CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO
Mestrado em Bioética
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL
DA EQUIPE DO CENTRO CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À
LUZ DA BIOÉTICA
São Paulo
2010
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL
DA EQUIPE DO CENTRO CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À
LUZ DA BIOÉTICA
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado
em
Bioética
do
Centro
Universitário São Camilo, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em
Bioética.
Orientadora: Profª Dra Luciane Lucio Pereira
Co-orientador: Prof. Dr. Pe. Marcio Fabri dos
Anjos
São Paulo
2010
Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Pe. Inocente Radrizzani
Gianini, Maristella Lopes
O enfermeiro e o relacionamento interpessoal da equipe do centro
cirúrgico: uma reflexão à luz da bioética / Maristella Lopes Gianini. -- São
Paulo: Centro Universitário São Camilo, 2010.
122p.
Orientação de Luciane Lúcio Pereira e Márcio Fabri dos Anjos, Pe.
Dissertação de Mestrado em Bioética, Centro Universitário São
Camilo, 2010.
1. Bioética 2. Centro cirúrgico hospitalar 3. Relações interpessoais I.
Pereira, Luciane Lúcio II. Anjos, Márcio Fabri dos, Pe. II. Centro
Universitário São Camilo III. Título.
DEDICATÓRIA
Dedico este estudo a todos que fizeram, fazem e farão parte da minha
história.
Em especial ao meu querido pai Nilton, chamado carinhosamente de “vovô
Ni”, que apesar de não estar mais aqui conosco foi exemplo de integridade,
honestidade e justiça tanto para mim e minha irmã Silvia, como para os meus
filhos. Ainda hoje apesar da saudade que deixou se faz presente em todos os
nossos momentos.
À minha querida mãe Thereza, chamada carinhosamente de “vovó Tita”,
mãe batalhadora, exemplo de alegria e força, incansável, sempre pronta a ajudar
e a lutar por mim. Juntos, meus pais plantaram a semente do amor e da união em
nossa família. Obrigada por tudo.
Aos meus três filhos Fernanda, Patrícia e Eduardo razão do meu viver, luz
dos meus dias, a paz e o sossego das minhas noites.
Obrigada por
compreenderem a minha ausência e auxiliarem nas minhas necessidades. Vocês
são o amor e o meu orgulho.
Ao Eduardo, amor da minha vida, cujas virtudes e condutas éticas fazem
da nossa história e do nosso amor um exemplo aos nossos filhos. Obrigada por
sempre estar ao meu lado.
À Silvia, João, Alessandra e André sempre presentes, exemplos de amor e
amizade que fazem a nossa família ser especial.
AGRADECIMENTOS
Embora uma dissertação tenha uma finalidade acadêmica e seja um
trabalho individual, existem muitas pessoas que contribuem de diversas maneiras
para a sua realização, não podendo permanecer anônimas. Por essa razão quero
expressar meus sinceros agradecimentos:
Primeiramente a Deus, meu pai eterno, meu amigo e confidente, presença
constante em minha vida, que me dá força e coragem, e permite que eu faça dos
meus sonhos uma realidade.
À querida amiga e professora Dra. Luciane Lucio Pereira, exemplo de
integridade e dignidade. Por meio dos seus ensinamentos e conduta ética
possibilitou que eu alcançasse meu objetivo: com paciência e doçura, sempre me
trouxe de volta à terra nas minhas “constantes viagens” . Obrigada pela amizade,
carinho, compreensão e dedicação.
Ao Professor Dr. Pe. Marcio Fabri dos Anjos, que me aconselhou e dirigiu
este estudo para uma fundamentação teórica pertinente.
Ao Professor Dr. Willian Saad Hossne, coordenador do Mestrado e
Doutorado em Bioética do Centro Universitário São Camilo pela sua dedicação e
exemplo profissional. Obrigada por nos fazer viajar no tempo e tornar nossas
noites de sexta feira e manhãs de sábado momentos de contemplação.
Aos professores do Mestrado, pela oportunidade de aprimoramento na
fundamentação bioética que ampliaram o meu universo de saber.
Aos professores Estella Regina Ferraz Bianqui e ao Padre Leocir Pessini
pela importante colaboração em minha qualificação, com reflexões e ponderações
pertinentes, permitindo a evolução qualitativa deste estudo.
Ao Centro Universitário São Camilo, por meio da coordenação do Curso de
Graduação de Enfermagem, Denise Augusto da Costa Lorencette, Lílian Cadah, e
em especial à querida amiga Maria Inês Nunes pelo convite e oportunidade de
ingressar no Centro Universitário São Camilo
À Elenilde e Rosana, bibliotecárias, que incansavelmente saíam em busca
dos meus pedidos. Vocês muito contribuíram na finalização desta dissertação.
À Enfermeira chefe do Centro Cirúrgico, Laura, e ao Anestesiologista
chefe do Centro Cirúrgico, Dr. Nigri, do Hospital e Maternidade São Camilo
Pompéia, pela ajuda na documentação deste trabalho, e a todos os profissionais
que se sujeitaram à pesquisa e a tornaram possível.
À toda a minha família, mãe, irmã, cunhados, sobrinhos, esposo e filhos
pela paciência, compreensão e incentivo na execução deste trabalho.
À amiga, Fúlvia Rodrigues Souza, que como um anjo surgiu no momento que
eu mais precisava, dando-me todo apoio e ajuda para poder ingressar no
mestrado.
À amiga Cláudia D’Arco e Sheila Tosta pelos momentos de alegria e
compartilhamento neste trilhar de descobertas.
Aos meus colegas da 5ª turma do Mestrado em Bioética que tanto me
encantaram com a singularidade de cada um.
À Emari Andrade de Jesus pela minuciosa revisão da língua portuguesa e
oportunidade de aprendizado.
A todos que, embora não estejam citados, muito contribuíram para a
realização desta pesquisa.
Meu muito obrigado.
“O desafio da futura bioética é que possuímos mais do
que nunca conhecimento científico e capacidade tecnológica,
e não temos, entretanto, o menor senso de como utilizar
esse conhecimento e essa tecnologia, (...) a crise de nossa
era é que adquirimos um poder inesperado e devemos usá-lo
no caos de um mundo pós-tradicional, pós-cristão e pósmoderno.”
H. T. Engelhardt
e
“Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo
qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim.”
Chico Xavier
GIANINI, M. L. O enfermeiro e o relacionamento interpessoal da equipe do cc –
uma reflexão à luz da bioética. 122f. Dissertação (Mestrado em Bioética) – Centro
Universitário São Camilo, São Paulo, 2010.
Equipes multiprofissionais cada vez mais têm sido formadas com o intuito de unir
experiências e conhecimento científico em prol da saúde do individuo. A
fragmentação assistencial exige hoje um novo modelo que favoreça a comunicação
e o trabalho em equipe. A interação e a comunicação dessa equipe são de extrema
importância no sentido de agregar conhecimento e promover ações
interdependentes para atender o paciente com competência e segurança. A bioética
surge com a responsabilidade de conduzir os profissionais de saúde a refletirem
sobre seus atos no sentido de dar conta dos desafios decorrentes da necessidade
de mesclar ética e técnica e as relações humanas. Esta pesquisa teve como objetivo
analisar, à luz da Bioética, o relacionamento interpessoal da equipe multiprofissional
que atua no CC; refletir quanto à existência de situações de conflito ético no trabalho
desta equipe; identificar a atuação do enfermeiro do CC. Trata-se de uma pesquisa
exploratória, descritiva de abordagem qualitativa utilizando-se a técnica do estudo de
caso. Após parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa foram realizadas
entrevistas individuais, semi-estruturadas. Participaram deste estudo cirurgiões,
anestesiologistas, enfermeiros e técnicos de enfermagem. A análise dos discursos
foi feita segundo a proposta da análise de conteúdo de Bardin. Os resultados foram
apresentados em categorias e subcategorias, sendo as categorias: Composição da
equipe; Percepção do Relacionamento Interpessoal da Equipe Multiprofissional;
Papel do Enfermeiro na Equipe; Conflito Ético; Atuação do Enfermeiro Frente ao
Conflito Ético; Autonomia Profissional do Enfermeiro. Os achados da pesquisa
formaram a base para as considerações bioéticas. A composição da equipe do CC é
multiprofissional e reflete uma consciência coletiva de interdependência. Os
relacionamentos interpessoais no CC caracterizam-se por ações e comportamentos
que promovem as relações, mas por outro lado, também caracterizam-se por fatores
que as restringem. O enfermeiro é apontado como profissional mais apto a liderar e
trazer coesão à equipe no CC necessita de competência e habilidades próprias para
saber lidar com conflitos. Foi percebida a sua ausência dentro da sala de operações
na qual traria maior segurança para a equipe. Os médicos são identificados como o
grupo que com maior freqüência são os causadores de conflitos éticos e os
problemas de relacionamentos. Considera-se que o trabalho em equipe é imperativo,
as relações são difíceis, mas podem melhorar quando o respeito e o reconhecimento
da vulnerabilidade forem a base dos relacionamentos. O aprofundamento do
domínio da bioética e seus referenciais poderão contribuir para a reflexão acerca do
modo de agir da equipe. A posição ideal do profissional autônomo no CC é aquela
quando o enfermeiro percebe que algumas decisões dependem de critérios médicos
e quando os médicos percebem que algumas decisões também dependem de
critérios de enfermagem e que ambos influenciam e são influenciados pelo trabalho
de toda a equipe. Considera-se ainda que determinantes históricos e situacionais
promovam o avanço e o retrocesso no modelo de estrutura do CC centrado no
cirurgião. Porém só se avança quando se incorpora uma ação interdisciplinar com
reconhecimento dos saberes convergentes e a responsabilidade compartilhada.
Palavras-chave: Bioética. Centro cirúrgico hospitalar. Relações interpessoais.
GIANINI, M. L. The nurse and the surgery room team’s interpersonal
relationship: an analysis in the light of bioethics. 122f. Dissertation (Master’s
Degree in Bioethics) – Centro Universitário São Camilo, Sao Paulo, 2010.
Multiprofessional teams more and more each time are being formed due to join
experiences and scientific knowledge for the individual’s health. The assistance
fragmentation demands nowadays a new model that makes the communication and
the teamwork easier. The interaction and the communication among these staff
members are extremely important in order to aggregate knowledge and create
interdependent procedures to attend the patients by offering them efficiency and
safety. The Bioethics emerges with the responsibility of leading Health professionals
to a reflection about their attitudes due to be able to notice their challenges of mixing
ethics, techniques and human relationships. This research aimed at analyzing, in the
light of Bioethics, the interpersonal relationship among multiprofessional team
members that labor at Surgery Room (SR); ponder how ethical conflicts affect these
team’s activities; identify the actuation of the SR nurse. It is an exploratory descriptive
research, with qualitative aspects, and was done by using the particular cases
technique. After the authorization of Comitê de Ética e Pesquisa (Ethics and
Research Committee), individual semi-structured surveys were conducted. The
participants of this research were Health laborers: surgeons, anesthesiologists,
nurses and nurse assistants. The discourse content analysis was done according to
Bardin’s framework. The results were classified in categories and subcategories; the
categories are: Team Composition; Multiprofessional Team Interpersonal
Relationship Perception; Nurse’s Role in the Team; Ethical Conflict; Nurse’s
Professional Autonomy. The data found by this research have composed the basis
for the bioethical considerations. The SR team is multi professionally composed and
reflects a blanket conscience of interdependency. The interpersonal relationships at
the SR are characterized by partnership, politeness, respect, willingness; on the
other hand, they are also characterized by non-communication or miscommunication,
disrespect, miscomprehension, insecurity and authoritarianism. The nurse is seen as
the most able in the group to be the leader and to bring the team the cohesion
everyone needs at the SR; nurses need expertise and own abilities to know how to
deal with conflicts, but their absence at the SR has been felt and their presence
would bring more confidence to the staff. The doctors are identified as the part of the
SR staff that causes ethical conflicts and behavioral problems. The collaborative work
is considered vital; the relationships have several difficulties, but they might improve
when respect and vulnerability recognition become the basis of the relationships. The
deep and serious study of Bioethics and its field may contribute to a reflection about
the staff’s procedures and attitudes when working. The ideal posture for autonomous
laborers at SR is nurses noticing that some decisions are the doctors’ decisions and
doctors noticing that some decisions are the nurses’ decisions and both of them
influence and have influences on the teamwork. Furthermore, historical aspects and
situations are considered the most adequate path to promote progress and
regression in the surgeon-centered model at SR. However, there is progress only
when we have an interdisciplinary view, which is reached when we recognize the
different scientific areas converge and responsibility must be shared.
Keywords: Bioethics. Interpersonal relationship. Surgery room.
GIANINI, M.L. El enfermero y El Relacionamiento Interpersonal del Equipo del
Centro Quirúrgico – Una Reflexión a la luz de la Bioética. 122f. Disertación
(Máster en Bioética) – Centro Universitário São Camilo, Sao Paulo, 2010.
Cada vez más equipos multiprofesionales están siendo formados con el objetivo de
unir experiencias y conocimientos científicos en favor de la salud del individuo. La
fragmentación asistencial exige hoy en día un nuevo modelo que favorezca la
comunicación y el trabajo en equipo. La interacción y la comunicación de ese equipo
tienen extremada importancia en el sentido de aportar conocimiento y realizar
acciones interdependientes para atender al paciente con la máxima eficiencia y
seguridad. La Bioética surge con la responsabilidad de conducir a los profesionales
de salud a que reflexionen sobre sus actos en el sentido de darse cuenta de los
retos decurrentes de la necesidad de mezclar ética, técnica y las relaciones
humanas. Esta investigación ha tenido como objetivo analizar, a la luz de la Bioética,
el relacionamiento interpersonal del equipo multiprofesional que actúa en el CQ;
reflexionar acerca de la existencia de situaciones de conflicto ético en el trabajo de
dicho equipo; identificar la actuación del enfermero. Se trata de una investigación
científica exploratoria, descriptiva, de abordaje cualitativo y con la utilización de la
técnica del estudio de caso. Tras el parecer favorable del Comitê de Ética em
Pesquisa (Comité de Ética en Investigaciones Científicas), se han realizado
encuestas individuales y semi-estructuradas. Han participado de este estudio
cirujanos, anestesiólogos, enfermeros; y técnicos de enfermería. El análisis de los
discursos se ha hecho según la propuesta de análisis de contenido de Bardin. Los
resultados han sido presentados en categorías y subcategorías. Las categorías son:
Composición del Equipo; Percepción del Relacionamiento Interpersonal del Equipo
Multiprofesional; Rol del Enfermero en el Equipo; Conflicto Ético; Actuación del
Enfermero frente al Conflicto Ético; Autonomía Profesional del Enfermero. Los
hallazgos de la investigación han formado la base para las consideraciones
bioéticas. La composición del equipo del CQ es multiprofesional y refleja una
consciencia colectiva de interdependencia. Las relaciones interpersonales en el CQ
se caracterizan por acciones promotoras e restrictivas. Al enfermero lo apuntan
como el profesional más apto a liderar y a brindarle cohesión al equipo en el CQ, por
lo que necesita competencia y habilidades propias para saber lidiar con los
conflictos; sin embargo, se ha sentido su ausencia dentro del CQ, y su presencia le
brindaría más seguridad al equipo. Los médicos se identifican como el grupo que
más causa conflictos éticos y problemas de relacionamiento. Se considera que el
trabajo en equipo es imprescindible, las relaciones son difíciles, pero se pueden
mejorar cuando el respeto y el reconocimiento de su vulnerabilidad son su base. La
profundización del campo de la Bioética y sus referenciales podrán contribuir para la
reflexión acerca del modo de actuar del equipo. La posición ideal del profesional
autónomo en el CQ es aquella en que el enfermero se da cuenta de que algunas
decisiones dependen de criterios médicos y cuando los médicos se dan cuenta de
que algunas decisiones dependen también de criterios de enfermería y cuando
ambos criterios influencian y son influenciados por el trabajo de todo el equipo. Se
considera aún que determinaciones históricas y situacionales causen el avance y el
retroceso en el modelo de estructura del CQ centrado en el cirujano. Pero sólo hay
avances cuando se incorpora una acción interdisciplinaria con reconocimiento de los
saberes convergentes y la responsabilidad compartida.
Palabras-Clave: Bioética. Centro quirúrgico. Relaciones interpersonales.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Origem da Categoria Predeterminada – Composição da
Equipe do Centro Cirúrgico .................................................................................. 48
Figura 2 - Origem da Categoria Predeterminada – Percepção do
Relacionamento Interpessoal da Equipe Multiprofissional do Centro Cirúrgico ... 48
Figura 3 - Origem da Categoria Predeterminada – Papel do Enfermeiro
na Equipe do Centro Cirúrgico ............................................................................. 49
Figura 4 - Origem da Categoria Predeterminada – Conflito Ético em
Centro Cirúrgico ................................................................................................... 49
Figura 5 - Origem da Categoria Predeterminada - Atuação do Enfermeiro
Frente ao Conflito Ético em Centro Cirúrgico ....................................................... 49
Figura 6 - Origem da Categoria Predeterminada – Autonomia Profissional do
Enfermeiro do Centro Cirúrgico ............................................................................ 50
Figura 7 - Categoria 2: Percepção do Relacionamento Interpessoal
da Equipe Multiprofissional do Centro Cirúrgico. Subcategorias: Fatores
Promotores do Relacionamento Interpessoal no Centro Cirúrgico; Fatores
Restritivos do Relacionamento Interpessoal no Centro Cirúrgico ........................ 59
Figura 8 - Categoria 3: Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico
Subcategorias: Papel de Liderança; Papel Assistencial ....................................... 69
Figura 9 - Categoria 4: Conflito Ético em Centro Cirúrgico – Subcategorias: O
Conflito Ético Reconhecido e Conflito Ético Justificado ....................................... 74
Figura 10 - Categoria 5: Atuação do Enfermeiro Frente ao Conflito Ético
em Centro Cirúrgico Subcategorias: Posicionamento do Enfermeiro; Enfermeiro
como agente mediador; Enfermeiro como agente causador do conflito............... 79
Figura 11 - Categoria: Autonomia Profissional do Enfermeiro no Centro
Cirúrgico. Subcategorias: Autonomia exercida pelo enfermeiro; Autonomia
não exercida pelo enfermeiro e Autonomia Limitada do enfermeiro .................... 83
Figura 12 - Equipe do Centro Cirúrgico ............................................................... 89
LISTA DE SIGLAS
BO
Bloco Operatório
CC
Centro cirúrgico
CoEP
Comitê de Ética em Pesquisa
CME
Centro de Material e Esterilização
HMSCP
Hospital e Maternidade São Camilo Pompéia
I.P.A.R
Instituto Paulista de Assistência Respiratória
RPA
Recuperação Pós-anestésica
SAE
Sistema de Assistência de Enfermagem
SO
Sala Operatória
SOBECC
Sociedade Brasileira de Enfermeiros de Centro cirúrgico,
Recuperação Anestésica e Centro de Material e Esterilização
UNESCO
United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
UTI
Unidade de Terapia Intensiva
SUMÁRIO
Resumo
Abstract
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE SIGLAS
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 15
2 OBJETIVOS ...................................................................................................... 20
2.1 Geral .............................................................................................................. 20
2.2 Específicos ..................................................................................................... 20
3 REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................ 21
3.1 Trajetória Histórica da Cirurgia ....................................................................... 21
3.2 O Hospital e o Centro Cirúrgico...................................................................... 26
3.3 Atuação da Equipe Médica e de Enfermagem no Centro Cirúrgico ............... 27
3.4 A Filosofia, a Ética, a Bioética e o Centro Cirúrgico ....................................... 29
4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA ..................................................................... 39
4.1 Opção pelo Método ........................................................................................ 39
4.2 Local de Estudo .............................................................................................. 40
4.3 Sujeitos da pesquisa ...................................................................................... 41
4.4 Coleta de Dados ............................................................................................. 42
4.5 Análise dos Resultados .................................................................................. 47
5 APRESENTAÇÃO DOS DADOS ...................................................................... 51
5.1 Caracterização do Local do Estudo ................................................................ 51
5.1.1 Caracterização da Instituição ...................................................................... 51
5.1.2 Caracterização do Centro Cirúrgico ............................................................ 52
5.1.3 Caracterização dos Sujeitos da Pesquisa ................................................... 53
5.2 Apresentação das Categorias e Subcategorias ............................................. 55
5.2.1 Categoria 1: Composição da Equipe do Centro Cirúrgico ........................... 56
5.2.2 Categoria 2: Percepção do Relacionamento Interpessoal da Equipe
Multiprofissional do Centro Cirúrgico ........................................................... 58
5.2.3 Categoria 3: Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico .............. 68
5.2.4 Categoria 4: Conflito Ético em Centro Cirúrgico .......................................... 73
5.2.5 Categoria 5: Atuação do Enfermeiro Frente ao Conflito Ético em Centro
Cirúrgico ...................................................................................................... 78
5.2.6 Categoria 6: Autonomia Profissional do Enfermeiro no Centro Cirúrgico .... 82
6 DISCUSSÃO ..................................................................................................... 88
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 105
REFERÊNCIAS .................................................................................................... 111
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ........................................................................... 118
APENDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................. 120
APENDICE B - Roteiro da Entrevista ................................................................... 122
ANEXO A - Carta de Princípios das Entidades Camilianas
ANEXO B - Serviço de Anestesia do Hospital e Maternidade São Camilo Pompéia
ANEXO C - Regimento Interno do Departamento Cirúrgico
ANEXO D - Carta do Comitê de Ética em Pesquisa (CoEP) do Centro Universitário
São Camilo
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
15
1 INTRODUÇÃO
A idéia de realizar um estudo em Centro Cirúrgico (CC) surgiu da minha
experiência como enfermeira supervisora e assistencial ao longo de mais de duas
décadas, em Pronto Socorro (PS) e em CC. Enquanto profissional atuando no CC de
um Hospital Escola da grande São Paulo, tive o privilégio de ter no meu trabalho o
reconhecimento, a valorização profissional e o respeito da equipe multiprofissional e
dos pacientes. Em grande parte, atribuo esse reconhecimento ao fato desse
hospital, desde a sua inauguração, ter trabalhado no modelo do Sistema de
Assistência de Enfermagem (SAE), ferramenta imprescindível para a prestação de
uma assistência de enfermagem de qualidade.
No CC, várias especialidades médicas como anestesiologistas, cirurgiões
gerais, cardíacos, plásticos, ortopedistas, oftalmologistas, ginecologistas dentre
tantos outros, interrelacionam-se e trabalham conjuntamente com enfermeiros,
técnicos e auxiliares de enfermagem e instrumentadores cirúrgicos, num ambiente
dinâmico, fechado, considerado estressante, rodeado de mitos e rituais que tornam
o lugar diferenciado no contexto hospitalar. Diante da complexidade do ambiente a
interação e a comunicação dessa equipe são de extrema importância no sentido de
agregar conhecimento e promover ações interdependentes para atender o paciente
com a máxima competência e segurança. Dessa experiência surgiu o interesse em
estudar os relacionamentos nesse ambiente sob a ótica da bioética, que se constitui
como área do conhecimento pluralista, multi e interdisciplinar.
Médicos e enfermeiros lidam com situações nas quais, a vida, o risco e a
morte se relacionam numa faixa muito estreita de segurança, ou seja, os riscos
inerentes ao procedimento anestésico-cirúrgico que um paciente se submete ao
entrar no CC fazem parte da rotina de trabalho. Observo que a particularidade e a
especificidade das atividades desenvolvidas nesse setor caracterizam-no como um
local onde as pessoas, inclusive profissionais de outras áreas do próprio hospital,
sentem-se curiosos em conhecer.
Ao longo do meu trabalho, percebi que o CC é um ambiente de trabalho
complexo, onde profissionais de várias categorias sócio-culturais e de diferentes
padrões de moralidade trabalham conjuntamente empenhados num único propósito:
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
16
atender e assistir ao cliente durante a cirurgia. Apesar de a finalidade ser a mesma,
os caminhos escolhidos pelos profissionais para atingir o êxito da cirurgia são
diferentes.
A sociedade gera um padrão de comportamento externo definido como
moralidade. Para Cohen e Segre (2004) moralidade é um sistema de valores do qual
resultam normas que são consideradas corretas por um determinado grupo social.
Uma
vez
que
vivemos
em
uma
mesma
sociedade,
observo
diferentes
comportamentos, praticados pelos profissionais da saúde. Isto se exemplifica no
comportamento de alguns profissionais quando atitudes desrespeitosas são
presenciadas por várias pessoas sem nenhum constrangimento. Vozes alteradas
são percebidas em conseqüência da intolerância e inexperiência de alguns, palavras
de baixo calão são proferidas dentro de um ambiente de trabalho por indivíduos
considerados “bons profissionais”. Esses comportamentos são comuns e lícitos para
alguns e imorais e antiéticos para outros.
Concordo com Santa Rosa (2002, p.130), ao afirmar que o enfermeiro de CC:
“[...] deve se posicionar diante de situações que ferem princípios éticos e desta
forma, ele terá condições de exercer sua autonomia, ao escolher o caminho do seu
crescimento, enquanto cidadão e profissional”. De acordo com Zoboli e Sartório
(2006), a bioética vem se agregando à construção histórico-social da prática da
enfermagem, no sentido de dar conta dos desafios decorrentes da necessidade de
mesclar ética e técnica.
Percebo, ainda, a vulnerabilidade no que diz respeito ao relacionamento e a
comunicação, uma vez que também nas atitudes profissionais, as relações de poder,
e de saber, interferem no comportamento e também no desempenho do restante da
equipe, pois se observa respostas e atitudes diferentes para uma mesma situação.
Apesar disso, acredito que enfermeiros com boa capacidade de liderança,
experientes, atualizados, com conhecimento técnico científico para prestar uma
assistência de qualidade e segurança, conhecimento administrativo para gerenciar
as atividades realizadas, uma grande capacidade de trabalhar em equipe e uma boa
comunicação interpessoal contribuam para tornar esse ambiente mais harmonioso.
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
17
Os pacientes, por sua vez, necessitam de um cuidado humanizado, pois se
encontram no momento crítico de seu tratamento. Por isso, necessitam de
profissionais responsáveis e competentes com valores morais e éticos, sensíveis e
capazes de perceber e atender as necessidades físicas e psicológicas desse
paciente. Necessitam de profissionais que, percebendo a vulnerabilidade dos
pacientes, estejam ao lado deles, conversando, segurando suas mãos, orientando e
fazendo-os interagir com as atividades necessárias ao procedimento, a fim de
promover um atendimento seguro e de qualidade.
Importante esclarecer que o termo responsabilidade é definido por Hans
Jonas como a capacidade individual de assumir antecipadamente pelo que se vai
fazer e ter consciência das conseqüências das suas ações e omissões (JONAS,
1995).
A idéia de o paciente cirúrgico ser “do cirurgião” implica num sentimento de
posse e nesse sentido, a atuação de uma equipe multiprofissional torna-se
assimétrica, atribuindo-se níveis de responsabilidade e comportamentos hierárquicos
e diferenciados. “O meu paciente”, frase ouvida no cotidiano hospitalar, tanto da
rede pública quanto privada, não reflete mais ao modelo assistencial prestado hoje
em dia. A partir do momento em que é necessária uma cirurgia, esse paciente passa
a ser alvo da atuação de muitos profissionais de saúde. Portanto a responsabilidade
do cirurgião é inquestionável, porém ela não é a única.
Durante minha atuação em CC, meu trabalho funcionava como um elo de
ligação entre todas as atividades multiprofissionais realizadas naquele local, pois
exercia diferentes funções: trabalhava com o cirurgião, anestesiologista e circulante
de sala dentro da SO assistindo ao paciente de forma integrada e compartilhada;
atuava “nos bastidores”, administrando a rotina cirúrgica, integrando as áreas afins,
Centro de Materiais e Esterilização (CME), familiares e pacientes em suas unidades
de origem de modo a providenciar sua chegada, equipamentos, pessoal
administrativo, entre outros; e ainda atuava com técnicos de enfermagem e
anestesiologistas na unidade de Recuperação Pós-anestésica (RPA) prestando
também um trabalho integrado e compartilhado.
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
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A minha trajetória profissional foi permeada por muitos desafios e
enfrentamentos, os quais serviram de impulso para a realização deste trabalho. A
urgência e prontidão que fazem parte da rotina da assistência ao paciente cirúrgico
exigem análise e rápida tomada de decisão com critérios para definir a ação.
Deparei-me com situações conflitantes, com perguntas sem respostas e com o não
saber como agir. Muitas vezes, precisei agir não da forma que era a mais correta,
mas a mais correta possível no momento. Precisar calar e procurar desculpas sem
sentido foram atitudes tomadas por mim e por muitos outros profissionais ao meu
redor para não correr o risco certo de perder o emprego.
A necessária exposição do corpo do paciente por alguns instantes dentro da
Sala Operatória (SO) é vista pela equipe como rotina, porém, na visão do paciente é
uma invasão à sua intimidade, e, portanto, esse momento deve ser acompanhado
com respeito. O não cumprimento do horário marcado para a cirurgia: a falta de
registro de ocorrências indesejáveis em SO como troca de medicação; acidente
intra-operátorio; queda do paciente da mesa cirúrgica; a suspensão da cirurgia por
falta de avaliação prévia; a falta de material solicitado em sala; a utilização
indiscriminada de celulares dentro da SO; as observações desrespeitosas feitas por
algum profissional sobre o paciente, achando que este não o está ouvindo, são
exemplos de situações de imperícia, imprudência e negligencia que se observam no
CC.
Tais situações podem afetar profundamente não só o paciente, mas também
as relações entre a equipe. Esses e outros tantos exemplos desrespeitam o ser
humano, comprometem a atuação profissional, interferem na sua autonomia e o
torna mais vulnerável. De certa forma, o respeito, a postura, a atitude profissional,
as dificuldades de relacionamento individual, o trabalho em equipe e a comunicação
estavam sempre permeando esses desafios.
Há três anos, ingressei no Centro Universitário São Camilo como supervisora
de estágio em CC, RPA e CME, da disciplina de Enfermagem na Saúde do Adulto,
do Curso de Graduação em Enfermagem. A partir da vivência em campo com os
estudantes de graduação em enfermagem do 5º semestre nos CCs de alguns
hospitais públicos e privados do Município de São Paulo e observando a sua
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
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dinâmica, era questionada pelos alunos sobre situações que observavam, as quais
diferiam das orientações dadas em sala de aula. Esses questionamentos se referiam
à presença do enfermeiro em SO diante de: práticas indevidas de instrumentadores
cirúrgicos, exposição do corpo e desrespeito ao paciente, grosserias dos cirurgiões
para com a equipe médica e principalmente com a enfermagem.
Importante ressaltar que a as atividades desses profissionais e suas atitudes
muitas vezes não são reconhecidas, nem por seus próprios colegas, como
comportamentos adequados. Percebendo que estas situações são identificadas,
relatadas e comentadas por profissionais de CC, por alunos e até pelos próprios
pacientes, acredito na relevância desta pesquisa de modo a refletir sob o olhar da
bioética neste ambiente e o interrelacionamento profissional dessa equipe.
O mestrado em bioética surge, em meu contexto de trabalho, como
ferramenta de enfrentamento e base para nortear e refletir os dilemas e conflitos
morais e éticos que possam emergir da observação dessas relações, observadas no
cotidiano do CC. O respeito, a justiça, o poder, a dignidade da pessoa humana, a
liberdade, a autonomia e a vulnerabilidade do paciente e do profissional, a
beneficência, a não maleficência fazem parte dos princípios e referenciais bioéticos
que acredito que devam estar sendo refletidos a cada ação profissional. É nesse
cenário que justifico a importância da presente pesquisa acreditando poder contribuir
para um ambiente de trabalho mais ético, harmonioso e integrado.
Vale a pena destacar que os estudos sobre relações interdisciplinares em CC
e Bioética ainda são poucos, por isso o tema está longe de ser esgotado. Até o
último acesso à Biblioteca Virtual BIREME, nas bases de dados LILACS, IBECS,
MEDLINE e SciELO em 15/06/2010 foram encontrados somente três artigos sobre a
temática, sendo dois nas bases de dados LILACS e um na SciELO. Após a leitura
dos resumos dos trabalhos, apenas um artigo foi selecionado correspondendo ao
estudo em questão.
Esta pesquisa se dispõe a lançar luz sobre determinados aspectos da
realidade e da vivencia dentro de um Centro Cirúrgico onde a Bioética servirá de
base para reflexão e foi proposta com os objetivos descritos a seguir.
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
20
2 OBJETIVOS
2.1 Geral
Analisar, à luz da Bioética, o relacionamento interpessoal da equipe
multiprofissional que atua no Centro Cirúrgico.
2.2 Específicos
Refletir quanto à existência de situações de conflito ético no trabalho desta
equipe.
Identificar a atuação do enfermeiro do Centro Cirúrgico.
Analisar a autonomia do enfermeiro na equipe do Centro Cirúrgico.
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21
3 REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 Trajetória Histórica da Cirurgia
Ao entender a história como memória de grupo humano, que influencia a
formação da consciência coletiva e desperta a atenção do indivíduo para o mundo,
pode-se dizer que um entendimento significativo do presente exige uma visão crítica
do passado (GRANGE; ARANTES, 2005).
Assim, para se entender os problemas da sociedade e desempenhar um
papel inteligente na construção da civilização, é preciso possuir um senso de
continuidade no tempo, ter consciência de ser impossível avançar para o futuro, sem
olhar para o passado.
Uma leitura histórica da cirurgia à luz da bioética leva a privilegiar alguns
aspectos notadamente éticos de sua trajetória. Segundo Paixão (1979), conhecer as
origens e a evolução de sua profissão deve despertar no indivíduo uma maior
compreensão dos seus deveres e lhe impõe mais entusiasmo pelo seu ideal.
Durante muitos séculos a medicina e a enfermagem foram privilégios
exclusivos dos sacerdotes e religiosos, pessoas consideradas de “elevado valor
moral e intelectual”. A história revela que nos períodos de fervor religioso, a
quantidade e a qualidade das pessoas a serviço dos enfermos faziam o diferencial
no processo de cura (PAIXÃO,1979, p.23).
Entre os aspectos éticos da trajetória histórica da cirurgia, podemos afirmar
que as exigências do cuidado a ser prestado ao paciente submetido a algum
procedimento cirúrgico provocam a consciência moral sobre a necessidade de uma
equipe multiprofissional. Identifica-se, nos relatos de Paixão (1979, p.22), que na
história da Índia do séc. VI a.C., dentro do Budismo, cuja doutrina de bondade era
um grande incentivo ao progresso, havia uma preocupação em prestar “uma
assistência inteligente”. Entre os médicos hindus, destacou-se Charaka, que foi o
primeiro a descrever muitas operações cirúrgicas como: catarata, hérnia e cesariana.
Charaka citado por Paixão (1979, p.22) afirma:
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O médico, as drogas, o enfermeiro e o paciente constituem um
agregado de quatro. Devemos conhecer a qualidade de cada um na
contribuição para a cura. [...] Conhecimento do preparo das drogas e
de sua administração, inteligência, dedicação, pureza de corpo e
espírito são as quatro qualidades do enfermeiro.
Qualidades de valor moral e ético e o trabalho com espírito de equipe é algo
que já se falava há mais de 28 séculos, sendo reforçado atualmente quando autores
como Barreto e Barros (2009) e Silva e Galvão (2007), afirmam que o
desenvolvimento do trabalho no CC exige uma integração harmoniosa, ética e
competente entre duas equipes, a saber, a médica e a da enfermagem.
Na história da enfermagem, Paixão (1979) ainda relata que objetivos como
dar conforto físico e moral ao doente, afastar dele os perigos e ajudá-lo a alcançar a
cura datam de tempos em que ainda não havia ciência. Nessa época, a mãe era
considerada, nas mais remotas eras, como a primeira enfermeira da família e os
conhecimentos sobre a enfermagem vinham acompanhados de assuntos médicos,
sociais e religiosos.
Dessa maneira, povos de todo mundo atribuíam as doenças como que
produzidas por espíritos malignos ou como castigo dos Deuses, de modo que a
medicina se prendia à Mitologia. Tempos depois felizmente, homens estudiosos e de
valor conseguiram desenvolver na sociedade da era pré-cristã, bases científicas
para o futuro da medicina. Hipócrates, 460 a.C., considerado o pai da medicina
enfrentou preconceitos com relação à dissecação de cadáveres, antes considerada
uma prática desrespeitosa. Apesar dos impecilhos sociais, Hipócrates explicava a
seus discípulos a verdadeira causa da dissecação (PAIXÃO, 1979).
A medicina e a enfermagem passaram por períodos de ascensão e
decadência. A Reforma Protestante do séc. XVI contribuiu para marcar um dos
piores períodos da enfermagem. Com a expulsão das religiosas dos hospitais, a
escassez de donativos e falta de pessoal preparado, um grande número de hospitais
precisou ser fechado. Os enfermos que conseguissem ficar em casa eram mais bem
cuidados, enquanto que nos hospitais os que se diziam enfermeiros não passavam
de pessoas da mais baixa classe social e moral duvidosa. Chegavam a extorquir
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dinheiro dos enfermos e, conforme afirma Paixão (1979, p.54), “deixavam os
doentes morrer ao abandono”. No mesmo período em que a enfermagem caía em
decadência, a ciência médica fazia conquistas notáveis (PAIXÃO,1979).
A enfermagem passa então a existir como profissão a partir do momento em
que Florence Nightingale (1820-1910), uma jovem intelectual da alta aristocracia
inglesa, imbuída de grande humildade e espírito humanitário passa a desenvolver no
séc. XX uma mentalidade mais social, trazendo para dentro dos hospitais
profissionais de elevado padrão cultural. De acordo com Paixão (1979), Florence foi
pioneira e renovadora ao abrir escolas de enfermagem às moças educadas e cultas
preparando, dessa maneira, as enfermeiras em bases mais científicas.
Florence ainda trabalhou intensamente na missão de cuidar dos feridos
durante a Guerra da Criméia (1854). Procedimentos cirúrgicos não faltaram e ações
para diminuir a mortalidade dos soldados foram aplicadas tanto com relação aos
aspectos organizacionais quanto aos assistenciais. Com essas práticas, conseguiu
diminuir a mortalidade dos feridos. Em 1956, Florence contrai tifo ao retornar da
Criméia, ficando impossibilitada de trabalhar com os doentes. Dedica-se então a
preparar profissionalmente as enfermeiras a exercer os serviços usuais da
enfermagem hospitalar e domiciliar. Segundo Paixão (1979), tinha grande
preocupação em desenvolver nas estudantes traços de caráter considerados
desejáveis como sobriedade, honestidade, lealdade, pontualidade, serenidade,
espírito de organização, correção e elegância uma vez que pretendia dissociar o
nome da enfermagem como uma “profissão” inferior.
Segundo Possari (2006), os médicos do séc. XVIII eram mais valorizados e
reconhecidos socialmente pela sua capacidade intelectual de tratar doenças. Na
época, acreditava-se que a denominada medicina interna, requeria mais reflexão,
estudos e percepção. Já as necessidades cirúrgicas eram tratadas por profissionais
chamados de cirurgiões barbeiros, os quais recebiam um aprendizado prático, não
universitário.
Durante muitos séculos a cirurgia atuou à sombra de vilões da medicina como
a dor, a hemorragia e a infecção. No séc. XIX, a dor passou a ser mais bem
controlada com a descoberta de equipamentos e novos agentes anestésicos. A
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tecnologia e a pesquisa no desenvolvimento de equipamentos e materiais usados
para hemostasia contribuíram com a medicina para atenuar as hemorragias durante
os procedimentos cirúrgicos (POSSARI, 2006).
A contribuição de Florence Nightingale é reconhecida como referência na
questão de infecção devido à sua preocupação com a organização, limpeza,
assepsia e o ambiente do cuidar, elementos que se tornam pontos indispensáveis na
cura dos doentes cirúrgicos e colaboram substancialmente para a diminuição das
infecções (PAIXÃO 1979).
O século XX foi considerado o século dos avanços tecnológicos e das
grandes revoluções e evoluções cientificas. Nas primeiras décadas desse século, a
cirurgia era realizada no próprio domicílio do paciente ou do cirurgião. A enfermeira
obedecia a uma escala hierárquica, sendo responsável por acalmar o paciente, pelo
preparo do ambiente e do instrumental cirúrgico.
Com o surgimento das instituições de saúde nas décadas de 1920 e 1930 as
cirurgias passaram a ser realizadas em salas de operação (SO). Nas décadas
seguintes com as descobertas de novas técnicas cirúrgicas e instrumentais, as
cirurgias passaram a se tornar mais complexas e especializadas. Dessa forma foram
criados os primeiros Centros cirúrgicos (GUIDO et al, 2008).
Segundo os mesmos autores, a Segunda Guerra Mundial também teve um
papel importante no cenário medico-cirúrgico e da enfermagem, pois com o aumento
do número de intervenções cirúrgicas nos hospitais, houve necessidade de trazer
para dentro das salas cirúrgicas o pessoal ocupacional. Esse pessoal inicialmente
sem preparo passou a ocupar o espaço do profissional de enfermagem, deixando as
atividades de coordenação dos recursos materiais e humanos e os aspectos
organizacionais e técnicos a cargo dos enfermeiros.
Nas décadas de 60 e 70 a alta tecnologia passa a fazer parte do dia a dia dos
enfermeiros de CC, de maneira que os transplantes e equipamentos sofisticados
passam a ser desafios a serem enfrentados. Surgem, assim, os conflitos de ordem
moral e ética e preocupações com a melhoria da qualidade da enfermagem em CC.
Grupos de estudos foram criados para discutir problemas relacionados às atividades
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de CC e em 1991 foi criada a Sociedade Brasileira de Enfermeiros de Centro
Cirúrgico (SOBECC), com o objetivo de desenvolver estudos, fundamentar a prática
com pesquisas cientificas e permitir a socialização dos conhecimentos adquiridos,
organizando e promovendo eventos técnico-científicos.
Podemos dizer que o maior avanço do ponto de vista cirúrgico se deu no séc.
XX e continua nos dias de hoje. Passaram-se das cirurgias realizadas em ambientes
precários às cirurgias em salas de operação em ambiente hospitalar, ao
desenvolvimento de cirurgias vídeo-assistidas e, atualmente, cirurgias por robótica
com a possibilidade de serem realizadas à distância.
Esse rápido avanço tecnológico trouxe para a sociedade muitas mudanças de
paradigmas atropelando valores seculares, principalmente quando se observa que
vivemos hoje em uma sociedade mercantilista e capitalista, na qual o valor do ser
humano passa a ser questionável.
Com relação ao comportamento, objeto deste estudo, observam-se histórias
profissionais antagônicas partindo dos sujeitos analisados. Cunha, Acunã e Bispo
(2007) relatam que a classe médica era treinada para atuar preferencialmente
sozinha, obedecendo a um código deontológico, sentindo-se independente do
hospital e de sua estrutura organizacional. Afirmam que a tradição de seus valores,
baseada na autonomia de sua profissão e na responsabilidade pessoal, refletiam-se
num modelo artesanal em que o sucesso era inteiramente creditado ao médico,
enquanto eventuais fracassos eram atribuídos às debilidades dos pacientes ou
mesmo à infra-estrutura oferecida pela organização. Tal modelo atitudinal pode ser
observado no comportamento médico ainda nos dias de hoje.
Com relação à enfermagem, Germano (1993) ressalta que no passado sua
ideologia significava: abnegação, obediência e dedicação. Isso tornava a enfermeira
disciplinada e obediente em suas atitudes e responsabilidades. Nas três últimas
décadas, este cenário vem se transformando, pela chegada nas instituições de
saúde, de profissionais mais bem preparados.
Santa
Rosa
(2002)
descreve
o
enfermeiro
de
hoje
como
agente
transformador, compromissado com a transformação do ambiente do CC no
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contexto social e que busca proporcionar uma prática fundamentada em valores
morais e éticos como responsabilidade, respeito, igualdade, solidariedade, e
princípios bioéticos como justiça, beneficência e autonomia.
3.2 O Hospital e o Centro Cirúrgico
O Hospital, segundo Oliveira (2002a), é considerado uma grande estrutura
integrada por mini-estruturas, que desempenham funções distintas, com o objetivo
único de prestar um serviço de qualidade. Dentre as diversas unidades da estrutura
hospitalar, destaca-se o CC, uma unidade que contém um conjunto de elementos
destinados às atividades cirúrgicas, constituindo, assim, o setor que tem como
prioridade prestar assistência de qualidade ao paciente: desde o recebimento na
fase
pré-operatória,
intra-operatória
e
pós-operatória
na
RPA
com
seu
encaminhamento à unidade de destino adequada. Reforça que é fundamental obterse condições adequadas ao ato anestésico-cirúrgico, tanto para segurança física e
psicológica do paciente quanto da equipe cirúrgica.
Já Barreto e Barros (2009) consideram o Bloco Operatório (BO), setor que
engloba as áreas de CC, CME e RPA, como o setor de maior importância do hospital
com áreas de acesso restrito, interligados com outras áreas hospitalares
necessitando de um trabalho interdependente. Também considera a unidade de
maior complexidade do hospital por sua especificidade, possibilidade de riscos a
saúde dos trabalhadores e dos pacientes, pelos custos, pela evidência dos
resultados, dramaticidade das operações e decisiva ação curativa da cirurgia.
A Unidade de CC também é considerada por Cunha e Caregnato (2008), um
dos setores críticos do hospital, pela sua exigência profissional em razão do
atendimento de alto risco, da geração de tensão e angústia. Nestas áreas, a autora
reforça que trabalham pessoas com formações e vivências diferentes e que isso
interfere nos relacionamentos interpessoais, e repercute na dinâmica do setor.
Em conseqüência das constantes descobertas e contribuições da pesquisa,
autores como Peniche e Araújo (2009), Guido et al. (2008) e Caregnato e Lautert
(2005) consideram que o conhecimento e a capacitação do profissional do CC
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podem estar ultrapassados em um curto período de tempo, deslocando este
profissional para a faixa perigosa da impudência, imperícia ou negligência, que
colocam em risco a vida do paciente. Dessa forma cabe ao profissional do CC
atualizar-se e capacitar-se continuamente.
3.3. Atuação da Equipe Médica e de Enfermagem no Centro Cirúrgico
Para Barreto e Barros (2009), a busca de amparo e solução para os
problemas de saúde, a dependência e a necessidade assistencial do paciente na
SO, depende de uma equipe multiprofissional que tem o dever ético e moral de
reconhecê-los e solucioná-los. Reforçam que, a partir da necessidade de uma
intervenção cirúrgica que pressupõe uma internação em ambiente hospitalar esse
indivíduo deixa de depositar sua confiança somente no médico e passa a depender
e a buscar competência também na equipe que irá cuidar dele.
Atualmente, o saber médico não figura solitário no cuidado à saúde. Equipes
multiprofissionais cada vez mais têm sido formadas com o intuito de unir
experiências e conhecimento científico em prol da saúde do individuo. Isso porque a
fragmentação assistencial exige hoje um novo modelo que favoreça a comunicação
e o trabalho em equipe, a fim de assegurar a melhor segurança do paciente
(CUNHA; ACUNÃ; BISPO, 2007).
Porém, Caregnato (2002), em seu estudo sobre a equipe multiprofissional,
relata que, tendo o CC seus próprios rituais, mitos e “deuses”, os cirurgiões
consideram-se semideuses, donos dos pacientes, com sabedoria e onipotência
superior aos demais profissionais membros da equipe. Assim eles consideram-se os
responsáveis pelo paciente. Os outros profissionais consideram ter grande
responsabilidade para com os pacientes, mas nunca assumem posição de chefia da
equipe. Os anestesistas acham-se responsáveis por controlar a dor dos pacientes,
as enfermeiras destacam a importância do seu papel de resolver problemas e se
auto definem como facilitadoras, enquanto os técnicos de enfermagem deixaram
evidente que fazem seu trabalho hierarquicamente, sendo dependente do cirurgião.
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Definir-se como agente facilitador não deve ser o objetivo do enfermeiro do
CC. A importância do trabalho que desenvolve vai além da simples tarefa de facilitar
o trabalho de outrem, pois exige assumir o seu papel de elo entre todas as equipes
atuantes em CC, arcando com as responsabilidades específicas do trabalho de
enfermagem. Importante ressaltar que a necessidade de reconhecimento dos
enfermeiros e demais membros da equipe de saúde, especialmente quanto aos
aspectos de cuidar, remetem a pensar sobre a valorização que se atribui aos pares e
ao trabalho em equipe. Na trajetória da prática, ressalta Castanha e Zagonel (2005),
dar
visibilidade
à
profissão
é
também
buscar
parcerias,
compartilhar
responsabilidades e tarefas.
Como esclarece Bianchi e Leite (2006), cada vez mais as instituições
hospitalares estão investindo na atuação do enfermeiro junto ao cliente, como
elemento essencial e participativo do desenvolvimento do ato anestésico cirúrgico. O
enfermeiro lida com os momentos críticos desse período, principalmente durante a
recepção do paciente no CC: o início e o término da anestesia; a colocação do
paciente na posição cirúrgica; a vigência de intercorrencias; o fim da cirurgia; o
transporte do paciente; a evolução e a alta do cliente da sala de operações; o
cuidado integral na recuperação anestésica; a evolução e alta da recuperação
anestésica.
Todavia, Peniche e Araujo (2009) alertam para o fato de que apesar do
exercício da enfermagem em CC ser de grande responsabilidade profissional, a
visibilidade do enfermeiro fica comprometida e, na maioria das vezes, passa
despercebida, principalmente quando o procedimento anestésico-cirúrgico é bem
sucedido. Relata ainda que o próprio paciente, por não ter tido um relacionamento
mais prolongado com a equipe de enfermagem do centro cirúrgico, desconhece que
o êxito de sua cirurgia deve-se, em parte, ao enfermeiro. O paciente ignora que
coube ao profissional da enfermagem a atividade assistencial e o gerenciamento de
recursos materiais, humanos e tecnológicos, o oferecimento à equipe da infraestrutura e o apoio logístico, indispensáveis para a realização da cirurgia.
Desconhece, ainda o sistema de assistência de enfermagem perioperatória
responsável por oferecer uma assistência de enfermagem de qualidade e promover
a segurança e o bem estar do paciente no período transoperatório.
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As mesmas autoras reforçam ainda a necessidade de o enfermeiro
reconhecer situações que possam causar riscos e danos aos clientes, atuando na
prevenção e propondo intervenções; uma vez que o CC é considerado um palco de
muitas ocorrências graves, tanto físicas como emocionais.
O trabalho em equipe é primordial, pois é no CC e principalmente dentro da
sala cirúrgica que existe em tempo real, que ocupam o mesmo espaço, trabalhando
num mesmo paciente, profissionais que necessitam de ações conjuntas,
dependentes e interdependentes, exigindo múltiplos conhecimentos, experiências e
julgamentos. Indubitavelmente, uma ação multiprofissional pautada no respeito na
valorização do profissional e no interesse do bem comum alcança resultados
melhores do que um conjunto de indivíduos que estejam atuando somente de
acordo com suas responsabilidades individuais, morais e éticas (PENICHE;
ARAUJO, 2009; SILVA; GALVÃO, 2007).
Caregnato e Lautert (2005) constataram em sua pesquisa, que os
profissionais sentem-se preparados para trabalhar tecnicamente com os pacientes,
porém não foram preparados para trabalhar o relacionamento interpessoal que
permeia a equipe multiprofissional.
Na opinião de Cunha e Caregnato (2008), as necessidades do CC devem ser
resolvidas imediatamente, pois, se isso não ocorrer, poderão surgir intolerâncias,
ansiedades, desrespeito e estrelismos individuais. Tomar decisões nesse ambiente é
complexo, pois envolvem restrições econômicas, questões sociais e respeito aos
direitos individuais e coletivos. “A decisão individual afeta o coletivo e a decisão
coletiva impõem restrições aos indivíduos”, desta forma deve-se respeitar as
diferenças individuais e coletivas, baseadas nos valores morais e éticos expressos
pela nossa sociedade (FERRAZ, 2009, p.49).
3.4. A Filosofia, a Ética, a Bioética e o Centro Cirúrgico
A bioética é um dos campos mais emergentes e dinâmicos da reflexão
filosófica atual. Apesar de pouco mais de três décadas de existência, a rapidez de
sua expansão e de seu amadurecimento fez com que assumisse uma influência
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direta, progressiva e irreversível na área da saúde. A sociedade globalizada, o
grande desenvolvimento da medicina, a morte instrumentalizada nos hospitais e a
influência dos aspectos econômicos e legais nas decisões médicas foram os
grandes responsáveis para que isso acontecesse.
Em sua definição, a bioética propõe uma análise do comportamento humano
frente às novas possibilidades que o conhecimento científico traz, podendo pensar
nas possíveis diferenças que surgem entre a própria ética e a ética do outro
(COHEN, 2008). Como bem colocam Grange e Arantes (2005), o homem de outrora
via no futuro uma vida moderna e cheia de facilidades. Hoje ele se vê atropelado
pela biotecnologia, preocupado em querer saber aonde ela o levará .
Dentro deste contexto apresentarei uma breve análise do processo
civilizatório e das descobertas científicas que influenciaram o desenvolvimento
humano e que trouxeram para o ambiente cirúrgico tantas inquietações. Para tanto,
não basta falar somente dos cientistas. A história é conhecida principalmente por
meio do pensamento dos que filosofavam (pensavam sobre a vida). Trago, então, na
figura de grandes filósofos a tradução do pensamento do homem e dos cientistas.
De acordo com Grange e Arantes (2005), para garantir a perpetuação da
espécie o fogo foi a primeira descoberta realizada por nossos ancestrais, frágeis e
desprotegidos, porém curiosos que, ultrapassando seus limites, perceberam que a
sua sobrevivência dependeria do domínio de suas descobertas. A partir de então a
evolução da humanidade tem seu ponto de partida e, como conseqüência, surgiram
as primeiras civilizações. Entre elas destaca-se a egípcia, cujo legado da descoberta
da escrita possibilitou a expansão geográfica e fez surgir as grandes civilizações,
fato que contribuiu para o desenvolvimento da humanidade no caminho do
entendimento da ciência. Os gregos, também deixaram sua marca como autores de
descobertas científicas. O grande pensador Sócrates, séc. IV ac., contribuiu para a
filosofia como educador público, tendo suas idéias perpetuadas através de outros
pensadores como Platão e Aristóteles.
Grange e Arantes (2005) discorrem que o poder daquela época se
concretizou na estrutura social à medida que as civilizações se organizavam em
Estados. A partir daí, por meio de uma hierarquia estabelecida, e muitas vezes
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injusta, surgiram os primeiros pensamentos que hoje designamos como éticos.
Sempre em busca da verdade, a ética de Aristóteles considerava que o homem
através da sua capacidade de raciocínio atrelava as descobertas cientificas a
realizações pessoais e de felicidade. Atribui-se então a Aristóteles um novo processo
na construção do pensamento centrado na razão e na experimentação, tornando
filósofos e cientistas porta–vozes das dúvidas existenciais dos seres humanos, os
experimentadores de idéias. Inicia-se, dessa forma, a construção do pensamento
científico, baseado em conhecimento, experimentação e ética.
Hossne (2002) destaca que a medicina ocidental se estrutura com Hipocrates,
o qual é referido como uma das grandes figuras da Grécia antiga juntamente com
Sócrates e Aristóteles. Ele era um asclepíade, isto é, membro de uma família que
durante várias gerações praticara os cuidados em saúde. Hipócrates compartilhava
a idéia segundo a qual a natureza das doenças só seria conhecida mediante o uso
da observação e da razão. O processo de observação e razão foi conhecido como
técnica médica que o latim traduziu como arte médica. Dessa forma surge o
fundamento do raciocínio clinico que poderia ser aprendido e ensinado.
Os médicos, sendo capazes de dominar a técnica e a arte, passam a ter um
poder amplo, abrangente e profundo, ditando ordens, regras e normas sobre a vida
de outro ser humano. Esse poder ou “competência”, como cita Hossne (2002),
mediante à visão hipocrática, deveria ser subordinado e condicionado a alguns
princípios contidos no “Juramento de Hipócrates”, que ao estabelecer os
fundamentos da técnica e da arte médica, deu enfoque especial à relação médicopaciente. Esta relação deveria ser fundamentada na amizade e no amor a serviço do
doente. Atribui-se a Hipócrates a famosa frase Primum non nocere (antes de tudo,
não prejudicar).
A Idade Média se caracteriza como um período que gradativamente
desenvolve o conhecimento pela busca dos grandes valores que conferem sentido à
vida humana, em sua história e após a morte. Predominam as razões religiosas. Em
filosofia, desenvolve-se o conhecimento pela busca das essências e das causas
finais; propicia-se o reencontro com os clássicos da filosofia grega, particularmente
Aristóteles; faz-se berço para as universidades que proliferam na modernidade. Mas
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este modelo de pensamento entra em crise com a chegada da ciência moderna, que
a partir do renascimento desloca-se da busca das essências para o estudo das
particularidades e dos fenômenos. Esta transformação gera o saber tecnológico, que
chega aos nossos tempos com suas vantagens, interrogações e ambigüidades
(HOTTOIS, 2008).
Grange e Arantes (2005) ainda consideram que foi por meio do papel e da
imprensa que a humanidade passou a conhecer as invenções científicas. A
Revolução Industrial do final do séc. XVIII veio trazer ao homem a possibilidade de
produzir objetos de consumo não encontrados na natureza.
O progresso tecnocientífico que resultou desse processo, além dos inúmeros
benefícios, trouxe também problemas, particularmente quanto aos sentidos e valores
éticos que permeiam o uso dos recursos técnicos. O ser humano acabou tornandose refém de si mesmo, não sobrevivendo sem a máquina.
De maneira analógica, no ambiente hospitalar, em especial no CC, nada se
realiza sem a necessidade inquestionável de materiais e equipamentos, dando-se
sempre preferência aos mais modernos. Esta constante busca da superação dos
limites tecnológicos permitia, até pouco tempo, o exercício pleno da autonomia
científica, sem o devido questionamento ético das conseqüências inerentes a cada
descoberta para a humanidade (GRANGE; ARANTES 2005).
Caregnato (2002) aponta que o desenvolvimento científico e tecnológico não
conseguiu modificar o significado da cirurgia para o paciente e seus familiares de
maneira que ela continua sendo um evento marcante, que invade a intimidade das
pessoas.
De acordo com Urban (2003) o séc. XX foi a época da história da humanidade
em que mais se falou do homem e dos direitos humanos. Contudo, também foi o
tempo marcado pelas maiores violações desses mesmos direitos, pela crise de
valores, a partir da qual o homem não reconhece a sua própria dignidade (respeito a
si próprio) e não respeita a dignidade do seu semelhante.
O campo da ética médica, tradicionalmente marcado por uma ênfase quase
exclusiva do relacionamento médico-paciente (direitos e deveres), atualmente não é
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suficientemente abrangente, capaz de abraçar uma série de situações emergentes
no campo das ciências da vida (URBAN, 2003).
Sendo assim, é neste contexto sócio econômico e cultural complexo que se
conceitua a Bioética. A Bioética é interdisciplinar, sendo essa uma das suas
propriedades mais evidentes. Na opinião de Urban (2003), o conceito de Bioética
mais ideal e aceito atualmente está descrito na Encyclopedia of Bioethics:
Estudo sistemático das dimensões morais – incluindo a visão moral,
as decisões, a conduta e as linhas que guiam – das ciências da vida
e da saúde, com o emprego de uma variedade de metodologias
éticas e uma impostação interdisciplinar (POST, 2004 p.246,247)
O mesmo autor coloca que três áreas contribuíram para a formação da
Bioética: a experimentação em seres humanos; o uso social da medicina e; o
emprego da alta tecnologia na prática médica. Vale salientar que esta última é muito
utilizada em áreas de atendimento de alta complexidade, onde se situa o CC.
A palavra bioética foi citada oficialmente por Van Rensselaer Potter,
oncologista norte-americano, em artigo publicado em 1970. Em 1971 Potter publicou
a obra que passou a ser referência inicial: “Bioética: Ponte para o Futuro” na qual
define bioética, como a ciência da sobrevivência humana, de forma a promover e a
defender a dignidade humana (o respeito ao ser humano) e a qualidade de vida
(POTTER, 1971).
Hoje, em tempos de novidades nunca sonhadas trazidas pela tecnologia, o
cenário bioético foi ampliado de modo que se observam calorosos debates quanto a
sua abrangência temática, seus paradigmas, sua fundamentação e seus princípios.
Hossne, Albuquerque e Goldim (2007) apontam para um primeiro aspecto que
pode ser considerado o campo de ação da Bioética. Afirmam que a Bioética é a ética
das (e nas) ciências da vida, da saúde e do meio ambiente. Um outro aspecto a ser
considerado corroborando com Urban (2006) é sua característica multi e
transdisciplinar, que a torna aberta à pluralidade. A reflexão bioética no sentido
multidisciplinar busca a participação de outras áreas de conhecimento além da ética,
e, sobretudo a transdisciplinaridade, que é a incorporação da visão ética de uma
Maristella Lopes Gianini
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disciplina na visão das outras e vice e versa. É nessa linha de pensamento que a
presente pesquisa busca trazer uma contribuição para além da minha área
profissional e dialogando com outros saberes.
Na opinião de Caregnato (2002), a cirurgia passa a ser um ato em que o
paciente deposita sua total confiança e submissão em relação à equipe cirúrgica.
Diante desta afirmação, Santa Rosa (2002) ressalta que o agir nas relações requer a
aplicação de um instrumento de reflexão para nortear ações que surgem das
práticas do CC, que entram em conflito com a garantia dos direitos do paciente,
identificadas no comportamento da equipe multidisciplinar. As relações dentro de um
ambiente como o CC envolvem questões de honestidade, justiça, respeito,
autonomia e cumprimento de compromissos.
De acordo com Santa Rosa (2002), a bioética em CC está presente e
fundamentada na razão e no juízo moral, por utilizar-se de valores e princípios
morais.
Nesse sentido cabe ressaltar o principialismo, definido como uma teoria moral
aplicada ao campo dos dilemas e conflitos morais que surgem na área biomédica
formulada por Tom Beauchamp e James Childress, eles a descrevem em quatro
princípios orientadores de ação: O Princípio da Beneficência, da Não maleficência,
da Justiça e da Autonomia (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
No CC, esses princípios são essenciais, quando se observa que a segurança
da vida humana é o mais importante. Os valores individuais justificam e
fundamentam as ações e tomadas de decisões na formação de juízos morais na
prática profissional do enfermeiro. Porém, ainda na opinião da mesma autora, a
maneira como são aplicados pode diferir de uma instituição para outra (SANTA
ROSA, 2002).
Passos (2000) relata que no CC o importante é a tomada rápida das decisões
e a eficácia da ação, podendo-se deixar de lado os valores éticos, o que também
poderia insinuar a polêmica idéia de que os fins justifiquem os meios.
Precisamos ter consciência de que estamos no meio de uma das mais
dramáticas revoluções na história, que nada deixa intocado: nossas maneiras de
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trabalhar, de comunicar, de pensar e de agir (ALMEIDA; BRAGA, 2006). Em nenhum
momento da história humana, segundo Puggina e Silva (2005), a ciência e a
tecnologia colocaram tantos desafios à ética como hoje.
A explosão tecnológica da qual o CC é cenário constante exige dos
profissionais habilidades técnico-científicas e constantes atualizações. Segundo
Puggina e Silva (2005, p.573), as relações pessoais estão perdendo a densidade
ética e as estruturas sociais alterando paradigmas. A desumanização das relações
entre profissionais de saúde e os pacientes tem sido uma das principais causas
apontadas para o aumento de denúncias e processos de promoção de
responsabilidade jurídica contra os profissionais de saúde
Não nascemos éticos, mas nos tornamos éticos através do nosso
desenvolvimento. Isso quer dizer que passamos dos direitos
humanos a uma ética das relações que, não sendo inata, deve ser
apreendida por todos os indivíduos que desejam se relacionar.
(PUGGINA; SILVA, 2005, p.543).
Segundo Bronzatti, Ponteli e Ferretti (2008), o profissional de CC, baseado
num código de condutas morais, deve ter qualidades essenciais no exercício de sua
profissão, tais como conhecimento; compromisso; habilidade; estratégia; altruísmo;
justiça; competência; sigilo; prudência; coragem; perseverança; compreensão;
humildade; imparcialidade e otimismo, tendo de desenvolver suas atribuições com
responsabilidade, lealdade e iniciativa.
Para que se possa refletir sobre autonomia em bioética inserida no contexto
do CC, faremos previamente algumas considerações semânticas e filosóficas sobre
autonomia.
A “autonomia” no sentido semântico da palavra vem do grego formada pelo
adjetivo autos que significa “o mesmo”, “ele mesmo”, “por si mesmo” e nomos que
significa “compartilhamento”, “lei do compartilhar”, “instituição”, “lei”, “convenção”.
Nesse sentido autonomia significa a competência humana em “dar-se suas próprias
leis”.
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Quando se fala em autonomia não é possível deixar de mencionar Immanuel
Kant, grande filósofo alemão do séc. XVIII. A ele se atribuiu o valor incondicional da
pessoa humana e sua capacidade de autodeterminação, transformando-a em lei
universal: “Age como se a máxima da tua ação se devesse tronar, pela tua vontade,
em lei universal da natureza.” (KANT, 2005, p.59).
Porém, a autonomia não pode ser entendida tão somente como sendo
autodeterminação de um indivíduo. De acordo com Goldim (2000), a melhor
denominação para o princípio da autonomia está na perspectiva que surge quando
se entende que o conceito não é dirigido apenas a um indivíduo e sim quando a sua
ação vislumbra a responsabilidade pelo respeito à pessoa do outro.
A proposta da responsabilidade dirigida aos cientistas cunhada por Hans
Jonas filósofo alemão do início do séc. XX, defende, por assim dizer, que o cientista
deve estar imbuído do máximo de consciência possível e comprometido com a
defesa de uma autêntica humanidade. Acreditando que a tecnologia elimina a
consciência, elimina o sujeito e elimina a liberdade em proveito de um determinismo,
Hans Jonas foi levado a propor novas dimensões para a responsabilidade
articulando duas realidades: uma subjetiva na qual ocorre a fusão do sujeito e da
ação, e outra objetiva, em que a ação se revela com suas conseqüências. Assim o
princípio da responsabilidade fica definido de forma que “a ordem ética está
presente não como realidade visível, mas como um apelo previdente que pede
calma, prudência e equilíbrio.” (SIQUEIRA, 2005, p.139).
Costa (1996) ao considerar a autonomia como ação, afirma que devemos
entender que ela parte do pressuposto da intencionalidade, do conhecimento e da
ausência de controle externos.
Uma vez que uma ação pode sugerir uma implicação em relação ao outro,
encontramos na opinião de Anjos (2006) a parceria da autonomia com a
vulnerabilidade, cujo termo é derivado do Latim (vulnus: ferida). Tratando-se de
pessoas, expressa a possibilidade de alguém ser ferido tanto no sentido físico
quanto no sentido da ofensa moral quando uma ação é realizada. A vulnerabilidade
pode se referir a indivíduos, grupos e até a toda a humanidade, podendo estar
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sendo defendida ou explorada nas relações quando o sentido de vulnerabilidade
torna-se vulneração (ANJOS, 2006).
Durand (2003, p.176) conceitua que autonomia é “a capacidade de fazer as
próprias escolhas e realizar atos sem coação”, ou, no sentido ético é a capacidade
de decidir no sentido do bem e do que é justo:
A autonomia, portanto, opõe-se tanto à servidão em relação a leis
externas (políticas ou morais) como a submissão em relação aos
próprios desejos e caprichos individuais, subjetivos.(...) A autonomia
remete, portanto, à capacidade ou, melhor, à responsabilidade de
buscar o que constitui o bem, o que é racionalmente ético.(...)não é
somente um atributo da pessoa, ela é um dever, uma
responsabilidade. (DURAND, 2003, p.176-177).
O mesmo autor (2003, p.181) esclarece que podem existir diferentes graus de
autonomia, já que não há uma noção de autonomia perfeita. Porém, a falta de
autonomia pode ser completa quando há coação de qualquer forma. Entre estes
dois extremos, há múltiplos graus:
- autonomia perfeita (utópica)
- autonomia adequada
- assentimento
- não-oposição
- ausência completa de autonomia
O princípio da autonomia está intimamente relacionada com as atitudes. Na
ética, a maneira de como dizer e como fazer é tão importante quanto o conteúdo, o
que dizer e quando dizer. As atitudes por sua vez se relacionam com o ambiente e
os sujeitos, portanto a ética das relações (DURAND, 2003).
Para Santa Rosa (2002) a autonomia é o princípio que preceitua a liberdade
individual de determinar as próprias ações de acordo com a própria escolha, é
reconhecer suas decisões, tomadas de acordo com os seus valores e convicções
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pessoais. Entretanto, coloca que nos dias de hoje a ética é negligenciada por falta
de lealdade dos empregados, pelo uso da tecnologia a serviço da fraude. No CC, a
exemplo de situações enfrentadas pelos enfermeiros temos:
O encobrimento ou deturpação de registros de nomes de elementos
da equipe cirúrgica, atuantes ou não, nos procedimentos cirúrgicos
realizados; a exigência de uma obediência cega à autoridade, não
importando se ela é antiética ou injusta; a negligencia da
necessidades de pudor e privacidade de pacientes no período
perioperatório [...] (SANTA ROSA, 2002, p.134).
A mesma autora ainda cita outros dilemas que a enfermeira enfrenta no
gerenciamento do BO:
[...] má qualidade no trabalho, decorrente de situações em que o
profissional enfrenta o duplo vínculo, a dupla jornada de trabalho;...o
sacrifício do mais fraco, para que as coisas sejam feitas levando a
sobrecargas de uns em benefícios de outros; a supressão dos
direitos de liberdade de expressão e de escolha de atividades, a
depender da política de pessoal; o deixar de denunciar a ocorrência
de práticas anti-éticas que tenha vivenciado no local de trabalho, por
temer a perda do emprego; o bajular o superior hierárquico, em vez
de fazer o trabalho bem feito; a promoção do empreendedor
destrutivo, que deixa para trás os seus erros; a não cooperação com
outras áreas do sistema;[...]atos de inverdade ou de omissão por
parte dos dirigentes para com os empregados, sob a justificativa de
serem pelo bem da instituição, não deixando claro seus propósitos; o
não assumir a responsabilidade por práticas danosas, intencionais ou
não. (SANTA ROSA, 2002, p.134).
É nesse contexto complexo, multifacetado que a presente pesquisa foi
desenvolvida seguindo a trajetória metodológica descrita a seguir.
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4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
4.1 Opção pelo Método
O caminho percorrido buscou se aproximar do universo dos valores, dos
significados e das crenças de um grupo multiprofissional que compartilha o mesmo
ambiente, o Centro Cirúrgico.
O processo do trabalho científico desta pesquisa foi o de construir
teoricamente as relações e os significados da realidade. Apropriamo-nos de Minayo
(2009), entendendo que por meio de uma abordagem qualitativa poderíamos
absorver essa realidade com seus subjetivismos.
Estudar no universo das ciências da saúde o comportamento e as relações
sociais a partir das quais os indivíduos se interagem formando grupos, equipes,
times, levou-me a optar pela pesquisa exploratória, descritiva de abordagem
qualitativa (MINAYO, 2009; GIL, 2009).
Ao analisar a natureza do problema a ser pesquisado, a abordagem
qualitativa se torna a mais adequada, uma vez que esta considera a existência de
uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito (CAREGNATO, 2002).
Segundo Oliveira (2002b), a pesquisa qualitativa possibilita a investigação de
situações complexas ou situações muito particulares. Preocupa-se em investigar o
fenômeno e não o fato, pois o fenômeno remete à interpretação subjetiva do fato
feita pelo observador.
Na pesquisa qualitativa, o pesquisador busca levantar as opiniões, as
crenças, o significado das coisas nas palavras, nos gestos e no comportamento dos
participantes da pesquisa. Busca explorar a compreensão das pessoas a respeito de
sua vida diária, ou seja, dar sentido ou interpretar fenômenos em termos das
significações que as pessoas trazem para elas (VIEIRA, 2008).
Há uma variedade de técnicas, caracterizações e desenhos segundo
Caregnato (2002), que possibilitam desvendar e discutir os problemas vivenciados e
sua prática. Neste estudo optamos por trabalhar com a técnica do “Estudo de Caso”,
pois segundo Minayo (2006), esse é um meio de se organizar dados de modo a
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preservar características individuais, permitindo também reunir informações em um
determinado campo, gerando conhecimento sobre características significativas de
eventos vivenciados, intervenções e processos de mudança. A mesma autora coloca
que este é o método indicado para responder ao “como” e ao “porque” determinado
fenômeno se apresenta. Eles exploram o contexto em que uma ação ocorreu ou
ocorre, as maneiras de interpretá-la com o objetivo de compreender os esquemas de
referência e as estruturas de relevância relacionadas a algumas situações por parte
de um grupo específico. Possibilita ainda apresentar modelos de análise replicáveis
em situações semelhantes.
De acordo com Kimura e Merighi (2003), o estudo de caso pretende relatar
uma configuração que, embora particular, funcione apenas como ponto de partida
para uma análise que busque o fortalecimento das relações sociais e que tem como
base o conhecimento que se inicia pela compreensão dos eventos particulares. A
autora coloca que, no estudo de caso, empregam-se vários métodos, incluindo a
entrevista, a observação participante e os estudos de campo. Acrescenta ainda que
para proceder a sua análise o pesquisador deve (p.18):
- depender de todas as evidencias relevantes;
- incluir todas as formas possíveis de interpretação;
- voltar-se para os aspectos mais relevantes do estudo de caso; e
- utilizar a habilidade e o conhecimento para promover a análise,
priorizando os pontos a serem explorados.
4.2 Local de Estudo
O campo de pesquisa é considerado um recorte espacial feito pelo
pesquisador para representar a realidade que deseja estudar. A escolha do campo é
considerada como uma etapa essencial da pesquisa qualitativa, uma vez que os
pesquisadores selecionam os fatos a serem observados e o local em que serão
coletados (MINAYO, 2006).
Diante disso, foi eleito como campo de estudo o CC de um Hospital Geral
Privado da região oeste da cidade de São Paulo inaugurado em 1960. Trata-se do
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Hospital e Maternidade São Camilo unidade Pompéia, campo de estágio de alunos
de graduação em enfermagem do Centro Universitário São Camilo. O hospital
referido e a Instituição de Ensino Superior fazem parte de uma organização que
compartilha valores semelhantes apoiando-se na bioética, saúde e cidadania. Desta
forma a escolha do campo e dos sujeitos se justificou presumindo ser o ambiente do
CC e os profissionais que lá atuam adequados para a realização esta pesquisa.
4.3 Sujeitos da Pesquisa
De acordo com Deslandes e Gomes (2009), a seleção dos sujeitos deve ser
aquela que possibilita abranger o problema da pesquisa nas suas diferentes formas
de representação e também deve ser capaz de responder a uma determinada
pergunta. Neste estudo de caso, a indagação foi formulada da seguinte maneira:
Quem são os indivíduos que se relacionam e interagem dentro do CC capazes de
fornecer opiniões, dados, valores e vivências para serem analisadas?
Esta resposta foi identificada nos artigos escritos por Barreto e Barros (2009),
Peniche e Araujo (2009) e Silva e Galvão (2007) quando discorrem que o CC é
formado por uma equipe multiprofissional que desenvolve no seu cotidiano ações
dependentes e interdependentes integradas num mesmo ambiente, compartilhando
responsabilidades.
Levando-se em consideração o grande número de profissionais de distintas
áreas e especialidades que atuam no CC, optamos neste estudo por entrevistar os
anestesiologistas, cirurgiões, enfermeiros e técnicos de enfermagem considerados
representantes da equipe de CC. Outro motivo que levou-nos a essa escolha foi o
fato de que são eles que atuam com um único objetivo, no mesmo espaço, no
mesmo tempo e com o mesmo paciente, de forma rotineira. Portanto, tais
profissionais são aqueles considerados “informantes chaves.” (GIL, 2009).
Na pesquisa qualitativa não se pode quantificar previamente o número de
sujeitos de pesquisa, tendo em vista que o estudo se propõe a analisar as
representações, conhecimentos, atitudes e comportamentos. De acordo com
Deslandes e Gomes (2009), o número de sujeitos deve ser definido por “inclusão
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progressiva”, ou seja, os sujeitos vão sendo incluídos durante a fase das entrevistas
e à medida que se observa, a partir das respostas, uma regularidade, uma repetição
das explicações e dos sentidos das respostas, interrompe-se seguindo o critério de
saturação dos dados.
Em outras palavras Minayo (2006), coloca que o dimensionamento da
amostra em pesquisa qualitativa obedece ao “critério de saturação dos dados”, que
se entende como o conhecimento formado pelo pesquisador, no campo, do que
conseguiu compreender a lógica interna do grupo. A relevância, portanto, está no
empenho de enxergar a questão sob várias perspectivas e pontos de vista.
Uma vez definidas as quatro categorias profissionais, as entrevistas foram
realizadas e à medida que se observou a saturação dos dados, a amostragem
daquela categoria profissional foi interrompida.
.
4.4 Coleta de Dados
O estudo de caso segundo Gil (2009) necessita de várias fontes de evidência
para se investigar e analisar o caso como um todo. Necessita, também, de múltiplas
técnicas de coleta de dados para que se possa garantir:
[...] a profundidade necessária ao estudo e a inserção do caso em
seu contexto, ...conferir maior credibilidade aos resultados. Com a
existência de dados obtidos mediante procedimentos diversos é que
se torna possível a triangulação, que constitui um dos procedimentos
mais indicados para obter a corroboração do fato ou do fenômeno.
(GIL, 2009, p.55).
Procuramos como pesquisadora atentar também para as indicações de
Minayo (2006, 2009) quando coloca que no que tange à pesquisa qualitativa, a
interação entre o pesquisador e o sujeito pesquisado é essencial. Dessa maneira,
todo pesquisador precisa ser um curioso, um perguntador. Deve ser atento e
observador para captar nas respostas dos sujeitos significados que vão além da
palavra escrita. Deve saber ouvir, ser flexível, porém, sem perder o foco da
entrevista. Cabe ao pesquisador, ainda, saber também escolher o local do estudo,
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selecionar a amostra, fazer os contatos, elaborar e realizar entrevistas e analisar os
dados coletados.
Os instrumentos definidos para a coleta de dados deste estudo foram
entrevistas semi-estruturadas e com perguntas abertas, observação e análise
documental e científica (GIL, 2009).
Importante destacar que a consulta documental é imprescindível para o
pesquisador obter informações referentes à estrutura, organização, descrição de
cargos e funções (GIL, 2009).
O “Regimento Interno do Departamento Cirúrgico” (ANEXO A), fornecido pela
enfermeira chefe do CC, O Folheto do Serviço de Anestesia (ANEXO B), fornecido
pelo chefe da anestesia, bem como os sites da Sociedade Beneficente São Camilo,
do Hospital e Maternidade São Camilo e da União Social Camiliana serviram como
base documental analisada nesta pesquisa.
Considera-se
que
em
entrevistas
abertas
e
semi-estruturadas
os
entrevistados apresentem uma fala relativamente espontânea, na qual a
subjetividade está muito presente. Ao discursar através do “eu” o entrevistado coloca
os seus próprios sistemas de pensamento, aflora o seu inconsciente, seus valores,
suas emoções e mesmo ao falar de outra pessoa ou de uma situação utiliza seus
próprios meios de expressão para descrever sua opinião, dando uma singularidade
individual à entrevista. Ao mesmo tempo, observa-se que as falas dos entrevistados
podem ser contraditórias, entrecortadas, desviadas do assunto, inseguras, com
clarezas enganadoras, atalhos, e recuos, o que demonstra “delicadeza” com que se
devem ser analisados esses discursos (BARDIN, 2008).
O roteiro da entrevista foi elaborado em duas partes: uma relativa aos dados
de identificação o outra com questões abertas (APÊNDICE B).
As entrevistas foram gravadas, conforme a recomendação de Gil (2009), que
considera este procedimento importante para que não se perca nenhum dado da
entrevista e para que o pesquisador possa observar nos gestos, nas pausas, na
comunicação não verbal, características individuais que não seriam conseguidas
através da tomada de notas.
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O projeto foi aprovado pela instituição em que se daria o local do estudo e
pelo CoEP – Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário São Camilo em
outubro de 2009. A prova de qualificação da pesquisa foi marcada e realizada em
novembro de 2009. Em dezembro de 2010, alguns ajustes sugeridos na qualificação
foram realizados.
Houve um contato telefônico, em janeiro de 2010, com a chefia de
enfermagem do CC que já havia sido previamente informada da intenção do projeto.
Deste contato, firmou-se uma visita pessoal que aconteceu no mês seguinte, no
sentido de conhecer o local de estudo e a melhor forma de contato com os sujeitos
da pesquisa.
Na data marcada, reconheci o CC na companhia da enfermeira chefe, para
quem o projeto foi apresentado. Em seguida apresentou-se o projeto para o
anestesiologista chefe do CC. Foram-lhes apresentados o objetivo, a metodologia e
o parecer do CoEP aprovando a pesquisa. Ambos se mostraram empenhados e
interessados no tema. Cada um na sua área forneceu-me dados necessários para a
caracterização mais detalhada do local e dos sujeitos da pesquisa.
Em comum acordo com as chefias de enfermagem e anestesiologistas, optouse por realizar as entrevistas dentro do CC durante o período de trabalho. Tal opção
foi motivada por dois motivos: 1) considerar que seria desconfortável aos
profissionais se ausentarem do seu local de trabalho devido ao acesso restrito do
CC, o que demandaria troca da roupa privativa; e 2) considerar a dinâmica do setor,
onde os profissionais das diversas categorias seguem um agendamento cirúrgico
com horários previamente estabelecidos. Desta forma, nos intervalos entre um
procedimento e outro os profissionais que se encontravam disponíveis eram
identificados e convidados a participar da pesquisa. A amostra deu-se por
conveniência, conforme descrevo a seguir.
Foi realizado um total de 27 entrevistas. Como dependia-se da disponibilidade
da equipe, as entrevistas foram finalizadas após oito visitas ao CC. No dia 09/03
foram entrevistados dois enfermeiros e um técnico de enfermagem; dia 11/03, mais
três enfermeiros e dois técnicos de enfermagem. Com uma amostra de cinco
enfermeiros as gravações foram ouvidas e transcritas identificando-se a regularidade
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e repetição das explicações, sem que nenhum dado novo fosse relatado. Dia 15/03
foram entrevistados quatro anestesiologistas. Dia 16/03 mais dois anestesiologistas
disponíveis foram entrevistados e um enfermeiro. Apesar do número da amostra dos
enfermeiros já ter sido considerada saturada, optou-se por entrevistar também este
enfermeiro por respeito à sua disponibilidade e por ser ele parte integrante dos seis
enfermeiros que atuam no CC durante o dia. Com seis anestesiologistas
entrevistados, realizei a escuta das entrevistas e da mesma forma que observei nos
enfermeiros, defini a amostragem com seis anestesiologistas suficientes e
satisfatórias. Dia 21/03 realizei entrevista com mais dois técnicos de enfermagem
que se encontravam disponíveis. A amostragem com os cinco técnicos de
enfermagem não me permitiu, através da escuta das entrevistas, observar respostas
regulares. Dia 22/03 foi entrevistado um cirurgião e mais dois técnicos de
enfermagem, que se encontravam disponíveis na ocasião. Com sete técnicos
entrevistados obteve-se o critério de saturação dos dados, fechando assim a
amostra do grupo de técnicos de enfermagem. Com apenas um cirurgião
entrevistado dia 23/3 foi realizada mais uma visita ao CC. Nesta data mais dois
cirurgiões foram entrevistados e me foram encaminhados mais dois técnicos de
enfermagem. Assim, também em respeito à disponibilidade dos profissionais, optei
por realizar as entrevistas e incluí-las nas análises, uma vez que os dados obtidos
vieram a reforçar os dados relatados dos outros entrevistados.
Considerando a proporcionalidade final dessa amostragem optamos por
entrevistar mais alguns cirurgiões a fim de garantir a equidade da participação das
diferentes categorias profissionais, embora não fosse intenção desta pesquisa
analisar separadamente as diferentes categorias. Realizei mais uma visita ao CC
que aconteceu dia 21/05 quando foram entrevistados mais três cirurgiões
disponíveis na ocasião.
O número dos sujeitos foi então fechado e definido através do critério de
saturação dos dados, ficando da seguinte maneira: seis enfermeiros denominados
aqui através da nomenclatura: E1, E2, E3, E4, E5, E6; nove Técnicos de
Enfermagem, denominados: T1, T2, T3, T4, T5, T6, T7, T8, T9; seis
Anestesiologistas, denominados: A1, A2, A3, A4, A5, A6, e seis Cirurgiões: C1, C2,
C3, C4, C5, C6.
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As entrevistas foram realizadas na sala da chefia de enfermagem do CC
cedida temporariamente para este fim.
Após as apresentações nominais, realizava um breve histórico profissional
informando aos entrevistados que o tema da pesquisa era “ O Relacionamento
Interpessoal da Equipe do Centro Cirúrgico – Uma Reflexão a Luz da Bioética” que
estava sendo
desenvolvida por mim, enfermeira e mestranda Maristella Lopes
Gianini, sob a orientação da Profª Drª Luciane Lucio Pereira e co-orientação do Prof.
Dr. Pe. Marcio Fabri dos Anjos. Apresentei-lhes os objetivos do estudo, esclareci
quanto a metodologia a ser seguida, garantindo-lhe a privacidade das informações e
a preservação do anonimato de cada um. Informava também que poderia ser
fornecidos esclarecimentos sobre o estudo, bem como a retirada de seu
consentimento a qualquer momento, sem que isto o levasse a qualquer penalidade.
Deixava meu contato telefônico e email bem como o contato telefônico do
Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário São Camilo caso houvesse
qualquer problema.
O aceite do entrevistado ficou registrado com a sua assinatura no TCLE
(Apêndice A) em duas vias, sendo que uma ficou em seu poder e outra em poder do
entrevistador.
Em seguida, iniciou-se a entrevista propriamente dita seguindo o roteiro préestabelecido (Apêndice B). Neste momento, recolher os dados de identificação dos
sujeitos me auxiliaram para que eu pudesse iniciar um relacionamento interpessoal,
deixando entrevistados e entrevistador mais à vontade.
Ao término de cada entrevista, os sujeitos foram questionados se gostariam
de ter contato com a transcrição das mesmas antes da análise. Nenhum solicitou,
mas muitos demonstraram interesse no resultado final da pesquisa.
Maristella Lopes Gianini
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4.5 Análise dos Resultados
Após cada entrevista ser realizada, ela foi ouvida e transcrita. A releitura
completa e atenta de todas elas foi realizada continuamente para que eu pudesse
familiarizar-me com as respostas e obter uma visão geral do material (GIL, 2009).
As categorias de analise foram predeterminadas a partir do roteiro de
perguntas.
Segundo Minayo (2009) a palavra categoria refere-se em geral a um
conceito que abrange elementos ou aspectos com características comuns ou que se
relacionam entre si. No caso do presente estudo a utilização de uma categoria
predeterminada foi utilizada com a idéia de estabelecer classificações, permitindo-se
agrupar elementos, idéias ou expressões em torno de um conceito.
Muito embora os resultados permitissem usar um roteiro preestabelecido,
trabalhando com categorias predeterminadas, busquei a validação dessas
categorias considerando os critérios de análise de conteúdo de Bardin (2008), que
indica que as categorias devem ser excludentes. Ferreira (2000) corrobora com esta
idéia afirmando que, na construção das categorias, os discursos são classificados
em uma única categoria ou subcategoria, respeitando a regra de exclusividade, em
que um elemento não pode ser classificado em mais de uma categoria.
No processo de análise dos dados dos estudos de caso, Gil (2009) aponta
que não há uma seqüência a ser seguida para se interpretar os dados. Porém, é
necessário que na análise das entrevistas o pesquisador consiga suprimir trechos
menos relevantes e com significados iguais; explicar trechos contraditórios ou que
revelaram mais de um sentido; além disso, deve estruturar formalmente o material
de modo que se estabeleça relações com o objetivo da pesquisa.
Sendo assim foram definidas seis categorias identificadas a partir das
perguntas da entrevista como mostram as figuras abaixo:
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
Pergunta 1
Pra você quem é a
equipe do CC
48
Categoria
Composição da equipe do Centro Cirúrgico
Figura 1 – Origem da Categoria Predeterminada – Composição da Equipe do Centro
Cirúrgico
Pergunta 2
Como você percebe o
relacionamento
interpessoal da equipe
multiprofissional que atua
no CC, quais os fatores
condicionantes (restritivos
e promotores)?
Categoria
Percepção do Relacionamento Interpessoal da equipe
multiprofissional do Centro Cirúrgico
Figura 2 – Origem da Categoria Predeterminada – Percepção do Relacionamento
Interpessoal da Equipe Multiprofissional do Centro Cirúrgico
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
Pergunta 3
Em sua opinião qual o
papel do enfermeiro
nesta equipe?
49
Categoria
Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico
Figura 3 – Origem da Categoria Predeterminada – Papel do Enfermeiro na Equipe do
Centro Cirúrgico
Pergunta 4
Você identifica
situações de conflito
ético no trabalho desta
equipe?
Categoria
Conflito ético em Centro Cirúrgico
Figura 4 – Origem da Categoria Predeterminada – Conflito Ético em Centro Cirúrgico
Pergunta 5
Em sua opinião como
você percebe a atuação
do enfermeiro diante
destas situações?
Categoria
Atuação do enfermeiro frente ao conflito ético em Centro Cirúrgico
Figura 5 – Origem da Categoria Predeterminada - Atuação do Enfermeiro Frente ao
Conflito Ético em Centro Cirúrgico
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
Pergunta 6
6. Como você
identifica a autonomia
do enfermeiro?
50
Categoria
Autonomia Profissional do enfermeiro do Centro Cirúrgico
Figura 6 – Origem da Categoria Predeterminada – Autonomia Profissional do
Enfermeiro do Centro Cirúrgico
Em seguida, dando continuidade à releitura das entrevistas foi possível
realizar o que Gil (2009) chama de codificação axial. Esta codificação permitiu
relacionar as categorias às suas subcategorias, cujo propósito foi o de relacionar e
reorganizar os dados de maneira que se pudesse identificar a idéia central e seus
desdobramentos. Nesta fase, também foi possível confirmar mais uma vez, por meio
das repetições das falas e seus significados, a saturação dos dados.
As codificações foram realizadas manualmente identificadas com cores
diferentes. A partir da primeira codificação, quem utilizou cores respectivas, foi se
extraindo através de corte e colagem dados significativos das respostas de todos os
entrevistados. Estas foram sendo agrupadas em suas respectivas categorias. Ao
utilizar-se sempre da releitura como forma de familiarização do conteúdo e
identificação da profundidade das respostas, as subcategorias foram sendo
identificadas.
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
51
5 APRESENTAÇÃO DOS DADOS
5.1 Caracterização do Local do Estudo
5.1.1 Caracterização da Instituição
O Hospital e Maternidade São Camilo Pompéia (HMSCP) é um dos 27
hospitais que são mantidos pela da Sociedade Beneficente São Camilo (SBSC),
juntamente com quatro clínicas e um plano de saúde, todos distribuídos por todo o
território nacional. A história deste hospital teve início em 1923 quando o Pe.
Inocente Radrizzani, criou um serviço assistencial gratuito para as pessoas menos
favorecidas do bairro de Vila Pompéia, na cidade de São Paulo.
Em 1932, construiu a Policlínica São Camilo com auxílio de donativos de
pessoas físicas e jurídicas. Em 23 de janeiro de 1960, a Policlínica deu lugar ao
Hospital e Maternidade São Camilo Pompéia. Hoje ele é um hospital geral,
filantrópico e de iniciativa privada que realiza desde partos até transplantes. Oferece
um atendimento de qualidade em todas as especialidades médicas, tendo um
completo centro de diagnóstico. A Unidade Pompéia é Acreditada com Excelência,
selo concedido pela ONA (Organização Nacional de Acreditação) e reconhecido pelo
Ministério da Saúde, mediante avaliação do Instituto Qualisa de Gestão (IQG). A
missão e valores do hospital são:
Proporcionar serviços na área da saúde, superando a expectativa
dos clientes, alicerçados na competência, tecnologia, humanização e
valorização da vida.
Através de valores éticos morais e culturais; espiritualidade;
comprometimento profissional e social; princípios éticos nas ações;
desenvolvimento profissional; valorização da vida e da saúde;
qualidade e humanização no atendimento; integração institucional;
gestão auto-sustentável. (PROVÍNCIA CAMILIANA BRASILEIRA,
2005).
Atualmente, conta com 308 leitos de internação sendo que 257 leitos estão
ativos. Os 51 leitos restantes são considerados extras, por conta de reformas que
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
52
estão sendo realizadas. Estes leitos são divididos em: 29 leitos de Maternidade; 20
leitos de Pediatria; 9 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal; 13 leitos
de UTI Pediátrica; 2 leitos de Berçário Patológico; 9 leitos de Transplante de Medula
Óssea (TMO); 11 leitos de Clínica Médica; 31 leitos de UTI Adulto; 131 leitos de
Clínica Médico-cirúrgica divididos em 7 andares” (1 comunicação pessoal).
O hospital segue os preceitos que regem a “Carta de Princípios das Entidades
Camilianas” (UNIÃO SOCIAL CAMILIANA, 2002) ANEXO A. Estes princípios são
alicerçados por valores éticos e cristãos cuja valorização da pessoa humana está
pautada na sua dignidade, no respeito e na valorização da vida e saúde.
5.1.2 Caracterização do Centro Cirúrgico
O Centro Cirúrgico está situado no sétimo andar do Bloco I e II. Neste mesmo
pavimento encontra-se a Central de Material e Esterilização e a Recuperação PósAnestésica.
De acordo com a ideologia camiliana:
“O CC oferece um atendimento humanizado e a preocupação com o conforto
e comodidade do médico e do paciente são dois aspectos sempre presentes.”
(HOSPITAL E MATERNIDADE SÃO CAMILO, 2008).
O CC conta com 13 salas de cirurgia e 11 leitos de Recuperação Anestésica
totalmente equipada com aparelhos de alta tecnologia. Atende a cirurgias eletivas,
de urgência e emergência, de pequeno, médio e grande porte bem como cirurgias
especiais, nas diversas especialidades cirúrgicas, inclusive transplantes. As cirurgias
eletivas são pré-agendadas na Central de Pré-agendamento Cirúrgico que funciona
nas dependências do dentro do CC de 2ª feira à 6ª feira das 7 às 19hs. A agenda é
aberta, não há limitação de dia e horário para a realização das cirurgias eletivas,
porém há um pré-agendamento da cirurgia onde o pedido de equipamentos e
material especial deve seguir rotina específica. A descrição detalhada do material,
suas quantidades e o fornecedor devem ser encaminhados por email ou via fax. As
cirurgias de urgência devem ser agendadas no próprio centro cirúrgico pelo cirurgião
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
53
ou outro membro da equipe de cirurgia. A média mensal de pacientes operados gira
em torno de 828, porém as cirurgias realizadas mensalmente são de 1024, uma vez
que é possível realizar mais de um procedimento cirúrgico num mesmo paciente.
Desta forma, 34 é a média de cirurgias realizadas diariamente. (FARAH, 2010).
5.1.3 Caracterização dos Sujeitos da Pesquisa
Ainda
que
os
sujeitos
desta
pesquisa
tenham
diferentes
vínculos
institucionais, consideram-se parte do “Time Camiliano”, de modo que:
[...] o time Camiliano trabalha comprometido com a responsabilidade
pela manutenção do constante pensamento cultural da missão, visão
e valores da instituição, alinhados à gestão estratégica pela
qualidade, por meio de ações e programas que atingem a todas as
categorias profissionais. Isso assegura o alinhamento dos processos
de trabalho com os objetivos globais da instituição. (HOSPITAL E
MATERNIDADE SÃO CAMILO, 2008).
Os médicos do CC são definidos neste estudo como anestesiologistas e
cirurgiões.
Para que um cirurgião possa utilizar o Hospital ele deve ser cadastrado na
instituição através da Diretoria médica e seguir as rotinas existentes. Os cirurgiões
cadastrados, alguns deles, fazem parte do corpo clínico do hospital, onde prestam
serviços nas diversas unidades (Unidade de internação, CC, CME, RPA e UTIs).
Outros ainda são apenas credenciados para utilizar os serviços oferecidos e adequar
às necessidades de seus pacientes que, no caso em questão, são as necessidades
cirúrgicas (FARAH, 2010).
Os anestesiologistas estão vinculados a uma empresa particular denominada
Instituto Paulista de Assistência Respiratória (I.P.A.R.). Esta empresa é formada por
cinco sócios, trinta e dois anestesiologistas, uma secretária e dois auxiliares
administrativos, os quais prestam serviços para o HMSCP nas unidades de CC, CO,
Hemodinâmica, Raio X, Tomografia e Unidade de Ressonância Magnética. A chefia
médica, ou seja, o anestesista chefe, o pessoal administrativo e os anestesiologistas
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
54
estão locados nas dependências do CC. Por meio de uma escala predefinida
rodiziam-se para atender atividades relacionadas ao procedimento anestésico. O
número de anestesiologistas varia conforme o pré-agendamento cirúrgico.
Basicamente, é escalado um anestesiologista por cirurgião para as cirurgias eletivas
e mais dois para as cirurgias de urgência e emergência. Desta forma, a média diária
de anestesiologista durante o dia é de 12 a 14 profissionais. Ultimamente, criou-se
um plantão estendido até às 22 horas, conforme a necessidade da agenda cirúrgica.
Aos sábados, este número varia entre 8 e 9 profissionais. À noite e aos domingos há
2 anestesiologistas fixos com cobertura por radio à distância conforme informado
pelo chefe da anestesiologia (NIGRO, 2010).
Aos clientes é oferecido um folder explicativo (ANEXO B) a respeito da
anestesia e do Serviço de Anestesia do Hospital e Maternidade São Camilo
Pompéia. Nele é informado que a anestesia é aplicada por médicos especialistas em
anestesiologia, capacitados não somente para aplicar a anestesia, mas também
para oferecer ao cliente segurança, sem sofrimento e tranqüilidade para o cirurgião
realizar o trabalho dele (NIGRO, 2010).
Quanto à enfermagem, ela está vinculada diretamente ao quadro de
funcionários do hospital denominados colaboradores. Há uma enfermeira chefe
responsável pelo CC a qual, por seu caráter administrativo, cumpre 40 horas
semanais de 2ª a 6ª feira, sendo que o restante da equipe de enfermagem obedece
a um regime de trabalho de 36 horas semanais, 6 horas diárias, de 2ª feira a
domingo com uma folga semanal. O período de 6 horas obedece aos seguintes
horários: Manhã: das 7hs às 13hs; Tarde: das 13hs às 19hs e Noturno das 19hs às
7hs (FARAH, 2010).
Há oito enfermeiras distribuídas da seguinte maneira: duas no período da
manhã; duas no período da tarde; uma em cada noturno (par e impar); uma
denominada ferista, que cobre as férias, e que quando não está nesta cobertura
cumpre o horário das 18 às 24 h; e uma folguista que também quando não está
nesta cobertura cumpre o horário das 9 às 15hs. As atividades diárias das
enfermeiras que se auto-denominam “assistenciais” são exercidas em todo o CC, ou
seja: prestam assistência de enfermagem nos pacientes pós-operados; na
Maristella Lopes Gianini
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CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
55
Recuperação Anestésica; organizam a dinâmica diária do CC com todos os
profissionais envolvidos; materiais e equipamentos; definindo horários, salas, equipe
de enfermagem;
cumprem e fazem cumprir toda documentação e
burocracia
exigida para a realização da cirurgia; atendem e assistem ao paciente e à equipe de
cirurgia dentro da SO (FARAH, 2010).
Há 29 técnicos de enfermagem distribuídos da seguinte maneira: 16 no
período da manhã; 15 no período da tarde; 3 em cada noturno (par e impar); 1
cumpre o horário das 18 às 24hs e 1 das 17 às 23hs. Os técnicos atuam nas salas
de cirurgia, sendo denominados circulantes de sala, e na Recuperação Anestésica.
Diretamente ligada à equipe de enfermagem propriamente dita há
quatro auxiliares de enfermagem que atuam como agentes de transporte. Eles
cumprem uma jornada de 8 horas diárias de trabalho de 2ª a sábado com horários
de entrada predefinidos: 6hs; 7hs; 10hs e 12hs (FARAH, 2010).
Subordinadas à chefia de enfermagem do CC há duas escriturárias; 1 auxiliar
de escritório e 2 auxiliares de guia responsáveis pela marcação das cirurgias, ou
seja, pelo pré agendamento cirúrgico (FARAH, 2010).
As atribuições dos colaboradores estão de forma mais detalhada no capítulo
V, Art. 10, 11, 12, 13, 14 e 15 do “Regimento Interno do Departamento Cirúrgico do
Hospital e Maternidade São Camilo unidade Pompéia”. (ANEXO C).
5.2 Apresentação das Categorias e Subcategorias
De
acordo
com
o
referencial
metodológico
as
categorias
foram
predeterminadas e as subcategorias emergiram através da relevância e da repetição
das idéias.
De maneira geral os dados foram observados no contexto de todas as
categorias profissionais, porém naquela em que o dado se mostrou muito relevante a
uma determinada categoria, este foi apontado.
As categorias predeterminadas e suas subcategorias foram:
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CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
56
Categoria 1: Composição da equipe do Centro Cirúrgico;
Categoria 2: Percepção do Relacionamento Interpessoal da Equipe
Multiprofissional do Centro Cirúrgico, constituída pelas
subcategorias: Fatores Promotores do Relacionamento
Interpessoal no Centro Cirúrgico e Fatores Restritivos do
Relacionamento Interpessoal no Centro Cirúrgico;
Categoria 3:
Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico, constituída
pelas subcategorias: Papel de Liderança e Papel Assistencial;
Categoria 4:
Conflito Ético em Centro Cirúrgico, constituída pelas
subcategorias: Conflito Ético Reconhecido e Conflito Ético
Justificado;
Categoria 5:
Atuação do Enfermeiro Frente ao Conflito Ético, em Cento
Cirúrgico, constituída pelas subcategorias: Posicionamento do
enfermeiro; Enfermeiro como agente mediador e Enfermeiro
como agente causador do conflito; e
Categoria 6:
Autonomia Profissional do Enfermeiro de Centro Cirúrgico
constituída pelas subcategorias: Autonomia exercida pelo
enfermeiro; Autonomia não exercida pelo enfermeiro e
Autonomia Limitada do enfermeiro.
5.2.1 Categoria 1: Composição da Equipe do Centro Cirúrgico
Quanto à primeira categoria: “Composição da Equipe do Centro Cirúrgico”
as respostas obtidas foram semelhantes. Os relatos de formação da equipe do CC
foram observados através de respostas utilizando formas de expressão iguais ou
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
57
similares como: todo mundo, todos nós, equipe multiprofissional, multidisciplinar,
geral, um time grande.
Porém, vale ressaltar que a partir da primeira indagação observou-se uma
surpresa dos entrevistados em relação à pergunta e também às que vieram na
seqüência. A partir do primeiro questionamento, que era a composição da equipe, a
repetição da pergunta, de certa forma mostrou a convicção da resposta.
“Quem é a equipe? Todos nós!” A6
“Quem é a equipe? Todo mundo... “ E5
“Quem é a equipe do CC? Eh... É uma equipe multidisciplinar...” T4
A composição da equipe na fala dos sujeitos fica clara quando se identifica o
CC como um ambiente onde a dependência do trabalho de um, interfere no
desempenho profissional do outro. Desta forma a composição da equipe também se
definiu através da consideração de que o trabalho individual de cada um reflete no
trabalho do outro e no objetivo final. Isto pode ser observado nas seguintes falas:
“São todos na verdade, equipe é equipe... O CC é um dos poucos
lugares que depende de todos. Quando um falha pára tudo. ....
atuação de cada um deles influi no resultado final” C4
“...qualquer pessoa que sair da... da linha, me atrapalha, então pra mim é
todo mundo.” A6
Ainda com relação à equipe, à sua interdependência, houve citação direta
quanto à composição segundo as funções e atribuições que cada profissional
exerce, reforçando, assim, a idéia de equipe multiprofissional. As funções citadas
foram:
ascensorista;
maqueiro;
enfermeiro;
enfermeiro
chefe;
técnico
de
enfermagem; circulantes de sala; anestesista; cirurgião; instrumentador cirúrgico;
pessoal da farmácia; da rouparia; da limpeza; da manutenção; da alimentação; da
central de materiais; pessoal que vem de fora:
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
58
“atuação de cada um deles influi no resultado final:.. o maqueiro, pra pegar
o paciente, o ascensorista pra trazer o maqueiro com o paciente a
enfermeira pra organizar as vindas, a circulante de sala pra... recepcionar
e deixar isso pronto, o anestesista, o paciente e eu... e minha
instrumentadora” .C4
“médico cirurgião, que vem com a paciente pra operar, o paciente, e aí os
demais, a enfermeira...chefe, a enfermeira coordenadora, os técnicos,
anestesistas, se tiver, o auxiliar do anestesista, instrumentadora, os
colaboradores também da farmácia, equipe de limpeza, todo mundo que
está envolvido”.T7
“englobando todos... e... a parte de suporte todo... desde da, da, do
pessoal da faxina, do pessoal da alimentação acho que isso forma... um
CC funcionando”. A2
“Aqui a equipe do CC não é só a equipe de enfermagem... mas sim ah...
multiprofissional. Seria a equipe anestésica,
farmácia,
central de
materiais, o ah... pessoal da higiene também né?” E2
“Claro que tem a equipe que eu chamo de equipe fixa, que é aquela
equipe que tá éh... são os profissionais que estão todos os dias com a
gente, e o pessoal que vem de fora que agrega ao trabalho ao nosso
trabalho. Né?” E3
5.2.2 Categoria 2: Percepção do Relacionamento Interpessoal da Equipe
Multiprofissional do Centro Cirúrgico
Com
relação
à
segunda
categoria
“Percepção
do
Relacionamento
Interpessoal da equipe multiprofissional do Centro Cirúrgico” foram observadas
respostas que levaram a identificar duas subcategorias: Fatores Promotores do
Relacionamento Interpessoal no CC; Fatores Restritivos do Relacionamento
Interpessoal no CC.
Quando os sujeitos discorrem sobre como percebem os relacionamentos
interpessoais no CC, eles apontam a realidade de interdependência que vivenciam
exemplificando-a com fatores promotores, e restritivos.
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
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Fatores Promotores do
Relacionamento
Interpessoal no Centro
Cirúrgico
Percepção do
Relacionamento
Interpessoal no
Centro Cirúrgico
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Fatores Restritivos
do Relacionamento
Interpessoal no
Centro Cirúrgico
Figura 7 - Categoria 2: Percepção do Relacionamento Interpessoal da Equipe
Multiprofissional do Centro Cirúrgico. Subcategorias: Fatores Promotores do
Relacionamento Interpessoal no Centro Cirúrgico; Fatores Restritivos do
Relacionamento Interpessoal no Centro Cirúrgico.
Subcategoria: Fatores Promotores do Relacionamento Interpessoal no
Centro Cirúrgico
Os sujeitos se referem aos relacionamentos interpessoais no CC de forma
cuidadosa. As pausas, as falas entrecortadas entre uma consideração e outra
evidenciaram que houve um processo de elaboração da resposta. Algumas falas
relatam que no local do estudo o relacionamento é bom, discorrem sobre fatores que
o promovem e incluem nestes fatores as suas percepções de como as relações
poderiam ser melhoradas.
As falas dos sujeitos também demonstraram que um CC organizado, onde há
uma preocupação com a qualidade da assistência e as tarefas são definidas, o
relacionamento tende a ser bom, bem como a capacidade e a necessidade de um
entender e respeitar o trabalho do outro. Quando se conhece a rotina do local a
função que cada um desempenha e a idéia de que juntos formam uma equipe
multiprofissional interdependente e com o mesmo objetivo, as relações fluem de tal
forma que tornam o ambiente harmonioso.
“...Eu acho que o entrosamento entre as pessoas da casa é muito
bom”.A6
Maristella Lopes Gianini
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“em algumas instituições, incluindo aqui, ele é harmônico, em geral, né, as
pessoas têm éh... idéia... das suas funções, tem... clareza do que, do que
deve ser feito, se empenham”.C1
“Eu acho que na realidade.é... como eu falei, éh... além de você... ter o
interesse de se comunicar com a pessoa, né, de de,... é uma divisão de
tarefas, eu acho que você tem que saber mais ou menos as tarefas de
cada um pra... ter um... uma equipe organizada no CC... ... e saber que
cada um tem o seu papel, a sua função, independentemente do que, do
que ela se formou, do que ela fez “.A5
“...você tem que saber também da forma certa de fazer, né, que cada...
cada um tem o seu, o seu é... vamos dizer assim, o seu pedacinho ali...
então cada um tem que saber o que ta fazendo”.T6
“você tem que ter basicamente, respeito entre as,... entre as diferentes,...
entre os diferentes profissionais, eles tem que,
atuar como uma
engrenagem”. C1
No hospital do estudo foi colocado que existem reuniões científicas
multiprofissionais,
protocolos
assistenciais
e
organizacionais
consideradas
ferramentas que contribuem com a organização do serviço e que influem
diretamente na busca contínua em melhorar a qualidade de assistência prestada
trazendo união para a equipe.
“a questão de você conseguir atingir certos objetivos, com os estudos
feitos
por
esses
grupos
né...
..e
uniu
ainda
mais
a
equipe
multiprofissional... eu sinto assim...”E3
“muitas dessas reuniões, mudaram a minha maneira de... orientar.
Conduzir isso, conduzir certos, certos assuntos [...] os profissionais de
enfermagem na sala são... bastante desenvoltos e bastante autônomos...
além do que eles contam com um mecanismo que é, um acesso que eles
tem ao centro de gerenciamento de casos quando eles vêem que tem
alguma coisa errada, eles comentam com a chefe deles e se eles quiserem
eles próprios fazem uma notificação de gerenciamento de caso”. A1
Maristella Lopes Gianini
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61
“Pra mim o que promove é a partir da criação de alguns protocolos né?
porque na criação de protocolos tem um consenso com as lideranças
então eles se sentem inseridos e estão cientes do que tem que
acontecer”.E2
“tem que fazer toda uma checagem, rechecagem e um provisionamento
antes... prever que tudo esteja ali no momento pelo menos o que ele
pediu... mas não depende só do enfermeiro porque quem... lembrando que
quem parte o processo é a equipe cirúrgica... é ele que vai dizer o que ele
vai fazer com o paciente... qual que é o procedimento e qual que é o
equipamento e material que ele vai precisar na sala... na hora, de acordo
com a técnica que ele vai utilizar... O enfermeiro vai fazer... o enfermeiro
mesmo, ele vai fazer... de ter tudo ali na hora que ele solicitou... com o que
ele solicitou”.E1
Ter um canal de comunicação aberto entre todos os profissionais da
enfermagem inclusive com a chefia de enfermagem, onde haja troca, respeito,
orientações igualitárias também foram fatores citados como promotores de um bom
relacionamento.
“... acho que essa liberdade que eles tem de estar trazendo pra gente os
problemas e a gente solucionando esses problemas, eu acho que, que é
uma coisa positiva” E5
“eu acho que a chefia aqui, dá bastante abertura, e isso vai passando para
os seus colaboradores,... então todo mundo é aberto tem um bom
relacionamento...”T2
“aqui qualquer momento que você precisa, você fala com a sua chefia e
você é ouvida...”T1
Ser conhecido no CC e reconhecer no profissional sua maneira de ser, suas
limitações, seus gostos até mesmo suas exigências foi relatado como fator que
influencia positivamente nos relacionamentos:
“... ... o relacionamento é melhor quando você freqüenta mais...”C4
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
62
“A primeira instância quando o médico vem... a gente as vezes... pelo
tempo a gente sabe quem é... ... as vezes vem o médico de fora, então...
[...] Então eu acho que cada um tem a sua particularidade... mas eu tento
tratar todo mundo igual, então assim, eu vou saber procurar saber quem é
o médico, converso com um...”T7
“Eu acho que, a... a medida que o tempo vai passando, que você vai... se
tornando
conhecido
na
casa,
e
conhecendo
as
pessoas,
esse
relacionamento tende a ser mais fácil. Éh, no começo, pelo fato de você
não conhecer as pessoas e vice e versa, é uma coisa um pouco mais...
difícil de se entender, isso foi uma coisa que eu percebi, comigo, com o
passar do tempo o relacionamento fica mais fácil, as pessoas conhecem a
maneira como você trabalha... como você prefere as coisas, enfim, então,
eu acho que isso é um fator importante, quer dizer, acho que quanto mais
uma pessoa tá vinculada a uma instituição, mais fácil é a relação entre
elas”.C2
Ainda como fatores promotores do relacionamento os profissionais destacam
que para iniciar um dia de trabalho deva-se começar com o cumprimento das
pessoas no momento de sua chegada. Desta forma, os relacionamentos se iniciam
e consegue-se perceber em um simples retorno de um cumprimento o humor dos
profissionais naquele dia. As relações dependem da disposição particular de cada
um no sentido de cooperação. Num ambiente dinâmico, como é o CC, estar
disponível para realizar alguma ação que não é da sua competência também auxilia
os relacionamentos, desde que estejam dentro dos padrões éticos de sua profissão.
A cordialidade, o modo de falar e agir influi diretamente no ambiente. Ter um canal
aberto entre as equipes médicas e de enfermagem também surgiu nas falas dos
sujeitos de modo que é possível no local do estudo a discussão de problemas
através do diálogo entre os profissionais. Foi possível perceber que o distanciamento
que existia entre o poder médico e a equipe de enfermagem vem diminuindo com a
mudança inclusive do papel social do médico e também com a profissionalização e a
melhora da qualidade de assistência de enfermagem. Assim, o relacionamento
através da aproximação de todos os profissionais tende a melhorar. Uma fala
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
63
também apontada foi a de se “ter jogo de cintura”, fator que acaba alterando muitas
vezes o rumo de um conflito.
“Começar com um bom dia,... claro que com um bom dia você vai saber
se a pessoa ta bem ou não está”.T7
“é cordialidade, éh... discernimento daquilo que te compete fazer, e
disposição em fazer aquilo que não te compete também”. C1
“As relações que, eu acho que promovem... assim, a gente é a amizade,
que é um fator... essencial para você trabalhar e... assim, o modo de falar,
o modo de agir...”T6
“hoje não, hoje o poder do médico,... ele não existe mais né... do ponto de
vista até social,... antigamente talvez, o médico ele ganhava muito mais...
ele podia muito mais e ele devia muito menos, muito menos explicações
que hoje. Então hoje... há uma interação maior dos profissionais dentro do
hospital. Então assim... ... as relações, tendem a melhorar quando isso
acontece”.C4
“com relação ao relacionamento entre a enfermagem e médico nós,
a
nossa relação aqui, é boa. Então a gente tem uma abertura... pra gente tá
...colocando os nossos pontos e vice e versa, então tem uma troca bem
interessante... tá tanto com as equipes da casa, quanto com os médicos
que vem de fora... a equipe da anestesia que trabalha aqui com a gente,
então o nosso relacionamento é bom, tem uma abertura boa pra...
trabalhando... pra discutir problemas”.E3
“você tem que ter basicamente, respeito entre a,... entre as diferentes...
entre os diferentes profissionais, eles têm que, atuar como uma
engrenagem...”C1
“Eu acho que é bem interessante, eu acho que o pessoal que a gente mais
lida que são os técnicos, eles têm uma boa vontade impressionante”.A6
Maristella Lopes Gianini
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Subcategoria: Fatores Restritivos do Relacionamento Interpessoal no
Centro Cirúrgico
As falas dos sujeitos contrapondo o lado positivo discorrem sobre um
relacionamento ruim, tendo que melhorar. As relações interpessoais em CC foram
apontadas como sendo relações que variam dependendo do momento, dos atores e
da dinâmica do CC. Segundo os entrevistados os relacionamentos são difíceis e
complicados e as relações tendem a ser desrespeitosas e conflituosas. Os
desentendimentos são atribuídos às situações de stress que são comuns neste
ambiente, dentre elas as situações de urgência e emergência, descumprimento de
horários principalmente por parte dos cirurgiões. A pressão dos cirurgiões é grande
porque querem chegar ao centro-cirúrgico e imediatamente iniciar a cirurgia,
desconsiderando, assim, a rotina estabelecida as normas da casa e a dinâmica
daquele momento. Atitudes como essas denotam falta de respeito com os demais
membros da equipe e com o paciente.
“então, então eu acho assim, que todo mundo é importante não existe um
mais importante que o outro, porque s... uma peça do, do jogo quebra,
todo mundo vai ter conseqüência, só que muitas vezes as pessoas não
percebem isso e aí acabam se desentendendo né?”. A4
“mas, pode ser conflituosa, em algumas situações ela pode ser conflituosa,
principalmente em situações de urgência e emergência...” C1
“Entre todos é um pouco conflituosa muitas vezes, principalmente da área
da anestesia com a área da enfermagem, porque o cirurgião, pressiona a
gente pra colocar o paciente na sala, e as vezes o anestesista não está na
sala, não preparou a sala, as vezes não tem anestesista disponível, aí o
serviço de anestesia cai em cima da gente, porque a gente colocou o
paciente na sala.. .é complicado”T9
“...principalmente nas trocas de sala e isso as vezes, pode gerar algum
ponto de de stress, dependendo do horário que você tiver... dos
compromissos que você tem... as vezes isso pode interferir.”C3,
“ele (o médico) chega aqui... quer fazer o que ele quer,
quer chegar a
hora que ele quer...” E2
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“...os médicos, principalmente, não tem essa idéia, né? de que eles
precisam, de que cada pecinha esteja
funcionando adequadamente e...
cada um tem a sua função”. C1
“as vezes você tem uma normativa da casa que as vezes é pré
estabelecida pelo próprio CRM ou pela ANVISA ou por qualquer órgão
legal, e que as vezes o profissional [cirurgião],... as vezes não quer seguir.
Porque ele entende que ele é dono do doente e ele pode tomar a conduta
sozinho”.E1
Alguns entrevistados resgataram o passado em suas respostas nas quais
eram observadas as relações baseadas na hierarquia, no exercício do poder dos
cirurgiões, submissão da enfermagem e pouco empenho em se desenvolver
profissionalmente. Essa percepção adveio ao observar-se citação do termo
“acostumado”, que foi usado para ligar a enfermagem a anestesistas antigos e com
vícios. As falas apontam também uma mudança deste aspecto que se observa na
realidade atual. Outras manifestações de poder que permeiam as relações
interpessoais foram citadas quando se percebem situações em que predomina o
egocentrismo médico. Assim sendo o relacionamento pode se tornar áspero, isso
porque a arrogância e a impaciência desrespeitam o profissional não médico. Em
contrapartida, com o ser conhecido no CC, o não ser conhecido, foi outra tradução
de restrição nas relações interpessoais nesse ambiente.
“... tudo girava, em torno da ordem do cirurgião, o cirurgião era a entidade
máxima. e ele dizia se atira no chão! e ele se atirava [o circulante de sala]
etc. etc. etc...”A1
“... hoje em dia, está havendo uma mudança, o cirurgião que grita, ele é
visto não como petulante e sim como inseguro,... então ele evita gritar,
evita fazer showzinho... porque antigamente... 20, 30 anos atrás... eram
traduzidos como poder...”.C4
“Eu acho que antigamente era diferente... a visão que todo mundo tinha
da enfermagem, do enfermeiro especificamente, não tinha muito que... não
tinha muita liderança, não tinha espaço, é... meio que ninguém dava muita
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importância, quem dominava o ambiente hospitalar eram os médicos... Eu
acho que isso vem mudando”.T5
“...a gente tinha uma grande dificuldade com os técnicos antigos, que vem
de uma época acostumados com anestesistas antigos, com vícios, que
não faziam as coisas então não por maldade mas eles estavam
acostumados...”A6
“eu vejo que os médicos geram muito conflito dentro do CC, e tornam o
ambiente mais difícil, mais hostil.” C1
“eu acho que os egos quando estão muito exaltados...Ai complica o
negocio né?” T9
A comunicação inadequada foi referenciada pelos entrevistados vista por
diferentes ângulos. Eles apontam aspectos especialmente em relação à enfermagem
e em relação aos médicos. Como, onde e quando falar faz toda a diferença na
manutenção de um bom relacionamento, tanto quanto a omissão de detalhes
técnicos necessários para o andamento do procedimento cirúrgico. A ausência do
enfermeiro
nas
atividades
práticas
com
o
paciente
distancia
a
equipe
multiprofissional. Enquanto o enfermeiro assume o rigor administrativo os médicos o
colocam de lado. Prender-se a detalhes burocráticos foram referenciados como
empecilhos para uma boa comunicação e relacionamento adequados, em contra
partida, não se adequar às rotinas administrativas da unidade também parecem
dificultar o relacionamento.
“às vezes erro de comunicação de... algum “telefone sem fio” que pode, sei
lá, promover um desentendimento na hora, um disse me disse, mas dá pra
ser corrigido”.T5
“não é muito bom o relacionamento... Eu acho que há uma falta de
comunicação... uma falta de comunicação”.A5
“então às vezes eu percebo que... por um por uma comunicação
inadequada acaba acontecendo alguns conflitos”.E5
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“em relação a equipe médica o contato verbal é mais normal, com a equipe
da enfermagem, tem que ser tudo meio que por escrito... você colocou no
papel vira uma coisa sem nenhum relacionamento...”A2
“essa burocracia engessa e afasta, dificulta um pouco essa relação, do
enfermeiro com a equipe médica, eu vejo, o enfermeiro distante desse... da
parte prática”.C2
“A gente trabalha com imprevistos também... se você não sabe que às
vezes seria necessário,... um determinado equipamento, medicamento ou
material, e você tem que prever aquilo na hora, sem ter sido solicitado
antes, a coisa se complica um pouquinho então a comunicação entre os
três tem que ser bem clara e específica [...] por isso a ah... interação é
muito importante da equipe cirúrgica e anestésica”. E1
“as vezes tem cirurgião que... quer pular os protocolos, as vezes a gente
fica tentando seguir os protocolos que ta dando certo, pra evitar erros,
mas assim,... a pressão é grande dos cirurgiões pra cima dos enfermeiros
né,...”T9
“agora se você tem aquela sua chefia que só fica te pegando no pé, não te
elogia quando você merece ser elogiado ai... num... num vai pra
frente...”T1
“eu tive lugares que eu trabalhei e que eu não tinha como chegar na
chefia, conversar com a chefia, e isso atrapalhava muito...” T1
A estrutura administrativa e os convênios foram também apontados pelos
cirurgiões como fatores restritivos de um bom relacionamento. Os cirurgiões
percebem que a realização das cirurgias não está mais atribuída somente à sua
chegada no CC. A liberação de algum equipamento ou material necessário para a
realização da cirurgia, algum implante ou até mesmo a própria realização da cirurgia,
quando dependem de uma fonte financiadora, retira do cirurgião o poder de decidir
sobre a realização ou suspensão da cirurgia. A dependência fica então citada pelos
cirurgiões como um fator restritivo.
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“Convênios,...liberação de convênios, desse ou daquele material... ... torna
a relação mais difícil... ... hoje em dia a medicina é embasada nesse tipo
de, de comércio, em que o dono, vamos dizer assim, das decisões...está
fora do ambiente do CC... é uma... uma empresa.. .a liberação desse ou
daquele material pode atrapalhar o andamento ...do CC... da cirurgia.”C4
“Tive reclamações de atraso de cirurgia....mas nunca motivado...por motivo
pessoal...e sim pela estrutura administrativa, né , pela, pela demora na
internação, demora na chegada do paciente, demora do convênio em
autorizar a cirurgia...”C6
As relações podem se tornar difíceis quando há uma quebra no caminho a ser
percorrido pelo paciente desde sua chegada ao hospital até sua saída do CC. Se
houver um problema em alguma fase desse caminho ou com algum membro da
equipe multiprofissional, se não há disposição pessoal no desempenho de alguma
atividade, uma reação em cadeia pode ser deflagrada influenciando negativamente
as relações multiprofissionais.
“porque assim se a internação ta atrasando, atrasa o transporte do
paciente, atrasa a sala, a sala fica ocupa e ociosa, e aí fica uma bola de
neve!... e as relações vão ficando né... todo mundo com, com os nervinhos
a flor da pele, ai por exemplo se o pessoal do raio X, não ta disponível
naquele momento, ou tem muita coisa pra fazer, a cirurgia fica parada,
porque não tem o técnico na sala, ou o aparelho quebrou...”A4
“nos hospitais públicos em que eu trabalho uma animosidade, é essa a
palavra, de alguns colegas com alguns profissionais da enfermagem.
Então o que você gera: o paciente entra na sala, o técnico não vem, ou ele
trás metade das drogas, ou ele não te ajuda na fixação, ou ele espera você
pedir pra trazer...” A6
5.2.3 Categoria 3: Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico
A categoria “Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico” é constituída
por duas subcategorias: Papel de Liderança e Papel Assistencial.
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As falas demonstraram que o enfermeiro atua como base de sustentação de
todo o CC. Foi relatado que o papel de liderança que o enfermeiro tem de assumir, e
que, muitas vezes assume, é imperativo para o desempenho do CC.
A necessidade do enfermeiro também ser um líder assistencial, papel que ele
pouco assume, foi relatada e solicitada pela grande maioria dos cirurgiões,
anestesiologistas e técnicos de enfermagem. Já os enfermeiros pouco identificaram
seu papel de líder assistencial.
A figura abaixo demonstra a situação do enfermeiro de CC e a necessidade,
relatada pelos entrevistados, de que o enfermeiro precisa exercer o papel de
liderança juntamente com o papel assistencial.
Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirurgico
Papel de Liderança
Papel Assistencial
Figura 8 - Categoria 3: Papel do Enfermeiro na Equipe do Centro Cirúrgico
Subcategorias: Papel de Liderança; Papel Assistencial
Subcategoria: Papel de Liderança
Quanto ao papel de liderança, o enfermeiro é visto como o profissional mais
bem preparado para liderar o CC e trazer coesão e harmonia para a equipe. Esta
pesquisa identificou o enfermeiro como referência dentro da equipe multiprofissional.
“A liderança do CC na forma da enfermeira chefe, eu dei o nome de chefe
éh... vital para que haja a predominância de harmonia entre todas as
equipes.”A1
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“Pra mim num CC onde a enfermagem não funciona bem, o CC não
funciona. Ele é movido pela enfermagem. A enfermagem vê éh,... aonde tá
o paciente, se o paciente tá em condição de subir para o CC, é ela que
proporciona essa subida pro CC, ela faz o gerenciamento de sala de
material de material de, de, hoje em dia tem material de, de como é que eu
vou dizer... consignado, isso tudo é o enfermeiro que faz, gerencia, se o
enfermeiro não tiver uma equipe boa, não tem médico, anestesista, nada
que vá funcionar no CC”.A2
“Eu acho que o enfermeiro ele, ele é um, ele tem um poder enorme em
trazer coesão pra equipe, porque o enfermeiro é aquela,... é aquela figura,
aquele profissional que domina o CC, todo... então o enfermeiro, ele é o...
chefe do CC, a cabeça do CC. Porque o, o médico, ele tá ali, por exemplo
ele tá ali focado em fazer a técnica dele, em fazer a cirurgia dele , em usar
o tempo dele da forma mais éh econômica possível, o anestesista também
tá ali com aquela função especifica, mas a, o indivíduo que tem a visão
geral das coisas, que pode gerenciar e trazer... né ...e fazer com que a
coisa ande da melhor maneira possível, é o enfermeiro, na
minha
opinião”.C1
“Eu acho que o enfermeiro nessa... ele tem a função e a capacidade de...
direcionar as coisas para o melhor resultado final. Tem coisa que depende
dele, única e exclusivamente. Talvez da vivência, talvez da perspicácia de
saber que a casa vai cair lá na frente, ele tem que ter meio que jogo de
cintura,... jogo de cintura é muito importante. Quando alguma coisa não vai
bem você tem que solucionar rápido, né pra não deixar éh... tumultuar o
negócio, então depende muito dele, as vezes não tem determinada... tá
faltando sala... por exemplo, aquele dia ta faltando uma sala pra operar... a
relação pessoal dele com quem ta esperando a sala, e a relação pessoal
dele com quem ta lá pra limpar a sala, ou pra montar... depende dele. Se
ele vai mal, a casa cai”. C5
Para que o enfermeiro possa realizar seu papel de liderança no CC, a fala dos
entrevistados demonstrou que através do diálogo o enfermeiro assume uma espécie
de ponte entre todos os envolvidos na dinâmica do CC, inclusive com o próprio
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paciente. Dessa forma, ele tem de ter pleno conhecimento de gestão administrativa
e principalmente possuir habilidades próprias para saber lidar com conflitos e trazer
segurança para todos.
“é aquela peça chave que faz a acolhida de todos, então tudo ta centrado
no enfermeiro, é aquele que conversa primeiro com o médico, é aquele
que conversa primeiro com o paciente, é aquele que conversa com a gente
e nos conduz para as atividades pertinentes daquele dia, ou pra aquele
paciente, ou pra aquele médico.T7”
“Então, o enfermeiro...ela é tudo... aqui... se você não tiver jogo de cintura
com a equipe médica, a equipe anestésica e com a gente, porque ele tá ali
no meio, ele tá recebendo tudo e tá passando, entendeu, ele que tem que
ser o líder, tem que ...saber administrar, senão acaba dificultando muita
coisa.”T4
“...coordenar a distribuição do serviço para toda a equipe, fiscalizar para
que tudo esteja sendo feito conforme os protocolos, fiscalizar a segurança
do paciente, se a gente também tá cumprindo com as metas de segurança
do paciente, e ...dar aquela retaguarda quando a gente precisa né?”T9
“prezar pelo bom andamento de todo, todo o funcionamento do CC.”C3
“O enfermeiro é quem vai éh... mediante tudo o que foi se passado lá no
pré agendamento né... do que foi solicitado pela equipe,... é quem vai estar
fazendo a parte de organização e de atuação, pra que tudo ocorra da
melhor forma possível, desde que solicitado.”E1
“além da nossa liderança na parte funcional do setor... eu acho que que a
parte de comunicação, de conflitos ....do dia a dia.... de seres humanos de
culturas diferentes...”E5
Subcategoria: Papel Assistencial
Os sujeitos da pesquisa relataram a necessidade do enfermeiro estar mais
presente na SO, para estar mais próximo do paciente. Isso facilitaria para que
melhor aprendessem os problemas da realidade. Os entrevistados criticam a
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excessiva atuação dos enfermeiros na burocracia, indicando que a maior dedicação
deles à assistência traria maior segurança à equipe. Alguns relataram a carga
excessiva de atribuições.
“...Eu acho que o enfermeiro deveria entrar mais em sala, né pra ele poder
ter o contato mais direto no que realmente acontece. Pra ele poder
observar melhor o técnico dele, melhor o anestesista, melhor o cirurgião ,
pra ele como coordenador dessa equipe, éh..não médica, mas da
enfermagem, ele conseguir achar o gargalo, de cada equipe, onde está o
gargalo do que esta acontecendo, é o profissional dele, é o anestesista, é
a equipe, e daí conseguir manejar isso melhor, Eu sinto uma ausência do
enfermeiro na sala, e com isso você não consegue passar os problemas
pra ele”.A6
“Aqui! Burocrático, 100% burocrático. Sem dúvida nenhuma. 100%
burocrático... Eu sinto a falta de uma participação maior da enfermagem,
da das enfermeiras responsáveis, é na na , no contato direto com o
paciente. Eu fico com a sensação que elas estão muito presas, a questão
burocrática...porque prioriza a burocracia, isso afasta a enfermeira, que na
minha visão, é a quem deveria ter contato mais direto com o paciente da
equipe médica, então o contato muitas vezes é com o técnico que não tem
formação suficiente,
pra isso, e, é cobrado por isso, em detrimento a
burocracia que a enfermeira fica presa”.C2
“o próprio técnico de sala, por exemplo, se sentiria mais seguro, tendo...
alguém superior... por perto, entendeu, ao invés do enfermeiro cobrá-lo por
não ter feito, o enfermeiro estar lá e fazer e mostrar - olha vamos fazer
isso assim, vamos fazer isso assado eu acho que acrescentaria inclusive
pro técnico, circulante de sala”.C2
“O papel do enfermeiro é assim, eh... ele tem que fazer o papel dele, mas
eu acho que ele também poderia ajudar agente assim, não ser técnico, não
sei se você ta me entendendo éh... tem enfermeiros que... ajuda a gente...
caminha... melhor, ...outro já ah to precisando de uma ajuda,... não vem...
então sei lá...” T1
“mas as vezes eu acho que elas esquecem de, de olhar uma coisa mais
prática, mais voltada ao ato cirúrgico e... as vezes eu acho que a tônica
Maristella Lopes Gianini
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fica esquecida nesse ponto, e fica muito focada em burocracia,
73
mas eu
não sei como eu faria se estivesse nessa posição, então eu acho que, eu
não dou muito palpite porque eu também
não sei como eu faria, se
estivesse nessa posição, né.”A4
”eles são poucos, e os problemas são muitos, então eles são muito
locados aqui pra resolver coisas mais... administrativas, falta papel, falta
material, faltou exame, então... eu acho que precisaria mais... o dobro da
equipe da enfermagem, de enfermeiros em CC com esse papel”.A6
“ele (o enfermeiro) tem que tá a par do material que tá sendo usado na
cirurgia, o que tá acontecendo nas salas, se teve algum problema na sala,
éh, e ele no caso: - o médico chamou o enfermeiro... ele já sabe o que tá
acontecendo dentro da sala, e não chegar perdido, e muitas vezes ele
acaba ficando ali na parte administrativa, e o assistencial....acaba deixando
um pouco pro lado”.T1
5.2.4 Categoria 4: Conflito Ético em Centro Cirúrgico
Na quarta categoria, “Conflito Ético em Centro Cirúrgico” foi observado que
falar sobre conflito ético não foi fácil. Mais uma vez notei a surpresa dos
entrevistados com relação à pergunta. A seqüência da entrevista gerou certo
desconforto, um cuidado e uma necessidade de elaborar mentalmente a pergunta
antes que esta fosse respondida. Essas demonstrações foram observadas nas
palavras e também no silêncio de alguns para a elaboração da resposta.
Na dificuldade dos entrevistados em dissertar sobre conflito ético duas
subcategorias foram identificadas: O conflito ético reconhecido e o conflito ético
justificado como demonstra a figura a seguir:
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Conflito
ético em
Centro
Cirúrgico
Conflito Ético Reconhecido
Conflito Ético Justificado
Figura 9 – Categoria 4: Conflito Ético em Centro Cirúrgico – Subcategorias: O Conflito
Ético Reconhecido e Conflito Ético Justificado
Subcategoria: Conflito Ético Reconhecido
Ao discursar acerca do conflito ético, as falas apareceram entrecortadas,
alguns se limitaram a responder sim ou não, outros preferiram contar casos, porém o
que ficou claro foi que os principais geradores de conflitos éticos reconhecidos são
os médicos principalmente da categoria dos cirurgiões. Tais profissionais, na
intenção de realizar a cirurgia a “qualquer preço” permitem-se agir contra princípios
éticos e morais de modo a incorrer ao risco de causar dano ao paciente e
restringindo, assim seu relacionamento com a equipe.
“É mais comum entre médicos. Conflitos éticos, entre colegas médicos [...]
às vezes o conflito ético é uma coisa velada, né, em geral entre cirurgiões,
entre anestesistas, entre cirurgiões e anestesistas, como a gente lida muito
com os colegas e, e são os profissionais com quem a gente tem mais
problema, é onde eu mais vejo conflito ético, entre colegas médicos”C1
“com o cirurgião já já notei... Eu acho que é um pouquinho de forçar a
barra.... na verdade....eu falo que eu tenho muito amor ao meu CRM, foi
muito difícil de conseguir...(risos), e eu pretendo não perdê-lo, então eu
sou muito zelosa em relação aos meus pacientes.”A3
“Aqui eu tive um caso na verdade que foi,... foi um caso mesmo assim,...
do tempo que eu to aqui, que é pouco, mas acabou...eu acabei preferindo
sair da, da história, e eu optei por não, não fazer a anestesia, pedi pra um
Maristella Lopes Gianini
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colega fazer, alguém que concordasse, que fosse de acordo com os
princípios dele e não era o meu”A3
“paciente assinou um termo de uma cirurgia e depois ele quer fazer outra...
e será que o familiar esta sabendo..., será que o paciente está
informando...será que ele esta esclarecido quanto ao que ele realmente vai
fazer dentro da sala...nesses momentos entra a parte de normativa da
instituição para você dar garantia e o paciente não sofrer riscos.”E1
O comportamento autoritário e desrespeitoso desses indivíduos que se julgam
acima de qualquer um gera situações antiéticas em relação à equipe e também em
relação ao próprio paciente. As falas que identificaram a enfermagem como
causadores de conflito ético, relataram um despreparo profissional em lidar com
situações difíceis. Ressaltaram, ainda, que “vozes de comando” em situações de
emergência não podem ser atribuídas a desrespeito profissional. Elas fazem parte
do momento emergencial e estressante que envolve todos os profissionais naquela
situação. Opinar sobre condutas que são exclusivamente de outra categoria
profissional e até mesmo realizá-las também foi apontado como conduta antiética.
“... ... ... uh... ... ... Essa é uma pergunta bem difícil!!!!!... ... ... Em alguns
lugares, eu vejo que sim[...] ... Eu acho que às vezes uma pessoa acha
que a... a... um ta fazendo a função do outro ou que ah... ta querendo ser
superior ao outro, coisa que eu acho que não...tem nada a ver”. A5
“chamo o enfermeiro e altero o meu tom de voz,... começo a desrespeitar a
pessoa,... eu acho que aí sim, é falta de ética,.não respeita o seu
espaço[...] Uma coisa é a gente saber falar em tom normal, conversar em
outro momento, não naquele momento, dentro da sala, com o paciente
acordado ainda, eu acho isso desagradável, eu acho que ai você ta
invadindo o meu espaço...” E6
“De repente, pra aquele procedimento, ele precisa de alguma coisa
específica que ele não pediu... e ai você tem que correr atrás na
emergência, você acaba expondo ao risco...com o anestesista a mesma
coisa, e com a enfermagem a mesma coisa que se ele pediu e aquilo não
Maristella Lopes Gianini
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está disponibilizado, não é na hora que o paciente está na mesa que você
tem que falar” E1
“Às vezes um colega ta fazendo um procedimento inadequado, outro
colega chama a atenção na frente do paciente...”.T9
“Às vezes quando é conveniente[...]eu já vi acontecer casos,
do
enfermeiro chamar atenção do seu técnico na frente de todo mundo. Aí eu
já não acho isso ético”.T7
“tem anestesista que chega e fala não, eu quero puncionar o acesso, de
repente o acesso já está puncionado, então gera aquele conflito e fala não,
isso aqui é função minha você não tem que se intrometer no meu
trabalho...”E3
“é uma infração ética quando a enfermeira ou circulante de sala, eh...
emite uma opinião, um juízo de valor técnico que é ... de outra área...”A1
“percebo
diariamente.
Tanto
médico-médico,
médico-enfermagem,
enfermagem-técnico de enfermagem, o tempo inteiro a gente percebe...
você dando... fugidinhas da ética”.A2
“Uh eu acho que... exigências com papeis, ah... ou com... é, assim, é mais
importante as vezes você chegar e assinar o papel do que recepcionar o
paciente..., conversar com a paciente, aqui no caso né, eu acho que existe
uma, uma tônica muito forte na burocracia, mas é uma instituição grande,
agora no... estado... nos outros hospitais que eu trabalho, eu acho também
que muitas vezes, elas esquecem de ajudar o pessoal da enfermagem, o
pessoal médico e ficam muito focadas em só administrar a parte...
burocrática”.A4
Subcategoria: Conflito Ético Justificado
As falas dos sujeitos, ao discorrer acerca do que é um conflito ético,
demonstraram que na interpretações em determinadas situações não como falha
ética não cabe, mas aparece de modo transformado, em desrespeito ou
comportamento inadequado.
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Foi relatado que alguns “comportamentos” influenciam toda a equipe ora
levando-os a assumir um papel que não é o dele ora expondo a equipe e o paciente
ao risco. Também foi citado que quando a enfermagem é tratada de forma
desrespeitosa dentro da SO por parte dos instrumentadores cirúrgicos e/ou dos
cirurgiões, essa postura é apontada como indesejável acarretando prejuízo na
dinâmica da sala.
“E tratar de ética... eu acho que é uma coisa muito... é delicada, porque as
pessoas confundem ética com varias coisas.”T7
“certas pessoas acharem que aquilo não é função dela fazer, e não ter
uma ,.. uma boa vontade ou então uma uma iniciativa de, assumir aquela
função pra resolver o problema de uma maneira mais rápida, e acaba
delegando pra ah , - isso não é da minha área, não vou fazer[...] uma
omissão
de algumas... atitudes que seriam... benéficas para o bom
andamento do do procedimento cirúrgico, do funcionamento do CC... e que
algumas pessoas acham que não é função dela fazer... ai passa para o
outro, e isso, as vezes acaba gerando um atraso.”C3
“Agora as eu acho que as vezes falta um pouco de respeito do pessoal que
vem de fora, não com o médico, mas com o não médico, mas da área da
saúde, então... ou com o enfermeiro, com o técnico... uma questão de
hierarquia eu acho que isso é mau orientado, então, as vezes a
instrumentadora da equipe cirúrgica falta com o respeito, as vezes o
cirurgião falta com o respeito e agente fica meio na... encruzilhada, porque
a gente depende do circulante da sala, né, e se ele é mau tratado, é óbvio
que ele vai ter um desempenho diferenciado...A gente precisa que isso
flua bem.”A6
As falas justificam os conflitos como conseqüência do ambiente estressante,
com aceitação do desrespeito médico com a enfermagem, com a incompreensão
dos cirurgiões e a insistência dos mesmos em cima dos anestesiologistas e da
enfermagem em não suspender a cirurgia mesmo sabendo que esta pode ser
considerada uma atitude de negligência.
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“Identifico, é mais assim... como posso te dizer... quando tá o fluxo de
cirurgia no dia ta muito alta... então o nível de stress dá sempre uma
aumentada... que você tem que ter aquele ritmo para acompanhar, ser
rápido,... e às vezes isso... nesse momento de stress, a gente acaba
estourando um pouquinho”.T6
“Há muitos anos que eu não vejo um enfermeiro gritar com algum colega
no corredor. Medico é normal...isso acontece né...”eles podem”..........a
gente entre nos,.... da enfermagem faz muitas anos que eu não vejo.T9
“um paciente que não tinha nenhum exame. Vai conversar com o cirurgião,
por exemplo, o cirurgião acha que – Não!...nessa hora ele esquece
totalmente que o paciente tem que ter exame, tem protocolo e etc.,...ele
quer forçar a barra pra ter o procedimento entendeu... é até alguma coisa
que o colega anestesista fica meio forçado a fazer o procedimento pra não
atrasar a cirurgia pra não suspender a cirurgia[...] se você chegar e falar
pro cirurgião: - não vou anestesiar porque o paciente não está em
condições..., por exemplo, ele não tem como fazer nada, mas ele força um
pouquinho,... até um pouco, como eu te falei... a linha é meio tênue,... ele
testa um pouquinho, pra tentar ver se você faz o procedimento ou não”.A2
“Mas tem conflitos sim, tanto médico como enfermeiro, como técnico... a
maioria das vezes é quando falta alguma coisa que vai atrapalhar no
procedimento... aí geralmente a cirurgia estressa né... e daí ele [o
cirurgião] quer descontar em alguém,... e quem é que ele desconta, é
quem está na sala, que é o técnico, às vezes não é nem culpa dele, mais
ele acaba levando...”T6
5.2.5 Categoria 5: Atuação do Enfermeiro Frente ao Conflito Ético em Centro
Cirúrgico
Na quinta categoria “Atuação do Enfermeiro Frente ao Conflito Ético em
Centro Cirúrgico”, os entrevistados apontam que os enfermeiros adotam posturas
diferentes dependendo da situação. Dessa forma, foram identificadas três
subcategorias: Posicionamento do enfermeiro; Enfermeiro como agente mediador; o
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Enfermeiro como agente causador do conflito conforme demonstrado na figura a
seguir:
Atuação do
Enfermeiro Frente ao
Conflito Ético em CC
Posicionamento do
Enfermeiro
Enfermeiro como
agente causador
do Conflito
Enfermeiro como
agente Mediador
Figura 10 – Categoria 5: Atuação do Enfermeiro Frente ao Conflito Ético em Centro
Cirúrgico Subcategorias: Posicionamento do Enfermeiro; Enfermeiro como agente
mediador; Enfermeiro como agente causador do conflito
Subcategoria: Posicionamento do Enfermeiro
As falas demonstram que o enfermeiro do CC tem uma preocupação em não
infringir a ética e que adotam uma postura de imparcialidade e respeito quando o
conflito é gerado entre médicos.
“os enfermeiros são muito bons em geral assim, eles tem muita noção de
não infringir essas coisas [...] Eles [os enfermeiros] são... assim, são muito
conservadores, né em relação a isso, eles procuram jamais interferir...
quando fazem diagnóstico do conflito, né”. C1
Porém há situações, nas quais o enfermeiro tem que se posicionar, não
havendo tempo para o diálogo. Essas situações são relatadas por eles de forma que
acabam por ter que decidir pela atitude que traga menos risco ao paciente, embora
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80
sabendo ela que causará um desconforto para com a equipe e que depois o
problema terá de ser retomado.
Quando o diálogo não consegue solucionar a questão, o caso então é
passado às chefias.
“Bom eu acho que ele tem que ter postura ehhhh.... ver o que ta
acontecendo realmente,... que como eu disse, as vezes um conta uma
versão outro conta outra.... então, nada como sentar junto conversar e
esclarecer ...
mas antes disso você tem que tomar um.... ....já tem
que ter um plano de ação rápido naquele momento, ....então você já
resolveu o problema. Foi o caso que eu contei, agora o que eu tinha que
fazer: uma coisa que eu não gosto, mas tive que fazer , que foi tirar o
técnico da sala, porque eu sabia que a cirurgia ia começar e
iam ficar
discutindo e a cirurgia não ia funcionar.”E2
“É tem que chegar até a equipe médica e posicionar... olha o seu paciente
esta referindo que ele vai fazer a cirurgia A e não a B [...] Ele tem... se o
médico chegar e disser que ele não vai cumprir, que ele esta
desconsiderando o que o enfermeiro ta fazendo, a gente passa para uma
hierarquia maior que é a parte da diretoria. Principalmente a diretoria
médica”E1
Subcategoria: Enfermeiro como Agente Mediador
Quando acontece um conflito ético com a equipe, a postura do enfermeiro é
relatada como mediadora do conflito. O diálogo é apontado como ponto norteador
que deve ser tomado por eles na tentativa de resolver situação. As falas referem que
eles têm que avaliar a situação, saber ouvir ambas as partes com imparcialidade e
educação e assim elaborar um plano de ação. Uma vez que a causa do conflito foi
identificada o enfermeiro também atua como orientador no sentido de passar
informações necessárias para que o mesmo problema não se repita.
“É, o mediador que eu digo, é assim, ele tem que avaliar a situação, ver o,
o que pode ser feito pra resolver aquilo da melhor maneira possível, e
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81
atuar de maneira imediata principalmente no CC, pra que seja
resolvido.”C3
“E... nessas situações... há conflitos... os enfermeiros tentam argumentar,
justificar o porque de tal atitude durante o procedimento, e... ... acaba
assim, ...ele não se altera né..., segue todos os protocolos que tem que
seguir.”T9
“o enfermeiro tenta resolver [o conflito] da melhor maneira possível.”T6.
“Eu acho que assim: que o enfermeiro ele... tem essa situação. Eu já me
coloquei diante dessa situação: você escuta,... né, deixa a pessoa falar,...
porque naquele momento não adianta você querer justificar ou dar
explicação, tem que escutar o tempo inteiro e inclusive falar que a pessoa
esta até certa, entendeu?... pra num outro momento que você vê que saiu
daquela situação toda, você pega e até conversa, você tenta atender...
mediante todo o conflito que ta gerando, você tenta atender da melhor
forma possível, por mais que você esteja certa, e sendo agredida, a gente
tenta atender pra normalizar aquela situação, a gente tenta,... estar
atendendo,... a não ser que você vê que o negócio ta passando do limite,
ai você se impõe: - fala assim:
- Oh!, você agora ta me ofendendo, você para,ou o negocio não vai dar
certo! Eu to tentando fazer o meu melhor pra você, agora se você não, nos
ajudar pra conseguir resolver essa situação, aí vai ficar difícil,... e sai de
cena. Porque você sabe que o negócio vai piorar... e nunca deixar a
pessoa agressiva falando e dá as costas de imediato, porque ela vai se
sentir ofendida... e o negócio pode virar um turbilhão, né, ... então você
escuta o tempo inteiro,... até concorda num primeiro momento...e você vê
que depois quando a adrenalina baixar dá pra conversar e ai vocês sem
entendem.”E6
“... mediante circunstâncias eh.... problemáticas ou que gerou algum tipo
de stress a gente .... eh .. enxerga o problema né, tria o problema... e
passa a informação para o grupo como um todo, pra todo mundo falar a
mesma língua, pra que outras pessoas não passem pelo mesmo
problema.” E3
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Subcategoria: Enfermeiro como Agente Causador do Conflito
Alguns entrevistados apontam que a conduta da enfermeira pode ser a
geradora do conflito. Quando isso acontece a equipe atribui a uma postura de
exercício autoritário de poder assumida pelo enfermeiro. Também foi apontado que
há um certo despreparo emocional do enfermeiro diante de situações de emergência
para não ofender-se com palavras de comando.
“Mas eu vejo assim, que há uma certa distancia: você técnico e eu a
enfermeira, mas não é uma coisa que chega a prejudicar ninguém. E só
pra deixar claro que cada um, eu não gosto de falar isso, tem que estar
cada um no seu quadrado.”T7
“Então o que eu percebo é isso, éh essa ênfase em querer mandar”A4
“Isso acho que varia de pessoa para pessoa, mas acho que no geral o que
eu percebo..., é uma postura assim... de...se manter... naquele propósito,
né, naquela função que lhe é dada, ...sem baixar a cabeça pra nada”A5
“Eu acho que o emocional de algumas pessoas precisariam ser melhor
trabalhado, porque na faculdade de medicina você acaba tendo um
distanciamento do pessoal para o profissional, eu não sei como é a
formação da enfermagem em que nível isso acontece. Mas o médico no
geral, sabe muito bem que quando você tem uma discussão profissional, é
profissional”[...] Numa situação de emergência, entender que as vezes
uma palavra ríspida, uma coisa e outra ... é ... devido ao risco de vida ou
morte especifico da cirurgia, o que não acontece na enfermaria ou numa
RPA, é uma coisa muito imediata”.A6
5.2.6 Categoria 6: Autonomia Profissional do Enfermeiro no Centro Cirúrgico
Acerca da sexta e última categoria “Autonomia Profissional do Enfermeiro no
Centro Cirúrgico”, perceberam-se nas falas, atitudes assumidas pelo enfermeiro do
CC e outras atitudes que a equipe de profissionais consideram que deveriam ser
assumidas pelos enfermeiros. Desta forma, identificaram-se três sub-categorias:
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Autonomia exercida pelo enfermeiro; Autonomia não exercida pelo enfermeiro e
Autonomia Limitada do enfermeiro.
Autonomia
exercida pelo
enfermeiro
Autonomia
Profissional
do Enfermeiro
no Centro
Cirúrgico
Autonomia não
exercida pelo
enfermeiro
Autonomia
limitada do
enfermeiro
Figura 11 – Categoria: Autonomia Profissional do Enfermeiro no Centro Cirúrgico.
Subcategorias: Autonomia exercida pelo enfermeiro; Autonomia não exercida pelo
enfermeiro e Autonomia Limitada do enfermeiro.
Subcategoria: Autonomia Exercida pelo Enfermeiro
A autonomia que o enfermeiro exerce dentro do CC na fala dos sujeitos é
condicionada à necessidade de tomadas de decisões para que a dinâmica de
funcionamento do CC não seja prejudicada. Através da sua atuação ele promove
condições de trabalho adequadas para o bom desempenho da equipe e proporciona
um ambiente promotor de prestar uma assistência de qualidade no CC minimizando
e/ou impedindo qualquer situação que ofereça risco ao paciente.
“Ah! [enfermeiro] tem bastante autonomia, tem que tomar algumas
decisões antes de...do médico falar alguma coisa, tem que prever as
coisas aqui...então, tem bastante autonomia”.T4
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84
“Eu acho que ele tem autonomia que ele tem que ter realmente,... ele tem
autonomia de chamar o paciente, ele tem autonomia de, de, éh... ele
gerencia alertas... isso é importante, por exemplo: detecta que um paciente
não tem jejum, gerencia isso pro cirurgião, pro anestesista; não tem vaga
de UTI, ele já consegue até um meio de começar um procedimento de
suspender a cirurgia; ele já gerencia essa parte de sangue; ele pede, aqui
no CC por exemplo, ela já: chega um paciente, que não foi detectado que
era uma cirurgia grande que precisa de sangue, vaga de UTI... precisa...
então aqui ...eu vejo que tem essa autonomia ...boa... e ele usa essa
autonomia pro melhor do paciente”.A2
“Bom... a autonomia do trabalho,... éh eu percebo pelo desempenho das
salas[...]
Percebo
autonomia,
quando
por
exemplo
há
alguma
intercorrência.”A1
Os entrevistados ressaltam que o exercício da sua autonomia implica no
estabelecimento anterior de uma relação de confiança e respeito.
“pra você ter autonomia, você tem que ter o respeito né, você tem que ter
segurança no que você faz, você tem que saber o que está fazendo, e
passar essa segurança pro colaborador e pras equipes que vem aqui, né
porque a partir do momento que você se sente seguro e as pessoas
confiam no seu trabalho eu acho que facilita muito a questão da sua
autonomia ... e se impor, colocar qual o seu verdadeiro papel aqui”E3
Foi relatado que o papel da instituição mediante à compreensão do trabalho
que é realizado pelos enfermeiros no CC, também define ou não o poder a lhe ser
conferido para que possa exercer suas atividades no CC com autonomia.
“a instituição dá autonomia pra enfermeira estabelecer o seu lugar, a sua
função em determinados setores... Aqui eu vejo que sim... eh dentro do
seu ambiente, ela tem como delegar, como explicar, enfim, diante dos
médicos, de representantes, do pessoal da farmácia, da gente, eu acho
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85
que ela tem autonomia sim, pra mudar alguma coisa... eh...pra
determinar...eu acho que sim”.T5
“por exemplo, quando vai começar o procedimento, tá faltando o material
que ele quer: aí o enfermeiro atua, vai até lá e fala:
- Olha, você não me
pediu em check list isto, então não queira reclamar”. T6
Subcategoria: Autonomia Não Exercida Pelo Enfermeiro
Os discursos que apontam a autonomia não exercida pelo enfermeiro passam
pela observação de que a instituição ou até mesmo o próprio
profissional não
reconhece seu verdadeiro papel dentro da dinâmica do CC e o quanto a equipe
depende dele.
“Eu acho assim que: o importante,... o enfermeiro do CC,.... a instituição
reconhecer a importância dele dentro do bloco operatório, que não o
cirurgião. Não adianta delegar e sem saber que o CC é direcionado.
Quem vai fazer a distribuição, quem sabe qual é o melhor local, melhor
sala, a melhor pessoa pra ser direcionada para essa cirurgia, eu acho que
isso do dia a dia é o enfermeiro.E6
“Tem, mas não exerce. Tem, mas não exerce. É não sei se por, por eh por
iniciativa própria, ele não exercer, ou se por determinação da equipe
médica” C2
“existem enfermeiros e enfermeiros[...]eu acho que o enfermeiro tem que
ter pulso sim aqui, não porque o médico, ele é médico e o enfermeiro não
pode falar[...]não é bem por ai, eu acho que cada um tem que ter, se você
tem aquela autonomia de enfermeira que você pode fazer isso, isso, isso,
então você não deve abaixar a cabeça porque o médico falou mais alto”.T1
“eu acho que o, o enfermeiro ou enfermeira responsável pelo CC ele tem
autonomia, é,... sobre o comando e o funcionamento do CC, então ele que
determina[...]ele teoricamente é a autoridade máxima no CC, é ele que
define, quais salas vão entrar, é ele que tem que,...coordenar isso, então é
ele que... tem que... assumir essa responsabilidade e pra isso ele também
vai ser cobrado, então eu acho que ele tem autonomia[...] falei
Maristella Lopes Gianini
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86
teoricamente, é porque tem muito cirurgião, que acaba éh...se achando
mais importante e superior, e exigindo algumas coisas, que eventualmente,
não são possíveis naquele momento mas, éh, por isso que eu falo,
teoricamente, como deveria ser, o enfermeiro deveria ter essa autonomia
pra coordenar, o bom funcionamento do CC e agradar a todos e não
especificamente a um, cirurgião ou, ou a um funcionário, ou uma pessoa
especifica”.C3
Subcategoria: Autonomia Compartilhada do Enfermeiro.
Para alguns profissionais discorrer sobre autonomia, sofre interferência de
fatores relevantes às atividades praticadas no CC. Uma vez que o trabalho é
multiprofissional e interdependente a autonomia não é absoluta, ela é dependente.
Os relatos também apontam que a autonomia do enfermeiro sofre interferências de
profissionais que julgam ter um poder maior que os outros, principalmente da classe
médica.
“Existe sim a parte do cliente médico, existe cada profissional, embora seja
uma equipe multi.... tem um pedaço pra que tudo aconteça, eh...a gente
tem normas dentro da instituição que seguem uma legislação... expor o
paciente ao risco não tá dentro do que a instituição quer pra si, até por
conta das acreditações... a gente foi
acabou de ser acreditado pela
Canadense, então eles viram muito essa parte de você estar... que o
paciente passe por riscos desnecessários... então a gente, acaba tendo
um respaldo da diretoria médica. Existe toda a importância de como você
se colocar para a equipe médica! que você tem que ter jogo de cintura... e
tal, porque o cirurgião, ele acaba pensando que ele é o dono do doente
porque é ele que acabou trazendo,
mas se ele tiver um processo ou
alguma coisa a instituição vai responder junto e pior as vezes na mídia
você acaba tendo uma imagem prejudicada, porque as vezes você não
seguiu o que precisa... o mínimo necessário para que o paciente não
sofresse esse risco.”E1
“É, ...ele tem autonomia assim um pouco limitada né , porque depende do
cirurgião, se for um estrelão, aqueles... né... aí eles interferem muito na
Maristella Lopes Gianini
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nossa, na nossa rotina de trabalho, dando opiniões, quer que muda de
sala,... de cirurgia porque aquela sala não é adequada, aquelas
coisas...”T9
“...Autonomia do enfermeiro então,
eu acho, que ninguém é totalmente
autônomo no CC,.. ninguém, é muito entrelaçado, a coisa, porque não
existe um um personagem mais importante”.A4
“No CC eu acho que ficam um pouco.... restritos né porque ele tem que
manejar a disposição de sala, com as vontades do cirurgião, com o atraso
do cirurgião, o atraso do paciente, o atraso da internação, eu acho que
tudo isso cai neles. .A6aut limitada
Eu percebo,...que eles tem autonomia, mas poderiam ter mais autonomia,
as vezes o que a gente percebe é que eles ficam,.. éhhh muito reféns de
protocolos institucionais[...] tentando correr atrás e manter.... toda a
papelada em ordem, toda a parte administrativa em ordem, né [...]
Eu
acredito assim, que o enfermeiro do CC tem muitas atribuições, e que não
é uma coisa simples pra ele gerenciar isso, tem que ter um bom senso
enorme, tem que ter um equilíbrio enorme, tem que saber gerenciar
conflitos, então.., eu acho que..... , como é que eu vou te dizer, eu acho
que eles tem, eles tem,... eles podem,.... eles deveriam ter mais
autonomia, na minha visão. Eu acho que a instituição, ainda tolhe um
pouco o enfermeiro, isso ai , ele acaba tendo eu acho que ele é...
massacrado por atribuições, o enfermeiro do CC, tem muitas atribuições, e
as vezes eles perdem o foco um pouco”.C1 autonomia limitada
“Total, ...deveria até,... por um pouco mais em prática. Tem uns médicos
que chegam, e tem que ser daquele jeito deles e...tem que ser uma coisa
conversada né...explicar porque não vai colocar assim,...então tem que
ter...Porque querendo ou não, é ele que tá coordenando a equipe inteira
dele, e a equipe não é pequena”.T8
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6 DISCUSSÃO
A “Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos”, aprovada na
Assembléia Geral da UNESCO em 19 de outubro de 2005, coloca que a saúde não
depende apenas dos progressos da investigação científica e tecnológica, mas
também de fatores psicossociais e culturais que envolvem o ser humano e suas
relações. Também declara que a sensibilidade moral e a reflexão ética devem fazer
parte integrante do processo de desenvolvimento científico e tecnológico e que a
bioética deve ter um papel fundamental nas escolhas do que é necessário fazer.
Desta
forma
considera
que
é
necessário
desenvolver
novas
formas
de
responsabilidade social (UNESCO, 2006).
Esta pesquisa busca contribuir com a perspectiva apresentada por esse
documento, analisando o grupo social de profissionais que atuam no Centro
Cirúrgico. Inicio, assim, com a discussão sobre a composição desta equipe.
Quanto à formação da equipe os entrevistados demonstraram ter clara a
relação multiprofissional de interdependência como exigência básica para o
funcionamento da dinâmica do CC. As respostas com relação à formação da equipe
foram todas categoricamente respondidas e tão amplamente exemplificadas, de
modo não alimentar qualquer dúvida a respeito do assunto. Esta posição esclarecida
da
composição
da
equipe
do
CC
reflete
uma
consciência
coletiva
de
interdependência.
Desta forma, demonstro, na figura abaixo, a equipe do CC identificada nesta
pesquisa:
Maristella Lopes Gianini
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Enfermagem
Pessoal da
alimentação
Pessoal da
manutenção
Central de
materiais
Equipes médicas
Pessoal que vem de
fora
Clientes/
Pacientes
Maqueiro
Instrumentador
Cirurgico
Nutrição
Ascensorista
Pessoal da limpeza
Pessoal da farmácia
Pessoal da rouparia
Figura 12 - Equipe do Centro Cirúrgico
Foi também possível observar uma preocupação quanto à responsabilidade
social o que reafirma as considerações contidas na Declaração Universal sobre
Bioética e Direitos Humanos (2005) no seu artigo 5º sobre autonomia e
responsabilidade individual: “ A autonomia das pessoas no que respeita à tomada de
decisões, desde que assumam a respectiva responsabilidade e respeitem a
autonomia dos outros, deve ser respeitada.” (UNESCO, 2006).
Essas observações foram identificadas na fala dos entrevistados quando
discorriam acerca de suas percepções quanto às relações interpessoais da equipe
multiprofissional no CC, quanto ao seu caráter de interdependência profissional e a
necessidade de se respeitar o trabalho do outro.
Entretanto, para dar continuidade à discussão dessas relações interpessoais
é necessário fazer algumas considerações. O uso das palavras carrega uma
responsabilidade enorme. Como seres humanos, não podemos escapar da
linguagem. As palavras pensam por nós. Em bioética a responsabilidade de conduzir
os profissionais de saúde a refletirem sobre seus atos e suas ações constitui
atualmente um grande desafio. Nesse sentido, este estudo pôde desvelar que os
entrevistados demonstraram certa dificuldade em encontrar palavras ao emitirem
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
90
suas opiniões principalmente quando indagados sobre como percebiam os
relacionamentos interpessoais e os conflitos éticos em CC.
Desta forma, para compor esta análise, encontro na teoria dos referenciais
uma fundamentação bioética e uma linguagem mais apropriada para dar
continuidade à discussão. Hossne (2006) esclarece que a teoria dos Princípios
pautados na Beneficência, Não Maleficência, Autonomia e Justiça torna-se
insuficiente para permitir uma reflexão ético filosófica de um determinado problema e
para tanto propõe com a teoria dos referenciais as pontes de referencia para a
reflexão bioética. Com isso me aproprio de alguns referenciais citados por este autor
devido a sua maior abrangência e contextualizações para as discussões deste
estudo como sabedoria, autonomia, vulnerabilidade, responsabilidade, liberdade e
serenidade.
A história influencia o processo de formação profissional, no sentido de que a
busca dos elos históricos compreende uma construção cultural com base na
construção do conhecimento. Essa construção cultural ilustra a representação dos
valores profissionais identificados nesta pesquisa, quando se observa o respeito que
se tem com relação à cultura médica, que é milenar. Esta pesquisa identifica a forte
presença do médico no ambiente do CC e o quanto o seu comportamento e suas
ações influenciam o trabalho da equipe multidisciplinar.
Também se percebe a necessidade da equipe em falar sobre as relações
interpessoais que permeiam a rotina do trabalho no CC. Esses profissionais estão
acostumados com uma rotina complexa, de alta demanda, com prazos e horários
determinados tendo pouca oportunidade de refletir e discutir sobre como se dão
suas relações interpessoais.
Marques e Vieira (2007) relatam que o trabalho multidisciplinar é fundamental
para a promoção da dignidade do doente, e que só trabalhando em equipe é que se
consegue centralizar e dirigir as atenções dos profissionais de saúde para a pessoa.
Segundo Hossne (2007, p.127), “[...] um violinista pode atuar como solista ou
como um dos componentes de uma orquestra. Um atleta pode ser um ginasta solo
ou um membro de uma equipe de esporte coletivo”. O que também ficou
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
91
demonstrado nesta pesquisa é que os entrevistados reconhecem em alguns
médicos a característica da medicina do poder, na qual eles podem até achar que
são solistas ou ginastas solo, e agir como seres independentes. Entretanto, ao
agirem dessa forma no CC a conseqüência de suas ações causará prejuízo tanto no
seu relacionamento com a equipe, quanto riscos ao paciente, uma vez que seu
comportamento pode interferir na dinâmica de trabalho do grupo.
Neste estudo identificou-se que os relacionamentos no CC podem ser bons
ou ruins, porém todos os sujeitos buscam contribuir com exemplos para expor suas
opiniões sobre o que poderia ser considerado significativo para a melhora dessas
relações principalmente quando indicam que o objetivo maior de toda a equipe é o
êxito da cirurgia e a segurança do paciente. Relatam que quando os
relacionamentos são bons é porque encontram ações e comportamentos de
parceria, compartilhamento, educação, respeito, boa vontade e se relacionam
através de um canal de comunicação aberto e troca de informações. Já quando são
ruins, caracterizam-se pela má vontade, falta de comunicação ou comunicação
inadequada, desrespeito, incompreensão, insegurança e poder autoritário. Muitas
vezes esses momentos são marcados por situações estressantes próprias do
ambiente, situações de urgência e emergência e que levam a momentos de tensão.
O sentido de equipe e como se dão as relações interpessoais identificadas no
nosso estudo passa pelo comportamento do médico. Nas relações interprofissionais
relatadas nesta pesquisa identificam que o comportamento dos médicos
principalmente dos cirurgiões, contribuem com fatores restritivos ao relacionamento
em CC. As falas apontam que os cirurgiões são os grandes protagonistas do conflito
ético no CC, principalmente porque na maioria das vezes não sabem lidar com
limites.
Pereira Filho (1998) relata que a autonomia do médico, conquistada,
sobretudo nos séc. XIX e XX vem sofrendo profundas alterações conceituais nos
últimos 50 anos. Enquanto o médico era sujeito autônomo de todas as suas ações, a
autonomia do paciente sequer era respeitada. Como referido anteriormente onde há
assimetria de relações a bioética tem que ser discutida.
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
92
O mesmo autor coloca que hoje a relação médico paciente é muito mais
aberta e democrática, permitindo o compartilhamento da responsabilidade na
tomada de decisão. A mudança para este comportamento se deu através da
organização social e a conscientização democrática dos pacientes, o que acarretou
em uma melhor relação médico-paciente. Enquanto por um lado os pacientes
adquiriram mais autonomia, a autonomia médica sofreu prejuízos. Outros dois
fatores também são apontados pelo autor como responsáveis pela diminuição do
poder autônomo do médico: a organização empresarial da assistência médica e daí
entendem-se hospital e empresa prestadora de assistência médica (convênios); e o
avanço tecnológico.
Reafirmam-se essas considerações quando observamos,
no relato dos cirurgiões, do presente estudo, que os convênios interferem nas
relações interpessoais de forma restritiva. Este foi um exemplo apontado por eles
como limitantes de sua atuação. Em outras palavras o poder decisório saiu das
mãos do medico e foi para “empresa.” (PEREIRA FILHO, 1998).
A liberação de algum equipamento ou material necessário para a realização
da cirurgia, algum implante ou até mesmo a própria realização da cirurgia, quando
dependem de uma fonte financiadora, retira do cirurgião o poder de decidir sobre a
realização ou suspensão da cirurgia. A interdependência fica então citada pelos
cirurgiões como um fator restritivo, de forma a comprometer sua autonomia. O que
se percebe, então é que o modelo mercantilista de organização dos sistemas de
saúde colocam a decisão dos custos de uma intervenção cirúrgica nas mãos das
empresas de saúde, tornando todos os incluídos nessa decisão vulneráveis.
Na análise das relações interpessoais observadas no presente estudo, em
incluir mais um fator restritivo ao poder médico atual, que é a inclusão e participação
de
outras
disciplinas
na
área
da
saúde
reconhecidamente
necessárias,
comprometidas e capacitadas. Acredito que alguns possam achar ser mais um
prejuízo em relação ao poder médico, porém considero oportuno apontar o lado
positivo desta questão quando os resultados desta pesquisa indicam uma
interdependência profissional necessária, e sobretudo, a importância do trabalho em
equipe no CC, mesmo que esse esteja condicionado ao trabalho interdependente de
cada um. As falas são claras ao apontar que o trabalho individual de cada um não
deve atrapalhar o desenvolvimento do trabalho do outro, e, mais que isso, destaca a
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
93
base do trabalho em equipe no estabelecimento de metas, que só podem ser
alcançadas conjuntamente.
A relação hierárquica de poder, acerca das relações dos profissionais
apontados nesta pesquisa, comprovou que o profissional mais vulnerável desta
equipe é o técnico de enfermagem.
Foi relatado que a exposição do técnico de enfermagem constantemente
integrado e interagindo diretamente através da sua atuação na SO juntamente com
os anestesiologistas, cirurgiões e outros profissionais identificados na composição
da equipe, somando-se ao seu conhecimento técnico-científico, podem contribuir
para que ele seja o profissional mais vulnerável dessa escala. Isto pode acontecer
quando participam dessa dinâmica, profissionais que não reconhecem e nem
respeitam o trabalho deste profissional, bem como não respeitam a característica de
interdependência do trabalho deste setor. Nesse sentido Malagutti e Santos (2009)
afirmam que a atividade de circulação de sala, que é realizada pelo técnico de
enfermagem é bastante complexa, exigindo destreza da técnica e muita
concentração. Porém o ambiente e o comportamento da equipe podem contribuir
para o desenvolvimento de alterações do estado emocional do profissional,
influenciando assim a sua atuação dentro da SO.
Ainda como fator restritivo ao relacionamento da equipe, este estudo
identificou que a ausência do enfermeiro dentro da sala de operação traz
insegurança para a equipe como um todo e principalmente ao técnico de
enfermagem.
Apesar da observação citada anteriormente o que também ficou demonstrado
nesta pesquisa é que o enfermeiro tem um poder de trazer coesão para a equipe e
que por meio do seu comportamento e suas ações podem-se transmitir segurança e
harmonia ao ambiente do CC. Os relatos desta pesquisa apontam a ausência do
enfermeiro em SO, porém o ambiente é organizado onde há uma preocupação com
a qualidade da assistência e com a definição de tarefas, assim o respeito é apontado
como a base dessas relações.
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
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O respeito à pessoa é tema central na bioética. De acordo com Goldim
(2000), as características do princípio do respeito à pessoa são a privacidade a
veracidade e a autonomia. A utilização desses conceitos assume diferentes
perspectivas, desde as mais individualistas até as que inserem o indivíduo no grupo
social. É suficientemente indicativo do peso que se atribui aos aspectos bioéticos,
sobretudo no que diz respeito à dignidade do ser humano quando da avaliação do
comportamento do profissional. Este estudo evidencia esta análise exemplificando
alguns comportamentos no quais se percebe a assimetria da relação médicopaciente, enfermeiro-paciente, quando se impõe determinada conduta e ação sem
levar em conta a escolha do paciente ou orientá-lo a respeito. A própria condição da
prática no CC, em que é permitido interrogar questões de foro íntimo, muitas vezes
sem a privacidade necessária, assim como examinar, realizar um contato físico
necessário à proposta cirúrgica, inclusive expondo o corpo do paciente, facilita esse
tipo de falha em profissionais que não compartilham o agir ético nas relações. Com
isso observa-se também nessa pesquisa a assimetria entre médico-enfermeiro,
médico-técnico de enfermagem, enfemeiro-técnico de enfermagem.
Já a autonomia segundo Beauchamp e Childress (2002) tem diferentes
significados, tais como: auto-determinação; direito de liberdade; privacidade; escolha
individual e livre vontade. De acordo com Costa, Anjos e Zaher (2007), é possível
conferir à autonomia vários significados, variando de acordo com o olhar que se
propõe a estudá-la, ou como respeitá-las nas pessoas. Porém todas as teorias
concordam que existam duas condições essenciais à autonomia: a liberdade e a
ação.
A autonomia identificada nesta pesquisa passa pela vontade do sujeito e, na
análise das relações, as ações e comportamentos livres dos sujeitos contribuem
favorecendo as relações interpessoais ou restringindo os relacionamentos, quando
ausente.
Segundo Imanuel Kant (2005, p.21-22) nada é possível pensar sem que haja
o pressuposto de um dom natural do ser humano que é o da “boa vontade”. Porém
essa boa vontade pode ser usada para o bem através do “discernimento, argúcia de
espírito, capacidade de julgar, coragem, decisão, constância de propósito” quando o
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CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
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caráter do indivíduo for bom, mas também pode ser prejudicial quando que esta boa
vontade parte da falta de caráter.
Ao analisar as relações interpessoais do CC descritas nos resultados deste
estudo através do referencial bioético da autonomia verifica-se também a
necessidade de discutir a vulnerabilidade dos atores. Importante lembrar que
vulnerabilidade é a possibilidade de alguém ser ferido tanto no sentido físico quanto
no sentido da ofensa moral quando uma ação é realizada (ANJOS, 2006).
Segundo Anjos (2006), é necessário entender que a consciência da
vulnerabilidade do sujeito autônomo é importante para se entender melhor o próprio
exercício da autonomia. O reconhecimento da própria vulnerabilidade é ponto de
partida para uma ação reflexiva dos problemas enfrentados. Nesta pesquisa foi
possível observar a vulnerabilidade dos profissionais. Eles se percebem autônomos
quando escolhem agir de uma determinada forma frente a alguma situação quer ela
seja técnica ou relacional, mas se tornam vulneráveis quando percebem que a sua
ação individual interdepende da ação do outro e vice e versa. Dessa forma esta
pesquisa identificou profissionais vulneráveis, mesmo não tendo conferido à palavra
vulnerabilidade o exemplo das suas percepções. Foi percebido principalmente nas
falas dos enfermeiros a necessidade de se retirar estrategicamente frente a alguma
situação ou até mesmo trocar o funcionário de sala para atender a uma determinada
cirurgia. Tais atitudes ocorrem em prol do objetivo final do CC, que é atender o
paciente de forma que se obtenha êxito da cirurgia mantendo a segurança do
paciente e o ambiente em harmonia, muito embora os relatos também apontam que
posteriormente a discussão de determinada situação deva ser retomada.
O desenvolvimento científico colocou o poder dos sujeitos humanos em
evidência. O homem através do conhecimento aliado à tecnologia no CC é capaz de
realizar cirurgias antes consideradas impossíveis. Esta pesquisa evidenciou que a
classe médica ainda detém o poder e que também as enfermeiras se utilizam de
algum poder. Este sentimento de poder, segundo Anjos (2006), não é o mesmo que
autonomia, já que essa é uma expressão do poder e corresponde a uma diminuição
de espaço para se admitir a fragilidade e a vulnerabilidade. Enquanto o poder e a
vulnerabilidade andam juntos, as sociedades sofrem sem limites. É possível
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perceber, portanto, que quando os profissionais do CC se percebem vulneráveis nas
suas ações e relações de interdependência é que eles contribuem positivamente
para obter e manter uma ambiente harmônico dentro do CC. Devemos então pensar
o que perceber nossa própria fragilidade nos torna fortes (ANJOS, 2006).
Houve alguns relatos nesta pesquisa que identificaram situações em que se
observaram vozes alteradas e comportamentos desrespeitosos. Esta observação
traduz um sentido de violência que também é reafirmada por Anjos (2006) ao colocar
que a violência demonstra a insegurança do poder, e que quando se percebe esse
poder inseguro, mais o indivíduo se cerca de medo e agressividade.”
Esta pesquisa demonstrou também que a equipe do CC de um modo geral
reconhece que as reuniões científicas multiprofissionais, os protocolos assistenciais
e organizacionais são ferramentas que contribuem com a organização do serviço e
diminuem a vulnerabilidade tanto dos profissionais quanto do próprio paciente. Esta
pesquisa identificou que os profissionais trabalham embasados nos protocolos
adotados para a segurança do paciente. (COREN Segurança do paciente). colocar
ref.
Esta conduta vem sendo adotada por vários serviços, utilizando uma lista de
verificação (checklist). O Brasil tornou-se signatário dessa estratégia da Organização
Mundial da Saúde (OMS) em 2008 e através da PROQUALIS, tomou como
referencia as ações do "Programa de Segurança do Paciente da Organização
Mundial da Saúde (WHO Patient Safety) que define, como uma de suas áreas
prioritárias de atuação, as Soluções para a Segurança do Paciente, que são
promovidas,
disseminadas
e
coordenadas
internacionalmente
pelo
Centro
Colaborador da OMS (WHO Collaborating Centre). A “cultura de segurança do
paciente” se embasa em estratégias voltadas para prevenir ou reduzir o risco de
dano ao paciente decorrente do processo de cuidado de saúde inseguro. As práticas
adotadas em CC para promover a segurança do paciente sofrem quando na visão
da equipe multiprofissional a adoção de mais um documento administrativo serve
para caracterizar somente a burocracia do CC, deixando de lado a reflexão dos
benefícios desta pratica, principalmente por parte dos médicos. Descrevo a seguir
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algumas práticas recomendadas que só alcançam êxito quando há um engajamento
da liderança gerencial e clínica e de todos os profissionais envolvidos no cuidado:
Realizar o procedimento correto na parte correta do corpo
(Performance of Correct Procedure at Correct Body Site). Os casos
de procedimentos ou cirurgias na parte errada do corpo ocorrem e
são considerados totalmente evitáveis. Resultam de falhas de
comunicação e informação, além de falta de padronização nos
procedimentos. A principal estratégia para reduzir as ocorrências de
dano aos pacientes relacionadas à cirurgia é a implantação do uso
de uma Lista de Verificação (checklist), preparada por especialistas
para auxiliar as equipes cirúrgicas. A lista padroniza os itens a serem
garantidos nas seguintes etapas: antes da indução anestésica, antes
da incisão na pele e antes de o paciente sair da sala cirúrgica. Para
que obtenha êxito, essa solução requer o engajamento da liderança
gerencial e clínica, além dos profissionais envolvidos no cuidado.
(ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2010).
Esta pesquisa também visa a contribuir acerca das relações interpessoais no
CC e conflitos éticos e os comportamentos diante desses conflitos com a análise dos
códigos de ética médica e de enfermagem, pois eles são conjuntos de normas que
regulam o exercício de uma profissão incidindo sobre obrigações, responsabilidades
e direitos. Os códigos também incluem normas de caráter ético ou moral, que visam
a assegurar a integridade do profissional de caráter jurídico e administrativo para
assegurar o exercício da sua profissão (NEVES, s.d.).
Segundo Anjos e Siqueira (2007) na bioética brasileira há um ponto de
encontro entre a ética normativa e a ética aplicada, por meio das deontológias
profissionais. Tais autores relatam que os códigos antecedem ao aparecimento da
bioética, que surge em um contexto de crise da ética normativa, diante da falência
de valores universais para regrarem as condutas humanas. Fortes (1998) corrobora
com esta análise quando coloca que para a tomada de decisão ética existem duas
correntes: a dos resultados, denominada consequencialista, e a dos deveres,
denominada deontológica. O mesmo autor coloca que, na prática, as decisões são
tomadas mesclando as regras deontológicas uma vez que vêm de princípios
universais, com a avaliação das conseqüências que a ação pode implicar.
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Analisando, portanto, os códigos de ética, observamos que: a bioética tem
sido incluída nas diversas disciplinas de saúde por meio de seu conceito pluralista e
interdisciplinar. Ainda hoje, mesmo o mais recente Código de Ética Médica
(CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2010) não contempla efetivamente a
importância da interdisciplinaridade. Este código parece reforçar o critério de
independência e exclusividade profissional, que torna o médico tão vulnerável
quanto à equipe de saúde e o doente. Também não faz referencia a
interdependência necessária em algumas situações da saúde como é o caso das
atividades praticadas realizadas no CC.
A título de exemplificar esta inegável afirmação coloco a situação onde a
responsabilidade de fornecer uma caixa cirúrgica com o instrumental corretamente
esterilizado seguindo as normas específicas desse procedimento é do enfermeiro; a
responsabilidade de promover condições anestésicas necessárias ao procedimento
cirúrgico é do anestesiologistas e o procedimento cirúrgico em si é do cirurgião.
Qualquer falha de um desses profissionais durante o procedimento cirúrgico
vulnerabiliza o outro podendo trazer conseqüências ao paciente. A implicação
jurídica nesses casos pode ser de responsabilidade de todos.
Marques Filho (2006), ao dissertar sobre os processos de cassação do
exercício profissional médico do Conselho Regional de Medicina (CRM) do Estado
de São Paulo, afirma que as infrações cometidas pelos médicos condenados foram
mais por falhas eminentemente éticas do que por falhas envolvendo imperícia,
imprudência e negligencia. Desta forma coloca que é possível que uma parte
considerável dos médicos condenados tenha problemas relacionados mais ao
caráter e à honestidade do que a formação técnica.
O novo código de ética médica pouco menciona a importante característica
constatada nesta pesquisa que é a responsabilidade compartilhada que advém do
trabalho multiprofissional e interdisciplinar. Observa-se alguma menção a respeito no
XVII Princípio Fundamental do Capítulo I:
“As relações do médico com os demais profissionais devem basear-se no
respeito mútuo, na liberdade e na independência de cada um, buscando sempre o
Maristella Lopes Gianini
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interesse e o bem-estar do paciente.” (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2010,
p.8).
Nesse sentido o Código de Ética da Enfermagem aprovado pela Resolução
do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) Nº 311/2007 que entrou em vigor a
partir de 12 de maio de 2007, coloca que a responsabilidade da prática
interdisciplinar é um direito, conforme descrito na Seção II das Relações com os
Trabalhadores de Enfermagem, Saúde e Outros,
DIREITOS
Art.36 - Participar da prática multiprofissional e interdisciplinar com
responsabilidade, autonomia e liberdade.
RESPONSABILIDADES E DEVERES
Art. 38 - Responsabilizar-se por falta cometida em suas atividades
profissionais, independente de ter sido praticada individualmente ou
em equipe.
E ainda por meio dos Princípios fundamentais aponta que:
“O profissional de enfermagem participa, como integrante da equipe
de saúde [...]”.
e, no Capitulo I das Relações Profissionais
Art. 1º o enfermeiro tem por direito:
Exercer a enfermagem com liberdade, autonomia e ser tratado
segundo os pressupostos e princípios legais, éticos e dos direitos
humanos. (CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2007).
Desta forma se estabelece deontologicamente o respeito entre os
profissionais e que na visão de Pessini (2005) incorpora-se à significação do
conhecimento e do cuidado pressupondo então a “interdependência colaborativa”. O
cuidado deve ser praticado por profissionais que demonstrem através dos seus
pensamentos e atitudes, uma consciência ética e um agir bioético segundo o qual as
tomadas de decisão devam perpassar por reflexões seguindo os referenciais
bioéticos.
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
Um outro aspecto ressaltado nos resultados dessa pesquisa afirmam que o
enfermeiro é o profissional mais indicado a liderar a equipe do CC, por ter um
domínio de todas as atividades realizadas no CC, e que suas atividades devem
contemplar a administração e a assistência ao paciente cirúrgico. O enfermeiro
apontado nesta pesquisa se aproxima das características de conhecimento,
competência, sabedoria, serenidade para tomar decisões em que faça escolhas em
nível de atuação profissional, especialmente no gerenciamento de conflitos, uma vez
que no trabalho que realiza ele é o profissional que tem um relacionamento mais
direto com todos os membros da equipe.
Se observarmos que as características de um líder perpassam sempre pela
necessidade de optar e de fazer escolhas, encontro no relato de Hossne (2007) o
quanto esta tarefa é difícil. Ele coloca que fazer escolhas é sempre angustiante para
o ser humano, a tal ponto, que por vezes, preferir não ter outra opção para que não
precise escolher. Este estudo mostrou que o trabalho no CC é sempre
interdependente, portanto, os profissionais que lá atuam estão constantemente
atuando e fazendo escolhas que influenciam diretamente no outro.
Diante disso, ao discutir o papel de liderança atribuído ao enfermeiro nesta
pesquisa, é necessário discorrer também acerca da competência que é descrita
como componente funcional e operativo da autonomia moral. Certas habilidades
psicológicas são obrigatórias para a tomada de decisões autônomas, sendo que tais
habilidades se estabelecem como parte do processo de desenvolvimento cognitivo
moral do indivíduo (URBAN, 2003).
Apesar de o objetivo ser sempre o paciente, a atuação direta do enfermeiro
com o paciente na SO foi pouco relatada pelos entrevistados, principalmente pelos
enfermeiros. Os profissionais percebem sua ausência não somente diante de
alguma atividade técnica dirigida diretamente ao paciente dentro da sala, como
também através daquele papel de ponte entre todos os envolvidos na cirurgia,
trazendo inclusive segurança para a equipe. Alguns justificam essa situação de
ausência pela carga excessiva de atribuições.
Segundo Farah (2010) o número insuficiente de profissionais para atender a
demanda do serviço, leva à sobrecarga de trabalho.
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
Todavia não é possível negar que esta situação de sobrecarga de trabalho e
numero insuficiente de enfermeiros em CC está posta na maioria do Centro
Cirúrgicos.
O enfermeiro de CC enfrenta uma crise compreendida entre a racionalidade
científica do modelo biológico de assistência à saúde e seus valores culturais,
sociais e éticos. Assim, em seu cotidiano, vê-se constantemente impulsionado a
transferir e adiar suas escolhas e ideais profissionais, entre as decisões tecnocratas
sentindo-se cada vez mais, como um instrumento de controle. Esse fato vem
pesando sobre si como uma grande e constante ameaça (BONFIM, 2009).
O que se percebe, é que a enfermagem é testemunha, em seu cotidiano, de
inúmeros problemas e conflitos relativos a questões morais e éticas, tais como
atitudes e comportamentos incorretos por parte da própria enfermagem, do corpo
médico e das instituições (WALDOW, 2001).
Os resultados desta pesquisa identificaram que a enfermagem tem uma
preocupação grande em não infringir a ética e não causar conflitos. Contudo,
também é apontada como causadora de conflito ético no que diz respeito às
relações quando assumem um comportamento autoritário e de desrespeito.
Nesta pesquisa pode ser observado que o enfermeiro de CC deve se
posicionar diante de situações que ferem princípios éticos e desta forma, ele terá
condições de exercer sua autonomia com responsabilidade ao escolher o caminho
do seu crescimento, enquanto cidadão e profissional. Siqueira (2003) e Matos Junior
e Bazzano (2010) colocam que segundo a nova ética da responsabilidade proposta
por Hans Jonas substitui os antigos “Imperativos Kantianos” p. 37, “Age de tal
maneira que o principio de tua ação transforme-se numa lei universal” por “Age de
tal maneira que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a permanência de
uma vida humana autentica”.
Passos (2000) relata que no CC o importante é a rapidez das decisões, e a
eficácia da ação, podendo-se deixar de lado os valores éticos", o que também
poderia insinuar a polêmica idéia de que os fins justifiquem os meios. Portanto o
enfermeiro do CC como líder administrativo deste ambiente deve seguir a
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
responsabilidade como a capacidade individual de assumir antecipadamente pelo
que se vai fazer e ter consciência das conseqüências das suas ações e omissões.
Neste sentido, responsabilidade implica dever perante o frágil e o vulnerável, não
como mera consciência passiva, mas como o dever fazer de alguém, em resposta
ao dever ser (JONAS,1995).
Pautar-se na ética é potencializar as relações por meio da comunicação e
solução de conflitos a fim de defender e promover a vida de todos. As condutas dos
profissionais de enfermagem incidem não somente sobre o paciente visto como o
ser mais vulnerável no CC mas também na equipe que também é vulnerável.
(SELLI, 2000; ZOBOLI; SARTÓRIO, 2006).
Em bioética, a conduta ética resulta de um discernimento em que é
importante ter consciência do ponto de vista que se assume. Desta forma, obtém-se
através da contraposição ou soma de diferentes pontos de vista, a qualidade da
verdade ética. Hossne (2007) contribui com esta afirmação quando coloca que ao
refletir sobre dilemas e conflitos é necessário identificar o “depende”, e aí permitir o
equacionamento adequado, pondo em jogo a competência, e sobretudo, a crítica
fundamentada no interesse do outro ou de outrem. Esta consideração se tornou
necessária nesta pesquisa uma vez que houve questionamentos sobre conflitos
éticos e as perguntas não consideraram somente o julgamento dos entrevistados
sobre eles mesmos ou indivíduos da mesma categoria profissional. As perguntas
buscavam também as opiniões a respeito de outras categorias profissionais, de
modo que somando-se as respostas ou observando as contraposições chegou-se a
essa analise.
As falas apontam que o enfermeiro tem de utilizar a sua autonomia baseada
no seu conhecimento técnico científico, nas suas habilidades de relacionamento
interpessoal sem prejudicar ou agradar quaisquer que sejam as pessoas ou os
motivos.
A autonomia do enfermeiro é condicionada também à necessidade de
tomadas de decisões para que a dinâmica de funcionamento do CC não seja
prejudicada. Cabe a ele promover condições de trabalho adequadas para a equipe
Maristella Lopes Gianini
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
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multiprofissional bem como para prever e atuar em qualquer situação que ofereça
risco ao paciente.
O papel da instituição mediante à compreensão do trabalho que é realizado
pelos enfermeiros no CC, também define ou não o poder a lhe ser conferido para
que possa exercer suas atividades no CC com mais autonomia.
Aliada a essas condições o que se identifica na nossa pesquisa é a
autonomia relacional que revela a nossa habilidade de nos relacionarmos com os
outros e nos mantermos nessas relações. De algum modo nossa autonomia é
paradoxal uma vez que nossa independência se faz por intermédio da
interdependência com outras pessoas. Se reconhecer como ser vulnerável nos leva
a elaborar decisões tendo em vista os limites e condicionamentos da nossa própria
liberdade (ANJOS, 2006).
Atualmente o conhecimento é tão abrangente e ao mesmo tempo fracionado
que carece do respeito multiprofissional (PESSINI, 2005, p.11):
O conhecimento científico se apresenta hoje como um conjunto de
especializações, por vezes desconexas, em que acabamos sabendo
sempre mais de cada vez menos, até chegarmos a saber quase tudo
de quase nada. É um paradoxo! Esse conhecimento dificilmente
transforma-se em sabedoria, se não honrar a contribuição da
perspectiva multidisciplinar.
O conhecimento de uma disciplina deve vir a somar nas outras para que o
cuidado se torne eficiente. A respeito disso, Sá (2010) coloca que o mundo de hoje
exige não só o conhecimento técnico, mas também que a nossa inteligência seja
avaliada do ponto de vista emocional e no êxito das relações humanas. O conceito
de qualidade na área da saúde data do séc. XXI e está permeado por questões que
envolvem o emocional humano, o trabalho em equipe, a re-aproximação do
indivíduo aos valores humanos e à diminuição da intolerância em relação às
diversidades.
A análise bioética em uma pesquisa qualitativa requer um cuidado especial
para que um determinado conceito não se feche nele mesmo e ao seu autor. Não
Maristella Lopes Gianini
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
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deixando de respeitar o rigor metodológico utilizado nesta pesquisa, mas ao
considerar o fato de que vivemos em uma era pós-moderna causada por um colapso
geral da confiança no poder da razão, é que concordo com a opinião de Campos
(1997) quando coloca que uma mesma situação pode ter várias verdades. Assim, o
movimento que acontece atualmente é no sentido de que não há mais a verdade
fundamental, da qual não se pode abrir mão.
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho possibilitou estudar o relacionamento Interpessoal da equipe do
CC sob a ótica da Bioética.
Os referenciais bioéticos abordados ao longo de toda a pesquisa serviram de
base de sustentação das discussões, onde todas as condutas dos profissionais
incidem umas sobre as outras.
Este estudo trabalhou no universo da equipe multiprofissional do CC com
enfoque maior no enfermeiro e suas atitudes. Considerando que o princípio da
autonomia remete ao respeito mútuo e às relações que permeiam o trabalho desta
equipe podemos afirmar que as observações feitas por eles referindo-se a uma
determinada categoria profissional também foram observadas e analisadas como
referência aos outros.
O CC é local de grandes desafios para o homem. Não somente do ponto de
vista técnico cientifico como também das relações humanas que o constituem. A
ética também é uma dimensão fundamental na busca da humanização tão ncessaria
nos dias de hoje. O termo humanização vem sendo utilizado no âmbito da saúde,
sobretudo no que se refere à forma como está sendo tratada a pessoa doente nos
hospitais. Humanizar o cuidar é dar qualidade à relação do profissional da saúde e
paciente, acolhendo suas angústias diante de sua fragilidade (PESSINI et al., 2003).
É importante, também, ressaltar que a bioética e a ética postulam uma
atuação dos profissionais da saúde mais humanizada, focada na relação profissional
com o paciente. Contudo não se pode deixar de lembrar que as relações
interprofissionais vão influenciar diretamente o cuidado, já que no CC todas as
atividades se relacionam.
Neste estudo, os relatos que emergiram dos sujeitos entrevistados foram
organizados em categorias e os resultados permitiram as seguintes conclusões:
- A equipe do CC é multiprofissional e atua de forma interdependente.
- O CC mais especificamente a sala de cirurgia é o único local do hospital
onde de forma rotineira trabalham profissionais de diferentes formações técnicas ao
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
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mesmo tempo com um único paciente, onde a ação de um profissional dependente
da ação do outro.
- Os relacionamentos são bons quando se cultiva uma cultura de
responsabilidade compartilhada, de boa vontade, solidariedade, respeito e harmonia.
- Os relacionamentos são ruins quando se identifica má vontade, imposições
autoritárias e atitudes individualistas.
- O enfermeiro é apontado como o profissional mais bem preparado para
liderar o CC e trazer coesão e harmonia para a equipe. Ele é referência dentro da
equipe multiprofissional
- As decisões devem ser tomadas e justificadas. É reconhecida a importância
de um conjunto de comportamentos e documentos, bem fundamentados (protocolos
institucionais), que respaldam as decisões profissionais.
- A abordagem acerca de conflitos éticos causou um certo desconforto sobre
os sujeitos desta pesquisa e ao mesmo tempo trouxe relatos de que essa temática
necessita ser melhor identificada e exploradas.
- Os médicos são identificados como o grupo que com maior freqüência
causam os conflitos éticos e os problemas de relacionamentos, especialmente os
cirurgiões.
- A fragilidade da estrutura hospitalar, caracterizada pela sobrecarga de
trabalho, devido ao número insuficiente de profissionais corrobora com a limitação
da atuação do enfermeiro no CC especialmente em sua dimensão assistencial em
SO, porém há necessidade de maior investigação quanto ao fato dos próprios
enfermeiros não mencionarem essas atividades em suas falas.
Analisar uma reflexão sobre conflito ético apenas sob o referencial do código
de ética, que essencialmente é deontológico, pode levar a uma visão distorcida e
muito restrita da questão ética implicada. Portanto, deve ser imperativa a construção
da reflexão bioética, porém não se pode esquecer de que as ações de enfermagem
estão intrinsecamente ligadas à responsabilização profissional. Portanto, é preciso
que os profissionais de enfermagem estejam capacitando-se, científica, técnica e
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
humanamente, para cumprir com esses direitos e atender às necessidades, ou seja,
prestar assistência com isenção de danos ou com sua minimização (FREITAS et al,,
2005).
Assim sendo, o aprofundamento do domínio da bioética e seus referenciais
por parte do enfermeiro deverá contribuir para uma maior exigência de reflexão
acerca do seu modo de agir. O enfermeiro de CC embasado nos referenciais
bioéticos como a sabedoria, autonomia, vulnerabilidade, responsabilidade, liberdade
e serenidade devem entender que suas ações precisam ser construídas seguindo
essa base de raciocínio. Com isso direitos, deveres, valores, compromissos éticos,
devem ser as linhas gerais que governam a sua conduta.
O profissional do CC percebe que faz parte de uma equipe e que as relações
interpessoais no CC refletem na assistência. É através do seu auto-conheciemento
reconhecendo suas forças e suas fraquezas e percebendo sua própria fragilidade e
vulnerabilidade, que este profissional se tornará forte e competente para atuar. Deve
também conhecer as atribuições dos outros profissionais para reconhecer e atuar
frente a interdependência.
Existem muitas questões éticas e bioéticas a serem trabalhadas e refletidas
em torno das práticas no CC e pelos membros que os integram. Este ambiente que
constantemente sofre transformações sociais e tecnológicas necessita ser melhor
investigado, abrir-se ao diálogo e ao conhecimento da sociedade.
Os resultados desta pesquisa permitem afirmar que no CC o trabalho em
equipe é imperativo, as relações são difíceis, mas podem melhorar quando o
respeito e o reconhecimento de sua vulnerabilidade forem a base dos
relacionamentos.
Apontado como profissional mais apto a liderar e trazer coesão à equipe no
CC, o enfermeiro necessita de competência e habilidades próprias para saber lidar
com conflitos e trazer segurança para todos. Sugiro então que ele procure embasar
suas ações e decisões através do que Hossne (2007) coloca que é exercício da
bioética: liberdade para optar por valores freqüentemente em conflito, a ausência
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
de julgamentos preconceituosos, humildade para respeitar o outro e grandeza para
alterar a opção caso ela se mostre equivocada.
O enfermeiro experiente, atualizado, com conhecimento técnico científico para
prestar uma assistência de qualidade e segurança, conhecimento administrativo
para gerenciar as atividades realizadas, uma grande capacidade de trabalhar em
equipe e uma boa comunicação interpessoal, deve assumir uma espécie de ponte
entre todos os envolvidos na dinâmica do CC, inclusive com o próprio paciente.
De acordo com Anjos (2006), o desenvolvimento científico põe em evidência o
poder dos sujeitos humanos, em sua capacidade racional e operacional. Assim o
desenvolvimento do conhecimento humano coloca o saber como a forma mais
importante de poder, mas o poder não é o mesmo que autonomia, embora a
autonomia seja uma forma de poder muito valorizada no mundo moderno. O
enfermeiro do CC deve ter muito claro que o fato de ele ser líder de coesão e
harmonia no CC não lhe confere o poder sobre a autonomia dos membros da
equipe. Ele tem de ter consciência que sua autonomia está sempre relacionada com
as conseqüências de sua atuação de modo que sua conduta e tomadas de decisão
devam sempre ser buscadas através do seu discernimento, do equilíbrio e da boa
vontade em decidir para o bem.
Devemos discutir a importância do papel da enfermagem no CC e sua
visibilidade diante da sociedade. A enfermagem ainda não tem a verdadeira noção
do quanto à sociedade depende dela e de qual é o seu poder. Um hospital e mais
diretamente o CC, não funciona sem a enfermagem. Ela não entra apenas na
segurança e no cuidado do paciente, ela é a engrenagem de todo movimento no CC.
Para tanto, é também urgente que os administradores reconheçam este profissional.
O trabalho realizado pelo enfermeiro, do ponto de vista da equipe, não é
congruente com a expectativa institucional. O que ficou demonstrado nesta pesquisa
é que a instituição quer gerenciamento, mas a equipe quer também participação na
assistência dentro da SO. É preciso que as instituições percebam que a equipe do
CC identifica no enfermeiro a ponte técnico-administrativa e das relações que
permeiam todo o trabalho realizado no CC. Para tanto, e necessário oferecer
condições para que esse profissional possa atender essa expectativa. O contingente
Maristella Lopes Gianini
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
de pessoal de enfermagem, principalmente de enfermeiros é insuficiente para
atender essa necessidade. Também o número insuficiente de técnicos e
anestesiologistas dificultam a atuação do enfermeiro diante da distribuição de salas.
Diante dessa situação é premente que esse olhar administrativo seja revisto.
Este estudo propõe que o enfermeiro do CC, esteja embasado em
referenciais bioéticos para guiar sua conduta e nortear suas tomadas de decisão, de
modo a poder atuar como Ponte entre os saberes nas Relações Multiprofissionais.
Uma vez que esta pesquisa aponta que as relações interpessoais interferem
no ambiente e também na qualidade da assistência prestada ao paciente cirúrgico,
acredito que o enfermeiro deva fazer esse papel de ponte de ligação entre todos os
profissionais que atuam no CC. Desta forma no ambiente do CC onde a saúde
enfrenta tantos desafios e onde tantos profissionais se encontram para realizar um
trabalho interdependente, é imperativo que exista alguém que possa cumprir esse
papel.
A visão bioética neste sentido transforma o enfermeiro em agente que
agrega e contribui positivamente para a manutenção da harmonia das relações e do
trabalho em equipe.
A posição ideal do profissional autônomo no CC é aquela quando o
enfermeiro percebe que algumas decisões dependem de critérios médicos e quando
os médicos percebem que algumas decisões também dependem de critérios de
enfermagem e que ambos influenciam e são influenciados pelo trabalho de toda a
equipe.
Nada substitui o que se assimila no contato direto com o paciente, com o
ambiente de trabalho e com as relações sociais. A competência resulta do
conhecimento
e
da
experiência.
A
disciplina teórico-prática e mesmo a
especialização em CC não pode ser aprendida apenas em laboratório, com poucas
atividades práticas, ou por meio de livros e palestras. O aprendizado do enfermeiro
em CC tem que ser basicamente prático. Acredito que através do modelo de
residência poderemos proporcionar o aprendizado prático do enfermeiro no CC
aliado a princípios e referencias bioéticos, contribuindo, assim, para preparar melhor
esse enfermeiro a enfrentar seu futuro profissional no CC.
Maristella Lopes Gianini
110
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
Observa-se que determinantes históricos e situacionais promovem o avanço e
o retrocesso no modelo de estrutura do CC centrado no cirurgião. Porém só se
avança quando se incorpora uma ação interdisciplinar com reconhecimento dos
saberes convergentes e a responsabilidade compartilhada.
Maristella Lopes Gianini
111
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
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120
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu,________________________________________,RG_________________,
abaixo assinado, concordo em participar do estudo intitulado “ O Enfermeiro e o
Relacionamento Interpessoal da Equipe do Centro Cirúrgico – Uma Reflexão a Luz
da Bioética” que será desenvolvido pela pesquisadora Maristella Lopes Gianini, sob
a orientação da Profª Drª Luciane Lucio Pereira e co-orientação do Prof. Dr. Pe.
Marcio Fabri dos Anjos, com o objetivo de analisar o relacionamento inter-pessoal da
equipe multiprofissional que atua no Centro Cirúrgico; Identificar a valorização
atribuída ao enfermeiro do Centro Cirúrgico e analisar a autonomia do enfermeiro
dentro da equipe do Centro Cirúrgico, em situações de dilemas e/ou conflitos éticos.
Fui devidamente informado(a) e esclarecido(a) pela pesquisadora, de forma clara e
detalhada, livre de qualquer coerção sobre a pesquisa e os procedimentos nela
envolvidos. Sei que serei entrevistado e a mesma será gravada em dispositivo
próprio para a utilização apenas nesse estudo.
Fui igualmente informado(a) que:
-
terei
liberdade
de
solicitar
a
qualquer
momento
esclarecimentos sobre o estudo;
-
estará garantida a retirada de meu consentimento a
qualquer momento, sem que isto leve a qualquer penalidade;
-
será
preservada
minha
identidade,
permanecendo
confidencial nos dados coletados;
-
as informações obtidas serão analisadas em conjunto a
dos demais pesquisados;
-
terei o direito de saber a qualquer momento, sobre os
resultados parciais da pesquisa;
-
não
correrei
quaisquer
riscos
quanto
da
minha
participação nesta pesquisa, principalmente no que se refere a
minha atuação profissional;
Maristella Lopes Gianini
121
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
-
não existirão despesas pessoais em qualquer fase do
estudo, nem qualquer compensação material ou financeira
relacionada à minha participação;
Qualquer dúvida entrar em contato com a pesquisadora Maristella Lopes Gianini,
pelo telefone (11) 5549-1520 ou celular (11) 9217-8218, ou pelo email
[email protected].
Em caso de qualquer problema ético entrar em contato com o Comitê de Ética em
Pesquisa do Centro Universitário São Camilo pelo telefone (11) 3465-2669
Local e data___________________________,________/___________.
Assinatura do sujeito de pesquisa.:_________________________________
Assinatura da pesquisadora.:______________________________________
Maristella Lopes Gianini
122
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
CIRÚRGICO – UMA REFLEXÃO À LUZ DA BIOÉTICA
APÊNDICE B
ROTEIRO DA ENTREVISTA
Código do Entrevistado:__________.
Idade: ________anos.
Sexo:______________.
Formação profissional:________________________________________________.
Tempo de formado:__________________________________________________.
Tempo que trabalha em CC:___________________________________________.
Tempo que trabalha na instituição:_______________________________________.
Outros Locais de trabalho:_____________________________________________.
Funções que desempenha:____________________________________________.
1 – Pra você quem é a equipe do CC?
2 – Como você percebe o relacionamento interpessoal da equipe multiprofissional
que atua no CC, quais os fatores condicionantes (restritivos e promotores)?
3 – Em sua opinião qual o papel do enfermeiro nesta equipe?
4 – Você identifica situações de conflito ético no trabalho desta equipe?
Sim ou Não?
Quais?
5 – Em sua opinião como você percebe a atuação do enfermeiro diante destas
situações?
6 – Como você identifica a autonomia do enfermeiro?
7 – Você gostaria de fazer mais alguma colocação a respeito do que já foi falado?
Maristella Lopes Gianini
O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
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ANEXO A
Carta de Princípios das Entidades Camilianas:
A Província Camiliana Brasileira da Ordem dos Ministros dos Enfermos Padres e Irmãos Camilianos - declara publicamente seu compromisso de fidelidade
aos ideais do fundador, São Camilo de Léllis, atualizando seu carisma e
espiritualidade para servir, com amor evangélico e competência profissional, às
novas gerações em suas múltiplas necessidades, dando atenção preferencial aos
mais carentes e excluídos da sociedade.
A missão profética que herdamos do nosso fundador, e que somos chamados
a levar adiante, consiste em "testemunhar no mundo o amor sempre presente de
Cristo para com os doentes", no respeito e na defesa incondicional dos valores
humanos, cristãos e católicos. Em conformidade com esta missão, os Camilianos
dão ênfase especial à valorização da vida e da saúde, da pessoa humana, de seus
profissionais, e à competente e fiel administração de suas obras.
Quanto à valorização da vida e da saúde, os Camilianos, seus profissionais e
respectivas entidades respeitarão todas as suas dimensões - biológica, psíquica,
social e espiritual. Empenhar-se-ão em promovê-las e cuidá-las, até o limite de suas
possibilidades, segundo os valores éticos, cristãos e eclesiais, dentro de uma visão
holística e ecumênica, repudiando tudo quanto possa agredir ou diminuir sua plena
expressão.
Quanto à valorização da pessoa, as entidades camilianas caracterizar-se-ão
pelo reconhecimento e defesa da dignidade fundamental de todos os seres
humanos, criados à imagem e semelhança de Deus. Os que atuam em instituições
camilianas deverão primar pela atenção, pelo respeito, cuidado personalizado e
amor efetivo para com todos os que utilizarem seus serviços, sem discriminação.
Quanto à valorização de seus profissionais, as entidades camilianas
reconhecerão neles seu principal e verdadeiro patrimônio, conscientes de que é por
seu intermédio e graças à sua dedicação que serão preservados os valores ora
professados em favor da vida e saúde da pessoa humana. Cientes do seu valor, as
entidades camilianas desenvolverão e aplicarão uma política de recursos humanos
que possibilite, de forma integrada, o desenvolvimento, a capacitação profissional e
a formação espiritual de seus profissionais, propiciando um clima de união,
fraternidade e co-responsabilidade entre todos os integrantes de suas instituições
assistenciais, educacionais, sociais e religiosas. A eles seja oferecida e incentivada
também a oportunidade de envolvimento na saúde comunitária e no engajamento
voluntário.
Quanto à administração, as entidades camilianas empenhar-se-ão na busca
incessante de conhecimentos humanos, éticos, científicos, tecnológicos e pastorais
capazes de garantir a utilização racional dos recursos disponíveis em benefício da
humanização e da qualidade dos serviços na comunidade, segundo o ideal de São
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O ENFERMEIRO E O RELACIONAMENTO INTERPESSOAL DA EQUIPE DO CENTRO
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Camilo. Além da excelência administrativa, as entidades camilianas terão sempre
presente o compromisso fundamental de respeito e preservação dos valores que
professamos, colocando-se efetivamente a serviço da vida e da saúde das pessoas,
sobretudo as mais carentes e excluídas, e valorizando seus profissionais. Dessa
forma, a administração não terá um fim em si mesma, mas será um excelente
instrumento para a viabilização da visão cristã de valores no mundo da saúde, bem
como para o exercício eficiente e eficaz do carisma camiliano, tornando-nos agentes
de transformação.
As entidades camilianas estudarão e estabelecerão estratégias adequadas
que possibilitem a avaliação de seus recursos e energias, para desenvolvê-los
sempre mais, respeitadas suas respectivas áreas de atuação social, assistencial e
educacional. Elas buscarão a integração, sinergia de esforços e recursos, mútua
ajuda e colaboração, parcerias em áreas afins, fortalecendo-se na unidade e na
missão, em vista da promoção e construção de uma sociedade mais saudável, justa
e solidária.
Fonte: www.camilianos.org.br
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ANEXO B
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ANEXO C – REGIMENTO INTERNO CENTRO CIRÚRGICO
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ANEXO D - CARTA DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA (COEP) DO CENTRO
UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO
Maristella Lopes Gianini
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centro universitário são camilo