Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas e Precedentes Judiciais: Instrumentos
efetivos à luz do Novo Código de Processo Civil.
Barbara Gaeta Dornellas de Lima
Rio de Janeiro
2014
BARBARA GAETA DORNELLAS DE LIMA
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas e Precedentes Judiciais: Instrumentos
efetivos à luz do Novo Código de Processo Civil.
Artigo Científico apresentado à
Escola de Magistratura do Estado
do Rio de Janeiro, como exigência
para obtenção do título de PósGraduação.
Orientadores:
Profª. Néli Fetzner
Prof. Nelson Tavares
Prof. Rafael Iorio
Rio de Janeiro
2014
2
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS E PRECEDENTES
JUDICIAIS: INSTRUMENTOS EFETIVOS À LUZ DO NOVO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL
Barbara Gaeta Dornellas de Lima
Graduada pela Universidade Estácio de Sá.
Advogada. Pós-graduada em Direito Processual
Civil pela Escola da Magistratura do Estado do Rio
de Janeiro.
Resumo: O sistema processual civil vigente necessita de reformas urgentes, compatíveis com
as necessidades e as exigências da vida hodierna, ante as transformações ocorridas na
sociedade de um modo geral. É preciso resgatar a crença no Poder Judiciário e atender às
necessidades dos cidadãos e da sociedade acadêmica, que há tempos clamam por uma justiça
célere, eficaz e justa, sem infringir as garantias constitucionais. Por essas razões é que o
anteprojeto do novo CPC valorizou corretamente os precedentes judiciais e criou o incidente
de resolução de demandas repetitivas.
Palavras-chave: Processo Civil. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Novo
Código de Processo Civil. Precedentes Judiciais. Alteração do atual Código (Lei 5.869/73).
Sumário: Introdução. 1. O incidente de resolução de demandas repetitivas como inovação
processual. 2. A relevância dos precedentes judiciais. 3. Notas importantes acerca da alteração
do Código de Processo Civil. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por escopo analisar a necessidade de mudança no texto do
atual Código de Processo Civil, com o fito de reduzir a morosidade da prestação jurisdicional
e, consequentemente, conferir maior celeridade às decisões judiciais, sem prejudicar a
efetividade de um processo íntegro.
Para tanto, a Comissão de juristas escolhida para elaborar o anteprojeto do novo
Código de Processo Civil, vem se empenhando para diminuir o número de ações e recursos
que tramitam pelo Poder Judiciário. São mais de 4 anos de muita pesquisa, realização de
diversas audiências públicas, palestras etc., haja vista que não se busca uma mera alteração
3
legislativa, mas sim a construção de um texto democrático, de modo que não só a comunidade
acadêmica seja ouvida, como também a sociedade de um modo geral. O jurisdicionado brada
por justiça e celeridade, que somente será possível com a adaptação da realidade normativa ao
novo ordenamento processual civil.
Dessa forma, dentre as inovações processuais, merecem destaque o incidente de
resolução de demandas repetitivas e a forma como os precedentes judiciais serão aplicados,
posto que ambos enfocam a presteza judicial, sem violar os preceitos constitucionais,
mormente a inafastabilidade do acesso à justiça e o devido processo legal, que devem ser
encarados como requisitos fundamentais em um sistema jurídico moderno e igualitário.
O estudo que se pretende realizar seguirá a metodologia do tipo bibliográfica,
qualitativa, parcialmente exploratória.
1. O INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS COMO
INOVAÇÃO PROCESSUAL
A criação do incidente de resolução de demandas repetitivas1 representa um dos
instrumentos mais importantes no novo código de processo civil, é o instituto mais comentado
nas audiências públicas. Em que pese algumas divergências, há consenso quanto à
necessidade de sua criação, sendo assente tal entendimento, haja vista que o referido incidente
propiciará o julgamento único de milhares demandas que versem sobre idêntica questão de
direito, estabilizará a uniformidade da jurisprudência dos Tribunais Superiores, impedirá
injustiças, promoverá o princípio constitucional da duração razoável do processo, afastará a
incidência de decisões conflitantes, gerando, consequentemente, a isonomia processual, a
segurança jurídica e o acesso à justiça.
1
BRASIL.
Projeto
de
Lei
n.
8.046
de
2010.
Disponível
<http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/anteprojeto.pdf>. Acesso em 12 out.2013.
em:
4
A litigiosidade de massa é o que fundamenta o instrumento supracitado, pois tem o
condão de formar inúmeros processos repetitivos desnecessários que, quase sempre,
abarrotam o Poder Judiciário, ocasionando a demora na prestação jurisdicional.
Por tais razões, esclarece Leonardo José Carneiro da Cunha2: “as causas repetitivas,
que consistem numa realidade a congestionar as vias judiciais, necessitam de um regime
processual próprio, com dogmática específica, que se destine a dar-lhes solução prioritária,
racional e uniforme”.
Neste ensejo, a Comissão de jurista incumbida de elaborar o anteprojeto do novo
Código de Processo Civil, se preocupou em zelar pela rápida solução da lide, obter maior
efetividade processual, combatendo a morosidade judicial, sem violar os direitos
fundamentais.3
Merece destaque a colocação do Ministro Luiz Fux4 acerca do tema:
O incidente criado pelo anteprojeto permite a seleção de causas piloto com base na
experiência germânica do mercado de capitais (musterverfhren) as quais, uma vez
julgadas servem como paradigma obrigatório para as inúmeras ações em curso na
mesma base territorial da competência do tribunal local encarregado de admitir o
incidente por provocação das partes, do juiz, do Ministério Público ou da Defensoria
Pública.
O referido instrumento é um exemplo que já deu certo em países como Alemanha e
Inglaterra e aqui será instaurado em cada unidade federativa, perante a primeira instância que
poderá provocar o tribunal (Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal), possibilitando
às partes legitimadas desafiarem uma manifestação dos tribunais locais sobre as ações com
situações jurídicas homogêneas para que seja decidida a controvérsia. Uma vez instaurado, a
sua admissibilidade determinará a suspensão dos processos juridicamente idênticos, no
âmbito da competência do tribunal. Ademais, a interposição de eventual recurso
2
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas
previsto no Projeto do Novo CPC. In: DIDIER JUNIOR, Fredie et al. O projeto do novo código de processo
civil: estudos em homenagem ao professor José de Albuquerque Rocha. Bahia: JusPodivm, 2011 p.272.
3
FUX, Luiz (Coord). O novo processo civil brasileiro: direito em expectativa. Rio de Janeiro: Forense,
2011.p.4-7 e 24.
4
Ibid.,p.23.
5
extraordinário ou recurso especial habilitará os tribunais superiores a suspenderem todas as
demandas que estiverem tramitando em território nacional, mediante a apreciação formulada
por qualquer interessado.5
De acordo com o Projeto de Lei no 8.046, de 20106, do Senado Federal, o incidente
de resolução de demandas repetitivas será regulamentado do artigo 988 ao 1.000 e seu
procedimento consistirá, primeiramente, na identificação de potencial controvérsia, capaz de
gerar milhares de processos, conforme já exposto.
Uma vez admitido, o incidente citado será registrado junto ao Conselho Nacional de
Justiça, que disponibilizará um cadastro nacional eletrônico que terá o objetivo de promover
ampla divulgação no intuito de estimular a participação de eventuais interessados, inclusive,
pessoas, órgãos e entidades com interesses na controvérsia bem como o amicus curiae, com o
fito de permitir um grande debate sobre o tema, contribuindo com a discussão, oferecendo
elementos técnicos e argumentos relevantes para a formação da tese jurídica a ser aplicada nas
sucessivas demandas repetitivas7.
É importante frisar que o anteprojeto instituirá, definitivamente, a atuação do amicus
curiae, que funcionará como um auxiliar do juízo, não só no incidente em exame, mas em
todos os graus de jurisdição, com o escopo de fornecer subsídios para o adequado julgamento
da lide.
Segundo Leonardo José Carneiro da Cunha8, o amigo da corte pode ser uma
entidade privada ou pública, que desempenha atividades relacionadas com a matéria a ser
analisada pelo tribunal, que o permitirá julgar e examinar de forma adequada, todas as
nuances da questão, podendo ponderar diversos pontos de vista.
5
Ibid.,p.10
BRASIL.
Projeto
de
Lei
n.
8.046
de
2010.
Disponível
em:
<http://xa.yimg.com/kq/groups/19318493/633205530/name/PARECER%20PAULO%20TEIXEIRA%20APRO
VADO%2018-07-13.pdf>. Acesso em: 27 jul.2013.
7
CUNHA, op.cit., p.281.
8
Ibid.,p.282-283 e 287.
6
6
Há que se observar que a competência para admitir, processar e julgar o incidente é
do plenário do tribunal ou onde houver o seu órgão especial. Assim, uma vez admitido, o
presidente determinará a suspensão das ações pendentes em primeiro e segundo graus de
jurisdição, sendo que, tal suspensão não impede a concessão de provimentos de urgência no
juízo de origem.
No tocante às medidas de urgência, explica J. E. Carreira Alvim9 “são todas aquelas
que se façam necessárias para a tutela do direito, podendo ser tanto de natureza processual
(meramente cautelar) quanto substancial ou de mérito (tutela antecipada ou de evidência)”.
Neste ensejo, ouvidas as partes e os interessados, no prazo de 15 dias, será concedido
igual prazo para manifestação do Parquet.
Quanto ao Ministério Público, insta frisar que além de legitimado, também poderá
suscitar o incidente atuando como fiscal da lei e, mesmo não o requerendo, intervirá
obrigatoriamente no incidente, assumindo a titularidade em caso de desistência ou abandono,
consoante prevê o parágrafo 6º, do artigo 988, do anteprojeto. A Defensoria Pública, por sua
vez, somente poderá instaurá-lo quando atuar na representação da parte.
Com efeito, o relator poderá requerer diligências para a elucidação da questão
controvertida, podendo as partes e os interessados, se manifestarem a respeito, em atenção aos
princípios do contraditório e da ampla defesa.10 Concluídas as diligências, o relator solicitará
dia para o julgamento do incidente.
Pela análise parágrafo 1º, do artigo 994 do anteprojeto, explica Leonardo José
Carneiro da Cunha11:
9
ALVIM, J.E. Carreira. Manual do novo código de processo civil: Processos nos tribunais e meios de
impugnação.Curitiba: Juruá, 2012, p.151.
10
Ibid., p.152.
11
CUNHA, op.cit., p.286
7
Feita a exposição do incidente pelo relator, o presidente do órgão julgador dará a
palavra, sucessivamente, pelo prazo de trinta minutos, ao autor e ao réu do processo
originário, bem como ao Ministério Público, para sustentar as suas razões. Em
seguida, os demais interessados (sejam amici curiae, sejam partes das causas
repetitivas) poderão manifestar-se no prazo de trinta minutos, divididos entre todos,
sendo exigida inscrição com quarenta e oito horas de antecedência.
Julgado o incidente em comento, a matéria jurídica firmada será aplicada em todas as
demais ações, individuais ou coletivas, que versem sobre a mesma questão de direito, que
tramitam na área de jurisdição do respectivo tribunal e servirá como paradigma para processos
futuros, reconhecendo-se assim, o seu efeito prospectivo.
Todavia, para que a tese jurídica seja aplicada em todos os processos que tramitam
em território nacional e que versem idêntica questão de direito, é necessário que o STJ ou
STF, aprecie a matéria ventilada, em sede de recurso especial ou extraordinário.
De acordo com o anteprojeto12, o incidente deve ser julgado dentro do prazo de um
ano, ostentando preferência sobre os demais feitos, com exceção apenas dos que envolvam
réu preso e os pedidos de habeas corpus. No entanto, se o referido prazo não for cumprido,
cessará a eficácia suspensiva do instituto, que autorizará a retomada de seu curso normal,
salvo se houver decisão fundamentada.
Conforme já ventilado, é cabível recurso especial ou recurso extraordinário contra a
decisão que julgar o incidente, nos termos do art. 998, do anteprojeto do CPC, que poderá ser
interposto por qualquer das partes, ora pelos legitimados, ora pelos interessados. Ademais,
cumpre frisar que o recorrente não precisará demonstrar a repercussão geral, caso interponha
um recurso extraordinário, tendo em vista que não há exigência no incidente em epígrafe, pois
a repercussão será presumida, devendo o recurso ser admitido e remetido ao tribunal
competente.
12
ALVIM, op. cit., p.157
8
Note-se que o reexame necessário foi substancialmente alterado no projeto do novo
CPC, posto que a remessa necessária foi extinta quando a sentença estiver fundada em
entendimento firmado no incidente em comento, ainda que proferida em face da Fazenda
Pública.13
É importante ressaltar que caberá reclamação para o tribunal competente, caso a
decisão proferida, com fulcro no incidente, seja descumprida, conforme se infere do artigo
1.000 do anteprojeto.
Com efeito, cumpre mencionar que o instituto da reclamação também é uma das
novidades contidas no anteprojeto, haja vista que será incorporada ao texto do código. No que
tange ao incidente em questão, a reclamação terá a finalidade de garantir a observância da tese
firmada pelo tribunal.
Por fim, deve-se observar que se o incidente for bem aplicado, realizará em plenitude
o princípio da isonomia e reduzirá muito os recursos e as demandas no âmbito do Poder
Judiciário.
2. A RELEVÂNCIA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS
O princípio da segurança jurídica, a celeridade e a economia processual nos
julgamentos dos processos civis estão entre as principais demandas a serem atendidas pelo
anteprojeto do novo código de processo civil. O texto busca dar uniformidade de decisões em
processos semelhantes e criar instrumentos que facilitem a resolução de demandas repetitivas,
isto é, que permitam o reconhecimento de precedentes de ações judiciais.14
13
CUNHA, op. cit., p.291
Reconhecimento de precedente judicial é principal mudança do novo código de processo civil. Disponível em:
<http://abdir.jusbrasil.com.br/noticias/100372821/reconhecimento-de-precedente-judicial-e-principal-mudancado-novo-codigo-de-processo-civil >. Acesso em: 11 set.2013.
14
9
O precedente judicial se caracteriza pela análise de casos concretos, que tenham em
sua gênese uma única reflexão jurídica acerca da aplicação do Direito, ou seja, segundo
Teresa Arruda Alvim15, os fatos não precisam ser idênticos, mas devem autorizar o uso da
mesma estrutura de pensamento aplicada na primeira decisão. Trata-se de uma decisão
tomada por órgão jurisdicional frente a um ou mais casos concretos deduzidos em juízo, tendo
por escopo servir como paradigma para julgamentos posteriores em processos análogos.16
Cruz e Tucci 17 sustenta que “todo precedente é composto de duas partes distintas: a)
as circunstâncias de fato que embasam a controvérsia; e b) o princípio jurídico assentado na
motivação (ratio decidendi) do provimento decisório”.18 Insta mencionar que os precedentes
judiciais possuem força vinculante, não sendo esta uma característica inerente ao referido
instituto, haja vista que a sua eficácia se dá de forma erga omnes apenas em relação a sua
fundamentação, isto é, somente no tocante à sua razão de decidir − que simboliza a tese
jurídica apreciada pelo órgão jurisdicional utilizada como sustentáculo da decisão −.
É indiscutível que o sistema de precedentes tem origem no common law, o que não
se pode confundir com a inexistência de leis. É ultrapassado o pensamento de que o sistema
common law se baseia unicamente no precedente e que o sistema civil law se fundamenta
somente nas leis, tendo em vista que o fato do ordenamento jurídico positivar as condutas
através da atividade do Poder Legislativo, não impede que o Poder Judiciário atue de forma
uniforme utilizando as suas teses jurídicas amparadas por essas mesmas leis.
15
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Estabilidade e adaptabilidade como objetivos do direito: civil law e
common law. In: Revista de processo, São Paulo: RT, v.172, ano 34, p. 132, jun. 2009.
16
BARBOSA, Andrea Carla; CANTOARIO, Diego Martinez Fervenza. Incidente de resolução de demandas
repetitivas no projeto de código de processo civil: apontamentos iniciais. In: FUX, Luiz (Coord). O novo
processo civil brasileiro:direito em expectativa. Rio de Janeiro: Forense, 2011.p.481.
17
BARBOSA; CANTOARIO, op. cit., p. 482.
18
TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do direito. São Paulo:RT, 2004. P. 12.
10
Hodiernamente, não se pode mais separar em nosso ordenamento o sistema da civil
law e da common law, pois ambos podem coexistir, sem que se viole algum princípio
democrático.19
Há que se observar que o atual sistema brasileiro é contemplado por diversas normas
que não cabem apenas na tradicional delimitação do civil law. Recentes inovações legislativas
conduzem o nosso ordenamento jurídico para posição mais próxima dos precedentes, como
por exemplo, a instituição da súmula vinculante (art. 103-A, da CRFB/88), a improcedência
prima facie (art.285-A, do CPC), a eficácia vinculante da decisão que nega repercussão geral
(art.543-A, parágrafo 5º, do CPC), os poderes do relator previstos no art. 557, do CPC, dentre
outros mecanismos.20
Outro ponto que merece atenção é a dimensão institucional do precedente bem
como a sua eficácia, que serão apreciadas à luz da relação de subordinação de escalonamento
hierárquico entre os pretórios.
Denomina-se de precedente vertical quando este for baseado na estrutura burocrática
dos tribunais, sendo certo que o precedente do Tribunal Superior exercerá maior influência
nas cortes inferiores e nestes casos a força vinculativa do precedente será baseada na
autoridade do órgão que emitiu a decisão, ou seja, quanto mais elevado é o nível da corte,
maior será a influência nas instâncias inferiores. O precedente horizontal, por sua vez, é o
oriundo de órgãos que se encontram no mesmo patamar hierárquico e nestes casos terá
eficácia relativa e força persuasiva, principalmente quando estiver apreciando matéria nova.21
19
SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Jurisprudência e precedente vinculante – Uniformização no STF e STJ. In:
ROSSI, Fernando et al. O futuro do processo civil no Brasil: uma análise crítica ao projeto do novo CPC. Belo
Horizonte: Fórum, 2011, p.322.
20
MACEDO, Lucas Buril de; PEREIRA, Mateus Costa; PEIXOTO, Ravi de Medeiros. Precedentes, cooperação
e fundamentação: construção, imbricação e releitura. In: DIDIER JUNIOR, Fredie (Coord); BASTOS, Antonio
Adonias Aguiar (Coord). O projeto do novo código de processo civil: estudos em homenagem ao professor José
Joaquim Calmon de Passos. Bahia: JusPodivm, 2012, p.528.
21
MADEIRA, Daniela Pereira. A força da jurisprudência. In: FUX, Luiz (Coord). O novo processo civil
brasileiro: direito em expectativa. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p.527.
11
É importante frisar que a eficácia do precedente não é absoluta e por essa razão, o
anteprojeto previu, em seu art. 521, parágrafo 5º, a chamada modulação dos efeitos da
alteração do precedente, permitindo ao Tribunal, quando modificar o entendimento, ressalve a
sua aplicação somente aos processos futuros, resguardando, assim, as demandas em curso,
que serão julgadas em consonância com o entendimento sedimentado à época de sua
instauração.22
Desta forma, verifica-se que o anteprojeto pretende assentar o respeito aos
precedentes judiciais, no intuito de otimizar o funcionamento de um processo cooperativo, de
modo que se possa valorizar a condução dos debates com a participação de todos os seus
sujeitos processuais, cujo resultado final servirá de paradigma para demandas semelhantes em
casos futuros. Ademais, com a institucionalização dos precedentes, haverá a garantia da
segurança jurídica, isonomia, boa fé e a duração razoável do processo, já que as ações
corriqueiras repetitivas serão facilmente solucionadas, o que evitará o abarrotamento do Poder
Judiciário e estimulará a dialética processual, contribuindo para a produção de decisões
qualitativamente superiores e estáveis no ordenamento jurídico.23
3. NOTAS IMPORTANTES ACERCA DA ALTERAÇÃO DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL
É de curial sabença que a comunidade jurídica questiona a morosidade de sua justiça
há muito tempo e que o jurisdicionado não tolera mais tanta demora. A sociedade
contemporânea vive a era da imediatidade, impondo soluções rápidas e efetivas.24
22
HILL, Flávia Pereira. Principais inovações quanto aos meios de impugnação das decisões judiciais no projeto
do novo CPC. Revista da Emerj, Rio de Janeiro, v.14, n.55, p.196, jul - set.2011.
23
Ibid., p.530 e 531.
24
DALL´ALBA, Felipe Camilo; AZEM, Guilherme Beux Nassif. Considerações gerais sobre o projeto do novo
CPC. In: ROSSI, Fernando et al. O futuro do processo civil no Brasil: uma análise crítica ao projeto do novo
CPC. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.681
12
Com efeito, verifica-se que o código de processo civil de 1973, envelheceu,
carecendo de reforma urgentemente, haja vista que passou por diversas revisões, algumas
delas tão substanciais, que o transformou em uma verdadeira colcha de retalhos, com enorme
perda sistemática. Fredie Didier Júnior25 aponta diversos motivos que justificam a elaboração
de um novo código, sendo certo que uma das principais razões é o fato de, ao longo destas
quatro décadas, o Brasil ter passado por tantas transformações, que seria correto dizer que
praticamente todos os paradigmas que inspiraram o código de 1973 foram revistos ou
superados. Tais mudanças se deram nos planos normativo, científico, tecnológico e social.
Em breve análise, no que concerne à revolução normativa, o autor sustenta que é
preciso construir um código adequado a nova estrutura jurídica, haja vista que entre 1973 e
2012, se teve uma nova Constituição Federal (1988), um novo Código Civil (2002), o Código
de Defesa do Consumidor (1990), a inclusão do instituto da antecipação de tutela (1995),
dentre outros, sendo certo que o ordenamento processual civil vigente, por óbvio, não foi
elaborado para uma realidade jurídica tão diferente.
No que tange ao plano científico, percebe-se que a atual ciência jurídica brasileira,
diferente de outrora, passou a ser referência no programa de mestres e doutores em Direito no
mundo. Quanto à revolução tecnológica, é notório que o processo em autos eletrônicos é uma
realidade inevitável, podendo afirmar que o Brasil é um dos países mais avançados no mundo
neste tipo de tecnologia. De fato, o anteprojeto do novo CPC deve ser pensado para regular
esta realidade justificadamente ignorada pelo sistema processual de 1973.
De acordo com os ensinamentos de Fredie Didier Júnior26, no tocante ao plano
social, assevera que a massificação dos conflitos é um dado de fato que não pode ser ignorado
na elaboração de um novo CPC. Foi proposta, no anteprojeto, a criação de instrumentos que
25
DIDIER
JUNIOR,
Fredie.
Razões
para
um
novo
CPC. Confiteor.
<http://www.frediedidier.com.br/editorial/editorial-151>. Acesso em: 10 out. 2013.
26
DIDIER JUNIOR, op.cit.
Disponível
em:
13
visam dar mais racionalidade ao processamento das demandas de massa, dentre estas
ferramentas, notabilizou-se o incidente de resolução de demandas repetitivas, que tem por
escopo a fixação de uma tese jurídica vinculante, que sirva para a solução de todas as causas
homogêneas.
Não se pode olvidar que o código de 1973 operou de modo adequado nas duas
primeiras décadas, tendo em vista que as mudanças passaram a ocorrer a partir dos anos 90,
com o escopo de adaptar as normas processuais às transformações na sociedade.
Por tais motivos, é que a comissão encarregada de elaborar o anteprojeto do novo
CPC se empenhou, arduamente, em garantir a simplificação do sistema em busca de
celeridade processual e a efetividade do resultado da ação, além do estímulo à inovação e à
modernização de procedimentos, assegurando o respeito ao devido processo legal,
contraditório, ampla defesa, acesso à justiça, segurança jurídica e a duração razoável do
processo.27
Insta salientar que, consoante análise da exposição de motivos do referido
anteprojeto, a douta comissão se curvou, precipuamente, em cinco objetivos, a saber 28:
1) Estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição
Federal; 2) Criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais
rente à realidade fática subjacente à causa; 3) Simplificar, resolvendo problemas e
reduzindo a complexidade de subsistemas, como, por exemplo, o recursal; 4) Dar
todo o rendimento possível a cada processo em si mesmo considerado; e, 5)
Finalmente, sendo talvez este último objetivo parcialmente alcançado pela
realização daqueles mencionados antes, imprimir maior grau de organicidade ao
sistema, dando-lhe, assim, mais coesão.
Neste diapasão, verifica-se que o anteprojeto do novo CPC é inspirado em um ideal
democrático, de boa fé, com contraditório participativo, cooperação entre todos os
participantes da relação processual, de modo que as normas jurídicas devem assegurar a
27
BRASIL.
Projeto
de
Lei
n.
8.046
de
2010.
Disponível
<http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/anteprojeto.pdf>. Acesso em 12 out.2013.
28
Ibid., p.14.
em:
14
efetividade às garantias constitucionais, oferecendo segurança jurídica ao jurisdicionado
evitando decisões surpresas.
CONCLUSÃO
No decorrer do presente trabalho, verificou-se a importância da alteração do código
de processo civil vigente, diante das mudanças na sociedade moderna que repercutem no
mundo jurídico, visto que não se pode solucionar novos problemas com os mesmos
instrumentos.
Atualmente, a população está cada vez mais ciente dos seus direitos e recorre,
frequentemente, ao Poder Judiciário, que precisa estar estruturado para solucionar, de forma
adequada e célere, todos os direitos violados e/ou ameaçados, assegurando às garantias
fundamentais. É imprescindível uma prestação jurisdicional eficiente e justa, mediante um
procedimento sem formalismo excessivo e sem dilações desnecessárias.
O anteprojeto do novo código de processo civil prestigia o princípio da segurança
jurídica, de essência constitucional, haja vista que pretende proteger e preservar as justas
expectativas do jurisdicionado, para se harmonizar com as garantias constitucionais. Se o
sistema processual for ineficiente, todo o ordenamento passará a carecer de efetividade ─ o
que não se espera em um Estado Democrático de Direito ─.
Desta forma, no intuito de transformar a realidade processual civil, merece destaque
a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas, que poderá reduzir a quantidade
de ações que tramitam pelo Poder Judiciário, dando maior consistência ao sistema
jurisdicional, evitando o abarrotamento de processos nos Tribunais.
Outra ferramenta promissora no anteprojeto é a forma como o precedente judicial
será implementado, tendo em vista que é mais que um guia para a interpretação e aplicação
15
dos textos normativos, é referência obrigatória para os operadores do Direito, posto que a sua
eficácia vinculante garantirá tratamento isonômico aos jurisdicionados, uma vez que impedirá
que uma mesma questão jurídica seja julgada de forma distinta, com posições contrárias e por
órgãos distintos.
O momento atual é realmente de mudança: Novos tempos reivindicam novos direitos
e o povo clama, cada vez mais, por uma justiça mais ativa, que possa enfrentar de forma
rápida, sensível e eficaz, a necessidade da sociedade que carece tanto da justiça!
REFERÊNCIAS
ALVIM, J.E. Carreira. Manual do novo código de processo civil: Processos nos tribunais e
meios de impugnação.Curitiba: Juruá, 2012, p.151.
BARBOSA, Andrea Carla; CANTOARIO, Diego Martinez Fervenza. Incidente de resolução
de demandas repetitivas no projeto de código de processo civil: apontamentos iniciais. In:
BRASIL.
Projeto
de
Lei
n.
8.046,
de
2010.
Disponível
em:
<http://xa.yimg.com/kq/groups/19318493/633205530/name/PARECER%20PAULO%20TEI
XEIRA%20APROVADO%2018-07-13.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2013.
BRASIL.
Projeto
de
Lei
n.
8.046
de
2010.
Disponível
em:
<http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/anteprojeto.pdf>. Acesso em 12 out.2013.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre o Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas previsto no Projeto do Novo CPC. In: DIDIER JUNIOR, Fredie et al.
O Projeto do Novo Código de Processo Civil: estudos em homenagem ao professor José de
Albuquerque Rocha. Bahia: JusPodivm, 2011.p.272.
DALL´ALBA, Felipe Camilo; AZEM, Guilherme Beux Nassif. Considerações gerais sobre o
projeto do novo CPC. In: ROSSI, Fernando et al. O futuro do processo civil no Brasil: uma
análise crítica ao projeto do novo CPC. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.681.
DIDIER JUNIOR, Fredie. Razões para um novo CPC. Confiteor. Disponível em:
<http://www.frediedidier.com.br/editorial/editorial-151>. Acesso em: 10 out. 2013.
FUX, Luiz (Coord). O novo processo civil brasileiro: direito em expectativa. Rio de Janeiro:
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