Dos que trabalham e dos que andam empregados
– subsídio para uma discussão do Emprego em Portugal sobre as duas faces de
uma moeda
Paulo Reis Mourão
[URL: http://www.eeg.uminho.pt/economia/paulom; Docente e Investigador do
Departamento de Economia da Escola de Economia e Gestão da Universidade do
Minho; Economista]
Natália Joana de Oliveira
[Aluna finalista da Licenciatura em Relações Internacionais, Económicas e Políticas da
Universidade do Minho]
A cara:
Queremos trabalhar ou queremos estar empregados?
Muitos de nós, aprioristicamente, julgarão esta questão mal colocada. Pensarão que
estas duas alternativas, no fundo, no sentido corrente, no senso comum, são uma só. E
enquanto assim o acreditarem, para eles, serão, efectivamente, uma só alternativa. Mas,
também, muitos de nós sabem que levar todos os ovos num único cesto é perigoso.
Sabem que apostar numa alternativa isolada (em concurso com alternativas múltiplas)
não é uma boa jogada. Por isso, e cada vez mais, procuram trabalho além de emprego.
Vamos entender por trabalho, entre diversas definições válidas, aquela que compreende
o trabalho como "a actividade humana produtiva, inserida numa unidade económica de
produção, remunerada, destinada a assegurar a manutenção (...) isto é que permita um
nível de vida adequado à realização do homem" (conferir, Moura, J. 1986. Economia do
Trabalho. Edição Fundação Oliveira Martins. Lisboa. P.14).
O emprego, dimensão pluridisciplinar, envolve um conjunto de condições físicas e
jurídico-institucionais previstas, com estabilidade remuneratória acrescida da
possibilidade de valorização além da capacidade monetária (nomeadamente, prémios e
direitos sociais).
Por diversas motivações metodológicas (contabilização dos agregados, entrada das
facetas do Trabalho em áreas dificilmente quantificáveis e devido a objectivos de
Política Económica), os economistas preferem emitir pareceres sobre os valores do
Emprego relativamente à dimensão do Trabalho.
Neste sentido, convidamos os leitores a uma partilha por algumas observações da nossa
responsabilidade realizadas sobre a Taxa de Crescimento do número de empregados no
Continente em três níveis de instrução (Básica, Secundária e Superior) entre o 1º
trimestre de 1992 e o 4º trimestre de 2002.
Assim, a maioria da população empregada no Continente só apresenta um nível de
instrução básica (até ao actual 9º ano de escolaridade). Na última década, a proporção
de população empregada com o Secundária alcançado aumentou ligeiramente (de,
aproximadamente, 10% do total de População Empregada para os 12%) e a quota de
população com um grau de Ensino Superior praticamente duplicou (de 5% para 10%).
Aproximando a lupa sobre as Taxas de Crescimento da População Empregada, entre
trimestres consecutivos, desagregada por nível de instrução, encontramos, em Portugal
Continental, resultados curiosos.
As Taxas de Crescimento da População Empregada detentora, no máximo, do nível de
instrução Básico, revelam 5 momentos isolados de valores negativos, 4 ciclos de dois
valores consecutivos negativos e 1 período de quatro taxas de decréscimo seguidas (o
que perfaz 17 trimestres de diminuição do agregado) em 10 anos.
Quanto à População Empregada com o Secundário, encontram-se, entre 1992 e 2002, 11
trimestres que devolveram um decréscimo desta categoria face aos valores de referência
do trimestre anterior. Agrupados, sugerem 6 taxas de variação com valores isolados, 1
par de valores consecutivos e 1 ciclo de 3 trimestres menos bons.
Os respectivos cálculos para a População Empregada com Ensino Superior encontraram
10 taxas de variação negativa entre trimestres consecutivos, assim esboçadas: 6 valores
isolados e 2 pares de valores consecutivos abaixo de zero (num ano t em que o 1º
trimestre devolve uma taxa positiva, o 2º trimestre uma taxa negativa, o 3º trimestre
uma taxa positiva também, e o 4 trimestre uma negativa, contabilizamos 2 valores
negativos isolados; se o ano t tiver o 1º trimestre negativo, o 2º positivo, e os 3º e 4º
abaixo de zero, então, reconhecemos um valor isolado, o do 1º trimestre deste ano, e um
par de valores negativos, constituído pelas taxas dos 3º e 4º trimestres).
A Taxa Média de Variação Negativa no 1º grupo (População Empregada só com o
Ensino Básico) é de -0,634% e a Taxa Média de Variação Positiva, neste segmento,
identifica-se com os 2,72%.
No sector da População Empregada escolarizada com o Ensino Secundário, a Taxa
Média de Variação Negativa assume o valor de -1,37% e a Taxa Média de Variação
Positiva, neste grupo, é de 1,83%.
Já com a População Empregada detentora de grau atribuído pelo Ensino Superior, a
Taxa Média de Variação Negativa é de -1,72% e a Taxa Média de Variação Positiva
identifica-se com os 4,19%.
Cruzando a evidência, concluímos por uma maior instabilidade laboral nos detentores
de patamares inferiores de escolaridade, embora com amplitudes (nas taxas de
crescimento) mais esbatidas. O que, por outro lado, deixa a imagem de um "exército" de
diplomados no Ensino Superior que começam a ser sazonalmente empregados e
sazonalmente desempregados, com as amplitudes das medidas de variação em
crescimento.
Daqui, podemos concluir que o mercado de trabalho português continua a revelar
capacidades de absorção dos trabalhadores com baixos níveis de escolaridade,
característica esta que não é contudo sustentável a prazo. Relativamente aos
trabalhadores detentores de níveis de instrução mais elevados, e, particularmente os
jovens que transitaram da escola para a vida activa, sabe-se que existem algumas
dificuldades na obtenção de um emprego compatível com o seu nível de habilitações.
No que respeita à participação da mulher no mercado de trabalho verifica-se uma subida
generalizada em todo o país e uma estabilização das taxas de crescimento da
participação masc ulina. Porém, as mulheres continuam a ser mais vulneráveis perante o
fenómeno do desemprego e isso confirma-se pelas inferiores taxas de emprego
relativamente ao sexo masculino. Além disso, confirma-se, segundo os dados
recolhidos, o envelhecimento da população portuguesa, e a região norte não é excepção.
A coroa:
As políticas activas de emprego são o motor de força no mercado de trabalho. Com a
última etapa de adesão na União Europeia, assistiu-se a uma profunda remodelação da
legislação laboral no sentido de atingir a convergência entre os quinze parceiros
comunitários. Nesse contexto, os quinze adoptaram a designada Estratégia Europeia de
Emprego, a fim de dar resposta aos sucessivos desafios da conjuntura económica. Nesse
âmbito e em articulação com o Plano Nacional de Emprego foram definidos quatro
pilares essenciais: melhorar a empregabilidade; desenvolver o espírito empresarial;
incentivar a capacidade de adaptação dos trabalhadores e das empresas e reforçar as
políticas de igualdade de oportunidades. Estes quatro pilares resumem-se num duplo
objectivo: criação de mais e melhores empregos.
No entanto, para lá de programas que envolvam e transformem activamente autarquias,
instituições produtivas privadas, organizações do “Terceiro Sector”, Escola s e Estado
em agentes concretos de desenvolvimento do capital humano, os tradicionais jargões
apelam a uma atenção necessária sobre as novas tecnologias de informação e
comunicação, a aprendizagem de novas línguas e a mobilidade.
Mas talvez o grande misté rio se encontre numa redescoberta do espírito que nos
constituiu enquanto nação: hoje chamaremos de empreendedorismo à aventura, de
inovação ao desconhecido e de projecção internacional à condição de exteriorização das
nossas capacidades? Ou ficaremos na praia, quedos, a olhar os que partem em outras
naus e noutras caravelas?
Estaremos hoje prontos para aceitar regras de globalização que procuram, avidamente e
muitas vezes sem tempo de reflexão, ideais de eficiência, de produtividade e de rácios?
Ou conseguiremos ser promotores de transformações, de novos Tratados de marear e
de novas definições de concorrência?
A ausência de respostas (nossas, públicas e privadas) é promotora de indefinição, de
sebastianismos e de desencantos.
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