TEORIA DOS CAMPOS CONCEITUAIS: UMA INVESTIGAÇÃO COM SITUAÇÕES-PROBLEMA SOBRE APRENDIZAGEM DE EQUAÇÕES DA RETA SILVA, Ronald de Santana da – UFRPE [email protected] BEZERRA, Elvis da Silva – UFRPE [email protected] Área Temática: Educação: Teorias, Metodologias e Práticas Agência Financiadora: Não contou com financiamento Resumo Este trabalho foi uma proposta de intervenção no 3º ano do ensino médio, tendo como finalidade por em prática os estudos de G. Vergnaud acerca da Teoria dos Campos Conceituais, em específico a relação da tríade situações (S), invariantes (I) e representações (R) na formação de um determinado conceito. Seu objetivo geral foi verificar a aprendizagem de equação da reta através de atividades que englobassem o campo conceitual desse conteúdo. Também nos direcionamos a realizar estudos acerca desse campo conceitual; a investigar como os alunos utilizam os invariantes para resolver situações-problemas nessa área de estudos; para isso elaboramos situações-problema no campo conceitual da equação da reta, essas situações foram apresentadas através de uma ficha de atividade dividida em cinco momentos. Para o desenvolvimento da pesquisa foram considerados quatro alunos voluntários de uma escola pública, na qual tivemos encontros periódicos, divididos em quatro momentos, dois destes foram reservados a aplicação do pré-teste e pós-teste, e nos demais foi realizada a intervenção com a ficha de atividade, utilizando a carga horária das aulas de matemática, própria do cronograma da escola. Tratamos os dados coletados de maneira quantitativa e qualitativa para fomentar nossas análises. Como um dos resultados da intervenção realizada, pudemos observar que houve uma significativa aprendizagem do conceito de equação da reta para os quatro sujeitos da pesquisa, pois nos informaram, através dos dados, que o encaminhamento para a obtenção de uma equação da reta foi apropriado por eles, mas foram notórias suas dificuldades acerca de outros conceitos como os algébricos e aritméticos. Palavras-chave: Teoria dos campos conceituais; Ensino de matemática; Geometria analítica. Introdução Este projeto mostra os resultados que se foram obtidos a partir do desenvolvimento e aplicação de atividades sobre equação da reta, conteúdo de geometria analítica em matemática do 3º ano do ensino médio, com finalidade de discutir a questão: fornecendo atividades e 10806 situações problematizadoras referente a um conceito, a aprendizagem desse pelos alunos passa a ter uma característica de um aprendizado significativo? Utilizamos então a teoria dos campos conceituais de Vergnaud, pois acreditamos que ela nos fornece bases para subsidiarmos nossa metodologia. Levamos em consideração que, a partir dessa concepção de como se dá a formação de um conceito pelo indivíduo, os professores possam cumprir seus objetivos obtendo resultados mais eficazes, pois acreditamos que os professores estão sendo orientados, quando elaboram seu currículo de prática pedagógica, pelas Orientações Curriculares para o Ensino Médio, esse informa que: Para a escolha de conteúdos, é importante que se levem em consideração os diferentes propósitos da formação matemática na educação básica. Ao final do ensino médio, espera-se que os alunos saibam usar a Matemática para resolver problemas práticos do quotidiano; [...] compreendam que a Matemática é uma ciência com características próprias, que se organiza via teoremas e demonstrações; percebam a Matemática como um conhecimento social e historicamente construído; saibam apreciar a importância da Matemática no desenvolvimento científico e tecnológico. (BRASIL, 2006, p.69) [...] A forma de trabalhar os conteúdos deve sempre agregar um valor formativo no que diz respeito ao desenvolvimento do pensamento matemático. Isso significa colocar os alunos em um processo de aprendizagem que valorize o raciocínio matemático [...]. Também significa um processo de ensino que valorize tanto a apresentação de propriedades matemáticas acompanhadas de explicação quanto a de fórmulas acompanhadas de dedução, e que valorize o uso da Matemática para a resolução de problemas interessantes, quer sejam de aplicação ou de natureza simplesmente teórica. (ibid, p.70) Como objetivos desse trabalho apresentamos os seguintes: como geral, verificar a aprendizagem de alunos do 3º ano do ensino médio sobre equação da reta através de atividades relativas ao campo conceitual deste conteúdo. A partir dele, os objetivos específicos são: realizar estudos acerca do campo conceitual da equação da reta; investigar como os alunos utilizam os invariantes para resolver situações-problemas no campo conceitual da equação da reta; elaborar situações-problema no campo conceitual da equação da reta. Uma proposta de Vergnaud é repensar as condições de aprendizagem com o objetivo de que esta se torne significativa para os alunos. Nessa perspectiva, a Teoria dos Campos Conceituais oferece condições para que identifiquemos dentro dos saberes científicos e cotidianos os elementos necessários para tal aprendizagem. Essa teoria tem como um de seus 10807 aspectos relevantes o destaque dado ao tratamento do saber escolar, esse situado entre o saber cotidiano e o científico. Dessa maneira, a teoria dos campos conceituais dá sentido ao saber escolar fundamentando-o nos dois saberes já citados, para que não haja o prevalecimento de uma dimensão sobre a outra. Cabe então à didática o desenvolvimento de situações que possibilitem a mobilização de uma diversidade de conceitos (PAIS, 2001). Analisaremos agora alguns aspectos da teoria dos campos conceituais. Vergnaud (1996) defende que: A teoria dos campos conceituais é uma teoria cognitivista que visa fornecer um quadro coerente e alguns princípios de base para o estudo do desenvolvimento e da aprendizagem das competências complexas, nomeadamente daquelas de relevam das ciências e das técnicas. (VERGNAUD, 1996, p.155) Temos então, que a teoria dos campos conceituais considera a existência de conceitos interligados entre si, formando assim uma rede complexa de conceitos. Para que ocorra o surgimento do conhecimento conceitual, esse deve emergir dentro de situações-problema, isto é, os docentes devem fornecer situações problematizadoras que possuem significação para o aluno, e que essas tenham como objetivo fornecer potencialidades para o surgimento e aquisição do conceito e sua estrutura. Segundo a teoria dos campos conceituais o conceito é constituído de três partes: o conjunto de situações (S) que dá significado ao conceito, o conjunto de invariantes (I) e o conjunto de representações simbólicas (R) que representam as situações e os procedimentos para lidar com os invariantes. Em seus estudos, Magina (2001), ratifica a idéia de Vergnaud de que um conceito não dever ser estudado isoladamente e sim em situações que inter-relacionem vários conceitos. Partindo desta idéia, os professores de matemática têm o desafio de fazer com que, em sala de aula, aconteça uma melhor relação entre o conceito e a resolução de problemas, tornando-os mais interessantes e compreensíveis para os alunos. Os argumentos anteriores nos levaram a estudar um ramo da matemática, a geometria analítica. Essa teve com principal função unir a geometria clássica com os estudos algébricos, esses que estavam emergentes no séc. XVII (IEZZI, 2004, p 80). A Teoria dos Campos Conceituais nos possibilita observar que ao tratarmos de um conteúdo da geometria analítica como equação da reta, está envolvida uma diversidade de outros conteúdos, como por exemplo, conceitos de álgebra; estudos sobre matrizes e cálculo de determinantes; noções 10808 básicas de geometria analítica como os axiomas de ponto, reta e plano; conceito de par ordenado e estudos acerca da distância entre dois pontos entre outros. Esses conhecimentos prévios são necessários para que o se possa fornecer situações para o aprendizado de equação da reta. Isso nos aponta mais uma vez para a Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud, onde percebemos que não se pode estudar um novo conceito matemático de forma isolada, mas sim o relacionando com outros conceitos através de situações problematizadoras. Metodologia A pesquisa teve abordagem qualitativa, contendo tratamento de dados quantitativos. Os dados quantitativos foram sistematizados e organizados em tabelas, para posterior interpretação e inferências cabíveis. O campo da pesquisa foi uma escola da cidade de Recife, da rede estadual de ensino que dispõe de duas turmas do 3º ano do ensino médio. O alvo da pesquisa foi o 3° ano B tarde, contendo cerca de dezessete alunos na referida turma. Para a amostra, todos foram convidados a participarem da pesquisa, sendo que quatro alunos da turma já citada aceitaram o convite foram sendo, portanto, considerados para sujeitos. Supomos que estes já viram na escola os conteúdos básicos para o estudo acerca de algumas concepções de geometria analítica, no qual estão implícitos os conceitos de ponto, reta, plano, plano cartesiano, par ordenado, entre outros conceitos relevantes ao aprendizado de equações da reta. Os instrumentos de coleta de dados foram os seguintes: um questionário de sondagem que foi aplicado como pré-teste, e o mesmo para o pós-teste (ver Apêndice I); uma seqüência didática que foi utilizada durante as intervenções (ver Apêndice II); também utilizamos anotações através de um observador durante as atividades realizadas pelos alunos. A intervenção mobilizou os alunos durante quatro (04) encontros. De início foram discutidos quais os métodos que iriam ser utilizados para coletar os dados que fundamentaram as discussões deste projeto. Os dados foram coletados durante a 10809 aplicação das atividades referidas anteriormente com os sujeitos da pesquisa, conforme já justificado acima. Em seguida, contatamos a escola previamente escolhida para participar da pesquisa. Nesse contato, solicitamos ao professor responsável a permissão para que os alunos participassem da intervenção; esses foram mobilizados através de quatro (04) encontros os quais foram divididos da seguinte forma: 1º momento: aplicação do pré-teste; 2º momento: 1ª intervenção com uma seqüência didática; 3º momento: 2ª intervenção com uma seqüência didática; 4} momento: aplicação do pós-teste. Por fim, foram transcritas todas as respostas dos alunos, analisados todos os comentários e possíveis tentativas de solucionar os problemas que foram propostos para fim de uma análise mais sistemática. Resultado e discussão Na Teoria dos Campos Conceituais consideramos a existência da interligação dos conceitos entre si, formando uma rede complexa de conceitos. Para que ocorra o surgimento do conhecimento conceitual, esse deve emergir dentro de situações-problema. O interventor iniciou fornecendo situações problematizadoras através de uma ficha de aula (ver Apêndice II) com situações potencialmente significativas para o surgimento e aquisição do conceito nos alunos. Observamos que, ao serem apresentados às situações, os alunos se mostraram motivados. Isso foi evidenciado pela da atenção na aula e, no momento do intervalo, cerca de 10 alunos permaneceram na sala tentando resolver as situações propostas. No que se refere aos conceitos mobilizados, Magina (2001), ratifica a idéia de Vergnaud de que um conceito não dever ser estudado isoladamente e sim em situações que inter-relacionem vários conceitos. Isso foi observado quando os alunos foram, nas situações propostas, questionados pelo interventor sobre o seu conhecimento prévio para a resolução das atividades. Alguns alunos informaram que: “Isso tem alguma coisa a ver com aquilo de repetir as colunas?” (aluno 1) 10810 Ela estava se relacionando ao algoritmo do determinante de uma matriz, mas esse conceito não estava formalizado, pois não conseguiu resolver o cálculo de determinante. “Tem que substituir alguma coisa.” (aluno 2) Essa fala foi proferida, quando os alunos foram confrontados com um problema em que poderiam utilizar um sistema de equações do primeiro grau. Ele explicou para um colega, sentado ao seu lado. “Isso é matriz?!” (aluno 3) Essa aluna apresentou essa resposta quando foi questionada a respeito do seu conhecimento sobre matrizes, a partir de uma ilustração, apresentada pelo interventor, de um determinante.A mesma também recorreu aos seus invariantes quando foi apresentado o problema a do 3º momento, a partir dele, ela disse: “Isso tem alguma coisa a ver seno, né?!” (aluno 4) Os resultados do pré e pós-teste são observados nas Tabelas 1 e 2, onde serão distribuídas as quantidades de alunos relacionadas com suas respostas: Tabela 1: distribuição das respostas dos alunos no pré-teste Tipos Respostas / Atividades Certas Raciocínio certo sem conclusão Raciocínio certo com cálculo errado Raciocínio errado Não respondeu 1ª 0 0 0 0 4 2ª 0 0 0 0 4 3ª 0 0 0 0 4 4ª 0 0 0 2 2 Tabela 2: distribuição das respostas dos alunos no pós-teste Tipos Respostas / Atividades Certas Raciocínio certo sem conclusão Raciocínio certo com cálculo errado Raciocínio errado Não respondeu 1ª 0 1 2 0 1 2ª 1 0 3 0 0 3ª 1 0 1 0 2 4ª 0 1 1 0 2 10811 Ao cruzarmos os dois testes anteriores, notamos uma expressiva mudança na resolução das atividades. Algumas situações necessitam de uma análise mais detalhada. As respostas da Tabela 2 nos mostram que, para a primeira atividade, três alunos conseguiram desenvolver o raciocínio certo, no entanto, um deles não conseguiu concluir, pois na tentativa de resolver por condição de alinhamento não obteve sucesso desistindo assim de resolver a atividade; e os outros concluíram com cálculo errado, devido à deficiência dos conceitos algébricos, o que podemos observar na situação ilustrada a seguir: Resolução do aluno 1 no pós-teste Nesse mesmo quadro temos que, na segunda atividade, todos os alunos tentaram responder. Apenas um obteve êxito, os demais apresentaram apenas a dificuldade em cálculos algébricos e aritméticos, pois utilizaram o raciocínio certo. Podemos observar isto na ilustração que segue: Resolução do aluno 2 no pós-teste Na terceira atividade do pós-teste, notamos que dois alunos utilizaram raciocínio certo, mas um deles não conseguiu concluir a questão, pela deficiência em cálculos algébricos, isso foi constatado na ultima etapa da resolução. Isto foi observado a seguir: Resolução do aluno 3 no pós-teste Na quarta atividade, os alunos foram confrontados com uma nova situação que não foi tratada durante a intervenção, mas dois alunos utilizaram raciocínio certo. Um deles não 10812 concluiu e o outro apresentou dificuldade na identificação das coordenadas de um ponto no plano cartesiano, quando o ponto se encontra em um dos eixos do plano. Essas observações são vistas a seguir: Resolução do aluno 4 no pré-teste Resolução do aluno 4 no pós-teste Conclusão Ao afirmar que a Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud informa que para o surgimento de um conceito, devemos fornecer uma diversidade de situações então cabe a didática o desenvolvimento dessas que possibilitando a mobilização de uma diversidade de conceitos (PAIS, 2001). Dessa forma, com a intervenção realizada, podemos observar que evoluiu a aprendizagem do conteúdo equação da reta para os quatro sujeitos da pesquisa, pois nos informaram, através dos dados, que o encaminhamento para a obtenção de uma equação da reta foi apropriado pelos alunos, mas foram notórias suas dificuldades acerca de outros conceitos como os algébricos e aritméticos já mencionados. Segundo a teoria dos campos conceituais os alunos construíram o conceito de equação da reta a partir de um conjunto de situações (S) que deram significado ao conceito, mobilizando um conjunto de invariantes (I), e utilizando um conjunto de representações simbólicas (R), que representaram as situações e os procedimentos para lidar com o invariante equação da reta. A partir dessa pesquisa, encaminhamos a validade da mesma, bem como a realização de outras pesquisas em turmas maiores nessa direção, inclusive em sala de aula. Encaminhamos também que, de acordo com a nossa realidade, confirmada através dos diversos exames nacionais e internacionais sobre conhecimentos de matemática em alunos de nível básico, é a ocorrência de alunos despreparados para tratarmos de um assunto que requeria mais conhecimentos prévios formalizados, por esse motivo não foi possível aplicar 10813 toda a seqüência didática planejada. Esperamos que estudos posteriores possam ser realizados contornando tais obstáculos. REFERÊNCIAS IEZZI, Gelson, et al. Matemática: ciências e aplicações, 3º série: ensino médio. 2ª edição. São Paulo: Atual, 2004. MAGINA, Sandra, et al. Repensando Adição e Subtração: contribuições da teoria dos campos conceituais. 2ª ed. São Paulo: PROEM, 2001. PAIS, Luiz Carlos. Didática da Matemática: uma análise da influência francesa. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 51–63. VERGNAUD, G. A teoria dos campos conceituais. In: BRUN, Jean (dir.). Didácta das matemáticas. Trad. Maria José Figueiredo. Lisboa: INSTITUTO PIAGET, 1996, p. 155–191. Apêndice I: Questionário de sondagem aplicado como pré e pós-teste. 10814 10815 Apêndice II: Seqüência didática aplicada na intervenção. UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO Programa de Pós-Graduação em Ensino das Ciências Aluno: ___________________________________________________________ Ficha de aula 1º momento: Uma função pode ser representada a partir de uma equação, de um diagrama, com pares ordenados, ou com um gráfico no plano cartesiano. Então, qual seria a representação gráfica da função f(x)=3x-1? 2º momento: Verifique se A(1,2), B(3,4) e C(4,6) estão alinhados. Determine m sabendo que os pontos A(2,m), B(4,1) e C(-1,-4) estão alinhados. Dado o gráfico abaixo, qual a função que o representa? Vamos determinar a equação da reta que passa pelos pontos A(1,3) e B(2,4), sabendo que um ponto C(x,y) é colinear aos outros dois. Verifiquem se P(1,2), pertence a seguinte reta: x y 1 2 3 1=0 3 4 1 10816 3º momento: Determine a equação da reta da figura: Calcule o coeficiente angular das retas nos seguintes casos: - A(1,2) e B(2,4), são pontos pertencentes a reta r. - Uma reta cuja inclinação mede 60°. 4º momento: Qual a equação da reta apresentada na figura abaixo: 5º momento: Geoplano: batalha de retas