capa Gestões campeãs Gestores das mais diversas atividades falam de suas experiências e mostram os passos a serem trilhados por um líder vitorioso. Por Eliana Antiqueira Eles lidam com expectativas e frustrações, têm que administrar conflitos e precisam ter voz de comando, mas também devem saber a hora de ouvir. Gerir pessoas, com seus egos, ambições e perspectivas não é fácil, e poucos estão preparados para esta tarefa. Nas próximas páginas, gestores de 36 SuperVarejo áreas tão diversas como uma escola de samba e um restaurante contam suas experiências à frente dos negócios, na lida diária por resultados, na condução de vitórias e derrotas e, principalmente, na missão de conduzir pessoas e explorar seus talentos para o benefício de todos. maio 2006 divulgação Carlos Alberto Parreira Técnico da Seleção Brasileira de Futebol Ambição é meta e estímulo maio 2006 Neste ano de Copa do Mundo, no qual as atenções estão voltadas para o desempenho da Seleção Brasileira na Copa do Mundo da Alemanha, cada espectador tem uma opinião de como dirigir o time, quem escalar e como a equipe deve jogar. Geralmente opiniões contrárias aos do técnico, aquele abnegado funcionário de 180 milhões de torcedores, que precisa tomar decisões sob pressão e arcar com os resultados de sua escolha. Carlos Alberto Parreira que o diga. O técnico da Seleção Brasileira, comandante do tetra (e quem sabe do hexa!) afirma que é apenas um gerenciador de talentos, um maestro. “Não é difícil comandar uma equipe de craques como a seleção brasileira”, afirma. Também não precisa entender de futebol para saber que ele está sendo modesto. Afinal, se o talento é muito, a vaidade não é menor. Para manter o talento de cada um a serviço do escrete canarinho, Parreira aplica três fundamentos: bom-senso, foco e autoconfiança. Por bom-senso, entenda-se o uso da experiência e dos conhecimentos; o foco leva o indivíduo a se mover por resultados e não por impulso; e, finalmente, a autoconfiança é importante para não se deixar abater pelas críticas. “Cada motorista de táxi, barbeiro e jornalista sabe dirigir a seleção melhor do que eu!”, brinca. “Mas quem está do lado de fora só sabe do espetáculo, não conhece as cobranças. Se o time ganha, o mérito é da equipe. Se perde a culpa é do técnico. Este é um cargo muito solitário, porque concentra muito poder”, desabafa Parreira. Não à toa, técnico de futebol é uma das profissões mais instáveis do esporte. Duas derrotas seguidas já são suficientes para, usando o jargão futebolístico, colocar o comandante na linha do pênalti. “O que as vitórias têm de bom é que não são definitivas. O que as derrotas têm de bom é que não são definitivas”. Esta frase do escritor português José Saramago é uma das prediletas de Parreira, e ele a repete como um mantra. “A derrota não é o fim do mundo, é só mais um acontecimento e oportunidade de crescimento. Para apreciar a vitória como se deve é preciso ter perdido antes”, contemporiza. Quanto ao desafio da Copa da Alemanha, Parreira sabe que a disputa não será fácil, mesmo com o elenco estrelado que comanda, mas está confiante na ambição de cada um dos jogadores em trazer o hexa. “A ambição é ao mesmo tempo uma meta e um estímulo. É a compulsão de lutar por algo que vale a pena e estar preparado para aproveitar as oportunidades”, conclui. SuperVarejo 37 capa Thobias da Vai-Vai Presidente do GRCES Vai-Vai Paulo Pepe/Nau Paulo Pepe/Nau O que importa é o espetáculo 38 SuperVarejo Uma entidade do carnaval paulistano, Thobias da Vai-Vai é um sujeito bem-humorado e imponente que, de tão apaixonado por sua escola de samba, a incorporou ao seu nome. Recentemente, depois de 25 anos de militância, Thobias foi eleito presidente da agremiação e enfrenta a missão de ser líder e componente, com o desafio de dividir muito bem estes papéis. “Quero passar a filosofia de que sou um componente que está no cargo de presidente, e minha missão é administrar o patrimônio maior que é a marca, o símbolo da escola, o pavilhão”, explica. Para levar esta missão a termo, Thobias da VaiVai estabeleceu uma relação de igualdade com seus comandados e procura manter a mente aberta e a visão de que nem todos têm a mesma opinião sobre um determinado assunto, mas que o presidente não pode vencer pela imposição ou pelo medo. “O ônus para o centralizador é grande. Quem não sabe delegar não pode administrar, porque ninguém sabe tudo”. Bom administrador, para o sambista-presidente, é aquele que conhece bem não apenas o negócio, mas as pessoas que o compõem e o talento de cada um. “Só assim é possível delegar as tarefas corretas às pessoas certas”, acredita. Ao longo do ano, 500 pessoas trabalham no barracão para produzir o luxuoso carnaval da Vai-Vai. Durante esse período, além de coordenar os trabalhos, Thobias também tem de manter um olho nos custos. Junto com a diretoria, precisa escolher um enredo que dê mídia, buscar patrocinadores e criar ações para levantar fundos que permitam a realização de um belo Carnaval. “Luxo gera mídia, mas luxo custa caro. Independentemente de ser uma escola de samba, uma empresa de parafuso ou um supermercado, tudo tem um custo relativo. Temos de saber negociar, não aceitar tudo pelo primeiro preço, estabelecer as relações custo/benefício e ter os pés no chão”, ensina. Chega o Carnaval e em apenas 70 minutos um ano de trabalho intenso é avaliado. Ganhar ou perder, para Thobias da Vai-Vai, é secundário. “Toda escola entra na avenida para ganhar. Temos de respeitar os adversários. Com 76 anos de história e 12 títulos, somos uma referência e nossa obrigação é contribuir para a imagem da Vai-Vai. Mais do que ser campeões, nosso maior objetivo é fazer um grande espetáculo”, finaliza. maio 2006 Paulo Coco Treinador da equipe feminina de voleibol vice-campeã da Superliga Finasa/Osasco e atual auxiliar técnico de José Roberto Guimarães na seleção brasileira feminina de voleibol Ninguém começa campeão Em 2005, Paulo Coco assumiu a equipe de vôlei feminino Finasa/Osasco com a difícil tarefa de substituir José Roberto Guimarães, que saíra para comandar a seleção brasileira. Paulo não se acanhou diante do desafio e levou o time às finais da Superliga, mais importante campeonato brasileiro interclubes. O time foi vice-campeão e Paulo foi convidado pelo mesmo Zé Roberto a ocupar o cargo de auxiliar técnico na seleção. Lidar com um grupo de mulheres em situações de ansiedade, pressão e competição não é fácil. Para conseguir o melhor de cada atleta, Paulo passou a estudar os efeitos dos hormônios, a observar ciclos menstruais, a tentar entender porque uma bronca insignificante se transformava num caminhão de mágoas e todos aqueles detalhes que fazem das equipes femininas um desafio e tanto para os comandantes masculinos. “A mulher têm períodos de sensibilidade mais exacerbada, com reações involuntárias e nervos à flor da pele. Não é frescura, é fisiologia! Mas, em compensação, têm uma capacidade de concentração e compreensão incríveis. Elas podem estar conversando com a colega do lado, mas estão absolutamente atentas às instruções que estou passando”, afirma. Num time cheio de estrelas, o papel de Paulo era também administrar egos e, neste quesito, ele é categórico: “em um time não existe ‘eu’, existe ‘nós’. Cada um tem seu objetivo individual, maio 2006 mas este não pode se sobrepor aos objetivos da equipe. Cada jogador, cada membro da comissão técnica tem seus deveres e obrigações. Tem de haver ordem e equilíbrio para que o sentimento altruístico prevaleça.” Acostumado à dinâmica dos esportes, em que um time tem que perder para que outro vença, Paulo Coco busca na derrota lições e inspirações para seguir com seu trabalho. Assimilar a derrota e não deixar que a frustração transpareça aos comandados é uma regra que o treinador tenta seguir, mesmo que passe noites em claro quando perde um jogo, como admite acontecer. “A derrota nos ensina mais do que a vitória. A vitória nos cega para os erros cometidos. E todo resultado é construído passo a passo, ninguém começa campeão”, acredita. SuperVarejo 39 capa Pedro Mello Pedro Mello é empreendedor desde a mais tenra idade. Aos 13 anos, começou vendendo leite para a vizinhança. Aos 15 anos montou uma empresa de Sócio-diretor da franquia social de processamento de dados e aos 19 anos estava nos Estados Unidos trabalhando na Microsoft. Adqui- construção civil Rasga Mato e do portal riu experiência profissional em grandes multinacionais como Accenture e Borland e fundou empresas de associações Tribecca como Plug Use e Nexxy Capital, mas o que Pedro quer mesmo é contribuir para um mundo melhor. Aos 34 anos, ele foi eleito pelo Fórum Econômico Mundial como um dos Global Leaders for Tomorrow 2003 (Líderes Globais do Amanhã) e isto não mudou em absolutamente nada sua vida. A essa altura, Pedro Mello já tinha descoberto que o conceito de sucesso é subjetivo e estava comprometido em ajudar no sucesso de outras pessoas. “Acho curioso que os empresários não percebam que estão criando uma massa de pessoas escravizadas, insatisfeitas. Quem recebe um salário hoje que lhe permite comer, vestir e ter um teto, virou escravo. E escravos não são criativos, muito menos empreendedores”, avalia. Dentro desta perspectiva de oportunidade para todos, Pedro criou, em 2002, a franquia social de construção civil Rasga Mato, cuja premissa é: não concentrar a riqueza na mão do dono. “Hoje, 50% do lucro de cada reforma é distribuído para a equipe que a realizou. Dessa maneira todos ficam comprometidos com os prazos, limpeza e organização da obra”, explica. O empreendedor prima pela qualidade dos materiais que utiliza e investe na formação dos profissionais que emprega. Cada um de seus empregados é potencialmente um empreendedor. Para ilustrar seu modelo chegar a mestre de obras, galgando todos os degraus de code gestão, Pedro Mello usa um exemplo bem prosaico: ovos nhecimento que cada função exige. “Esta é a minha forma de com bacon. “A galinha está envolvida com o café da manhã, ajudar que pessoas de baixa renda tenham a oportunidade de enquanto o porco está totalmente comprometido. É o porco crescer e encontrar um caminho para a independência finanquem sente o calor da frigideira. Um empreendimento só pode ceira”. Afinal, ele mesmo reconhece que nem todo mundo dar certo se todos forem bacon!”, emenda. tem a sorte ou a oportunidade de estudar em boas escolas e Na Rasga Mato, o empregado entra como aprendiz e pode estabelecer contatos no mundo corporativo. Paulo Pepe/Nau Empreender é preciso 40 SuperVarejo maio 2006 Paulo Pepe/Nau capa Sergio Arno Chef de cozinha e proprietário do restaurante La Vecchia Cucina pessoais da equipe ficam do lado de fora. “É importante manter o astral e a amizade entre companheiros de trabalho. Digo sempre que eles não precisam conviver lá fora, mas no restaurante têm que ser amigos”. Adepto de uma administração democrática, Arno ouve as queixas dos funcionários e promove reuniões de incentivo e, porque não, de desabafo. “Aqui todo mundo é igual, não tem esta coisa de patrão e empregado. Estamos todos no mesmo barco, cansados e estressados do mesmo jeito. Todos têm direito de opinar e reclamar, mas, em contrapartida, são todos responsáveis”, determina. Comunicação é um mandamento sagrado no restaurante, e, principalmente na cozinha, cada equipe tem de estar informada sobre o que aconteceu no período anterior. Desde que abriu o restaurante, o proprietário instituiu um check-list, e ele jura que nunca conseguiu abrir as portas com a checagem 100% cumprida. “São detalhes que os funcionários não percebem, porque só o olho do dono enxerga algumas coisas. Por isso é preciso manter-se crítico a respeito de seu negócio, para não cair na armadilha da acomodação”, argumenta. Com a decisão de reformar o restaurante, Sergio Arno decidiu também mudar algumas coisas na sua vida e resolveu voltar para a cozinha, afinal, foi o prazer de cozinhar que, em primeira instância, o levou a abrir um restaurante. “Lembrei do quanto era feliz cozinhando e que este é meu principal talento. Ganhar dinheiro é a conseqüência de um trabalho bem realizado. E só faz um bom trabalho quem faz o que gosta”, resume. Todos são responsáveis Há quase 19 anos, o restaurante La Vecchia Cucina brilha no circuito gastronômico paulistano. Uma longevidade surpreendente num ramo em que portas abrem e fecham a todo instante. O La Vecchia Cucina, menina dos olhos do chef Sergio Arno, que também é proprietário dos restaurantes La Pasta Gialla, Alimentari, Duets, Universidade da Cachaça e General Prime Burger, passou por uma reforma completa, que incluiu revisão do cardápio, redução de lugares e – decisão rara – de preços. “O Brasil mudou e eu tinha que adequar meu negócio a esta nova realidade. Volume compensa mais do que preço”, acredita. Diariamente, o chef comanda uma equipe de 48 funcionários que precisam estar a postos ao meio-dia, prontos para servir a primeira refeição. “O cliente não quer saber dos meus problemas. Ele quer chegar, comer e ir embora. Com nenhum stress e o máximo de satisfação”, explica. Para garantir este ambiente, Sergio Arno impôs uma regra de ouro: os problemas 42 SuperVarejo [email protected] maio 2006