelado pela via da ação civil pública, seria, no entendimento de alguns,
vedada a transação no curso da demanda.
Nesse sentido, José Roberto Marques entende que:
A transação teria o sentido de ajustamento da conduta do réu
as exigências legais, ou seja, atendimento, por ele, das normas
vigentes. O autor da ação não pode dispor dos direitos que não
lhe pertencem, mas seria admissível essa adequação de
comportamento, o que seria obtido caso julgada procedente a
ação, mas em menor tempo (o compromisso de ajustamento
de conduta pode ser firmado antes da propositura da ação civil,
ressalvadas as hipóteses em que a lei, expressamente, vede).
Dispondo-se o réu a atender a todos os pedidos constantes da
inicial, é viável esse compromisso tomado sob a forma de
transação, que constitui título executivo judicial (deve ser fixada
multa diária para o caso de descumprimento). O compromisso
de ajustamento de conduta obtido fora do processo é título
executivo extrajudicial. (MARQUES apud DONIZETTI)
Hugo Nigro Mazzilli assim leciona:
Por último não é preciso insistir em que o compromisso de
ajustamento a que alude, no § 6º do art. 5º da LACP, tomado
extrajudicialmente, não impede que qualquer dos colegitimados ativos possa discutir em juízo o próprio mérito do
acordo celebrado. Esse compromisso tem o valor de garantia
mínima em prol do grupo, classe ou categoria de pessoas
atingidas; não pode ser garantia máxima de responsabilidade
do causador do dano, sob pena de admitirmos que lesões
fiquem sem acesso jurisdicional. Entender-se ao contrário seria
dar ao compromisso extrajudicial que versa interesses difusos
da coletividade a mesma concepção privatista que tem a
transação no direito civil, campo em que a disponibilidade é a
característica principal. Graves prejuízos decorreriam para a
defesa social, a admitir esse entendimento. Não sendo os
órgãos públicos referidos no dispositivo os verdadeiros titulares
do interesse material lesado, o compromisso de ajustamento
que tomam passa a ter o valor de determinação de
31
responsabilidade mínima; não constitui limite máximo para a
reparação de uma lesão ao meio ambiente ou a qualquer outro
interesse de que cuida a Lei n. 7.347. (MAZZILLI, 1993, p. 215
apud PEREZ; TRUJILLO, 2011, p. 86).
A Lei da Ação Civil Pública, diz que o juiz ao receber a inicial poderá
“conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita
a agravo” (art. 12, caput da LACP). O § 2º desse dispositivo legal, diz que é
cabível o arbitramento de multa em decisão liminar, que embora devida desde
o dia em que se der o descumprimento, só é exigível após o trânsito em
julgado da decisão, que deve ser favorável ao autor.
Donizetti (2010) lembra que a concessão de medidas acautelatórias
contra atos do Poder Público é disciplinada pela Lei nº 8.437/92, cujas
disposições valem também para a tutela antecipada (art. 273 e 461 do CPC),
contra a Fazenda Pública, em consonância com o art. 1º da Lei nº 9. 494/97.
Depreende-se da leitura desses diplomas normativos que:
a) não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou parte, o objeto
da ação (art. 1º, § 3º, da Lei nº 8.437/92);
b) também não será cabível medida liminar que defira compensação de
créditos tributários (art. 1º, § 5º, da Lei nº 8.437/92), reclassificação ou
equiparação de servidores públicos, concessão de aumento ou
extensão de vantagens (art. 1º da Lei nº 9.494/97 c/c art. 5º, caput, da
Lei nº 4.348/64);
c) por força do art. 4º, caput e § 1º, da Lei nº 8. 437/92, bem como do art.
12, § 1º, da LACP, é possível a suspensão das liminares e das
sentenças nas ações civis públicas movidas contra o Poder Público e
seus agentes.
No que diz respeito à resposta do réu e à fase instrutória, aplicam-se as
disposições do procedimento comum ordinário, ante a ausência de regras
específicas na LACP.
Terminada a fase instrutória, o juiz prolatará sentença, com resolução de
mérito ou não. E, com relação ao objeto da causa, a LACP determina que: “a
ação civil pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o
cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer”. (art. 3º da LACP).
O art. 11 da LACP diz que na ação que tenha por objeto o cumprimento
de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará que se satisfaça a
obrigação ou a cesse a atividade danosa, sob pena de “execução específica”,
ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, a
despeito de requerimento do autor.
32
E, no caso de condenação em dinheiro, dispõe o art. 13 e §§ da LACP
que:
a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um
Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão
necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade,
sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados. §
1º Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará
depositado em estabelecimento oficial de crédito, em conta com
correção monetária. § 2º Havendo acordo ou condenação com
fundamento em dano causado por ato de discriminação étnica nos
termos do disposto no art. 1º desta Lei, a prestação em dinheiro
reverterá diretamente ao fundo de que trata o caput e será utilizada
para ações de promoção da Igualdade Racial estaduais ou locais, nas
hipóteses de danos com extensão regional ou local, respectivamente.
(BRASIL, 1985).
No que tange aos efeitos da decisão proferida em sede de ação civil
pública, o art. 16 da LACP, com a redação conferida pela Lei nº 9.494/97, se
estende a todos, mas nos limites da competência territorial do órgão prolator.
A exceção do efeito erga omnes da sentença, está em o pedido ser
julgado por insuficiência de provas, caso em quaisquer dos demais legitimados
poderá propor nova ação, com idêntico fundamento, mediante a apresentação
de novas provas.
Donizetti (2010) faz uma crítica à limitação territorial dos efeitos da
sentença, ressaltando que a finalidade da ação civil pública é evitar a
proliferação de ações em todo o território nacional, não podendo ser aceita a
restrição do art. 16 da LACP, sobretudo, quando o CDC no seu art. 103 traz
previsão em sentido oposto. Veja-se o quando determina esse último
dispositivo legal:
E, em não tendo o legislador alterado a redação do CDC, inútil foi a
modificação do art. 16 da LACP. Continuando sem limites territoriais o regime
do CDC acerca da coisa julgada erga omnes e ultra partes, a inovação é
inócua, tendo em vista a remissão ao CDC contida da própria LACP, no seu
art. 21.
Assim, a modificação da redação do art. 16 da Lei nº 7.347/85, em a
mudança do art. 103 do CDC, restou ineficaz. Dessa forma, o autor aponta que
a competência territorial não deve determinar os limites do julgado, mas em
contrapartida, é o objeto da tutela que deve fixar a competência do órgão
jurisdicional, em consonância com o art. 93 da Lei consumerista.
33
O jurista assevera, no entanto, que o entendimento predominante no
STJ não é esse. Veja-se:
I – A orientação fixada pela jurisprudência sobranceira desta
Corte é no sentido de que a decisão proferida no julgamento de
Ação Civil Pública faz coisa julgada nos limites da competência
territorial do órgão que a prolatou (AgRg no REsp 755. 429/PR,
Rel. Min. Sidnei Beneti, 3º Turma, julgado em 17/12/2009, DJe
18/12/2009). De acordo com a jurisprudência firmada na corte
Especial do STJ, a sentença na ação civil pública faz coisa
julgada erga omnes nos limites da competência territorial do
órgão prolator, segundo dicção do art. 16 da Lei n. 7.347/85,
alterado pela Lei n. 9.494/97 (AgRg no REsp 573.868/RS, Rel.
Min. João Otávio de Noronha, 4ª Turma, julgado em
15/10/2009, DJe 26/10/2009).
3.4 RECURSOS CABÍVEIS E OUTROS MEIOS DE IMPUGNAÇÃO
Por força do art. 19 da LACP, as decisões, sentenças e acórdãos
proferidos na ação civil pública, podem ser impugnados com os mesmos
recursos previstos na Lei Processual Civil, dispõe esse dispositivo de lei que:
“aplica-se à ação civil pública, prevista nesta Lei, o Código de Processo Civil,
aprovado pela Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, naquilo em que não
contrarie suas disposições”.
Ocorre
que,
no
sistema
processual
tradicional,
a
regra
é
a
suspensividade, enquanto que a LACP traz tal efeito de forma excepcional, o
art. 14 da referida lei diz que: “o juiz poderá conferir efeito suspensivo aos
recursos, para evitar dano irreparável à parte”.
Assim, o CPC impede que a decisão produza os seus efeitos de forma
imediata, enquanto que em se tratando de jurisdição civil coletiva, como lembra
Marcelo Abelha:
a regra é a de que todos os recursos (recorribilidade) não são
dotados de efeito suspensivo [...]. Essa interpretação deriva da
correta leitura do texto da norma citada, que é bem claro ao
dizer que o juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos,
demonstrando a posição (muito elogiável nesse particular) de
se deixar, por via de regra, todos os recursos desprovidos de
tal efeito. (ABELHA apud DONIZETTI).
Donizetti (2010) lembra que par da peculiaridade trazida pela LACP, está
a possibilidade de a liminar concedida em ação civil pública ser alvo de agravo
de instrumento, bem como por um incidente processual apresentado pela
Fazenda Pública, denominado “pedido de suspensão de segurança” – ou
ainda, suspensão de liminar e antecipação de tutela. É que se depreende do
exame conjugado do caput e do § 1º do art. 4º da Lei nº 8.437/92:
34
Art. 4º Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o
conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho
fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas
contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do
Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público
interessada, em caso de manifesto interesse público ou de
flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à
saúde, à segurança e à economia públicas. § 1º Aplica-se o
disposto neste artigo à sentença proferida em processo de
ação cautelar inominada, no processo da ação popular e na
ação civil pública, enquanto não transitada em julgado. [...].
(BRASIL, 1992)
O § 1º do art. 12 da LACP estabelece, no mesmo sentido da norma
supracitada que:
A requerimento de pessoa jurídica de direito público
interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à
segurança e à economia pública, poderá o Presidente do
Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso
suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada,
da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no
prazo de cinco dias a partir da publicação do ato. (BRASIL,
1985).
Dessa forma, a suspensão da segurança tem lugar na ação civil pública.
Sua interposição, diferente dos recursos, não enseja o reexame da decisão,
mas apenas a recíproca suspensão, em razão dos reflexos que podem advir da
decisão, como a possibilidade de grave lesão a valores políticos relevantes.
Assim, a existência de vício na decisão, error in judicando ou in procedendo,
não é requisito para a suspensão da segurança; basta a demonstração de
manifesto
interesse
público
ou
flagrante
ilegitimidade,
bem
como
a
possibilidade de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia
públicas.
Não há prazo para a suspensão da segurança, assim a delonga na sua
apresentação, pode evidenciar ausência de risco de grave lesão.
Cumpre observar, que a interposição de agravo de instrumento e a
suspensão da segurança, manejados contra uma mesma liminar, são se
prejudicam reciprocamente, nos termos do art. 4º, § 6º, da Lei nº 8.437/92.
A ressaltar, que diante da remissão ao CPC, a Fazenda Pública e o
Ministério Público dispõem da prerrogativa de prazo em dobro para recorrer,
bem como os litisconsortes com diferentes procuradores (arts. 188 e 191 do
CPC, respectivamente). Pelo mesmo motivo, a sentença proferida contra a
União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e
35
fundações de direito público, via de regra, fica sujeita ao reexame necessário,
nos termos do art. 475, I do CPC.
O Código de Processo Civil não dispõe acerca da Defensoria Pública, no
entanto, essa instituição por força da sua lei de regência, a Lei Complementar
nº 80/1994, com redação dada pela LC nº 132/2009, também é detentora de tal
prerrogativa. Veja-se o quanto determina o art. 44, I do referido diploma
normativo:
São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União: [...]
receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com
vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou
instância administrativa, contando-se lhes em dobro todos os prazos.
(BRASIL, 2009).
3.5 COISA JULGADA
A regra geral é de que a coisa julgada tem efeito interpartes, isto é, o
julgado é dirigido às partes litigantes, independentemente do resultado da
demanda.
No processo coletivo, porém, por conta da natureza dos direitos levados
a juízo, houve uma releitura da dinâmica da coisa julgada, de modo que os
efeitos do julgado estendem-se àqueles que não foram partes na causa e,
ainda, de acordo como resultado da lide.
O Código de Defesa do Consumidor regula pormenorizadamente a
matéria relativa aos efeitos da sentença nas ações coletivas, razão pela qual,
mais uma vez, se deve interpretar a regra constante do art. 16 da LACP em
conformidade com as normas do CDC.
Pois bem, no que tange a coisa julgada nas ações coletivas, dispõem os
arts. 103 e 104 do CDC que:
Art. 103. Nas ações coletivas de que trata esse Código, a
sentença fará coisa julgada:
I – erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente
por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer
legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico
fundamento, valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I
do parágrafo único do art. 81;
II – ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou
classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos
termos do inciso anterior, quando se tratar de hipótese prevista
no inciso II do parágrafo único do art. 81;
III – erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido,
para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na
hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.
36
§ 1º Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não
prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da
coletividade, do grupo, categoria ou classe.
§ 2º Na hipótese do inciso III, em caso de improcedência do
pedido, os interessados que não tiverem intervindo no
processo como litisconsortes poderão propor ação de
indenização a título individual.
§ 3º Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16,
combinado com o art. 13 da Lei 7.437, de 24 de julho de 1985,
não prejudicarão as ações de indenização por danos
pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma
prevista neste Código, mas, se procedente o pedido,
beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão
proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a
99.
§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença
penal condenatória.
Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II do
parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as
ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes
ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior
não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for
requerida sua suspensão no prazo de 30 (trinta) dias, a contar
da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.
(BRASIL, 1990)
Assim, a sistemática da coisa julgada na ação civil pública está
esquematizada da seguinte forma:
3.5.1 Quanto aos direitos difusos (art. 103, I, do CDC)
Na hipótese do inciso I, do art. 103 do CDC, a coisa julgada em ação
civil pública se estende a toda a comunidade titular do direito lesado, isto é,
erga omnes. Essa amplitude subjetiva da coisa julgada permite que, no caso do
pedido ser julgado procedente, as vítimas ou seus sucessores, integrantes da
comunidade procedam à liquidação e execução da sentença, nos termos do §
3º do art. 103 do CDC.
Por outro lado, se o pedido for improvido, “a extensão e a própria
formação da autoridade da coisa julgada far-se-ão de acordo com o
fundamento probatório da decisão transitada em julgado (coisa julgada
secundum eventum probationis)”. (CERQUEIRA apud DONIZETTI).
Isso ocorre, porque conforme já dito, quando o pedido for julgado
improcedente por insuficiência de provas, outro legitimado, até mesmo o que
ajuizou a ação, poderá propor nova demanda coletiva, com idêntico
fundamento, com apresentação de nova prova; por outro lado, se o pedido for
julgado improcedente mesmo diante de ampla dilação probatória, a coisa
julgada se forma naturalmente, cuja imutabilidade se estende erga omnes.
37
Deve-se ter em mente por outro lado, que em qualquer hipótese de
improcedência do pleito inicial, seja na ação civil pública ou outra ação de
cunho coletivo, a extensão da coisa julgada não prejudica interesses e direitos
individuais daqueles que integram a comunidade lesada (art. 103, § 1º, do
CDC). Com efeito:
se o pedido formulado na ação coletiva for julgado
improcedente, impede-se, em razão dos efeitos negativos da
coisa julgada, o ajuizamento de nova ação coletiva. Não há
preclusão, porém, acerca da possibilidade de se propor ação
individual com o mesmo fundamento, haja vista que o objeto
desta ação é diverso do daquela. (CERQUEIRA apud
DONIZETTI).
3.5.2 Quanto aos direitos coletivos em sentido estrito (art. 103, II, do CDC)
No que diz respeito aos efeitos da coisa julgada, nos direitos coletivos
em sentido estrito, Elpídio Donizetti (2010, p. 223) esclarece que apesar de o
legislador ter se valido da expressão ultra partes para determinar o alcance do
julgado, não haveria, em verdade, diferenças entre a sistemática da coisa
julgada nas ações coletivas que tratem dos direitos difusos e naquelas que
versem sobre direitos coletivos em sentido estrito.
Dessa forma, a regra da extensão da coisa julgada secundum eventum
probationis vale tanto para os direitos difusos como para os direitos coletivos
em sentido estrito.
O doutrinador explica, que o correto seria a utilização da expressão ultra
partes em ambos os casos, já que a expressão erga omnes dá vasão a
interpretações equivocadas, como observa Antônio Gidi:
A imutabilidade do comando (coisa julgada) nas ações coletivas não
atinge a todos os seres humanos existentes no planeta, mas tão só e
exclusivamente a comunidade lesada (inc. I), o grupo, a categoria ou
classe lesados (inc. II) e as vítimas lesadas e seus sucessores (inc. III).
Enfim, em uma palavra, da imutabilidade do comando da sentença
coletiva favorável só se beneficiam os titulares do direito lesado (ação
repressiva) ou possivelmente lesado (ação preventiva). Ninguém mais.
Afinal, a estes pertence a titularidade do direito material invocado na
ação coletiva, como prevê o art. 81 do CDC). (GIDI, 1995, p. 111 apud
DONIZETTI, 2010, p. 223).
Vale lembrar, que a improcedência do pedido em sede de ação que
verse sobre direitos coletivos sem sentido estrito, assim como nos direitos
difusos, não prejudica os demais indivíduos que fazem parte da coletividade,
esses podem intentar ação individual.
38
3.5.3 Quanto aos direitos individuais homogêneos (art. 103, III, do CDC)
Para os direitos individuais homogêneos não se adotou a regra da
extensão secundum eventum probationis da coisa julgada.
Como se percebe da leitura do art. 103, III do CDC, os efeitos subjetivos
da coisa julgada estende-se erga omnes, isto é, para todos os indivíduos
homogeneamente tidos, apenas em caso de procedência do pedido. A hipótese
é, portanto, de extensão da coisa julgada conforme o resultado da lide
secundum eventum litis, isto é:
se julgado procedente o pedido formulado na ação coletiva, todos os
indivíduos (ou seus sucessores) lesados por determinado fato serão
beneficiados pela extensão da coisa julgada formada em tal ação,
podendo partir diretamente para a fase de liquidação da sentença e
execução dos correlatos direitos individuais. Por outro lado, se
improcedente o pedido, apenas a via coletiva de defesa dos direitos
individuais fica trancada (coisa julgada inter partes), podendo cada
indivíduo ajuizar ação (individual) em defesa de seus direitos.
(CERQUEIRA apud DONIZETTI, 2010, p. 224).
Nesse caso, na hipótese de improcedência do pedido formulado na ação
coletiva pela entidade legitimada (art. 103, § 2º do CDC), somente os
indivíduos que não tiverem intervindo como litisconsortes poderão ajuizar ação
a título individual para requerer indenização.
Isso se dá pela natureza dos direitos considerados, que diferentemente
dos difusos e coletivos em sentido estrito, “são direitos essencialmente
individuais, porém coletivamente considerados”, razão pela qual os indivíduos
que intervierem como assistentes litisconsorciais não afetados pela coisa
julgada (inter partes) formada na ação coletiva.
3.6 EXECUÇÃO
Em tendo a sentença na ação civil pública caráter condenatório, o ente
legitimado deve prosseguir com sua execução ou, no caso dos direitos
individuais homogêneos (art. 97 e 98 do CDC), a própria vítima ou seus
sucessores devem dar continuidade.
O art. 15 da LACP diz que: “decorridos sessenta dias do trânsito em
julgado da sentença condenatória, sem que a associação autora lhe promova a
execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos
demais legitimados”.
O art. 13, da LACP determina por sua vez que:
39
Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado
reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por
Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério
Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos
destinados à reconstituição dos bens lesados. § 1º Enquanto o fundo
não for regulamentado, o dinheiro ficará depositado em
estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária. §
2º Havendo acordo ou condenação com fundamento em dano causado
por ato de discriminação étnica nos termos no disposto no art. 1º desta
Lei, a prestação em dinheiro reverterá diretamente ao fundo de que
trata o caput e será utilizada para ações de promoção da igualdade
étnica, conforme definição do Conselho Nacional de Promoção da
Igualdade Racial, na hipótese de extensão nacional, ou dos Conselhos
de Promoção de Igualdade Racial estaduais ou locais, nas hipóteses
de danos com extensão regional ou local, respectivamente. (BRASIL,
1985, grifo nosso).
Embora o dispositivo transcrito não excepcione, por consequência
lógica, no que diz respeito aos direitos individuais homogêneos, a indenização
devida, não irá para um fundo, via de regra, uma vez que, nesse caso, os
destinatários da tutela jurisdicional são determinados, havendo possibilidade de
divisão da quantia indenizatória entre eles.
E, conforme dito alhures, o termo de ajustamento de conduta tomado por
órgãos públicos legitimados tem eficácia de título executivo extrajudicial, como
dispõe o art. 5º, § 6º, da LACP (BRASIL, 1985). Assim, a execução coletiva
poderá ser instruída com esse documento.
3.7 SUCUMBÊNCIA E LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
O art. 18 da LACP determina que nas ações regidas por esse diploma
normativo, “não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários
periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora,
salvo comprovada má fé, em honorários de advogado, custas e despesas
processuais”. (BRASIL, 1985). Donizetti (2010) ressalta que não haveria
mesmo sentido em condenar a associação autora a pagamento dos ônus
sucumbenciais, já que essa age como substituta processual.
E, art. 17 da LACP determina que essa condenação é solidária entre a
associação e os diretores responsáveis pela propositura da ação, e as custas
serão computadas ao décuplo, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e
danos a que ficam sujeitos. (BRASIL, 1985).
3.8 AÇÃO CIVIL PÚBLICA E CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Donizetti (2010) esclarece que, embora grande parte da doutrina
entenda não ser cabível a declaração incidental de inconstitucionalidade na
40
ação civil pública, em razão dos efeitos erga omnes advindos dessa espécie de
ação, o que equivaleria a uma ação direta de inconstitucionalidade ou ação
declaratória de constitucionalidade, o que significa controle abstrato, cuja
competência, sobretudo no que tange às normas federais, é exclusiva do
Supremo Tribunal Federal.
A despeito de tal corrente, ambos o STF e STJ têm reconhecido a
possibilidade da declaração incidental de inconstitucionalidade na ação civil
pública. Para tanto, a controvérsia constitucional deve vir como causa de pedir,
fundamento ou como questão prejudicial indispensável à solução da lide, e não
como pedido. Veja-se julgado do STJ nesse sentido:
O Supremo Tribunal Federal admite a propositura de ação civil
pública com base na inconstitucionalidade de lei, ao
fundamento de que, nesse caso, não se trata de controle
concentrado, mas sim controle difuso de constitucionalidade,
passível de correção pela Suprema Corte pela interposição de
recurso extraordinário.
Na verdade, o que se repele é a tentativa de burlar o sistema
de controle constitucional para pleitear, em ação civil pública,
mera pretensão de declaração de inconstitucionalidade, como
se de controle concentrado se tratasse.
In casu, o pedido formulado pelo Parquet diz respeito ao direito
individual homogêneo do contribuinte de não recolher tributo,
que,
segundo
seu
entendimento,
é
legítimo.
A
inconstitucionalidade da lei criadora do “complemento de taxa
de serviços públicos”, instituído pela Municipalidade de
Campos do Jordão, nada mais é do que o fundamento dessa
ilegitimidade e sequer faz coisa julgada, nos termos do artigo
469 do Código de Processo Civil.
Admitida
a
declaração
incidenter
tantum
da
inconstitucionalidade de lei municipal em ação civil pública,
devem os autos retornar à Corte a quo para que examine as
demais preliminares arguidas, incluído o exame da legitimidade
do Parquet para a defesa dos contribuintes, e, se for o caso,
prossiga no exame do mérito da demanda (STJ, 2ª Turma,
REsp 175222/SP, Rel. Min. Franciulli Netto, j. em 19/03/2002,
DJ 24/06/2002, p. 230).
Assim, o mencionado autor conclui pela possibilidade da declaração
incidental de inconstitucionalidade na ação civil pública.
41
4 DA DEFENSORIA PÚBLICA
Conforme já dito no capítulo destinado aos direitos coletivos, difusos e
individuais homogêneos, o direito constitucional, no decorrer de sua evolução,
adotou diferentes paradigmas. (GOGOY, 2012, p. 142).
No paradigma do Estado Liberal não era possível a concepção de uma
assistência jurídica gratuita, uma vez que o Estado era mínimo, assim, o
trabalho jurídico prestado aos pobres era voluntário, não era um direito do
cidadão.
No Estado Social, ou Estado do Bem Estar Social, o Poder Público
passa a ser o responsável por prestar à população, direitos como saúde,
educação, segurança entre outros.
Ocorre, nesse contexto, que os direitos precisavam de garantias, que os
assegurassem, não só formalmente, mas também materialmente. Assim,
começou a se pensar a questão da assistência judiciária aos necessitados, foi
o que Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988, p. 31) denominaram de
“Primeira Onda do Acesso à Justiça”.
Dessa forma, surgem os primeiros modelos de Assistência Judiciária
Gratuita. Ora se fala em assistência judiciária, no sentido de que caberia ao
Estado custear o processo daqueles que comprovarem insuficiência de
recursos; ora em convênios com advogados particulares, para que esses
mediante pagamento patrocinem a causa dos pobres.
Assim, o acesso à justiça aos hipossuficientes é garantido, nos sistemas
judiciários ocidentais, adotando-se diversos modelos de assistência, de acordo
com a conveniência do poder constituído. Costuma-se agrupar os diferentes
modelos em três grupos: o sistema judicare, o staff model e o misto.
O sistema judicare, é bastante comum, sendo adotado, sobretudo por
países europeus, tais como França, Inglaterra, Holanda e Áustria. Nesse
modelo, o Estado contrata uma prestação de serviço, já que o patrocínio dos
necessitados é feito por advogado particular, remunerado pelo Poder Público,
mas sem vínculo empregatício.
O sistema staff model, é a assistência prestada por advogados que
prestam um serviço público, na forma de convênio com o Estado.
Há países, por outro lado, que adotam tanto o sistema judicare, quanto o
staff model, de forma combinada, isto é, de forma mista, sendo esse último
42
modelo, a implantação de Defensorias Públicas como entidade pública, e a
utilização de advogados particulares pelo Poder Público.
Felipe Dezorzi Borges (2012, p. 170/171), explica cada um daqueles
sistemas.
-sistema judicare: a assistência é estabelecida como um direito para
todas as pessoas que se encaixem nos requisitos legais, e é prestada por
advogado pago pelo Estado. Nesse sistema, cabe ao cidadão reconhecer um
direito e procurar auxílio.
-representação por advogado particular indicado pelo Estado: a
assistência é outorgada a advogados particulares pagos pelo Estado, que
prestam um serviço público, em favor dos hipossuficientes.
-representação por Defensor Público: a assistência judiciária é
estabelecida como um direito do cidadão, custeado pelo Estado. É prestado
por servidores especialistas do próprio Estado. O indivíduo é tido como o objeto
da prestação jurisdicional. Esse sistema não trata apenas de causas
individuais, mas possui autonomia pra identificar problemas dentro da
comunidade, inclusive apontando soluções metaindividuais.
Quanto a esse último modelo, veja-se o quanto propôs Mauro Cappelletti
e Bryant Garth (1988, p.54), quando aduzem ser a instituição do advogado
público superior aos demais sistemas:
Há um desequilíbrio na advocacia, que em muitos casos só
pode ser corrigido por advogados pagos pelo próprio governo,
para defender os interesses não representados dos
consumidores, do meio ambiente, dos idosos e de outros
interesses não organizados. É preciso que um advogado
público fale por esses interesses se pretendermos que eles
sejam ouvidos.
O conceito de Assistência Judiciária Gratuita, no entanto, passou por
uma nova mudança de paradigma constitucional, com o advento do “Estado
Democrático Social”, no qual passou a se conceber o Estado dentro de uma
realidade de solidariedade social, em que se concebem grupos de
vulnerabilidade, e que se busca dar máxima efetividade ao princípio da
igualdade, considerando-se uma sociedade que se apresenta sob muitos
aspectos.
Felipe Dezorzi Borges (2012, p. 144) explica que:
É corolário deste novo paradigma que se identifique que o atual
fundamento constitucional da Assistência Judiciária Gratuita
43
esteja radicado no art. 3º da Constituição Federal de 1988, o
qual assim prevê: ‘Art. 3º.: Constituem objetivos fundamentais
da República Federativa do Brasil: III – erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.
Assim, é de se observar, no paradigma do Estado Democrático de
Direito, que o próprio conceito de pobreza e necessidade evoluiu, em relação
aos adotados anteriormente. O conceito de pobreza não é mais restrito àqueles
que carecem de recursos financeiros, mas se estende cada vez mais, a todas
as formas de exclusão. (BORGES, 2012, p. 143).
ROCHA (2009) atinge o cerne da questão, ao definir que a pobreza
transcende a falta de recursos econômicos, sendo também pobre aquele que
tem seus direitos fundamentais desrespeitados, como o acesso à saúde,
educação e moradia. É necessitado e merece especial proteção do Estado,
portanto, aquele que não tem como reivindicar os seus direitos básicos.
Conclui-se, até aqui, que a finalidade precípua da assistência jurídica
gratuita, seja qual for o modelo adotado, é garantir acesso à justiça.
Por fim, alguns países decidiram por criar suas próprias instituições, cujo
fim,
é
garantir
aqueles
direitos
ditos
sociais,
aos
economicamente
hipossuficientes. O que na América Latina foram denominadas Defensorias
Públicas.
No Brasil, a assistência judiciária aos pobres é garantida desde a
Constituição de 1934, que previa no seu artigo 113, 32) que, “a União e os
Estados concederão aos necessitados assistência judiciária, criando, para esse
efeito, órgãos especiais assegurando, a isenção de emolumentos, custas,
taxas e selos”. (BRASIL, 1934).
Porém, somente na Constituição de 1988, é que foi criada a Defensoria
Pública como instituição atuante tanto no âmbito estadual como federal, cujo
objetivo é garantir assistência jurídica integral e gratuita a todos os
necessitados.
A Defensoria Pública está na Constituição Federal de 1988, no capítulo
IV, das Funções Essenciais à Justiça. Assim como o Ministério Público (Seção
I), a Advocacia Pública (Seção II) e a Advocacia (Seção III), a Defensoria
Pública é instituição que contribui para o regular funcionamento da Justiça.
(BRASIL, 1988)
44
Felipe Dezorzi Borges (2012), ressalta que a Constituição, ao organizar
o Poder Estatal, diferentemente das constituições anteriores, não se limitou às
descentralizações tradicionais entre os complexos orgânicos denominados
Três Poderes, mas instituiu um quarto complexo orgânico que, conforme o
autor, não se constitui um quarto Poder, mas recebeu a seu cargo a função
essencial de provedoria da Justiça diante dos demais poderes constituídos.
Conforme o dizer de Ana Rita V. Albuquerque (2000, p. 19):
Frise-se que a instituição da Defensoria Pública ao receber a
atribuição constitucional de instituição essencial à função
jurisdicional do Estado, não desempenha função “auxiliar” no
sentido orgânico, mas sim que sua função é essencial no
sentido de ser tão imprescindível à existência do Estado
Democrático de Direito quanto qualquer das demais do título
IV, e por isso a expressão constitucional se refere a “todos os
Poderes do Estado, enquanto diga respeito à realização do
valor da Justiça por qualquer deles”.
Nesse sentido, asseverou Ada Pellegrini Grinover (2008, p. 307):
O art. 134 da CF não coloca limites às atribuições da
Defensoria Pública. O legislador constitucional não usou o
termo exclusivamente, como fez, por exemplo, quando atribuiu
ao Ministério Público a função institucional de promover,
privativamente, a ação penal pública, na forma da lei (art. 129,
I). Desse modo as atribuições da Defensoria Pública podem ser
ampliadas por lei, como, aliás, já ocorreu com o exercício da
curadoria especial, mesmo em relação a pessoas não
economicamente necessitadas, e não sua tarefa exclusiva.
Assim sendo, a Defensoria Pública no Brasil está fundamentada e
edificada normativamente na Constituição da República pelos artigos 1º, II, III e
IV, 3º, I, II, III e IV, 5º, LXXVI, disciplinadas nos artigos 134 e seguintes
(BRASIL, 1988), bem como regulamentada pela Lei Complementar nº 80 de
1994 (BRASIL, 1994), a chamada Lei Orgânica da Defensoria Pública.
Conforme a lei de regência,
A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como
expressão
e
instrumento
do
regime
democrático,
fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos
direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e
extrajudicial dos direitos individuais e coletivos, de forma
integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na
forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal.
(BRASIL, 1994).
A instituição obedece três princípios institucionais, quais sejam, a
unidade, a indivisibilidade, já que aquela abrange a Defensoria Pública da
45
União, do Distrito Federal e dos Territórios, bem como a dos Estados, e a
independência funcional.
Cleber Francisco Alves e Marília Gonçalves Pimenta (2004) ensinam
que a unidade consiste em ver a Defensoria Pública como um todo formado
pela Defensoria Pública da União, dos Estados e a do Distrito Federal e dos
Territórios.
A indivisibilidade, por sua vez, significa que a Defensoria Pública como
um todo que é não está sujeita a rupturas ou fracionamentos. (MORAES, 1999,
p. 171)
A independência funcional garante a autonomia da Defensoria Pública,
perante os demais órgãos, na medida que suas funções institucionais podem
ser exercidas até mesmo contra as pessoas jurídicas de direito público das
quais fazem parte como entes despersonalizados pelo fenômeno de direito
administrativo da desconcentração (MELLO, 2002, p. 273), e impede que seus
membros sejam subordinados à hierarquia funcional, ficando os membros
subordinados apenas à hierarquia administrativa. Veja-se o quanto determina o
art. 4º, § 2º da LC nº 80/94: “São funções institucionais da Defensoria Pública,
dentre outras [...] as funções institucionais da Defensoria Pública serão
exercidas inclusive contra as Pessoas Jurídicas de Direito Público”. (BRASIL,
1994)
Tal princípio institucional “elimina qualquer possibilidade de hierarquia
diante dos demais agentes políticos do Estado, incluindo os magistrados,
promotores de justiça, parlamentares, secretários de estado e delegados de
polícia”. (GALLIEZ, 2001, p. 27).
Para atuar de forma a dar cumprimento ao art. 1º da LC 80/94, e em
consonância com as normas abstratas acima descritas, a Defensoria Pública
tem suas atribuições organizadas em três pontos principais que se comunicam:
a) a prestação do serviço de assistência judicial integral e gratuita perante
os Juízos Federais, do Trabalho, Juntas e Juízos Eleitorais, Juízos
Militares, as Auditorias Militares, Tribunal Marítimo e a instâncias
administrativas, nos Tribunais Superiores e no Supremo Tribunal
Federal, nas mais diversas áreas de atuação, tais como direitos
humanos, previdenciário, criminal entre outras;
46
b) a atuação extrajudicial para a resolução dos conflitos às pessoas físicas
e jurídicas e as mais diversas instâncias da Administração Pública
Federal, uma vez que cabe ao Defensor Público realizar acordos entre
as partes em conflito, o que contribui sobremaneira para a redução das
demandas que chegam ao Poder Judiciário; e
c) a prestação de assistência jurídica preventiva e consultiva, que funciona
para a minimização dos conflitos de interesse no seio da sociedade, o
que contribui para a formação da cidadania plena. (DEFENSORIA
PÚBLICA DA UNIÃO, 2012, p. 11).
A Defensoria Pública está organizada em duas instituições: a Defensoria
Pública da União (DPU) e as Defensorias Públicas dos Estados, Territórios e
Distrito Federal (DPEs). A primeira tem atribuição para atuar nas Justiças
Federal, Eleitoral, Militar e do Trabalho; a competência das DPEs é residual.
O art. 3ºA da Lei de regência da Defensoria Pública, incluído pela Lei
Complementar nº 132, de 2009, dispõe acerca dos objetivos da referida
instituição, que estão em pleno acordo com os objetivos da República
Federativa do Brasil, são eles:
I – a primazia da dignidade da pessoa humana e a redução das
desigualdades sociais; II – a afirmação do Estado Democrático
de Direito; III – a prevalência e efetividade dos direitos
humanos; e IV – a garantia dos princípios constitucionais da
ampla defesa e do contraditório. (BRASIL, 2009 - grifo nosso).
O ingresso na carreira de Defensor Público, a teor da Constituição (art.
37, inciso II c/c art. 134, parágrafo único, da CRFB/88), se dá por meio de
aprovação em concurso público. E, as garantias dos membros da Instituição
estão positivadas no art. 43 da LC nº 80/94.
Assim, há uma diferença substancial entre o advogado e o defensor
público, pois a função desse, é defender o cidadão necessitado.
A legitimação constitucional outorgada pelo Estado brasileiro à
Defensoria Pública constitui a essência do mandato processual, e se difere
essencialmente do mandato concedido por um particular a um advogado
privado, pois nesse último caso, é necessária a participação individual do
outorgante. Assim, a atuação da Defensoria não se confunde com aquela
desempenhada pela Advocacia.
47
Dispõe o art. 44, inciso XI, seção III da Lei Complementar n. 80/1994,
que: “São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União: [...]
representar a parte, em feito administrativo ou judicial, independentemente de
mandato, ressalvados os casos para os quais a lei exija poderes especiais”.
(BRASIL, 1994)
Vê-se, pois, que a legislação complementar reforça o múnus público
para a orientação jurídica e defesa dos interesses, tanto individuais como
coletivos, dos cidadãos que necessitados e vulneráveis, independentemente de
mandato.
É, dessa forma, razoável que tenha o constituinte autorizado à
Defensoria Pública, a “orientação” dos necessitados quanto à análise de
pretensões e a prevenção de litígios, por meio de medidas conciliatórias,
contribuindo com a administração da justiça.
Em suma, a Defensoria Pública objetiva garantir aos necessitados,
“acesso à ordem jurídica justa”. (SOARES, 2002, p. 69 e 107).
48
5 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA O AJUIZAMENTO
DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Preliminarmente é necessário avaliar que, num primeiro momento, a
ação civil pública era precipuamente uma das funções institucionais do
Ministério Público, que exercia, quase que exclusivamente, “a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos” (art. 129, III, da CF).
E, a Defensoria Pública foi estatuída para realizar a defesa dos
“necessitados”, ou hipossuficientes. A Constituição Federal de 1988 determina
no seu art. 134 ser essa a função essencial da referida instituição.
Como evidenciado no capítulo anterior, a Defensoria Pública foi o
modelo adotado pelo nosso ordenamento jurídico, para propiciar acesso à
justiça àqueles que não poderiam tê-lo, sem a intervenção estatal.
Pois bem, vemos que é no plano constitucional que estão definidas as
finalidades das instituições políticas e sociais.
Por consequência lógica, é na Constituição Federal, e na sua
interpretação sistemática, que encontraremos respostas para as controvérsias
e indagações originariamente debatidas e colocadas.
Constantemente a legitimidade da Defensoria Pública tem sido
impugnada, no que diz respeito à defesa dos direitos difusos, coletivos stricto
sensu e individuais homogêneos.
Tramita, a propósito, no Supremo Tribunal Federal (STF), uma Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) de nº 3943, ajuizada pela Associação
Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), que contesta o
dispositivo de lei contido na LACP, que legitimou a Defensoria Pública a propor
ação civil pública. (BRASIL, 2013).
Aquela associação alega, em síntese e entre outras coisas, que
aqueles que são atendidos pela Defensoria Pública devem ser,
pelo menos, individualizáveis, identificáveis, para que se saiba,
realmente, que a pessoa atendida pela Instituição não possui
recursos suficientes para o ingresso em Juízo [...] não há
possibilidade alguma de a Defensoria Pública atuar na defesa
de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos
como possuidora de legitimação extraordinária [...] conclui-se,
pois, que a legitimidade ampla conferida à Defensoria Pública
não pode prevalecer, em face dos artigos 5º, LXXIV, e 134 da
Constituição Federal. (BRASIL, 2013)
49
Essa não é a única entidade que nega a legitimidade da Defensoria
Pública, a FEBRABAM – Federação Brasileira de Bancos requereu o seu
ingresso como amicus curiae na ADI 3934, corroborando com os argumentos
da Conamp e acrescentando pormenores. (BRASIL, 2013)
Assim, a discussão situa-se em âmbito constitucional ainda, pois embora
a Lei nº 11.448/07 tenha elencado a Defensoria Pública como ente legitimado a
propor a Ação Civil Pública, sem especificar se abrangia ou não apenas os
economicamente hipossuficientes, tal omissão não afastaria a delimitação, a
que estaria submetida a Defensoria, de defender os interesses apenas dos
necessitados.
Esse entendimento baseia-se na interpretação literal dos artigos 134 e
5º, inciso LXXIV da Constituição da República Federativa, que assim dispõe
respectivamente: “A Defensoria Pública é instituição essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em
todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º, LXXIV”, e “O Estado
prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos”. (BRASIL, 1988).
Tal interpretação, no entanto, deve ser afastada, e assim tem feito a
jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. Isso porque, tem-se
interpretado a expressão “necessitados”, no campo da ação civil pública, em
sentido amplo, de modo a inserir ao lado dos precisamente carentes de
recursos financeiros, os hipervulneráveis, isto é, os socialmente estigmatizados
ou excluídos, tais como os consumidores, as crianças, os idosos, as gerações
futuras, as minorias étnicas e, ainda hoje, as mulheres. Veja-se:
Por espelhar e traduzir exemplarmente as marcas
identificadoras do Welfare State, que está baseado nos
princípios da solidariedade, da dignidade da pessoa humana e
da efetiva igualdade de oportunidades, inclusive de acesso à
Justiça, a Defensoria Pública – instituição altruísta por
excelência – é essencial à função jurisdicional do Estado, nos
termos do art. 134, caput, da Constituição Federal. A rigor,
mormente em países de grande desigualdade social, em que a
largas parcelas da população – aos pobres sobretudo – se
nega acesso genuíno ao Judiciário, como ocorre infelizmente
no Brasil, seria impróprio falar em verdadeiro Estado de Direito
sem a existência de uma Defensoria Pública nacionalmente
organizada, conhecida de todos e por todos respeitada, capaz
de atender aos necessitados da maneira mais profissional e
eficaz possível. A expressão “necessitados” (art. 134, caput, da
Constituição), que qualifica, orienta e enobrece a atuação da
Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação
50
Civil Pública, em sentido amplo, de modo a incluir, ao lado dos
estritamente carentes de recursos financeiros – os miseráveis e
pobres -, os hipervulneráveis (isto é, os socialmente
estigmatizados ou excluídos, as crianças, os idosos, as
gerações futuras), enfim todos aqueles que, como indivíduo ou
classe, por conta de sua real debilidade perante abusos ou
arbítrio dos detentores de poder econômico ou político,
“necessitem” da mão benevolente e solidarista do Estado para
sua proteção, mesmo que contra o próprio Estado. Vê-se,
então, que a partir da ideia tradicional da instituição forma-se,
no Welfare State, um novo e mais abrangente círculo de
sujeitos salvaguardados processualmente, isto é, adota-se uma
compreensão do minus habentes impregnada de significado
social, organizacional e de dignificação da pessoa humana. Ao
se analisar a legitimação ad causam da Defensoria Pública
para a propositura de Ação Civil Pública referente a interesses
e direitos difusos, coletivos stricto sensu ou individuais
homogêneos, não se há de contar nos dedos o número de
sujeitos necessitados concretamente beneficiados. Basta um
juízo abstrato, em tese, acerca da extensão subjetiva da
prestação jurisdicional, isto é, da sua capacidade de favorecer,
mesmo que não exclusivamente, os mais carentes, os
hipossuficientes, os desamparados, os hipervulneráveis. A ser
diferente, bastaria ao universo dos sujeitos beneficiados incluir,
direta ou indiretamente, um só abonado ou ricaço para a tutela
solidarista ser negada a centenas ou milhares de necessitados,
deixando-os à míngua diante de graves lesões de natureza
supraindividual
[...]
em
verdade,
cabe
à Defensoria Pública a tutela de qualquer interesse individual
homogêneo, coletivo stricto sensu ou difuso, sobretudo aqueles
associados aos direitos fundamentais, pois sua legitimidade ad
causam não se guia, no essencial, pelas características ou
perfil do objeto da tutela (= critério objetivo), mas pela natureza
ou status dos sujeitos protegidos, concreta ou abstratamente
defendidos, os necessitados (= critério subjetivo), perspectiva
essa que fez com que precedente do STJ ampliasse essa
legitimidade [...] a jurisprudência desta Corte vem se
consolidando no sentido de que a inclusão da entidade como
legitimada ativa para a propositura da Ação Civil Pública faz
parte de mudanças no arcabouço jurídico-processual com o
objetivo de, ampliando o acesso à tutela jurisdicional e
tornando-a efetiva, concretizar o direito fundamental disposto
no art. 5º, XXXV, da CF. (BRASIL, 2011)
A Constituição Federal de 1988 assevera no seu art. 5º caput e incisos
XXXV, LIII, LIV, LV, LXXIV, LXXVIII dentre outros, acerca do acesso à justiça
(BRASIL, 1988). Temos, pois, da leitura desses dispositivos constitucionais,
que o acesso à justiça será pleno apenas consoante a paridade de condições
entre os contendores, sendo certo, que a busca pela satisfação de um direito,
perpassa
pelo
equilíbrio
da
relação
jurídico-processual
e
por
uma
representação adequada das partes litigantes.
Consoante adverte Araken de Assis (2001, p. 75):
É natural que, evitando tornar a garantia judiciária inútil à
maioria da população, e ao menos para os desprovidos de
51
fortuna e recurso, a ordem jurídica estabeleça mecanismos de
apoio e socorro aos menos favorecidos. Antes de colocar os
necessitados em situação material de igualdade, no processo,
urge fornecer-lhes meios mínimos para ingressar na Justiça,
sem embargo da ulterior necessidade de recurso e armas
técnicas, promovendo o equilíbrio concreto.
É nesse sentido que deve ser lido o quanto consta do art. 5º, inciso
LXXIV da Constituição da República, quando assegura “assistência jurídica
integral” aos cidadãos, in verbis: “o Estado prestará assistência jurídica integral
e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” (BRASIL, 1988).
Felipe Dezorzi Borges (2012) explica que nessa norma constitucional
está implícito o objetivo de reverter a visão estritamente econômica do
processo, uma vez que tal inciso resume a evolução dos institutos da
assistência judiciária e da gratuidade de justiça, que estariam adstritos aos
mecanismos de orientação e defesa do cidadão necessitado pobre, para trazer
uma Assistência Jurídica Integral que abrange uma gama maior de garantias a
serem prestadas pelo Estado.
Dessa forma, o Estado propiciou ao cidadão vulnerável instrumentos
para acessar o Judiciário e o extrajudicial, transpondo as barreiras da
vulnerabilidade apenas econômica.
Tem-se, pois, que o conceito de “necessitado” sofreu modificações ao
longo das décadas.
As Constituições de 1934 e 1946 já traziam em seu bojo a prestação de
“assistência integral” em favor dos “necessitados”.
Ocorre, porém, que somente com o art. 68 do Código de Processo Civil
de 1939 tratou-se de forma objetiva de quem seria o destinatário do benefício
da assistência jurídica, qual seja “a parte que não estiver em condições de
pagar as custas do processo, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”.
Posteriormente foi editada a Lei nº 1.060/1950 que “estabelece normas
para a concessão de assistência judiciária aos necessitados”, e que determina
no seu artigo 2º caput e parágrafo único que:
Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros
residentes no País, que necessitarem recorrer à Justiça penal,
civil, militar ou do trabalho [...] Considera-se necessitado, para
os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe
permita pagar as custas do processo e os honorários de
advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
(BRASIL, 1950).
52
Portanto, a redação dada pelo inciso LXXIV do art. 5º da Constituição
Federal de 1988 inova ao se comprometer com uma assistência jurídica
integral que abrange os necessitados nos termos da Lei 1.060/50 e também os
hipossuficientes.
É no contexto de uma constituição social, que o Estado se obriga,
através do seu órgão de atuação, Defensoria Pública, a prestar uma
assistência jurídica integral em prol do cidadão.
Tem-se, dessa feita, um dever de assistência jurídica integral e gratuita
reservada à Defensoria Pública, com o objetivo de garantir acesso à Justiça,
custeada e fornecida pelo Estado, à luz do art. 5º, inciso LXXIV, e art. 134 da
CF/88.
Dessa forma, a despeito da visão tradicional do conceito de necessitado,
deve-se considerar a visão macro da proteção que o Estado visa assegurar
quando da sua aplicação à tutela de direitos ou interesses difusos e coletivos,
de modo a incrementar aquele conceito, por meio de uma releitura aberta e
flexível, que propicie a adequada proteção dos interesses transindividuais.
É que os textos constitucionais anteriores e suas respectivas leis,
sobretudo estatutos processuais, possuíam uma visão individualizada dos
conflitos, que é marca do Estado Liberal, visão essa, apartada da dimensão
transindividual aferível a partir da litigiosidade de massa e dos direitos
metaindividuais e individuais homogêneos.
Nesse passo, é natural o rumo inicialmente trilhado pela legislação
nacional, que dirige a assistência judiciária à defesa de direitos e pretensões
exclusivamente individuais.
Ainda em vigor, a Lei 1060/50 guarda silogismo diverso daquele aferido
pelo inciso LXXIV do art. 5º da CF/88, o qual, muito embora possibilite menção
direta àquela legislação, no sentido de complementar sua garantia, conferiu
amplitude à assistência, haja vista não delimitar em seu texto o titular da
garantia da assistência jurídica integral.
Nesse sentido, a rubrica necessitado – dada pela Lei 1060/50 -, e a
prescrição aos que comprovarem insuficiência de recursos – informada pelo
inciso LXXIV do art. 5º da Constituição, compreendem um microssistema de
proteção integral, cujo alcance não se limita à garantia de direitos individuais,
53
mas também abarca a proteção de direitos difusos, coletivos stricto sensu e
individuais homogêneos, em favor de todos aqueles socialmente vulneráveis.
Essas circunstâncias têm por objetivo realizar o Acesso à Justiça, o que
se revela hodiernamente, através da assistência jurídica integral, de modo que
a leitura do termo necessitado abrange, no ponto, não apenas a pessoa física
economicamente fragilizada, mas também, aqueles necessitados no plano
coletivo,
então
considerada
a
vulnerabilidade
de
defesa
de
direitos
transindividuais e a fragilidade organizacional na salvaguarda as pretensões
coletivas.
Sob esse aspecto, a assistência jurídica integral consubstancia os
necessitados do ponto de vista
organizacional e/ou
presumidamente
hipossuficientes, cuja orientação jurídica de massa e defesa coletivizada, em
todos os graus, incumbe à Defensoria Pública, nos termos do art. 134 da
Constituição Federal.
Outro dos argumentos utilizados por aqueles que negam legitimidade à
Defensoria Pública para a propositura da ação civil pública, é que mais essa
função demandaria grande esforço, e acabaria por desvirtuar a instituição de
sua finalidade precípua, qual seja a defesa dos interesses daqueles que
comprovarem o estado de pobreza.
Dessa forma, haveria um afastamento contínuo do objetivo concebido
pelo legislador constituinte, uma vez que a Lei Maior adota como princípio
básico a proibição do retrocesso.
Sustenta-se que a Defensoria Pública teria ainda, muitos problemas
estruturais, como o número insuficiente de unidades e de defensores para fazer
frente a uma demanda que ficaria ainda maior com mais atribuições,
diminuindo a eficiência dos atendimentos.
Sobre o assunto entende Renato Franco de Almeida (2009, p. 42):
De efeito, à luz da realidade institucional da Defensoria Pública
em todo o país, é notório que a ampliação de suas atribuições
operada pela lei sob comento tem o condão de, obliquamente,
mitigar a concretização de direito fundamental estampado no
art. 5º, LXXIV, da Constituição da República, em flagrante
violação ao princípio da proibição do retrocesso [...] destarte,
impõe-se reconhecer que a atuação legislativa conformadora
deve restringir-se à maior concretização dos direitos sociais
lato sensu, e, não operar um retrocesso social em relação à
legislação infraconstitucional em vigor. Nessa linha de
raciocínio, podemos afirmar que a Lei nº 11. 448/2007 se
traduz em claro retrocesso social.
54
Contudo, a atuação mais ampla da Defensoria Pública, leia-se, a sua
legitimidade para a propositura da ação civil pública, ao contrário do que
afirmam os que negam essa possibilidade, contribui, e muito, para a
concretização dos direitos sociais, uma vez que a hipossuficiência que
desiguala os litigantes e diminui o acesso à justiça, é exponencialmente maior
do que a carência de recursos financeiros e não se restringe a essa. Não
podendo, pois, falar-se em retrocesso social em relação à Lei nº 11.448/07.
Doravante, as demandas coletivas, substituem centenas de lides
individuais, e colaboram com o progresso da cidadania, da igualdade, além de
reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos.
Estando, pois, de acordo com os fundamentos e objetivos da República
Federativa do Brasil.
De forma alguma os direitos sociais conquistados estariam ameaçados
por falta de serem praticados através da assistência judiciária, mas estariam
ainda mais garantidos.
A Lei nº 11.448/07, não pode ser tida como inconstitucional, pois não
anula, revoga ou aniquila qualquer pretensão de direito e tampouco afeta o
núcleo essencial daqueles.
É compreensível que haja uma preocupação, até saudável, em não se
querer ver os direitos sociais conquistados, desprotegidos, uma vez que tomar
medidas,
sem
a
respectiva
criação
de
mecanismos
alternativos
ou
compensatórios pode resultar em um vazio, no que diz respeito à atividade
prestacional do Estado. Assim, é de se impor a esse, a adoção de medidas
neutralizadoras de tudo aquilo que possa resultar em diminuição dos direitos
dos cidadãos, para se evitar efeitos negativos na esfera jurídica desses
indivíduos (CANOTILHO, 1941, p. 339/340):
O princípio da proibição do retrocesso social pode formular-se
assim: o núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e
efectivado através de medidas legislativas (“lei de segurança
social”, “lei do subsídio de desemprego”, “lei do serviço de
saúde”) deve considerar-se constitucionalmente garantido,
sendo inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que, sem
a criação de outros esquemas alternativos ou compensatórios,
se traduzam, na prática, numa “anulação”, “revogação” ou
“aniquilação” pura e simples desse núcleo essencial. Não se
trata, pois, de proibir um retrocesso social captado em termos
ideológicos ou formulado em termos gerais ou de garantir em
abstracto um status quo social, mas de proteger direitos
55
fundamentais sociais sobretudo no seu núcleo essencial [...]
impondo-se ao Estado o dever da adopção de medidas
neutralizadoras da diminuição dos direitos sociais do
<<cidadão-utente.
É bem verdade, que a Defensoria enfrenta problemas como a carência
de pessoal de apoio, já que não tem quadro próprio suficiente, e a excessiva
centralização orçamentária e financeira.
No entanto, é inquestionável o fato de que a Defensoria Pública, apesar
de todas as dificuldades, passa por um momento de transformação e
ascensão.
A despeito dos obstáculos, a Defensoria dispõe de vários fatores que
favorecem sua atuação, como: contato direto com a população, atribuições
estratégicas: inclusão social, atuação extrajudicial, abrangência nacional,
carreira com previsão constitucional, paixão dos Defensores pela causa, apelo
político dos membros e gestores, Defensor Público–Geral da União eleito
dentre os membros da carreira.
Dessa forma, a Defensoria Pública está buscando se aperfeiçoar, por
meio de medidas que a tornam cada vez mais eficiente e eficaz, como o
aprimoramento de seus quadros internos e a elaboração e implementação de
planos e estratégias de ação.
Cumpre observar ainda, que a Lei nº 11.448/07 não trouxe de forma
inédita a legitimidade da Defensoria Pública para o manejo da ação civil
pública. Nesse sentido, note-se a jurisprudência do STJ:
É imperioso reiterar, conforme precedentes do Superior
Tribunal de Justiça, que a legitimatio ad causam da Defensoria
Pública para intentar ação civil pública na defesa de interesses
transindividuais de hipossuficientes é reconhecida antes
mesmo do advento da Lei 11.448/07, dada a relevância social
(e jurídica) do direito que se pretende tutelar e do próprio fim do
ordenamento jurídico brasileiro: assegurar a dignidade da
pessoa humana, entendida como núcleo central dos direitos
fundamentais. (BRASIL, 2011)
Assim, todos aqueles, de forma individual ou não, que por conta de suas
debilidades reais e não meramente formais, bem como dos abusos dos
detentores do poder econômico ou político, ou ainda aqueles afetados por um
mau uso da discricionariedade conferida à Administração Pública, necessitem
da proteção do Estado, que por este mesmo é prestada através dos entes
competentes, são necessitados em termos de acesso à justiça.
56
Para
explicar
tal
expansão
do
conceito
de
“necessitados”,
a
jurisprudência vem alegando que em países de grande desigualdade social,
como o Brasil, não se pode garantir um acesso genuíno ao Poder Judiciário, e
assim se falar em verdadeiro Estado de Direito, sem a presença de uma
Defensoria Pública nacionalmente organizada, conhecida dos cidadãos, capaz
de atender aos hipossuficientes da forma mais abrangente possível,
profissional de eficaz (BRASIL, 2012).
E, verdadeiramente não se pode compreender os direitos, sobretudo os
que estão emergindo, sem a consideração e a compreensão da sociedade em
que eles estão inseridos, e tampouco falar-se em democracia, sem a proteção
daqueles direitos.
Assim, é imperioso reconhecer, que a promulgação da CF/88 permitiu a
amplificação da tutela coletiva, uma vez que os seus princípios, direitos e
garantias fundamentais, ensejam uma maior exigência da instrumentalidade do
processo, da promoção da justiça social, da efetivação dos direitos coletivos e
da diminuição do espaço existente entre a teoria e a prática processual. Nesse
sentido, veja-se o brilhante pensamento do filósofo do direito Norberto Bobbio
(1909, p. 21 e 83):
Nesse sentido, veja-se o brilhante pensamento do filósofo do
direito Norberto Bobbio: Direitos do homem, democracia e paz
são três momentos necessários do mesmo movimento
histórico: sem direitos do homem reconhecidos e protegidos
não há democracia; sem democracia não existem as condições
mínimas para a solução pacífica dos conflitos [...] Num discurso
geral sobre os direitos do homem deve-se ter a preocupação
inicial de manter a distinção entre teoria e prática, ou melhor,
deve-se ter em mente, antes de mais nada, que teoria e prática
percorrem duas estradas diversas e a velocidades muito
desiguais. Quero dizer que, nestes últimos anos, falou-se e
continua a falar de direitos do homem, entre eruditos, filósofos,
juristas, sociólogos e políticos, muito mais do que se conseguiu
fazer até agora para que eles sejam reconhecidos e protegidos
efetivamente, ou seja, para transformar aspirações (nobres,
mas vagas), exigências (justas, mas débeis), em direitos
propriamente ditos (isto é, no sentido em que os juristas falam
de “direito”). Tendo sempre presente essa distinção, a fim de
não confundir dois planos que devem se manter bem distintos,
pode-se afirmar, em geral, que o desenvolvimento da teoria e
da prática (mais da teoria do que da prática) dos direitos do
homem ocorreu, a partir do final da guerra, essencialmente em
duas direções: na direção de sua universalização e naquela de
sua multiplicação. Não irei me deter aqui no processo de
universalização, antes de mais nada porque me parece menos
relevante para a sociologia do direito, e depois porque o tema
foi amplamente tratado na doutrina do direito internacional, que
vê corretamente, nesse processo, o ponto de partida de uma
57
profunda transformação do direito das “gentes”, como foi
chamado durante séculos, em direito também dos “indivíduos”,
dos indivíduos singulares, os quais, adquirindo pelo menos
potencialmente o direito de questionarem o seu próprio Estado,
vão se transformando, de cidadãos de um Estado particular,
em cidadãos do mundo. Irei me deter em particular no segundo
processo, o da multiplicação, pois ele se presta melhor a
algumas considerações sobre as relações entre direito do
homem e sociedade, sobre a origem social dos direitos do
homem, sobre a estreita conexão existente entre mudança
social e nascimento de novos direitos, sobre temas que, em
minha opinião, podem ser mais interessantes para uma reunião
de sociólogos do direito, de estudiosos cuja tarefa específica é
refletir sobre o direito como fenômeno social. Também os
direitos do homem são, indubitavelmente um fenômeno social:
e, entre os vários pontos de vista de onde podem ser
examinados (filosófico, jurídico, econômico, etc.), há lugar para
o sociológico, precisamente o da sociologia jurídica. Essa
multiplicação (ia dizendo “proliferação”) ocorreu de três modos:
a) porque aumentou a quantidade de bens considerados
merecedores de tutela; b) porque foi estendida a titularidade de
alguns direitos típicos a sujeitos diversos do homem; c) porque
o próprio homem não é mais visto na especificidade ou na
concreticidade de suas diversas maneira de ser em sociedade,
como criança, velho, doente, etc. Em substância: mais bens,
mais sujeitos, mais status do indivíduo. É supérfluo notar que,
entre esses três processos, existem relações de
interdependência: o reconhecimento de novos direitos de (onde
“de” indica sujeito) implica quase sempre o aumento de direitos
a (onde “a” indica o objeto). Ainda mais supérfluo é observar, o
que importa para nossos fins, que todas as três causas dessa
multiplicação cada vez mais acelerada dos direitos do homem
revelam, de modo cada vez mais evidente e explícito a
necessidade de fazer referência a um contexto social
determinado.
Vê-se que a atuação estatal hodierna, revela uma tendência pósmoderna, de superação do individualismo liberal, e se volta mais à realização
do que à declaração dos direitos de cunho coletivos.
Dessa forma, os instrumentos de proteção e efetivação dos direitos, bem
como o conceito de necessitados devem acompanhar a sociedade, que está
cada vez mais organizada sob a forma de grupos de vulnerabilidade que vão
muito além da carência de recursos. Deve-se ter em mente, que a natureza dos
direitos coletivos e difusos não permite outro meio de defesa, senão a tutela
coletiva.
Veja-se esse julgado da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da
Quarta Região do relator Rogério Favreto:
A defesa dos necessitados não se resume àquelas pessoas
desprovidas de recursos financeiros para contratar advogado a
fim de representa-los processualmente. O necessitado pode
ser definido como aquela pessoa que se encontra em estado
de vulnerabilidade social, podendo ser incluído não somente o
58
indivíduo na condição de consumidor, mas também aquele que
busca tutela em razão de sua condição de segurado pelo
regime geral da previdência social.
E, a Defensoria Pública instituição solidária por natureza, e essencial à
função jurisdicional do Estado, deve ser legitimada a atender as necessidades
dessas coletividades que nem sempre vêm expressas na forma de pobreza,
mas em grande parte das vezes, de abusos do próprio Estado, bem como do
avanço da própria sociedade.
Não se pode conceber uma democracia amarrada à literalidade das
palavras e distanciada de sua realidade social, sob pena de se cometer
grandes injustiças.
Ademais, a ação civil pública obedece aos ditames dos princípios do
sistema processual coletivo, cuja premissa maior é o acesso à justiça, entre
outros princípios como o da Participação Social no Processo Coletivo, o que
não se concretiza com o monopólio da ação civil pública nas mãos do
Ministério Público.
É bem verdade, que o modelo ideal seria que a própria sociedade civil
organizada se apropriasse dos instrumentos de tutela coletiva e, assim, desse
vasão à proteção dos seus direitos de forma mais independente e autônoma, e
não depender, quase que exclusivamente, das entidades públicas para fazer
sua defesa.
Mas o processo democrático caminha ao seu próprio tempo, e enquanto
a sociedade civil não conhece de forma apropriada os mecanismos de defesa
que estão à sua disposição, a legitimidade da Defensoria Pública quebra um
pouco dessa quase exclusividade do órgão ministerial, dando efetividade aos
princípios do processo coletivo ao mesmo tempo em que cumpre com sua
função constitucional e missão institucional, de essencialidade à jurisdição e
defesa dos mais necessitados.
Vê-se assim, que o processo não pode servir de obstáculo, é preferível a
matéria em detrimento da forma. O processo deve ser o veículo a impulsionar a
efetivação dos direitos, sobretudo os coletivos e difusos, que demandam ainda
maior responsabilidade social, e não uma utopia.
59
5.1 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO
CIVIL PÚBLICA NA DEFESA DE DIREITOS COLETIVOS STRICTO SENSU
Dispõe o art. 4º, inciso VIII, X e XI da Lei Complementar nº 80/1994, com
redação dada pela LC nº 132, de 2009, que:
São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre
outras: [...] exercer a defesa dos direitos e interesses
individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e dos
direitos do consumidor, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da
Constituição Federal; [...] promover a mais ampla defesa dos
direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus
direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e
ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações
capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela; [...] exercer
a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do
adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades
especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e
de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção
especial do Estado. (BRASIL, 1994, grifo nosso).
E, tendo-se demonstrado que a vulnerabilidade presente em nossa
sociedade não é só a econômica, mas fala-se ainda em “fragilidade
organizacional”, no que diz respeito ao acesso à justiça, não estaria cumprindo
a Defensoria Pública com suas funções institucionais, se não amparasse todo e
qualquer grupo social que faça jus à especial proteção do Estado.
O Defensor Público Federal Felipe Dezorzi Borges (2012, p. 190/191),
esclarece o seguinte:
E certo que existem necessitados no plano econômico, mas
também existem necessitados do ponto de vista
organizacional. Consoante adverte Ada Pellegrini Grinover: ou
seja, todos aqueles que são socialmente vulneráveis: os
consumidores, os usuários de serviços públicos, os usuários de
planos de saúde, os que queiram implementar ou contestar
políticas públicas, como as atinentes à saúde, à moradia, ao
saneamento básico, ao meio ambiente etc.
Assim, a Defensoria possui legitimidade para defender direitos coletivos
em juízo, haja vista ser essa uma das suas funções institucionais.
5.2 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO
CIVIL PÚBLICA NA DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS
Para que se possa compreender a Defensoria Pública como entidade
legitimada a defender em juízo direitos difusos, é preciso atentar para a
natureza desses direitos, que não permite o reconhecimento dos sujeitos
individualmente considerados, que são detentores de determinado direito, e
que estão sendo lesados, ou em risco de sê-lo.
60
Existe, em verdade, uma ordem lógica no ordenamento jurídico
brasileiro, irrefreável, a propósito, que legitima a Defensoria Pública a defender
os direitos difusos, ela não é aleatória, mas decorre primeiramente da
Constituição,
depois
das
leis,
sobretudo
daquelas
que
compõem
o
microssistema de tutela coletiva, e da interpretação que os tribunais superiores
têm conferido a Carta Magna e a essas.
Acerca desse tema, discorreu o ministro Celso de Mello quando do seu
voto nos autos do recurso extraordinário nº 163.231-3/SP, da seguinte forma:
O sistema normativo brasileiro, tendo presentes a natureza e a
alta significação de determinados valores sociais suscetíveis de
proteção estatal – e observando, ainda, uma tendência que
então se verificava no plano do direito comparado, no sentido
da crescente coletivização dos instrumentos de índole
processual – veio a instituir mecanismo ágil destinado a
viabilizar, de modo eficaz, imediata tutela jurisdicional dos
interesses metaindividuais, cuja noção conceitual resultou de
um demorado processo de elaboração teórica. A construção
doutrinária em torno desse tema, que é recente no Brasil
(1976), tem a sua origem histórica vinculada ao gênio jurídico
de Roma. Os estudiosos do tema, ao analisarem o perfil
histórico do processo civil romano, costumam mencionar as
actiones populares como o instrumento original de proteção
aos interesses coletivos e difusos. Os interesses
metaindividuais, ou de caráter transindividual, constituem
valores cuja titularidade transcende a esfera meramente
subjetiva, vale dizer, a dimensão puramente individual das
pessoas e das instituições. São direitos que pertencem a todos,
considerados em perspectiva global. Deles, ninguém,
isoladamente, é o titular exclusivo. Não se concentram num
titular único, simplesmente porque concernem a todos, e a
cada um de nós, enquanto membros integrantes da
coletividade. Na real verdade, a complexidade desses múltiplos
interesses não permite sejam discriminados e identificados na
lei. Os interesses difusos e coletivos não comportam rol
exaustivo. A cada momento, e em função de novas exigências
impostas pela sociedade moderna e pós-industrial, evidenciamse novos valores, pertencentes a todo o grupo social, cuja
tutela se revela necessária e inafastável. Os interesses
transindividuais, por isso mesmo, são inominados, embora haja
alguns, mais evidentes, como os relacionados aos direitos do
consumidor ou concernentes ao patrimônio ambiental,
histórico, artístico, estético e cultural. Em todas as formações
sociais, com maior ou menor intensidade, a presença desses
interesses, notadamente daqueles que ostentam caráter difuso,
tem sido marcante: o direito à saúde, o direito à habitação, o
direito a um ambiente ecologicamente equilibrado, o direito a
uma qualidade superior de vida, o direito ao aproveitamento
racional dos recursos naturais, o direito à conservação da
natureza, o direito à publicidade comercial honesta, o direito à
utilização adequada do solo urbano e rural, o direito à
intangibilidade do patrimônio cultural da Nação [...].
61
Assim, a legitimidade da Defensoria Pública para a defesa de direitos
difusos, por meio da ação civil pública, decorre da própria natureza desses
direitos, que fazem parte da sociedade moderna e complexa em que estamos
inseridos, sendo responsabilidade do operador do direito contribuir com a
realização do “projeto constitucional-democrático”.
5.3 A LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO
CIVIL PÚBLICA NA DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS
Donizetti (2010) nos lembra de que, no que tange aos direitos difusos e
coletivos em sentido estrito, a própria Lei da Ação Civil Pública, expressamente
autoriza a defesa desses interesses pela via da ACP, ao passo que, no que diz
respeito aos direitos individuais homogêneos, ambas a Constituição Federal e
a LACP são omissas quanto ao seu ajuizamento por intermédio da ação
coletiva em comento.
Assim, além da discussão acerca da legitimidade da Defensoria Pública
poder ajuizar a ação civil pública na defesa de direitos coletivos e difusos, ante
a indefinição de sujeitos beneficiados com a medida, com relação aos direitos
individuais homogêneos, alega-se haver a possiblidade de se individualizar os
indivíduos, exigindo-se, ainda mais, que eles sejam hipossuficientes para que a
referida entidade possa substituir esses sujeitos em juízo.
Nesse diapasão, faz-se necessária a sutileza do intérprete da lei, em
sempre fazer uma leitura coordenada dos diplomas legais que compõem o
microssistema de tutela coletiva. O que levará a conclusão de que é cabível a
defesa dos direitos individuais homogêneos, pela via da ACP.
Conforme já restou demonstrado, temos em nosso ordenamento jurídico,
um microssistema de tutela coletiva, no qual, a LACP é complementada pelo
CDC, e vice versa.
Assim,
sabendo
que
não
estamos
incorrendo
em
nenhuma
impropriedade ao fazer essa correspondência, veja-se o quanto dispõe o
parágrafo único do art. 81, III do CDC: “a defesa coletiva será exercida quando
se tratar de: [...] interesses ou direitos individuais homogêneos, assim
entendidos os de origem comum”. (BRASIL, 1990).
Aplicando-se o dispositivo mencionado à LACP, temos a possibilidade
de a Defensoria Pública tutelar, por intermédio da ação civil pública, qualquer
62
direito individual homogêneo, uma vez que, por força do art. 21 da LACP,
essas leis (LACP e CDC), integram um mesmo diploma normativo.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, mantém suas decisões.
Veja-se:
A Lei 8.078/90, ao alterar o art. 21 da Lei 7.347/85, ampliou o alcance
da ação civil pública e das ações coletivas para abranger a defesa de
interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, desde que
presente o interesse social relevante na demanda. In casu, os
interesses são homogêneos, tendo em vista o debate de uma ampla
classe de segurados da Previdência Social, onde se tem um universo
indeterminado de titulares desses direitos [...]. Recurso desprovido.
Com vistas a fundamentar ainda mais o que se afirma, o Supremo
Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 163.231
– SP, entendeu que os interesses individuais homogêneos são espécies de
interesses coletivos. Veja-se:
CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS
INTERESSES
DIFUSOS,
COLETIVOS
E
HOMOGÊNEOS.
MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO
PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. [...] Direitos ou interesses
homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da
Lei n 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em
subespécie de direitos coletivos. 4.1 Quer se afirme interesses
coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu,
ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos,
explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou
classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas
isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim
de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua
concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias
ou classe de pessoas.
Tendo como base o julgado acima transcrito, e o art. 1º, inciso V da Lei
nº 7.347/1985, que disciplina ser cabível a ação civil pública para tutela de
“qualquer outro interesse difuso ou coletivo”, conclui-se que cabe ação civil
pública na defesa de direitos individuais homogêneos.
Isso porque, temos uma premissa maior, cabe ação civil pública para
proteção de qualquer interesse coletivo (art. 1º, V, LACP), uma premissa
menor, os interesses individuais homogêneos são espécies de interesses
coletivos (entendimento do STF); logo, cabe ação civil pública para defesa de
qualquer interesse individual homogêneo.
63
6 CONCLUSÃO
Conclui-se, pois que a Defensoria Pública possui legitimidade para o
ajuizamento da Ação Civil Pública, a uma porque a Lei da Ação Civil Pública
elencou essa instituição no rol dos legitimados; e a duas porque, em razão da
referência recíproca entre a LACP e o CDC, essa legitimidade abrange todo e
qualquer interesse coletivo stricto sensu, difuso e individual homogêneo.
Ademais, a Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, com
redação dada pela LC nº 132 de 2009, regula a Defensoria Pública da União,
do Distrito Federal e dos Territórios, dispõe no seu art. 4º, inciso XI, que é
função institucional da Defensoria Pública, a defesa de grupos sociais
vulneráveis.
E, no que tange especificamente a legitimidade da referida instituição na
Constituição da República Federativa do Brasil, dentre os modelos de
assistência judiciária que poderiam ter sido adotados, consta na nossa Carta
Magna a Defensoria Pública, sistema de representação por Defensor Público,
que não prioriza apenas lides individuais, mas identifica as necessidades da
comunidade e problemas sociais, sendo aquele, detentor de autonomia,
inclusive para apontar soluções metaindividuais.
Assim, a nossa Constituição traz em seu bojo um modelo de assistência
judiciária viva, cuja finalidade é dar maior efetividade aos direitos, o que se dá
por meio do acesso à justiça.
Dessa
forma,
considerando-se
os
novos
direitos
de
cunho
transindividuais e os grupos de vulnerabilidade existentes na atualidade, não se
pode falar em Estado Democrático de Direito, sem uma Defensoria Pública
atuante.
Vê-se, pois, que o conceito de "necessitados" não pode ser estático e
restritivo, mas deve ser visto como parte integrante de uma sistemática
constitucional, que privilegia o progresso.
A legitimidade da Defensoria Pública para defender direitos coletivos
stricto sensu, difusos e individuais homogêneos está radicada ainda, no artigo
3º da Constituição Federal de 1988, que traz os atuais fundamentos da
República Federativa do Brasil, sobretudo no inciso III desse dispositivo de lei,
que propõe a erradicação não somente da pobreza, mas da marginalização, e
a redução das desigualdades sociais e regionais.
64
Dessa forma, o constituinte deferiu à Defensoria Pública uma
legitimidade ampla e irrestrita para defender o seu objeto institucional,
amparada em premissas democrático-constitucionais, sustentadas no art. 134
e sua remissão ao inciso LXXIV do art. 5º, da CF/88, atualmente confirmadas
pelos incisos VII, VII, VIII, IX, X e XII, IX, X e XI do art. 4º da Lei Complementar
n. 80 de 1994 (com alteração dada pela LC 132 de 2009), a autorizar a defesa
e orientação dos interesses e direitos de todas as categorias de
hipossuficientes, o que inclui o cidadão economicamente pobre, o grupo
vulnerável, a coletividade de pessoas cuja falta de organização social ou
cultural não consiga, per si, alcançar a plenitude do acesso à justiça.
65
REFERÊNCIAS
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preto e branco. Retratos Institucionais da Defensoria Pública. Ed. Lumen Juris.
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BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho;
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Morgana Souza Militão - Universidade Católica de Brasília