EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA NA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES: CONCEPÇÕES DISCENTES E DOCENTES
Leandra Martins de Oliveira
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
RESUMO: O presente artigo é parte de um estudo sobre a Educação Tecnológica na formação
dos educadores das séries iniciais, estudo que nos instigou a desvelar quais as concepções de
alunas e professoras de dois cursos de licenciatura – Normal Superior e Pedagogia - sobre
tecnologia e Educação Tecnológica. Através de entrevistas semi-estruturadas e de questionários,
pudemos alcançar certas representações que o grupo discente e docente tinha a respeito do papel
da tecnologia em nossa sociedade e no ambiente dos cursos investigados. Os dados
demonstraram uma tendência em associar a tecnologia aos instrumentos utilizados para facilitar
as atividades humanas e a Educação Tecnológica como uma possibilidade de se aprender a
utilizar estes instrumentos, com ênfase nas novas tecnologias. Tal tendência desencadeia alguns
reducionismos tecnológicos, dificultando a compreensão da tecnologia enquanto processo de
invenção e reinvenção humana, de intervenção na vida social.
PALAVRAS-CHAVES: Educação Tecnológica; tecnologia; concepções de alunas e
professoras.
1. Educação Tecnológica
Autores como Bastos (2000), Bueno (1999), Grinspun (2001) e Reis (1995), que
têm discutido a Educação Tecnológica (doravante ET), apontam suas considerações em
torno da importância de se estabelecer um “diálogo” entre os indivíduos e as tecnologias
presentes em todos os setores e camadas sociais. As tecnologias são comumente
percebidas como instrumentos ou como produtos lançados para os cidadãos, a fim de
que estes tenham suas necessidades de consumo atendidas. Geralmente, é apresentada à
sociedade na forma de resultado final, objetos dissociados de um processo de
construção investigativo, onde escolhas e decisões são tomadas desconsiderando, muitas
vezes, princípios éticos e estéticos essenciais à vida humana, em prol da economia de
mercado e do baixo custo/benefício.
A Educação Tecnológica se manifesta como seqüência de uma luta pela
democratização do saber, aqui, em específico, do saber científico-tecnológico que vem
direcionando a vida social, mas que se concentra nas mãos de poucos. Para Bastos
(2000), a ET envolve uma busca na formação de sujeitos competentes e inventores de
novos processos que reflitam atitudes inovadoras e criativas. O autor esclarece que “os
sujeitos competentes não são aqueles que apenas sabem aplicar técnicas, mas que
adquirem, pelos contatos com os artefatos, a capacidade de entender o mundo e a
sociedade tecnológica em que vivemos.” (BASTOS, 2000, p.38). Esse pensamento é a
busca da superação de uma mentalidade centralizada na competência técnica para uma
atitude reflexiva e crítica sobre o saber-fazer.
Segundo Reis (1995), o grande objetivo da ET é promover um desenvolvimento
da educação moral e intelectual, para que a tecnologia seja utilizada com fins pacíficos e
socialmente proveitosos. O futuro da ET, para a autora, se relaciona com a formação de
professores em cursos de pós-graduação, a relação entre conteúdo e processo nas
atividades realizadas em sala, a diversificação e relevância das tarefas para a sociedade
científica e tecnológica. Partindo desses pressupostos educacionais, a ET forma o
cidadão para compreender que, além das máquinas, do contexto produtivo e
informacional, o sistema tecnológico é composto por pessoas, situadas e
circunstanciadas, de organizações dotadas de diferentes culturas e contextos (BASTOS,
2000). O tópico seguinte aprofunda um pouco mais nesta visão de tecnologia.
2. Tecnologia
Na literatura acadêmica, há uma ampla reflexão sobre a importância de se
compreender os processos tecnológicos manifestados na sociedade, já que tais processos
são, muitas vezes, percebidos pela maioria da população somente como objetos,
instrumentos facilitadores das tarefas do cotidiano. Rodrigues (2001) propõe o
desenvolvimento de espírito crítico em relação aos benefícios proporcionados pela
tecnologia, para que o homem não venha a viver alienado diante das inovações na
sociedade tecnológica. No entanto, os estudos apontam que é na condição de ‘coisa’ que
a tecnologia é apresentada para grande parte da sociedade (GRINSPUN, 2001;
OLIVEIRA, L. et al; 2007). Esse tipo de percepção é, segundo Santos (2005, p.148),
[...] fruto de um complexo jogo de poder, por meio do qual os resultados dos
empreendimentos científico e tecnológico são apresentados como sendo fatos consumados
e indiscutíveis, como o supra-sumo do avanço do conhecimento, plenos de saberes que
estão além de nossa capacidade de compreensão, só nos restando usufruir de seus
benefícios.
O resultado desta “coisificação” tecnológica é uma polarização, ou
determinismo e reducionismos já discutidos por diversos autores (BASTOS, 2000;
OLIVEIRA, M. R., 1997; LIMA FILHO e QUELUZ, 2005). Buscando superar tais
interpretações, entende-se como tecnologia:
•
•
•
produtos da ação humana, historicamente construídos, expressando relações sociais
das quais dependem, mas que também são influenciadas por eles. Assim, os produtos
e processos tecnológicos são considerados artefatos sociais e culturais, que carregam
consigo relações de poder, intenções e interesses diversos;
artefatos mediadores da interação social e cognitiva do ser humano com as bases
materiais da sociedade;
recursos que, se de um lado não possuem características do sagrado – de poder
infinito e perene -, que demandaria celebração, de outro, também não são artefatos
destituídos de cultura e criados apenas para serem consumidos e trocados como
mercadoria. (OLIVEIRA, M. R., 2000, p.42).
No contexto escolar, a concepção da tecnologia enquanto processo de construção
histórica ainda parece ser um saber hermético. Assim, alguns reducionismos permeiam
esse contexto, tais como aqueles apontados por Oliveira, M. R. (1997):
•
ensino com tecnologia: idéia de que as novas tecnologias, em especial aquelas
voltadas para informática, solucionarão problemas educacionais;
•
ensino da tecnologia: preocupação em aprender a utilizar novas tecnologias
(equipamentos eletrônicos, softwares, etc.);
•
ensino para a tecnologia: com base nos dois reducionismos acima, a escola
aborda uma dimensão mercantil das tecnologias, onde a preocupação com os
meios supera a preocupação com os fins.
As concepções elaboradas acerca da tecnologia influenciam, consideravelmente,
as práticas profissionais e as reações dos sujeitos frente à sociedade. Por concepção,
corroboro com Ferreira (2004) que a define como “uma forma de conhecimento
fortemente influenciada pelas emoções, crenças e valores. As concepções que um
indivíduo tem, acerca de um assunto, influenciam sua atitude face a esse mesmo
assunto.” (p.46). Segundo Lima Filho e Queluz (2005), as representações construídas
sobre a tecnologia podem ser situadas em duas matrizes conceituais: relacional e
instrumental. A matriz relacional “compreende a tecnologia como construção, aplicação
e apropriação das práticas, saberes e conhecimentos” e a matriz instrumental
“compreende a tecnologia como técnica, isto é, como aplicação prática de saberes e
conhecimentos.” (p.24).
Um dos estudos que possibilitaram a Lima Filho e Queluz (2005) identificarem
estas matrizes conceituais foi o resultado de uma pesquisa realizada com docentes da
educação profissional da rede pública estadual do Paraná, cujo objetivo era apresentar
as representações desses profissionais acerca do conceito de tecnologia e suas
influências na prática escolar (BREMER e LIMA FILHOi apud LIMA FILHO e
QUELUZ, 2005). Há uma aproximação dessas matrizes conceituais e os estudos de
Oliveira, L. et al. (2007), que apresentam as concepções acerca da Educação
Tecnológica na voz dos docentes das séries iniciais do Ensino Fundamental. As
matrizes relacional e instrumental exercem considerável influência sobre as práticas
pedagógicas e sobre os aspectos curriculares das instituições escolares. Pode-se inferir
que reducionismos, como aqueles apresentados por Oliveira, M. R. (1997), identificamse com uma conceituação instrumental da tecnologia.
Não se pretende, a partir do exposto, apresentar essas matrizes como dois pólos
conceituais acerca da tecnologia, mas, sim, como referenciais frente a uma amplitude
conceitual que permeia seu estudo. Aliás, Lima Filho e Queluz (2005) não
desconsideram as conceituações divergentes existentes no interior dessas matrizes.
Tendo as matrizes relacional e instrumental como referência, percebemos vários pontos
convergentes nas vozes de sujeitos atuantes, em diferentes espaços educacionais e
geográficos, e com uma história pessoal diversificada. E buscando convergência se
torna possível elaborar políticas públicas, projetos e iniciativas rumo a uma participação
mais equilibrada de todos os setores sociais, frente ao desenvolvimento científicotecnológico. Nos tópicos seguintes, veremos as concepções de alunas e professoras de
dois cursos de licenciaturas acerca da Educação Tecnológica e tecnologia.
3. Rumo às concepções dos sujeitos
Ao realizarmos um estudo que buscava compreender de que maneira a Educação
Tecnológica se evidencia nos Projetos Pedagógicos e nas práticas educativas de dois
cursos de licenciatura para docência nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos
deparamos com a necessidade de se entender quais as concepções que alunas e
professoras dos cursos guardavam sobre Tecnologia e Educação Tecnológica. O
objetivo era discutir a importância de se oferecer às futuras professoras uma formação
que desenvolva a leitura crítica da tecnologia e do mundo tecnológico, o que nos levou a
entender a natureza destas concepções, e suas influências no estabelecimento de
relações mais dialógicas e interativas entre ciência, tecnologia e o ser humano.
As entrevistas semi-estruturadas e o questionário permitiram mapear as
concepções dos sujeitos envolvidos, mas na pesquisa como um todo adotou-se outros
instrumentos de coleta de dados: observações de aulas e análise das propostas
pedagógicas. Foram entrevistados 8 professores – 4 de cada curso - e o questionário foi
aplicado à 22 alunas do curso Normal Superior e 32 alunas do curso de Pedagogia,
totalizando 54 discentes.
A coleta e a análise dos dados pautaram-se em uma abordagem
predominantemente qualitativa, mas utilizamos também métodos quantitativos para o
tratamento das informações contidas no questionário, tendo como recurso o programa
SPSS 13.0 for Windows, programa este que contém diversos procedimentos de análise
estatística. Enfim, procuramos estabelecer um diálogo entre os dados recolhidos e as
categorias de análise elaboradas, dentre as quais se encontra as concepções do grupo
docente e discente sobre a tecnologia e Educação Tecnológica, objeto de discussão
deste artigo.
4. Concepções do grupo docente e discente sobre a tecnologia e Educação
Tecnológica
Segundo Kominek (2000), mais do que capacitar o aluno quanto ao aspecto
técnico ou quanto à assimilação de conteúdo, a ET tem como objetivo levá-lo a:
1 – compreender o processo tecnológico e, assim, fazer opções; 2- estabelecer e valorizar o
diálogo, a troca, a discussão; 3 – perceber o caráter histórico, contextual e cultural do
conhecimento e da tecnologia; 4 – exercer plenamente sua criatividade; 5 – manter-se
sempre aprendiz; 6 – abstrair e refletir sobre sua realidade; 7 – realizar a crítica de sua
sociedade; 8 – tomar decisões que considerem seu contexto cultural e social, assim como
também suas conseqüências. (p.91).
O alcance dos objetivos acima depende muito das relações estabelecidas entre o
sujeito e a ciência e tecnologia. Tal relação se constrói no âmago das concepções que os
sujeitos elaboram sobre a ciência e a tecnologia. Neste estudo procuramos identificar
indicadores das representações que os sujeitos da pesquisa obtinham sobre dois termos
essenciais à compreensão do fenômeno investigado: tecnologia e Educação
Tecnológica. No grupo discente, observou-se uma tendência em relacionar tecnologia
com instrumentos que facilitariam as tarefas diárias. Pela Tabela 3, pode-se visualizar
melhor a freqüência de respostas das alunas:
Tabela 3: Conceito de tecnologia para as alunas
Definições
Freqüência
%
1ª) Recursos inovadores,
modernos, avançados da
sociedade atual.
11
20
2ª) Instrumentos que facilitam a
relação do homem com o
mundo.
29
54
3ª) Desenvolvimento e
aperfeiçoamento de técnicas.
6
11
4ª) Outros
6
11
5ª) Não respondeu
2
4
Total
54
100
Fonte: Dados da Pesquisa
Na amostra, 20% (11) das alunas entendiam a tecnologia como novos recursos
presentes na nossa sociedade, e que se sofisticam intensivamente. Então, associavam o
conhecimento tecnológico ao que há de novo e moderno no contexto social. Já 54% (29)
delas entendiam a tecnologia como instrumentos facilitadores das ações do homem na
natureza e percebem a presença desses instrumentos desde as primeiras civilizações
humanas. Nesse grupo, percebe-se uma idéia de evolução desses instrumentos ao longo
dos tempos. O que distingue este grupo do primeiro é o caráter de contemporaneidade
que predomina na concepção do primeiro grupo, se atendo a um olhar mais no presente.
A idéia de evolução, de aperfeiçoamento, também foi percebida no 3º grupo, que
compõe 11% (6) da amostra. Este grupo entendia a tecnologia como desenvolvimento e
aperfeiçoamento das técnicas, mas não fazia referência explícita aos instrumentos.
Ainda
que
superficialmente,
apontaram
a
tecnologia
como
a
ciência
do
“desenvolvimento” sem, no entanto, aprofundar estas reflexões. O 4º grupo – 11% (6) apresentou idéias mais vagas que não se constituíram em um novo conjunto de
definição.
As concepções das docentes também indicaram um entendimento da tecnologia
como recursos. Algumas, quando indagadas sobre a possibilidade de terem sua aula
observada, diziam que sua disciplina em nada contribuiria para a pesquisa, pois não
usavam nenhum recurso tecnológico. Para a professora P2, a tecnologia é apresentada
na sociedade prioritariamente na forma de máquinas,
Tudo o que você faz hoje exige um conhecimento tecnológico e geralmente esse
conhecimento tecnológico ele aparece em termos de máquina. É o que a gente percebe no
ambiente. Você vai lá, não falo nem só máquina complexas, máquina simples, seja a
máquina que for existiu uma tecnologia. Então a tecnologia é mais do que a pessoa saber
lidar com computador, não é ?! (P2, Normal Superior).
A entrevistada P4 manifestou sua surpresa ao descobrir a tecnologia em
materiais corriqueiros, como o lápis:
Então assim o lápis é uma tecnologia, o papel; o menino que sabe que pra ele escrever ele
tem que usar um lápis e um papel ele já tem um nível de letramento e ele já usa uma
tecnologia. E eu achava que não. Quando eu li essas coisas – a [...] que me emprestou uns
livros sabe – eu achei fantástico! (P4, Pedagogia).
Já a professora P8, identificou a tecnologia com os recursos que facilitariam o
dia-a-dia das pessoas:
Seria você conhecer as técnicas, ou os recursos que você tem, pra poder estar aplicando,
facilitando alguns trabalhos em busca de conhecimento ou na execução de algum trabalho.
Hoje é muito difícil separar a tecnologia do conhecimento científico porque uma auxilia a
outra. (P8, Pedagogia).
As professoras P1 e P5 disseram que tecnologia é mais do que instrumentos
disponíveis na sociedade:
Tecnologia são processos. Então quando eu falo de tecnologias formais eu estou falando
assim: como que é uma aula expositiva? O que eu preciso pra uma aula expositiva ser
desenvolvida? Então uma das aulas que eu dou no II formativo é a gente desconsiderar que
tecnologia é só alguma coisa voltada pro digital. Não é um recurso... não é um fim em si
mesmo, é um processo que usa de recursos. Mas recursos humanos, recursos físicos. E
nesse processo a gente constrói alguma coisa para o bem comum, pra resolver o problema,
para solucionar (inaudível). (P1, Pedagogia).
Tecnologia é não só artefato em si, mas a própria prática quando você discute a tecnologia
ou que sentido que ela tem na sociedade quando você está vendo a tecnologia como poder,
o poder que tem a tecnologia, então quem tem a tecnologia tem mais poder. Então não é só
artefato, eu acho a tecnologia é bem mais ampla mesmo. (P5, Normal Superior).
Vários pontos de convergência entre o pensamento do grupo discente e docente
são percebidos, no tocante à visão da tecnologia como recursos disponíveis para facilitar
as atividades humanas. Tais concepções talvez contribuíssem para que os sujeitos
ficassem, muitas vezes, surpresos quando explicávamos o contexto da pesquisa. Por
considerarem as instituições carentes de bons equipamentos, entendia-se que ali não
tinha tecnologia.
A Tabela 4 mostra as concepções das alunas sobre Educação Tecnológica:
Tabela 4: Conceito de Educação Tecnológica para o grupo discente
Definições
Freqüência
%
20
37
15
28
3º) Formação crítica do aluno no
contexto da sociedade atual.
2
4
4º) Outros.
5º) Não respondeu.
Total
9
8
54
17
15
100,0
1º) Estudos de recursos
inovadores na educação,
tecnologia educacional.
2º) Utilização de recursos
diversos na sala de aula.
Fonte: Dados da pesquisa
Captar as impressões do grupo sobre Educação Tecnológica foi mais difícil do
que sobre tecnologia, e verificou-se que 32% (17) das alunas não conseguiram expressar
com clareza o que entendiam sobre Educação Tecnológica (na tabela, correspondem às
4º e 5º definições). Quanto às demais, 37% (20) relacionaram a ET com a aprendizagem
da tecnologia educacional, entendendo-a como o estudo dos recursos inovadores na
educação, visando à aplicação em sala de aula, e 28% (15) definiram como a utilização
de recursos diversos no processo de ensino-aprendizagem, desde o giz até o
computador. Este último grupo centra o discurso na diversificação dos instrumentos, e
não na ‘modernidade’ dos mesmos. Para 4% (2) das alunas, a ET é a formação crítica do
aluno no contexto da sociedade atual, definição esta que mais se aproximou da proposta
defendida neste estudo.
Diante dessas definições, notou-se que a concepção de tecnologia parecia
exercer influência direta sobre a concepção de Educação Tecnológica. Analisando mais
detalhadamente os questionários respondidos, percebeu-se que, das alunas que
entendiam a tecnologia como novos recursos materiais presentes na sociedade, muitas
relacionaram a Educação Tecnológica enquanto aprendizagem desses novos recursos
para potencializar o ensino na sala de aula. Na mesma lógica, das alunas que apontaram
a tecnologia como ferramentas facilitadoras da relação do homem com o mundo, desde
os primórdios da civilização, muitas entendiam a Educação Tecnológica enquanto
utilização de recursos diversos no processo de ensino-aprendizagem, incluindo as
“velhas” e “novas” tecnologias. A Figura 1 ilustra a reciprocidade dessa relação:
Tecnologia: recursos
inovadores, avançados na
sociedade.
Tecnologia: instrumentos
facilitadores das
atividades humanas.
1º Grupo
ET: aprendizagem das
novas tecnologias
educacionais para utilizálas no ensino.
2º Grupo
ET: uso de diversos
recursos no ensino: do
giz ao computador
Figura 1: Relação entre as definições de Tecnologia e Educação Tecnológica
Fonte: Dados da pesquisa
Entre o grupo docente, também se observou uma dificuldade de se conceituar
ET, sendo que as falas seguintes expressam com mais clareza as impressões de algumas
professoras:
Então eu tenho esperança assim, que quem estuda, sabe, pesquisa educação tecnológica
consiga que a pessoa tenha o domínio das tecnologias mais atuais porque eu pressuponho
que se está trabalhando... fazendo pesquisa numa instituição de Educação Tecnológica você
precisa de saber o que tem de ponta em tecnologia mas o que você faça lá, sirva pra
humanizar as pessoas. (P4, Pedagogia).
A Educação Tecnológica não é só você... os meios tecnológicos não é só ensinar a
tecnologia. É uma discussão ampla sobre tecnologia, sobre a sociedade, a vida e a
educação. (P5, Normal Superior).
As concepções manifestadas entre os sujeitos desta pesquisa se identificam com
o estudo que Bueno (1999) realizou, demonstrando as percepções dos professores de
cursos de formação docente acerca da tecnologia, percepções estas que referenciavam a
tecnologia como instrumentos, recursos, objetos utilizados facilitadores da vida diária.
A mesma tendência pode ser verificada no estudo realizado por Santos (2005) com as
alunas do Curso de Pedagogia de três universidades brasileiras. Nesse estudo, as alunas
concordavam que a tecnologia, sendo o resultado do trabalho de pessoas geniais, produz
inovações que facilitam a vida de todos. A definição da tecnologia a partir dos objetos
se reflete em todo discurso feito pelas alunas. Assim, observou-se, em algumas aulas,
que o debate sobre o papel das tecnologias na sociedade abarca as mesmas questões: o
uso do computador, professores resistentes às inovações, falta de acesso da população
brasileira, falta de interesse em aprender. Predomina-se nos discursos, uma visão mais
utilitarista das tecnologias, ou, nas palavras de Lima Filho e Queluz (2005), uma visão
mais instrumental.
5. Conclusão
As concepções elaboradas pelos sujeitos sobre a tecnologia e sobre a ET
parecem influenciar as relações que o indivíduo estabelece com esta área de
conhecimento, além de influenciar suas atitudes diante da sociedade tecnológica. Não
pretendíamos com este estudo classificar em certo ou errado as representações
elaboradas pelos sujeitos, mas conhecê-las e discutir até que ponto poderiam ser
ressignificadas, buscando cada vez mais o desenvolvimento de uma consciência
tecnológica nos futuros educadores, cujo papel na preparação dos cidadãos para a vida
em sociedade é fundamental.
Os dados demonstraram uma tendência em relacionar a tecnologia ao uso de
objetos para facilitar a vida diária, a cotidianidade do sujeito vivenciada no trabalho, em
casa ou no lazer. Consequentemente, a Educação Tecnológica seria um caminho para se
aprender a utilizar com certa competência esses instrumentos, dando-se ênfase ao
aprendizado das novas tecnologias. Essa tendência corrobora com os reducionismos
apontados por Oliveira, M. (1997) que acabam por causar impactos significativos no
contexto escolar, na medida em que são incorporados pelos educadores, reforçando o
pensamento unicamente mercadológico acerca da tecnologia. A nossa experiência em
ambientes escolares, bem como as nossas observações nos cursos pesquisados permitenos realizar alguns apontamentos desses impactos:
•
as tecnologias são percebidas somente como recursos facilitadores da ação
pedagógica e, às vezes, até reduzidas aos novos recursos, esquecendo-se
daqueles mais antigos (e presentes) do contexto escolar, a começar pelo giz;
•
ao não se sentirem capacitados para lidar com as novas tecnologias, os
educadores não as incorporam em suas práticas. O resultado disso é a existência
de salas de informáticas fechadas e inativas, ou utilizadas somente com a
presença de um profissional especializado no assunto: o professor de
informática;
•
os educadores não percebem os processos tecnológicos presentes na organização
curricular, no processo de alfabetização, nas manifestações criativas dos alunos
ou na diversidade da prática pedagógica.
A ET é uma preocupação ainda em estágio inicial nos cursos pesquisados.
Destarte, é necessário promover a realização de atividades que permitam ao alunado
ampliar sua concepção sobre ciência e tecnologia, sentir-se engajado, forte e com poder
de mudança nesse processo, e não como um sujeito que recebe as invenções geniais de
outros. Algumas práticas e estudos curriculares com este objetivo puderam ser
percebidos nos cursos, mas de maneira modesta.
Ao confrontarmos este estudo com outras pesquisas (BUENO, 1999; LIMA
FILHO e QUELUZ, 2005; OLIVEIRA, L. et.al 2007), verificamos a semelhança nas
concepções adotadas pelos sujeitos de diferentes instituições e realidades: professores
dos anos iniciais, professores de outros estados atuantes em cursos de formação
docente, professores do ensino técnico-profissional. Sujeitos com formações diferentes,
com histórias de vidas diferentes, mas dentro de um único macro-contexto, onde a
ciência e a tecnologia se desenvolve intensamente, onde o consumo é exagerado, onde
as questões éticas são comumente subjugadas aos ditames capitalistas. Bem, as
concepções desses sujeitos distintos têm como ponto de interseção a predominância de
um caráter instrumental da tecnologia. Isto é no mínimo um alerta para as instituições a
fim de considerarem o estudo da tecnologia enquanto processos de invenção e
reinvenção humana, enquanto processos de intervenção na vida social.
i
BREMER, M; LIMA FILHO, D. L. El concepto de tecnología em la enseñanza secundaria y
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Download

educação tecnológica na formação de professores - CEFET