O PERIGO DA O.S1 NA EDUCAÇÃO PÚBLICA
Um mercado avassalador dito global é apresentado como capaz de
homogeneizar o planeta quando, na verdade, as diferenças locais
(desigualdades locais, grifo meu) são aprofundadas. Há uma busca de
uniformidade, ao serviço dos atores hegemônicos, mas o mundo se torna
menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania
verdadeiramente universal. Enquanto isso, o culto ao consumo é estimulado.
Milto Santos, 2008, p.19.
Cristino Cesário Rocha2
Como educador e pessoa humana compartilho uma impressão sobre a
Organização da Sociedade (O.S) que se mostra preocupante pelo fato de ser o que
considero uma ameaça e um perigo aos quatro aspectos interpenetrantes da educação:
Escola pública, magistério público, financiamento e função social do Estado.
Parto das contribuições de Pablo Gentili em obra a falsificação do consenso:
simulacro e imposição na reforma educacional do neoliberalismo e de argumentos do
governador de Goiás Marconi Perillo em artigo pesquisado: “Governador Marconi
Perillo pretende repassar a administração de unidades educacionais estaduais para as
organizações sociais. Modelo a ser adotado obteve grande sucesso nos Estados Unidos”.
1
O.S é Organização da Sociedade que tem a prerrogativa de gerenciar serviços públicos com a
aproximação e estabelecimento da parceria público-privado. Esse modo de administrar a saúde, a
educação e outros serviços coloca em risco a dimensão genuinamente pública dos espaços e trabalhos.
2
Cristino Cesário Rocha é professor de Filosofia e Sociologia da rede pública de ensino do Distrito
Federal. Possui formação Filosófica nas Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras das Faculdades
Associadas do Ipiranga – São Paulo. Formação Teológica no Instituto de Filosofia e Teologia de Goiás –
Goiânia. Pós-Graduação em Administração da Educação – UnB. Pós-Graduação em Culturas Negras no
Atlântico: História da África e Afro-brasileiros – UnB. Pós-Graduação em Educação na Diversidade e
Cidadania, com ênfase na Educação de Jovens e Adultos - UnB. Pós-Graduação em Educação,
Democracia e Gestão Escolar Unitins/Sinpro-DF. E-mail: [email protected]
O objetivo é problematizar e desqualificar a O.S que se afigura como uma faceta
neoliberal amplamente perversa para a educação pública.
Evidencio uma percepção inicial para lidar com a complexidade do assunto, daí
uma afirmativa que merece um debate: A escola pública organizada sob os ditames de
uma O.S é um perigo para quem reconhece a escola como espaço de dimensões pública,
laica, democrática e de qualidade socialmente referenciada.
Para entender a razão de minha inquietação/impressão, ao perceber a O.S como
faceta neoliberal perigosa, entendamos o que é a O.S, o discurso de quem defende esse
tipo de administração dos serviços públicos, precisamente no caso de Goiás sob a
liderança do governador Marconi Perillo (PSDB), bem como a intenção de Rollemberg
(PSB) de implantar no DF e, em decorrência do tipo de discurso, estabeleço correlações
com o discurso neoliberal e suas implicações no Brasil e no DF como particularidade.
A Organização da Sociedade é uma espécie de instituição que administra
serviços públicos sob a forma de parceria público-privado, em que a gestão se dá de
maneira compartilhada, podendo ser gestor/a um empresário/a, professor/a, militar ou
qualquer outra pessoa que se ajuste ao padrão exigido por quem comanda a instituição
como tal. Nessa tendência administrativo-pedagógica o Estado repassa recursos
públicos em forma de valores orçamentários, material, bens imóveis e pessoais para o
funcionamento da O.S. O problema já começa nessa definição. Cabe aqui a
desqualificação de alguns aspectos:
Primeiro que a gestão compartilhada não funciona em forma de lei (nº 4.036, de
25 de outubro de 2007), nem como mecanismo que forja uma aproximação entre o
público e o privado. Uma gestão da escola pública deve ser efetivamente democráticoparticipativa (Lei nº 4.751, de 07 de fevereiro de 2012) e sob uma gestão pública dos
espaços, pessoas e recursos.
Segundo, que os princípios de uma gestão pública que reconhece a democracia
participativa como direito e fundamento da educação não tem nada a ver com os
princípios de gestão privada que possui outra orientação, entre as quais a
privatização/terceirização, planejamento estratégico de caráter tecnocrático, ênfase na
eficiência, eficácia e produtividade e gestão de caráter militar.
Terceiro, podendo ser o gestor/a um empresário/a ou um militar, seguramente a
educação pública terá o viés, a cultura e a prática desses senhores/as e logicamente esse
perfil atende ao que Gentili (1998:25) chama de “experts” da perspectiva neoliberal
como saída para a crise na educação. É a tentativa de colocar no comando da educação
pública quem de fato atende às exigências neoliberais (empresários, exitosos nos
campos da competição e da meritocracia, experts no mercado, especialistas
tecnocratas...).
O quarto aspecto que se pode avaliar é a questão do repasse público para a O.S.
Por muito tempo empresas e empresários/as têm mamado nas tetas do Estado,
apropriando de recursos públicos para engodar o mercado privado. Uma das disputas
que se coloca hoje no campo da educação pública é sobre o financiamento, de modo que
a luta é pelo financiamento público do público. Essa lógica modifica substancialmente a
orientação do trabalho administrativo-pedagógico das escolas acoplada à ideia de gestão
pública do público.
As motivações de Marconi Perillo3 em matéria disponibilizada (consultar site
abaixo), argumentando favorável à O.S em educação podem ser identificadas como
destrutivas e, mais do que isso, apresento outro modo de perceber a mesma
situação/demanda. Há que colocar em xeque também a possibilidade de o governador
do Distrito Federal (Rodrigo Rollemberg) em copiar tal iniciativa que não tem sentido
para a nossa realidade e seguramente não o tem para Goiás e demais entes federados.
A ideia é que a O.S como modelo administrativo a ser implantado siga o padrão
de Charter Schools americanas, ou seja, colégio estadual com maior autonomia, cuja
gestão é compartilhada entre os setores públicos e privado. Nesse contexto, o governo
Perillo avalia que a proposta é viável, porém o projeto deve passar por análise mais
profunda. A nova Secretária Estadual de Educação, Raquel Teixeira, está em viagem
pelos Estados Unidos, contudo não se sabe se a titular estaria buscando maiores
informações acerca do modelo americano de colégios charter. Façamos uma avaliação
dessa concepção administrativa.
3
Consultar o site: http://www.jornalopcao.com.br/reportagens/estado-deve-implantar-oss-na-area-daeducacao-aos-moldes-das-charter-schools-americanas-2-25931/. Marconi Perillo (Governador de Goiás)
fala sobre a O.S em Goiás como possibilidade de qualificar o gerenciamento e as práticas pedagógicas.
Ele pretende repassar a administração de unidades educacionais estaduais para às organizações sociais.
Pretende também que as escolas estaduais tenham o mesmo padrão de qualidade das particulares. Isso
prova a aproximação indevida e inconsistente que se pensa estabelecer entre o público e o privado, vez
que se pode problematizar o conceito de qualidade no âmbito da escola privada.
Há um primeiro problema crucial que precisa ser desarticulado e desqualificado:
a ideia de Estados Unidos como a extensão de toda a América, o modelo exemplar e a
civilidade absoluta que deva ser globalizada. Não dá para engolir a ideia de que Estados
Unidos seja a síntese das Américas, civilizada e desenvolvida e as demais nações, povos
e civilizações sejam periferias, bárbaros e subdesenvolvidos. As epistemologias
Históricas, Sociológicas, Filosóficas, Geo-humanas e Antropológicas precisam reverter
esse quadro conceitual. A geração da posteridade precisa ter uma referência de PátriaNação autônoma, percebida como civilidade, como cultura, como povo e historicidade
própria.
O segundo problema está na cópia de modelos estadunidenses sem considerar a
realidade complexa, diversa e contraditória de cada localidade, sujeitos, instituições e
políticas educacionais. Eu diria que tentar enquadrar o modelo educacional
estadunidense no brasileiro é como tentar enquadrar o pensamento da filosofia grega
nascente (antiguidade grega) ao pensamento hebraico - cristão. Dito de outro modo: são
dificuldades, desafios, possibilidades e expectativas distintas que não se encaixam em
tudo e em todos os lugares.
O terceiro argumento é que a viagem da Secretária Estadual de Educação aos
Estados Unidos possa ter uma motivação concreta: beber na fonte neoliberal. A
América Latina, de modo particular o Brasil com a sua extensão geopolítica (União,
Estados, Municípios e Distrito Federal) ainda seguem os ditames da política de
educação baseada nos interesses do Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e
Banco Interamericano de Desenvolvimento.
A ideia-mote de uma educação de caráter privado, sem a intervenção do Estado
e que atenda aos interesses dos grandes bancos tem a ver com o que se intitulou como
Consenso de Washington, um conjunto de medidas, formuladas em novembro de 1989
por economistas de instituições financeiras situadas em Washington, fundamentado
num texto do economista John Willianson, não mera coincidência o fato de ter sido
cunhado por um economista que atendia aos interesses do Banco Mundial, FMI e outros
organismos internacionais. As medidas4 que se tornaram oficiais do FMI em 1990,
4
Pablo Gentili, 1998, p.14 evidencia o conjunto de medidas do Consenso de Washington, assim
identificadas: disciplina fiscal, redefinição das prioridades do gasto público, reforma tributária,
liberalização do setor financeiro, manutenção de taxas de Cambio competitivas, liberalização comercial,
passaram a ser receitadas para promover o ajustamento macroeconômico dos países em
desenvolvimento que passavam por dificuldades.
Há a difusão da ideia de que o neoliberalismo advoga o “Estado mínimo” como
garantia de redução do tamanho do Estado em sentido de atuação/intervenção no campo
das políticas sociais. Entretanto, tenho entendido, a partir da percepção de certas
relações entre Estado, Indivíduo e Sociedade que haja uma lacuna no discurso do
“Estado mínimo”. Começo com a pergunta: mínimo para quem?
Pela real tendência de o Estado estar a serviço das classes dominantes e ao
mesmo tempo recebendo contrapartidas dessa classe, não vejo Estado mínimo de forma
genérica como se tem colocado por intelectuais, pesquisadores, movimentos sociais etc.
Percebo que o estado seja mínimo para atender aos interesses da classe trabalhadora,
otimizar os serviços públicos, valorizar e qualificar os quadros, assegurar e garantir
direitos. É Forte, absoluto e interventor para fazer valer o direito de duas classes que em
certas relações e situações se confundem: a dirigente e a empresarial, banqueiros e
latifundiários. Não tenho dúvidas: O mesmo Estado é mínimo e máximo ao mesmo
tempo, a depender do lado que se defende e do jogo de interesse que está inderido.
O quarto argumento é que há uma falácia no uso do termo “Consenso”. O que
existiu de fato foi a imposição de um pacote de consultores/especialistas de grandes
corporações internacionais (de bancos) à América Latina. Restou aos governos latinos
americanos na condição de países em desenvolvimento com sérias dificuldades
econômicas exercitar o dever de casa (10 regras ditadas) pelos Estados Unidos como
pretenso “salvador das pátrias” em desenvolvimento ou não adotar um ajuste absoluto
diante dos princípios neoliberais que dão sustentabilidade ao capitalismo globalizado
que teve e tem a influência do FMI, Banco Mundial e Departamento do Tesouro dos
Estados Unidos. Gentili elucida esse modo de perceber ao apresentar uma ideia que põe
em dúvida a mera conspiração diante do ajuste neoliberal que ocorreu e vem ocorrendo
no Brasil e no mundo:
atração das aplicações de capital estrangeiro, privatização de empresas estatais, desregularão da
economia, proteção de diretos autorais.
Realmente, não parece muito sério supor que as políticas
neoliberais sejam planejadas por um reduzido grupo de
malignos conspiradores durante uma partida de bridge. Isso é
tão absurdo quanto supor que o Consenso de Washington
expressa, de fato, um verdadeiro “consenso”, ou seja, o acordo
unânime entre nações ou grupos que negociam questões de
interesse comum. As nada discretas e certamente pouco
pacíficas maneiras de persuasão que foram usadas na América
Latina, para “impor” o citado “consenso”, têm bastante pouco a
ver com aquilo que geralmente denominamos sob esse nome
(Gentili, 1998:28).
Não se pode, a rigor, pensar que tudo seja conspiração contra a América Latina,
de modo particular contra o Brasil. A imposição do modo de organizar a economia e de
concepções de pessoa, de culturas, de sociedade e mundo perpetrados pelos agentes
institucionais do FMI, Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento e o
Departamento do Tesouro dos Estados Unidos poderiam e podem ser aprofundados e
repensados a partir do modo de caminhar latino-americano. Dessa maneira há que
perguntar: até onde vai a conspiração? Qual o papel dos governos latino-americanos
diante da pretensa absolutidade dos Estados Unidos? É preciso nos perguntar também
quais as reais demandas locais e regionais que não encontram solução/resposta nos
Estados Unidos e em outras localidades. Copiar projetos, programas e políticas públicas
é burrice, ingenuidade, preguiça mental ou tudo isso?
A matéria em análise segue um ritmo de discurso nada animador do ponto de
vista ideológico-político-educacional. De acordo com a ideia de O.S, confundida com
Escola Charter, o que difere esses colégios dos demais é a disciplina aos moldes dos
quartéis e o método pedagógico que exige mais comprometimento dos alunos. Avalio
em dois níveis:
Primeiro que escola não é quartel, nem aqui nem alhures. Essa é uma das
grandes ambiguidades da implementação da O.S em educação pública, vez que a
natureza pública não se ajusta, nem se adéqua ao modo privado de conceber e atuar em
nível administrativo-pedagógico. A disciplina de quartel aplicada à escola pública acaba
por transformar o espaço público em regime militar e em última análise, tornar-se um
modelo prisional com todas as formas de controle que essa instituição adota. A escola
pública não precisa de pretensos salvacionistas, messiânicos e mágicos. A educação
pública lida com pessoas humanas complexas e em processo de crescimento, por isso
não se pode buscar soluções parciais para situações de grande envergadura.
O segundo aspecto é tão temerário quanto o primeiro (método pedagógico) que
exige mais comprometimento dos alunos. Exigir comprometimento não é o problema. O
que coloco em discussão e problematizo é o fato de se pensar um comprometimento
dentro de um método. Qual método? Método ao estilo de um quartel? Ao estilo militar?
O compromisso é algo forjado ou uma atitude de vida que tem mais a ver com o
despertar? A escola pública já cumpre essa função social de provocar/parir ideias que
levem ao compromisso pessoal e social por meio de projetos pedagógicos em que
estudantes aprendem na escola a atuar com prática coletiva, pensar no outro com suas
diferenças, valores e direitos; respeito aos diferentes espaços e compromisso com a
vida. Talvez o que a O.S e a escola charter não sabem é que a escola pública trabalha
com o humano, genuinamente humano.
O desejo de se aplicar o modelo estadunidense na escola pública brasileira tem o
seu repertório afiado em governos que defendem esse modo de administrar a educação.
Em entrevista à imprensa, Marconi Perillo deseja ir além, ou seja, que o filho do pobre
estude em escolas com padrão de escola de rico. Ainda se posicionando sobre o assunto,
Perillo acredita na produtividade dos servidores no regime celetista sob o comando das
OSs em detrimento do estatutário. Para o tucano, os funcionários do Estado contratados
pelo regime celetista rendem mais pelo simples fato de serem substituídos por
profissionais no mercado se não corresponderem as expectativas da sociedade em
desempenhar um trabalho de qualidade. Há três problemas nesse discurso de caráter
governamental que precisam de uma avaliação séria.
A primeira diz respeito à nítida dualidade entre escola de rico e escola de pobre.
A concepção de escola que se mostra na fala de Perillo é que haja uma escola de rico
(privada) com padrão de qualidade que deve ser copiada como modelo, restando à
escola pública, nesse modo de ver, um lugar desprestigiado e até sem importância diante
do padrão privatista que se pretende exemplar. O que se pretende atingir e desqualificar
com o viés neoliberal embutido na O.S é, na verdade, a dimensão pública da educação.
Neste contexto, em que o governador de Goiás se posiciona sobre o assunto O.S
deixa muito evidente qual tipo de educação se acredita e para qual tipo de sociedade. É
basicamente uma crença neoliberal: separa a Política da Educação e acredita ser o
dilúvio de técnicas e métodos, especialistas e exitosos no mercado educacional os
responsáveis pela qualidade da educação. Acredito que a educação seja um campo que
não prescinde da epistemologia, nem de determinado método/técnica, mas depende e
exige que necessariamente esses processos epistemológico-metodológicos sejam
emancipatórios e humanizados. Técnica, métodos e ciência alienadas é um desastre para
a construção de pessoas como sujeitos
que fazem história e são produzidos pela
história.
Penso ser desnecessário formatar uma escola em que pobres tenham acesso de
padrão como a de ricos, geralmente as escolas privadas. A educação como direito de
acesso, permanência e à qualidade deveria ser toda ela pública, laica, democrática e de
qualidade socialmente referenciada. Ao mercantilizar a educação, privatizou-se os
recursos, paga-se mal o profissional da educação, estabelece-se um sistema de controle
fabril e prisional na escola e divulga uma falsa noção de qualidade. A ideia é que se faça
o inverso do que vem ocorrendo em governos que bebem na fonte neoliberal. Eles
precarizam todas as instituições públicas, inclusive a escola pública e apresentam saídas
neoliberais para solucionar, saídas já comprovadas que não deram certo. Qual é o
inverso? Otimizar a educação pública como direito a todas as pessoas.
Outro modo de ver do governador de Goiás que representa um perigo é o que
considero como segundo aspecto que deve estar em alerta: a concepção de
produtividade dos servidores, em que de acordo com o governador professores serão,
em outras palavras, descartados caso não se ajustem ao modelo de produtividade das
OSs. Essa flexibilização da contratação de professores/as, bem como a possibilidade
real de substituição tendo como parâmetro um tipo de concepção de produtividade gera
esfacelamento e degradação do magistério público e atinge outra frente: enfraquece
sindicatos. Quem acredita na educação pública deve negar com veemência a O.S e
qualquer estratégia que leve à privatização da educação e de outros serviços públicos.
Essa exigência põe em destaque com maior complexidade a função político-social dos
sindicatos, CUT e CNTE.
A substituição de professores no “mercado” deixa bem evidente o ideário
neoliberal de estabelecer um mercado humano e tecnocrático. Ao dizer “não atender às
expectativas da sociedade” pode ser traduzido ou modificado por não atender às
expectativas do mercado, do ideário privatista, elitista e desumano. É preciso fazer o
debate amplo com os diversos segmentos sociais do Distrito Federal sobre o processo de
contratação temporária na educação pública e o desejo de se implantar a O.S. Diante da
riqueza do significado da Lei de Gestão Democrática nº 4.751, de 07 de fevereiro de
2012 a O.S emerge como uma afronta à lei e aos sujeitos históricos que a reconhecem
como marco ético-normativo, político-social e educacional crível e singular em sua
propositura e fundamentos.
Uma evidência de que essa reflexão problematiza com seriedade a O.S é que na
América Latina, verificou-se que as instituições católicas são as organizações do setor
privado mais ativas na gestão de escolas públicas em parceria com o Estado. No Chile,
por meio do sistema de voucher, os alunos são matriculados em escolas do setor privado
com financiamento público. No entanto, resultados de avaliações nacionais e
internacionais mostram que a participação do setor privado na educação pública não é,
em si, garantia de melhoria de resultados no aprendizado.
Fato que não desmente a história é que as regras do jogo para a educação pública
e outras políticas sociais na América Latina foi ditado por quem entende do mercado,
mas sem a mínima condição de solucionar problemas que escapam da ordem mundial
capitalista. Gentili sela o que venho avaliando nessa diminuta reflexão que pode ser
problematizada por quem gosta de ler e reler:
É possível verificar que os países que aplicaram ou aplicam o ajuste
estrutural e setorial promovido pelo Banco Mundial não podem demonstrar
melhorias substantivas na qualidade dos processos pedagógicos, mas que,
contrariamente, evidenciam um agravamento nas péssimas condições de
ensino e aprendizagens nas instituições escolares (Gentili, 1998:34).
Nesse contexto, pode-se chegar a seguinte conclusão provisória em forma de
indagação: o que levaria o governo do Distrito Federal a copiar uma ação que traz em
seu conteúdo noções e práticas neoliberais fracassadas? Qual o entendimento e
discussão ampla que governos fazem com a sociedade, com sindicatos e movimentos
sociais acerca de projetos complexos, entre os quais a adoção de O.S na educação? O
que motiva a usar esse modelo O.S em educação pública? O que pensam os
Deputados/as Distritais sobre esse assunto? Daria uma ótima audiência pública na
Câmara Legislativa um debate sobre o contorno ético-político e pedagógico da O.S na
educação pública.
Seguramente o círculo vicioso de cópia é tão inconsequente quanto estabelecer
uma alteração da gestão da escola pública sem ouvir os sujeitos educativos e de saberes
que são os que movimentam o ensino-aprendizagem e o crescimento socioeconômico e
cultural do país. Trago ao contexto conclusivo o pensamento de Milton Santos,
Evidenciado na abertura desse artigo que ajuda a entender que a tentativa de
homogeneizar localidades, regiões e nações é, sem dúvida, um perigo neoliberal
acoplado à globalização e o capitalismo, ambos articulados em benefício de uma elite
global.
GENTILI, Pablo. A falsificação do consenso: simulacro e imposição na reforma
educacional do neoliberalismo. Petrópolis: Vozes, 1998.
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência
universal. 16ªed. Rio de Janeiro: Record, 2008.
Taguatinga Norte-DF, 04 de novembro de 2015.
Artigo para um debate sobre a Organização da Sociedade na educação pública.
Download

O PERIGO DA O.S NA EDUCAÇÃO PÚBLICA - sinpro-df