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Debate Escola Pública ou “Serviço Público de Educação” e
Os Mega-Agrupamentos no Concelho da Amadora
Francisco Santos (Professor)
«Os Mega-Agrupamentos Fazem Mal à Escola Pública»
A escola pública tem estado sob um ataque que se insere num movimento mais vasto, que visa a reconfiguração
do Estado Social e Provedor de serviços públicos. Nos últimos seis anos a situação agravou-se com a aplicação
das medidas de política educativa desenhadas pelos governos de José Sócrates, que pretendem abrir espaço à
privatização da educação, como já acontece em larga medida no sector da saúde.
Sob a batuta das “boas práticas” de gestão impõem-nos Instrumentos de Acção Pública, que são apresentados
como medidas de carácter técnico com uma racionalidade científica não contestável e que asseguram maior
eficiência aos processos de livre circulação dos capitais. Entre estes instrumentos aplicados à educação
encontramos o modelo de gestão, a avaliação de desempenho, o fim dos quadros de escola e, mais
recentemente, a criação dos mega-agrupamentos.
A imposição de constituição de mega-agrupamentos, que as DRE’s estão a levar a cabo, diminuirá muito a
qualidade do ensino ministrado nas escolas públicas, afectando directamente as aprendizagens e a segurança
dos estudantes, em função de um previsível aumento da conflitualidade e da indisciplina.
Estes problemas ocorrerão porque a articulação do trabalho docente se fará em situação muito mais precária,
devido à dispersão dos membros do mesmo grupo disciplinar por diversas escolas com culturas organizacionais
diferentes. Mas também porque os alunos sentirão a direcção do agrupamento muito mais distante e a
respectiva capacidade de intervenção disciplinar diminuída.
É certo que a retórica governamental nos apresenta esta medida envolta num alegado desejo de melhoria do
“serviço público de educação”, afirmando-se, na resolução do Conselho de Ministros n.º 44/2010, que o objectivo
é «promover condições para a criação e consolidação de unidades de gestão que integrem todos os níveis de
ensino e que permitam a um aluno completar a escolaridade obrigatória no mesmo agrupamento de escolas.»
Nesse sentido o governo estabeleceu, em Junho de 2010, 3 orientações:
a) Adaptar a rede escolar ao objectivo de uma escolaridade de 12 anos para todos os alunos;
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b) Adequar a dimensão e condições das escolas à promoção do sucesso escolar e ao combate ao
abandono; e
c) Racionalizar os agrupamentos de escolas, de modo a promover o desenvolvimento de um projecto
educativo comum, articulando níveis e ciclos de ensino distintos.
Já em Novembro, através da Portaria n.º 1181/2010 foram estabelecidos os procedimentos de criação, alteração
e extinção dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, bem como de estabelecimentos públicos de
ensino. Aqui, mais uma vez, o texto do preâmbulo não encaixa muito bem no articulado da portaria, já que
apesar de ser realçada a importância dos municípios e das cartas educativas no planeamento e na gestão da
rede escolar, o Artigo 2.º indica que a apresentação de propostas de criação de agrupamentos de escolas e de
estabelecimentos da educação pré -escolar, do ensino básico e do ensino secundário, compete a) No caso de
criação de agrupamentos de escolas, às direcções regionais de educação (DRE); e b) No caso de criação de
estabelecimentos da educação pré -escolar, do ensino básico e do ensino secundário, às DRE e aos municípios.
É certo que há duas semanas atrás foi publicado o Despacho n.º 4463/2011, em que se determina que a
agregação de agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas pode ser da iniciativa das direcções regionais
de educação (DRE) ou dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas.
Só que, a determinação de que os municípios e os conselhos gerais apenas têm um prazo máximo de 10 dias
para se pronunciarem sobre as propostas de agregação de agrupamentos de escolas e escolas da iniciativa das
DRE’s denuncia um propósito de fazer avançar os mega-agrupamentos a qualquer custo.
Ao contrário dos alegados propósitos de melhoria da qualidade da escola, o verdadeiro objectivo do governo é
de natureza económica e visa a contenção orçamental, através da redução de custos com pessoal e com os
suplementos remuneratórios das direcções.
A concretizar-se a criação de 6 mega-agrupamentos no concelho da Amadora, o valor poupado só com os
suplementos de directores, sub-directores e adjuntos rondará os 16.000 € mensais. Aos quais se deverá
adicionar a poupança gerada por menos 45 horários dos actuais membros de direcções que passarão a ter
turma(s) para leccionar, deixando de ser substituídos por 45 professores contratados.
Quando afirmo que o que se pretende obter com os mega-agrupamentos é apenas uma contenção de custos,
baseio-me na investigação existente sobre a dimensão das escolas, segundo a qual podemos concluir que
existe uma consistência notável entre todos os estudos realizados sobre o tamanho das escolas: mais pequeno
é melhor.
Isto decorre do facto de as necessidades das crianças, em especial as mais novas, se centrarem ao nível da
estrutura, estabilidade social e apoio comunitário. É que, parece que as escolas mais pequenas fortalecem as
relações interpessoais e o senso de comunidade, além de também serem associadas a um maior
empenhamento e responsabilização parental e terem maiores índices de envolvimento dos pais.
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Alguns investigadores argumentam que, hoje em dia, as escolas tendem a ser maiores porque o foco nos
“curricula cognitivos e académicos” obriga os decisores a ignorar as dinâmicas sociais esquecendo que as
escolas grandes contribuem para a despersonalização, negativismo, alienação e, por último, para o absentismo
e abandono.
O dilema para os decisores que apenas olham para os custos e taxas de sucesso é que estes números não têm
em conta os custos a longo prazo de tomadas de decisão erradas, custos reais que são difíceis de estimar e que
se relacionam com o crime, vandalismo, desemprego e outros problemas comunitários atribuíveis a
comportamentos associais, adquiridos através de um contexto social inadequado nos anos da infância e
adolescência.
Numa revisão da literatura existente sobre o tamanho das escolas, Cotton (1996) debruçou-se sobre alguns dos
factores que, de acordo com a sua análise, são afectados pela dimensão da escola.
Entre eles os investigadores descobriram que os ganhos para a qualidade do currículo são insignificantes, uma
vez que o dobro da capacidade da escola apenas aumenta em 17% a variedade das ofertas curriculares e que
apenas 5 a 12% dos alunos das escolas maiores se inscrevem nesses cursos extra. Mas, mais importante ainda,
cinco de seis estudos relataram que as escolas mais pequenas eram tão eficazes como as maiores na
preparação dos estudantes para o prosseguimento dos seus estudos.
Quanto aos custos de Eficácia, os investigadores descobriram que, até certo ponto, há economias de escala e
os custos por aluno diminuem com o aumento do tamanho da escola. Só que, a partir de certo ponto, à medida
que aumenta o número de alunos, torna-se necessário contratar pessoal extra e os custos voltam a subir. O
tamanho da escola que maximiza os custos de eficácia é variável e altamente dependente de particularidades da
comunidade e do sistema escolar.
No que respeita aos resultados académicos nenhum estudo provou que as escolas grandes proporcionam
melhores resultados académicos do que as mais pequenas, ao mesmo tempo que estas mostram melhores
resultados por parte das minorias étnicas e dos estudantes com baixos rendimentos.
A pesquisa sobre as atitudes dos estudantes favorece largamente as escolas mais pequenas em relação às
maiores, verificando-se de novo que as minorias e os estudantes de mais baixo status económico beneficiam do
ambiente das escolas mais pequenas.
As escolas pequenas têm menor incidência de comportamentos sociais desajustados do que as escolas
maiores, com as minorias e os estudantes de mais baixo rendimento mostrando os efeitos mais positivos das
escolas pequenas.
Os estudantes das escolas mais pequenas envolvem-se numa variedade maior de actividades extracurriculares do que os das escolas maiores.
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As estatísticas de assiduidade voltam a favorecer as escolas mais pequenas em relação às maiores.
Nove em dez relatórios revistos por Cotton relataram menor abandono escolar nas escolas mais pequenas.
Os investigadores relataram um maior sentido de comunidade e pertença entre os estudantes das escolas
mais pequenas, além de que a auto-estima pessoal e académica é mais forte nestas escolas.
Finalmente, os investigadores relataram que as relações interpessoais entre estudantes e professores eram
mais positivas nas escolas mais pequenas, e, não menos importante, os poucos estudos sobre a atitude dos
professores favorecem as escolas mais pequenas, porque “As escolas grandes parece favorecerem uma
percepção negativa dos professores em relação à administração escolar e um moral baixo do pessoal.”
Em conclusão poderemos afirmar que propor a criação de mega-agrupamentos, nalguns casos com mais de três
mil alunos, centenas de professores, dezenas de funcionários e vários espaços escolares dispersos pelo
território, pode servir a poupança imediata de umas centenas de milhar de euros. Não serve é, com toda a
certeza, a qualidade da escola pública e um ensino de qualidade que é um direito de todos os cidadãos e um
dever do estado.
Obras Citadas
Cotton, K. (1996). School Size, School Climate, and Student Performance. School Improvement Research Series
.
Amadora, 24 de Março
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