O PLANEJAMENTO PEDAGÓGICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Denise Dalpiaz Antunes (Mestranda/ PUCRS)
Jussara Bernardi Hauschild (Mestranda/ PUCRS)
Resumo
Construir uma proposta pedagógica, contemplando educar, cuidar e brincar
significa planejar ações pedagógicas, que auxiliem as crianças. Estas
considerações originaram a pesquisa O planejamento pedagógico na
Educação Infantil Tendo como problema detectar os tipos de planejamento
desenvolvidos junto às crianças. Os resultados evidenciam que as instituições
de ensino possuem planejamento para as intervenções pedagógicas na
Educação Infantil, embora diferente entre si.
Palavras – chave: Planejamento Pedagógico, Educação Infantil, Projetos de
Trabalho.
O planejamento pedagógico na educação infantil
A Educação Infantil é apresentada na atual legislação brasileira como a
primeira etapa da educação básica, onde a prática pedagógica deve favorecer
a construção do conhecimento das crianças de 0 a 6 anos de idade.
O Planejamento frente as Diferentes Pedagogias
O estudo das diferentes pedagogias constata a existência de um
conjunto de influências teórico-metodológicas permeando a construção das
propostas curriculares, ao longo da história da escola.
Conforme Libâneo (2002), estas tendências pedagógicas, que se têm
estabelecido nas escolas através das ações educativas dos professores,
classificam-se em pedagogia liberal e pedagogia progressista.
Nas pedagogias liberais, a escola é tida como instrumento de
preparação dos indivíduos para a sociedade. Nesse grupo, encontram-se a
tendência tradicional, a tendência renovada progressivista, a tendência
renovada não-diretiva e a tendência tecnicista.
Na tendência tradicional, o professor era o total responsável pelo
planejamento, não considerando nem os interesses nem as necessidades da
criança, consolidando-se uma prática pedagógica voltada para a construção da
moralidade, para o cuidado com a higiene e para o treinamento de habilidades,
através das Unidades Didáticas.
A tendência progressivista contemplava: a globalização, o interesse e a
participação dos alunos, onde os conteúdos escolares foram organizados em
torno de um Centro de Interesse.
Na tendência renovada não-diretiva, a escola era responsável pela
formação de atitudes no indivíduo, onde a educação estava centrada no aluno.
Este buscava por si mesmo os conhecimentos.
Já no enfoque educacional tecnicista, o planejamento didático era formal
e
previamente
elaborado,
introduzindo
no
ensino
uma
pedagogia
comportamental. Visando a aquisição de habilidades, atitudes e técnicas
específicas.
Dentro das pedagogias progressistas, que fomentava a transformação
da sociedade através da análise crítica da realidade, destacaram-se a
tendência libertadora, a tendência libertária e a tendência crítico social dos
conteúdos.
A tendência libertadora ou método de Paulo Freire abordou os Temas
Geradores como forma de planejamento. Com concepções epistemológicas
semelhantes ao planejamento por temas geradores, encontram-se outras
formas de definir o currículo, difundidos como Rede Temática ou Complexo
Temático. Tais definições partem do levantamento da realidade local, onde a
escola está inserida.
Outra tendência progressista que partia da análise crítica da realidade
social era a escola libertária, a qual se inseria num projeto de modificação da
sociedade, como instrumento de resistência contra a burocracia. Os conteúdos
eram colocados à disposição do aluno, mas não era exigido, sendo o principal
conhecimento
adquirido
aquele
resultante
das
desenvolvidos pelos alunos através da auto-gestão.
experiências
grupais
E, finalmente, a tendência crítico-social dos conteúdos, assume os
Projetos de Trabalho como forma de organizar o currículo, valorizando a
escola como mediadora entre o aluno e o conhecimento.
As diferentes maneiras de planejar o ensino abrangendo desde a
listagem dos conteúdos da educação tradicional, passando pela organização
das aprendizagens escolares em torno dos centros de interesse, no
escolanovismo, ou ainda, questões interdisciplinares tratadas por temas
geradores na pedagogia libertadora e, por fim, os projetos de trabalho têm sido
difundidas ao longo da história.
As crenças e as ações dos docentes a cerca do planejamento de ensino
Os dados foram coletados em nove instituições de Porto Alegre das
redes privada, estadual e municipal de ensino em 2002. O trabalho foi
desenvolvido numa abordagem sócio-antropológica, etnográfica e qualitativa,
utilizando-se, como instrumentos de pesquisa: o protocolo de observações
descritivas e de entrevistas semi-estruturadas, gravações fonográficas e
registros fotográficos. Os dados foram sistematizados, ordenados, examinados
e submetidos a uma análise de conteúdo vertical e horizontal, identificando um
fazer pedagógico que contemplasse as diferentes necessidades dos pequenos.
Analisando as diferentes concepções pedagógicas na práxis dos
profissionais da Educação Infantil, percebe-se um abismo na constituição dos
planejamentos pedagógicos das instituições investigadas.
Na elaboração do planejamento as instituições de ensino privado
utilizam princípios de sua mantenedora. Já nas escolas públicas não é
encontrada uma filosofia que norteie a proposta político-pedagógica, os
educadores utilizam-se de várias concepções pedagógicas ao mesmo tempo.
As práticas docentes remetem a métodos pedagógicos desenvolvidos
pela Escola Nova como os centros de interesse utilizados por Decroly. Outro
aspecto relevante que aparece na prática pedagógica dos profissionais é o
resgate de uma pedagogia libertadora, onde o planejamento é feito em cima de
temas geradores, estabelecidos das relações com o meio no qual o educando
está inserido. Segundo Freire (1974, p. 124): “Estes temas se chamam
geradores porque, qualquer que seja a natureza de sua compreensão como da
ação por eles provocada, contém em si a possibilidade de desdobrar-se em
outros tantos temas que, por sua vez, provocam novas tarefas a serem
cumpridas”.
Os complexos temáticos citados apenas pelos docentes da rede
municipal de Porto Alegre, tornaram-se obsoletos e engavetados. Segundo os
depoimentos dos docentes, tal fato ocorreu porque os complexos temáticos
dificultam o trabalho pedagógico interdisciplinar.
Por outro lado, encontram-se também nos atos de ensino de alguns
profissionais da Educação Infantil, a implementação de uma metodologia de
trabalho preocupada em desenvolver um conteúdo mais significativo que
oportuniza
situações
de
maior
envolvimento
por
parte
dos
alunos,
denominados como projetos de trabalho.
A organização dos projetos de trabalho, se baseia
fundamentalmente numa concepção da globalização
entendida como um processo muito mais interno do
que externo, no qual as relações entre conteúdos e
áreas de conhecimento tem lugar em função das
necessidades que traz consigo o fato de resolver
uma série de problemas que subjazem na
aprendizagem. (HERNANDEZ e VENTURA, 1998, p.
63)
No universo dos participantes da pesquisa a opção consciente por um
processo de construção em parceria com os alunos, através dos projetos de
trabalho, é quase inexpressiva. Em grande parte das instituições de Educação
Infantil, o professor é o idealizador de propostas pedagógicas estereotipadas
ou ambígüas ou, até mesmo, seguidor de uma proposta elaborada pela
supervisão pedagógica.
Esta diversidade presente na elaboração do planejamento evidencia o
tecnicismo, leva à classe os projetos de trabalho, contemplam a visão sóciointeracionista, abordam os centros de interesse, os temas geradores, os
complexos temáticos e a pedagogia construtivista, tecendo uma verdadeira
“colcha de retalhos pedagógica”.
Carta de Navegação
Já no século XXI, é surpreendente que a escola ainda transite com
concepções sócio-educativas do século XVII e continue privilegiando as
relações de poder sobre as de saber. As inovações no ensino devem acontecer
dentro da sala de aula, e em sintonia com a realidade local, global, bem como
em coerência com aquilo que os alunos esperam aprender.
Os profissionais participantes da pesquisa, na sua maioria, possuem
formação acadêmica para atuar no Ensino Fundamental, sendo que esta
formação, não contempla a habilitação específica para a Educação Infantil.
Porém, sua atuação não foi muito aquém daqueles que possuem uma
formação específica. Constata-se que, assim, que o domínio acadêmico do
saber pareceu não influenciar na prática efetiva, que vai desde cuidados
básicos essenciais para com os pequenos até conhecimentos específicos das
diferentes áreas do desenvolvimento das crianças de 0 a 6 anos.
Em contrapartida, não basta ter apenas competência acadêmica é
preciso que estes profissionais tornem-se aprendizes do saber. É necessária
uma reflexão diária sobre as suas práticas, utilizando-se da observação, do
registro, da avaliação e do planejamento.
A análise evidenciou professores com práticas bastante aproximadas,
inclusive fazendo as mesmas atividades. Em oposto, há professores fazendo à
planificação de todas as suas ações pedagógicas. Há alguns que fazem
apenas um esboço das atividades desenvolvidas durante suas situações
didáticas e há outros educadores, com práticas arcaicas e contraditórias,
usando recursos pedagógicos não condizentes com a realidade do ensino e do
aluno.
Nesse sentido, observou-se que a prática do professor em sala de aula,
nem sempre, leva em conta o que foi planejado. Os docentes, muitas vezes,
copiam de um ano para o outro os planos de ensino já idealizados.
Uma boa parte dos actos de ensino não está,
deixaram de estar ou nunca estiveram sob o controle
da razão e da escolha deliberada. Por um lado, a
profissão é composta por rotinas que o docente põe
em acção de forma relativamente consciente, mas
sem avaliar o seu caracter arbitrário, logo sem as
escolher e controlar verdadeiramente. É a parte de
reprodução, de tradição colectiva retomada por
conta própria ou de hábitos pessoais cuja origem se
perde no tempo (PERRENOUD, 1993, p. 21).
Este tipo de análise pode elucidar a idéia de que as práticas educativas
não são as concretizações de uma teoria aplicada na sala de aula, nem
tampouco regras de ação ou receitas. É muito mais que isso, além de
obedecerem a um conjunto de regras e filosofias determinadas pelo sistema
educacional, são concebidas segundo as concepções que cada profissional
entende possuir.
É insuficiente dominar o saber, este deve ser modificado, a partir da
competência pedagógica e inscrito num contrato didático que sustenta a
epistemologia e a transposição didática dos saberes, arquitetado para além de
uma competência acadêmica.
É visível a distância entre a prática efetiva e a intenção expressa nos
planos, o que salienta a falta de sentido no planejamento, colocando este, num
campo de disputas e controvérsias. Falta consciência educacional no que se
refere à importância de planejar. É preciso provocar novas interrogações no
meio educativo para que possa haver um processo de entendimento e de
compreensão, dando um novo sentido ao educar - aprender.
Alguns dos problemas que a instituição escolar enfrenta hoje ou que a
sociedade leva à escola precisam ser entendidos de outra maneira. Como por
exemplo, a globalização do ensino, ou seja, retirar da informação tudo aquilo
que mais se aproxima da identidade de cada aluno e que possa favorecer a
construção de seus saberes. Além de recordar as informações de que se
aprende na escola, passa a ser importante transferí-las sempre que
necessário, e com a complexidade do conhecimento.
Para poder dar resposta ao conjunto das suas missões, a
educação
deve
organizar-se
em
torno
de
quatro
aprendizagens fundamentais que, ao longo de toda a
vida, serão de algum modo para cada indivíduo, os pilares
do conhecimento: aprender a conhecer, isto é adquirir os
instrumentos da compreensão; aprender a fazer, para
poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver
juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em
todas as atividades humanas; finalmente aprender a ser,
via essencial que integra as três precedentes (Delors,
2001, p. 89-90).
Numa nova perspectiva para que a escola possa cumprir seu papel
social e educativo, o professor deve contextualizar a prática pedagógica de
forma a ensinar o seu aluno a entender o significado do seu aprender, através
de experiências inovadoras, entendendo assim, como tirar das tantas
informações o seu saber.
Transgredir e mudar a visão da escola, dentro de realidades socialmente
determinadas, busca despertar um novo fazer pedagógico, sem desvirtuar ou
simplificar os intercâmbios simbólicos que a sala de aula representa. Ao
pensarmos na Educação Infantil, percebe-se o quão importante é uma
concepção onde a criança possa ser percebida como um sujeito em plena
construção pessoal e social, e que precisa ser respeitado em cada época de
sua vida.
Ao professor desta fase tão significativa cabe o despertar deste
processo educativo, onde a escola atual busca uma proposta recriadora e
transgressora para uma escolarização que proporciona desvincular-se de uma
visão tradicional, tecnicista e descontextualizada.
Quando se pensa e se percebe a necessidade de mudar o planejar,
entende-se a real dimensão do grau de complexidade desta transformação,
bem como, a importância desta conscientização. As idéias se enraizam a partir
da tentativa de colocá-las em prática, se ganha clareza à medida que se faz a
mudança e se reflete sobre isso, coletiva e criticamente.
Finalizando, afirma-se que repensar o planejamento na Educação Infantil
implica sanar as lacunas existentes entre o planejar e a prática efetiva do
docente. Significa re-imaginar e recriar as práticas pedagógicas aliadas às
teorias educacionais numa convergência de significados.
Referências:
DELORS, Jacques. Educação um tesouro a descobrir. 5a ed. São Paulo:
Cortez, 2001. 288 páginas.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974. 184
páginas
HERNÁNDEZ, Fernando; VENTURA, Montserrat. A Organização do currículo
por projetos de trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1998. 199 páginas.
LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da Escola Pública. São Paulo: Loyola,
2002. 149 páginas.
PERRENOUD, Philippe. Práticas pedagógicas profissão docente e formação
perspectivas sociológicas. Lisboa: Nova Enciclopédia, 1993. 201 páginas.
Download

O planejamento pedagógico na educação infantil