Resumo do Curso: CST – Fı́sica Geral / Primeira parte Notas: Rodrigo Ramos∗ 1o . sem. 2015 – Versão 1.0 Em nossa introdução à Fı́sica falamos brevemente da história dessa ciência e sua relevância no desenvolvimento tecnológico da humanidade. Depois selecionamos uma área da Fı́sica (Mecânica, a teoria do movimento dos corpos) para aperfeiçoarmos nossa linguagem na descrição de fenômenos e vermos como funciona uma teoria Fı́sica. Estudamos a teoria do movimento, sua descrição (posição, velocidade e aceleração), suas causas (Forças) e passamos então a sua interpretação em termos da Energia Mecânica. Essa área da Fı́sica, chamada Mecânica Clássica, consiste de uma teoria completa, e que é exemplar como modelo de teoria. Desenvolvida desde o século XVI (Galileu e contemporâneos), com seu grande momento no século XVII com as leis de Newton, até o século XIX com a formalização do conceito de energia mecânica.1 Para cada etapa de interpretação e compreensão dos fenômenos em termos de um esquema lógico e quantitativo (que possa fazer previsões numéricas), usamos sempre um exemplo de modelo. Os exercı́cios da lista exploram também esses conteúdos. Abaixo listo, em ordem, os conceitos desenvolvidos nesta primeira parte do curso: 1) Descrição do movimento 1: A partir da representação do movimento de um corpo (exemplo: exercı́cio X da lista 1) descrevemos em tabelas e gráficos as posições, velocidades (taxa de variação da posição em relação ao tempo) e acelerações (taxa de variação da velocidade do corpo em relação ao tempo). Sempre construı́mos a tabela: tempo (s) posição (m) velocidade = ∆x (m/s) ∆t aceleração ( ∆v (m/s2 )) ∆t 2) Descrição do movimento 2: vimos escalas em movimentos, discutimos as velocidades tı́picas do movimento, e a conversão entre unidades m/s = 3, 6km/h. 3) Descrição do movimento 3: Utilizamos o experimento da rampa de Galileu (o experimento que inaugura a ciência como a conhecemos hoje), e a descoberta da descrição do movimento de queda. ∗ Caso encontre erros ou coisas do tipo, por favor me avise. [email protected], ou pessoalmente. No século XX incorporou reformulações vindas dos trabalhos de Einstein e contemporâneos, nascidas com as inovações conceituais da teoria eletromagnética (em problemas onde velocidades sejam comparáveis à da luz, além de uma nova teoria da gravidade), e atualmente segue viva em Sistemas Dinâmicos e Complexos e na Teoria do Caos. 1 4) Causas do movimento 1: As três leis de Newton, e seu uso na descrição do movimento e suas causas. O conceito chave aqui é o de força (a causa do movimento), e sua relação com a massa de um corpo e a aceleração (movimento) que produz. a) Discutimos o conceito de inércia (primeira lei de Newton), o movimento ”perfeito” (ou seja aquele que ocorre se não houver ”ação externa”(forças) sobre os corpos) é o de velocidade constante em linha reta. Conceito descoberto por Galileu e seu estudo sobre o movimento de corpos e incorporado por Newton. b) A passagem de força sobre um corpo à aceleração que é produzida sobre esse corpo envolve a ”invenção” (ou formalização) do conceito de massa. F = ma. A força tem a ”curiosa”definição de sua unidade: N = newton. N = kg · m/s2 . c) Discutimos a lei de ação e reação: as forças entre corpos sempre se aparecem aos pares. Se um corpo age em um segundo com uma força F (independente da origem fı́sica da força), sobre esse corpo o segundo também haje com uma força de mesma intensidade, na mesma direção porém em sentido oposto. d) Discutimos o movimento de curva, gerado por uma força sempre direcionada ao centro da trajetória circular com o corpo se deslocando com uma velocidade constante. Tratamos qualitativamente de satélites e discutimos a manobra de foguetes. 5) Causas do movimento 2: Vimos a descrição de Newton ao movimento (modelo) de queda livre. a) A independência da aceleração de queda foi interpretada pela definição da força peso como sendo diretamente proporcional à aceleração da gravidade: P = mg. Trata-se da famosa lenda da ”maçã de Newton”, que propõe a causa para a lei de Galileu de que corpos de diferentes massas caem com mesma aceleração. b) Com essa definição de força peso, P = mg, vimos como comparar a intensidade das forças em nossa escala humana, a partir do peso de objetos que tenha intensidade de força equivalente (massa equivalente = Força/g). (Problemas tı́picos: ”força de frenagem de um carro”, ”força sobre a mão de um goleiro”, ”batida entre automóveis”2 ). c) Vimos como se realiza o estudo completo queda dos corpos (que partem do repouso de uma altura). Desde a força-peso: P = mg que atua sobre o corpo, obtendo a aceleração de queda desse corpo: F = ma ⇒ mg = ma ⇒ a = g De maneira que a aceleração constante é g (9, 8m/s2 ≈ 10m/s2 ). 2 aceleração velocidade a=g v = gt posição x= gt2 2 Notamos que o tempo em que ocorre o processo é uma quantidade central. Usamos o tempo de resposta do ”ser humano”, na escala de 0,1s; Discutimos experimentos como ”chutar uma bola”contra uma balança Não entramos em detalhes sobre a matemática para obter essas equações, mas verificamos como se passa de um gráfico à outro (procedimento chamado de cálculo diferencial (inclinações) e integral (áreas), inventado por Newton e Leibniz, que não estudaremos em detalhe). inclinacao area inclinacao area x(t) −−−−−−→ v(t) e v(t) −−→ x(t) v(t) −−−−−−→ a(t) e a(t) −−→ v(t) O importante é: existe um procedimento matemático completo que permite que se obtenha essas equações. Ou seja: a partir das forças que agem sobre um corpo é possı́vel saber ”onde ele vai estar” (posição no tempo), ”com que velocidade ele vai estar” (velocidade no tempo). Essa é a essência dos modelos mecânicos na concepção de Newton3 d) Utilizamos as expressões matemáticas obtidas pelo método de Newton para responder as perguntas (admitindo o movimento de queda livre, ou seja, sem forças de atrito ou resistência do ar): 1) Qual o tempo de queda de um corpo se ele cai de uma determinada altura? 2) Qual a velocidade com que o corpo chega ao chão? gt2 , para um experimento do ”tempo e) Usamos o modelo de queda livre a partir do repouso, x = 2 de reação”de uma pessoa que frequenta a disciplina4 . f) Percebemos que o tempo é elemento central da descrição newtoniana do movimento. Poderemos eliminar o tempo ao passarmos para uma descrição por uma quantidade ”invariante no tempo”, que será conseguida com o uso do conceito de Energia. g) Discutimos, ao longo das aulas, como o mundo pode ser interpretado à luz de experimentos e modelos simplificados. 6) Causas do movimento 3: A partir da descrição do movimento de queda livre dos corpos vimos que uma interessante relação é sempre verificada, e independe do tempo5 . W = ∆Ec onde: W = F d, Ec = mv 2 2 W é chamado ”trabalho de uma força” (energia dada a um corpo pela ação de uma força) – calculado a partir de F que é a força (N), d é o deslocamento (m) sobre o qual agiu a força; Ec é a ”Energia Cinética de um corpo em movimento” (energia contida em um movimento) – que aumenta (varia, ou seja: ∆Ec > 0) se a força ajuda no deslocamento do corpo, ou diminui (varia, ou seja: ∆Ec < 0) se a força atua na direção oposta ao deslocamento. Para verifica isso usamos a tabela abaixo e as equações para x e v em termos do tempo de queda de um corpo. posição (m) velocidade (m/s) 3 Ec (J) W Causalidade e determinismo: Conhecidas as causas todo o movimento já está determinado. Obtivemos o tempo de reação médio de 0.28s, para a Jaqueline. 5 Essa relação, descoberta inicialmente por Leibniz, é chamada ”teorema da Energia Cinética”. 4 Note que, conhecida a velocidade de um corpo de massa m, você pode calcular a energia deste corpo neste estado de movimento. Para elevar sua energia (ou seja sua velocidade) você precisa que uma força atue sobre esse corpo realizando trabalho, ou seja cedendo energia. Ou seja: iniciamos uma mudança na interpretação das causas do movimento, que é, entretanto, completamente compatı́vel com a Fı́sica de Newton. A vantagem é que temos uma descrição independente do tempo. A Energia tem unidade fı́sica: kg · m2 = J = joule. s2 7) Causas do movimento 4: Reinterpretamos a expressão W = ∆Ec para a queda livre dos corpos. Em vez de dizermos que a força peso está gradualmente dando energia (cinética) ao corpo, passamos à idéia de que essa energia já estava ”estocada” quando o corpo estava inicialmente a uma dada altura. Essa energia ”estocada” chamamos de ”Energia potencial”6 , Ep . A expressão W = ∆Ec passa, assim, a ser escrita para o caso da queda por: Ec + Ep = constante mv 2 , e Ep = mgh, h é a altura inicial (m). 2 Para chegar a essa interpretação usamos a tabela, obtida a partir dos valores de posição e velocidade da tabela do item anterior: onde Ec = altura (h) (m) velocidade (m/s) Ec (J) Ep O que fizemos foi verificar que as equações W = ∆Ec e Ep + Ec = constante, são equivalentes nesse problema da queda livre. Essencialmente o que fizemos foi mudarmos de W para Ep , mudando a referência em que calculamos o W. W é zero no começo do movimento, mas para Ep consideramos seu valor no começo (topo) igual ao valor de W no final da queda (base).7 Assim, ao cair um corpo converte a energia potencial (que diminui a medida em que sua altura é diminuida) em energia cinética (que aumenta sua velocidade). A compreensão do movimento foi portanto, reinterpretada pela conversão de um tipo de energia (potencial) em outro tipo de energia (cinética). Essa descrição é compatı́vel e está apoiada na fı́sica de Newton.8 6 potencial: que já está em ”potência”, ou seja ”em possibilidade”. Isso é equivalente a dizer: W = −∆Ep , e então W = ∆Ec ⇒ −∆Ep = ∆Ec ⇒ ∆(Ec + Ep ) = 0. 8 De maneira que mudança de interpretação não significa que existem teorias conflitantes, mas sim que existem aspectos que uma teoria explora de maneira mais clara que outra. A Natureza é apenas uma, mas as teorias (ou seja as visões que fazemos dela) podem ser muitas. Mas toda teoria tem que satisfazer uma coisa, já dita por Galileu: devem ter suas previsões verificáveis por meio de experimentos. 7 O uso da ”Energia potencial” serve para incorporarmos a idéia de ”Conservação da Energia”. Ou seja: A energia não pode ser destruı́da ou criada ”do nada”. Ela pode apenas mudar de um tipo a outro. No nosso exemplo/modelo (queda livre), na medida em que o corpo cai Ep vira Ec . Se o corpo fosse lançado para cima então se daria o inverso: Ec se transforma gradualmente em Ep . Esse mecanismo de compreensão do mundo é muito semelhante à concepção da (famosa) lei de Lavoisier (final do do séc. XVIII): ”Nada se cria, tudo se transforma”.9 Adiante veremos que podemos ampliar o conceito de Energia, incorporando novos tipos, e que possibilitam falar de fenômenos diferentes da mecânica. Apesar da Conservação ser inviolável, falamos em ”degradação” da energia, quando nos referimos à sua transformação para uma forma ”desorganizada” de energia, especialmente calor10 8) Vimos que a expressão anterior nos permite responder à pergunta: ”qual a velocidade com que um corpo chega ao chão caindo de determinada altura?”, sem que precisemos passar pelo ”tempo de queda”, como era feito a partir das equações vindas das leis de Newton para o movimento. Abaixo as etapas que serão realizadas no dia 25 de março e 1 de abril. 9) Causas do movimento 5: Refinamos o conceito de energia potencial, vimos que independe da trajetória de descida (força conservativa). Vimos que o atrito não pode ser descrito em termos de uma Energia Potencial (força não conservativa), na medida em que o ”caminho” faz ser diferente o total da energia retirada de um corpo. Aqui alguns problemas-modelo de aplicação: Velocidade de um móvel que desce um rampa a partir de uma certa velocidade inicial. Pêndulo balı́stico (como aproximação)11 . Movimento com atrito, movimento em meio viscoso com velocidade terminal, etc... 10) Causas do movimento 6: Discutimos dispositivos que permitem a geração de movimento a partir de fenômenos de outra natureza fı́sica como os fenômenos térmicos e elétricos: 1) calor ↔ movimento: pistão (experimento de Joule). 2) movimento ↔ corrente elétrica: gerador (ou motor) de indução (experimento de Faraday). Aqui passamos à outras áreas da Fı́sica, e discutimos cadeias de transformação de energia. ∆E , a taxa de processamento de energia de um dispositivo ao longo do 11) Definimos ”Potência”: P = ∆t tempo. Sua unidade é: J/s = W , W = watt. Para dispositivos elétricos passamos a compreender a unidade kWh (quilowatt vezes hora = potencia vezes tempo). 12) Para dispositivos elétricos discutimos e aplicamos a expressão P = V i, onde V é a tensão (volt, ou energia/carga elétrica = joule/coulomb = J/C) e i é a corrente (carga elétrica/tempo = coulomb/segundo = C/s = ampére = A). 9 Dois comentários: 1) A Lei de Lavoisier diz respeito à conservação da massa em reações quı́micas. A conservação da massa não ocorre em processos nucleares e de altas energias. 2) A Conservação de energia nunca foi violada, é apenas questionada atualmente na fronteira da cosmologia, no estudo de fenômenos cósmicos de altas energias, ou seja: muito distante da escala humana. 10 Assista ao documentário ”Ordem e Desordem: História da Energia- BBC”, cujo link está na página www.fisup.com.br 11 Nota: Uma outra quantidade conservada é encontrada na fı́sica clássica, chamada ”momento”. Ela é útil para calcular choques, como o de uma bala com uma massa de prova, ou entre móveis. Ela precisaria ser levada em conta aqui, mas iremos desprezar – por isso aproximação. A discussão deste princı́pio, e deste problema pode ser vista em livros texto. 13) Discutimos a Transformação de Energia e sua Conservação. Discutimos qualitativamente máquinas térmicas, motores de combustão, de indução, usinas geradoras de energia (hidrelétrica, termelétrica e nuclear). Falamos da energia liberada na forma de calor em reações quı́micas e nucleares. Avaliamos o preço (custo em dinheiro) das diferentes fontes de energia que dispomos para acionar os dispositivos da vida moderna. Energia: note que é um conceito obtido indiretamente como o de força e massa (nascidos do estudo do movimento). Não é intuitiva sua definição como o ”tempo” e ”espaço” que ”vemos” surgir de maneira simples e natural, pelo simples fato de existirmos. Foi usada pra expressar um padrão verificado nos experimentos e nas teorias que os descrevem (no caso, uma quantidade conservada), e se trata da ”moeda da natureza”(que não tem ”inflação”, na medida em que é uma quantidade conservada). Todo sistema fı́sico pode ser interpretado em termos de energia, portanto muitas formas de calcular energia podem ser obtidos para cada situação. Mas sempre ela será uma quantidade conservada. Se a energia total de um sistema reduz ao longo do tempo trata-se de sua conversão a outras formas de energia (normalmente calor, ou movimentos não de elementos não incluidos no modelo, como o som ou o cisalhamento de superfı́cies). Perceba que a palavra ”Energia” sem designar qual o seu tipo, não tem sentido prático. Por exemplo, calor é um tipo de energia, energia no movimento de um corpo é outro, energia acumulada na possibilidade de movimento em um sistema é outro. Energia irradiada por antenas (Energia eletromagnética) é outro tipo (calor é também deste tipo fı́sico de energia, ou seja de natureza eletromagnética, vide as ”câmeras de calor”). Por sua generalidade é um conceito-chave que une todos os fenômenos fı́sicos e dispositivos. Com os conceitos desenvolvidos até aqui podemos avançar. Na continuação do curso o foco será estudar uma teoria fı́sica que descreva os fenômenos ondulatórios e sua aplicação em sistemas de telecomunicação (em dispositivos como antenas e fibras óticas).