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Ano II – Edição I – Maio 2010
O DESAFIO DA EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS NOS CURRICULOS E
NAS PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
Ana Carolina Corrêa1
RESUMO
O presente artigo pretende refletir sobre a urgente e necessária efetivação da
educação em direitos humanos como parte integrante do currículo e das práticas
cotidianas na educação superior, sendo a mesma, um dos eixos fundamentais para
a construção de uma sociedade justa, igualitária e democrática.
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Ana Carolina Corrêa é Pedagoga formada pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora,
especializada em Pedagogia Empresarial pela Faculdade Estácio de Sá e acadêmica do 4° período
de direito pelo Instituto Vianna Júnior. Atua como Supervisora Pedagógica do município de Santos
Dumont. Endereço: Rua Waldemar Silva, 722, bairro São Sebastião, Santos Dumont, Minas Gerais.
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A preocupação com a educação em direitos humanos tem se afirmando com maior
força no país, no âmbito das políticas públicas e na esfera das organizações da
sociedade civil e, sem dúvida, a implementação do Plano Nacional de Educação em
Direitos Humanos (PNEDH - 2006) tem exercido uma função relevante de
referência, estímulo, apoio e viabilização de diversas atividades.
É a partir disso que emerge para as instituições de ensino superior o desafio de
realizar a educação em direitos humanos. Este é um desafio curricular e
extracurricular, teórico e prático. E, também, um desafio no terreno das pesquisas
acadêmicas que se debruçam sobre o assunto.
PALAVRAS-CHAVE:
EDUCAÇÃO
SUPERIOR.
DIREITOS
HUMANOS.
DEMOCRACIA.
INTRODUÇÃO
Vistos como “possibilidade de transformação” da sociedade, os jovens
participam das mudanças políticas e culturais de sua época. Atualmente, vivemos
um tempo de grandes mudanças, assistimos a importantes transformações
históricas e encontramo-nos frente a um processo de globalização que tem
produzido uma reorganização das formas de pensar, de se relacionar, de intervir
socialmente e comunicar-se.
Dentro deste contexto, a educação superior exerce um papel fundamental,
pois é considerada como uma das principais instituições de socialização e tem sido
uma importante arena de luta entre diferentes projetos políticos ideológicos da
sociedade. Ao mesmo tempo em que as instituições de ensino superior têm exercido
papel decisivo no processo de redemocratização da sociedade, no seu interior
ocorre um intenso processo de recontextualização frente às mudanças que têm
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ocorrido no seu entorno e, também, segundo a maneira como os jovens nela
ingressam (vide programas de inclusão universitária), atuam e interagem.
Tendo presente esse novo cenário, é importante que as instituições de ensino
superior promovam mudanças de mentalidades a partir de valores e práticas
baseados na solidariedade e na participação cidadã. Torna-se necessário, conceber
a cidadania como uma prática social cotidiana, que perpassa os diferentes âmbitos
da vida, numa progressiva ampliação do seu horizonte, na perspectiva de um projeto
diferente de sociedade e humanidade, conforme (Lucinda, apud, Candau, 2000).
Daí, faz-se necessário promover uma educação baseada nos princípios dos
direitos humanos, que não se dará por meio de receitas ou recomendações, mas
possivelmente a partir de uma proposta educativa que considere a faculdade ou
universidade como espaço de formação de sujeitos para serem construtores ativos
da sociedade em que vivem e exercem sua cidadania.
Propomo-nos aqui o desafio de abordar alguns aspectos relacionados com a
questão da educação em ⁄ para os direitos humanos e a cidadania, a partir do Plano
Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH1) para educação superior.
DESENVOLVIMENTO
O Estado brasileiro tem como pilar a afirmação dos direitos humanos como
universais indivisíveis e interdependentes e, para que os mesmos sejam reais, todas
as políticas públicas precisam incluí-los na busca incansável da construção de uma
sociedade fundamentada na promoção da igualdade de oportunidades e da
eqüidade, no respeito à diversidade e na consolidação de uma cultura democrática e
cidadã.
Nesse sentido, se torna urgente e necessário educar em direitos humanos, em todos
os níveis e modalidades de educação, na educação básica, na educação superior,
1 O PNEDH é um documento de referência para essa área no país, pois considera a educação como
um meio privilegiado na promoção dos direitos humanos. O documento compreende a educação em
direitos humanos como um processo sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito
de direitos.
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na educação não-formal, na educação dos profissionais do sistema de justiça e
segurança e na mídia, conforme destaca o PNEDH (2006).
No âmbito da educação superior, a conquista do Estado Democrático de Direito
traçou, para as instituições de ensino superior, o desafio da participação e
construção de uma cultura de promoção, proteção, respeito e reparação dos direitos
humanos, através de ações interdisciplinares, com formas diversas de relacionar as
múltiplas áreas do conhecimento humano com seus saberes e práticas.
Historicamente, a reflexão acerca dos direitos humanos e da formação para
cidadania vem alcançando maior amplitude e relevância no Brasil, a partir das
décadas de 1980 e 1990, por meio de proposições da sociedade civil organizada e
de
ações
governamentais no
campo das
políticas
públicas,
visando
ao
fortalecimento da democracia.
A democracia, é entendida como regime alicerçado na soberana popular, na
justiça social e no respeito integral aos direitos humanos, ou seja, é fundamental
para o reconhecimento, a ampliação e a concretização dos direitos.
Esse movimento discussão sobre os direitos humanos, teve como marco
fundamental a Constituição Federal de 1988, que formalmente consagrou o Estado
Democrático de Direito e reconheceu, entre seus fundamentos, a dignidade da
pessoa humana e os direitos ampliados da cidadania (civis, políticos, econômicos,
sociais, culturais e ambientais). O Brasil passou a ratificar os mais importantes
tratados internacionais1 (globais e regionais) de proteção dos direitos humanos, além
de reconhecer a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do
Estatuto do Tribunal Penal Internacional.
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Decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF), em 3 de dezembro de 2008, mudou o estatuto
legal das convenções internacionais de direitos humanos das quais o Brasil é signatário. Antes
tinham o valor de lei, segundo a Constituição, mas desde a decisão são supralegais (nenhuma lei
brasileira pode contrariar tais convenções), embora infraconstitucionais. Votação apertada: cinco
votos (capitaneados pelo entendimento do Ministro Gilmar Mendes) contra quatro votos
(capitaneados pelo entendimento ainda mais radical do Ministro Celso de Mello querendo dar estatuto
constitucional a tais convenções), caráter supranacional. Tal decisão é histórica, porém, teve parca
divulgação, demonstrando o abismo entre legislação e vida concreta no Brasil. Mas está em vigor,
sendo um tremendo avanço na questão dos direitos humanos em nosso país, além de exemplo para
outras nações.
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Além disso, a Constituição Federal trouxe a autonomia universitária (didática,
cientifica, administrativa, financeira e patrimonial) para as instituições de ensino
superior, pautando-se no principio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão.
Também a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal n°
9.394/1996) no artigo 3° define, como finalidade para a educação superior, a
participação no processo de desenvolvimento a partir da criação e difusão cultural,
incentivo à pesquisa, colaboração na formação continua de profissionais e
divulgação dos conhecimentos culturais, científicos e técnicos produzidos por meio
do ensino e das publicações, mantendo uma relação de serviço e reciprocidade com
a sociedade.
A Constituição Federal Brasileira e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, afirmam o exercício da cidadania como uma das finalidades da educação,
ao estabelecer uma prática educativa "inspirada nos princípios de liberdade e nos
ideais de solidariedade humana, com a finalidade do pleno desenvolvimento do
educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho".
A partir desses marcos legais, e do PNEDH, as instituições de ensino superior
brasileiras, em seu papel de instituições sociais irradiadoras de conhecimentos e
práticas novas, assumiram o compromisso com a formação critica, a criação de um
pensamento autônomo, a descoberta do novo e a mudança histórica.
As atribuições constitucionais da universidade nas áreas de ensino, pesquisa
e extensão afirmam sua missão de ordem educacional, social e institucional. A
produção do conhecimento é o motor do desenvolvimento cientifico e tecnológico e
de um compromisso com o futuro da sociedade brasileira, tendo em vista a
promoção da justiça social, da democracia, da cidadania e da paz.
O Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos (ONU, 2005) ao
propor a construção de uma cultura universal de direitos humanos por meio do
conhecimento, de habilidades e atitudes, aponta para as instituições de ensino
superior a nobre tarefa de formação de cidadãos (as) hábeis para participar de uma
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sociedade livre, democrática e tolerante com as diferenças étnico-racial, religiosa,
cultural, territorial, físico-individual, de gênero, de orientação sexual, de opção
política, de nacionalidade, dentre outras.
Diante disso, o PNEDH torna-se um referencial indispensável para as
instituições de ensino superior que se comprometam a trabalhar em defesa,
respeito, promoção e valorização dos direitos humanos.
A implementação do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos visa,
sobretudo, difundir a cultura de direitos humanos no país. Essa ação prevê a
disseminação de valores solidários, cooperativos e de justiça social, uma vez que o
processo de democratização requer o fortalecimento da sociedade civil, a fim de que
seja capaz de identificar anseios e demandas, transformando-as em conquistas que
só serão efetivadas, de fato, na medida em que forem incorporadas pelo Estado
brasileiro como políticas públicas universais. (PNEDH, 2006, p.18).
Porém, recai aqui uma pergunta: como realizar a educação em direitos
humanos na educação superior e, ainda, como introduzir essa cultura de promoção
e respeito aos direitos humanos nos currículos e na prática educativa cotidiana.
Segundo as orientações do PNEDH, no ensino superior, a educação em
direitos humanos pode ser incluída por meio de diferentes modalidades , tais como,
disciplinas obrigatórias e optativas, linhas de pesquisa e áreas de concentração,
transversalização no currículo e no projeto político pedagógico, entre outros. Na
pesquisa, as demandas de estudos na área dos direitos humanos requerem uma
política de incentivo que institua esse tema como área de conhecimento de caráter
interdisciplinar e transdisciplinar. No dia-a-dia é necessário não apenas ensinar e
aprender em direitos humanos, mas vivenciá-los.
Contudo, as atividades acadêmicas devem voltar-se para a formação de uma
cultura baseada na universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos
humanos, como tema transversal e transdisciplinar, de modo a inspirar a elaboração
de programas específicos e metodologias adequadas nos cursos de graduação e
pós-graduação.
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Portanto, incluir a educação em direitos humanos na esfera da educação
superior é um grande desafio, entretanto, tornar esse projeto de sociedade possível
é urgente e necessário se considerarmos o atual contexto de desigualdade e
exclusão social, mudanças ambientais e agravamento da violência, que coloca em
risco permanente a vigência dos direitos humanos.
As instituições de ensino superior precisam responder a esse cenário,
contribuindo não só com a sua capacidade critica, mas também com uma postura
democratizante e emancipadora que sirva de parâmetro para toda a sociedade.
CONCLUSÃO
Ao finalizarmos estas reflexões, frisamos que a luta pelos direitos humanos se
dá no cotidiano, no nosso dia-a-dia, e afeta profundamente a vida de cada um de
nós e de cada grupo social. Não é a mera convicção teórica que faz com que os
direitos sejam realidades.
Um dos aspectos cruciais da introdução da educação em direitos humanos na
educação superior está relacionado à articulação entre o currículo e as pesquisas
dessa temática. Em geral, a fragmentação do currículo nas diferentes disciplinas, o
isolamento entre os professores, a falta de incentivo à pesquisa e a extensão não
são elementos facilitadores. Ao contrário, representam impasses a serem
trabalhados e não podem ser desconsiderados.
Assim sento, não pretendemos reforçar a reflexão que enxerga a inclusão dos
direitos humanos na educação apenas como uma mudança curricular. Na verdade,
quando propomos a educação em direitos humanos, é preciso começar por praticálos. Não existe projeto educativo eficaz nesse âmbito sem intenso compromisso
social por torná-lo realidade.
No entanto, uma instituição de ensino superior que se comprometa com a
educação em direitos humanos deve debruçar-se nas questões relativas ao tema e
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envolver a totalidade do corpo docente, a fim de assumirem uma postura condizente
com a proposta. A educação em direitos humanos compromete a proposta educativa
da instituição como um todo e questiona não somente os conteúdos pedagógicos
como as práticas que diariamente a instituição mobiliza. Envolver os professores
numa prática coletiva, favorecer que reflitam sobre a relação dos conteúdos de suas
disciplinas com os direitos humanos, mesmo quando parecem não ter nenhuma
relação direta, representa um grande desafio.
Nesse caminho, a ética da solidariedade não pode ser separada da luta pela
justiça e a transformação social, e para que possam ser desenvolvidas é
fundamental que a instituição promova experiências que ultrapassem seus próprios
muros, oferecendo contatos com diferentes realidades sociais, onde os direitos são
freqüentemente violados e ações desenvolvidas na perspectiva da denúncia e da
promoção dos direitos humanos.
Em definitivo, enfatizamos que a proposta da educação em direitos humanos
precisa articular teoria e pratica. A educação em direitos humanos tem contribuído
para a conscientização e compreensão mais amplas possíveis dos conceitos e
valores consagrados da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da
Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente, entre outras
legislações vigentes. O desafio é promover processos e atitudes que levem a
despertar a consciência e estimular o sentimento de co-responsabilidade dos jovens
pela vida em sociedade.
E para que isso se torne realidade, é importante o
envolvimento dos universitários em ações, projetos e movimentos sociais concretos.
Sem dúvida, educar em direitos humanos é um meio de conscientizar sobre a
necessidade e importância da participação cidadã na construção de uma sociedade
mais solidária, justa e democrática, onde os direitos humanos sejam parte das
atitudes e ações cotidianas dos nossos jovens.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
______. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n° 8.069/90, de 13 de julho de
1990.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n° 9.394/96, de 20 de
dezembro de 1996.
______. Secretaria Especial dos Direitos Humanos e Ministério da Educação. Plano
Nacional de Educação em Direitos Humanos. Brasília: 2006.
CANDAU, Vera Maria e SACAVINO, Susana (org.). Educar em direitos humanos:
construir democracia. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos
Humanos, 1948.
______.Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos, 2005.
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