O Projeto do Novo Código de Processo Civil e a Arbitragem
O projeto do novo Código de Processo Civil atualmente em tramitação perante o
Senado Federal - Projeto de Lei do Senado nº 166/2010 - deu valioso destaque ao
reconhecimento da garantia da autonomia da vontade das partes na escolha pelo
procedimento arbitral; todavia, deixou de lado a oportunidade de conferir à arbitragem
tratamento amplo e pormenorizado em sede de capítulo especial.
Como exemplos do expresso reconhecimento do projeto do novo CPC à possibilidade
da opção pelo procedimento arbitral ao poder judiciário para a solução de litígios,
pode-se destacar os seus artigos 3º e 27, que assim dispõem:
“Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça
ou lesão a direito, ressalvados os litígios voluntariamente
submetidos à solução arbitral, na forma da lei."
"Art. 27. As causas cíveis serão processadas e decididas
pelos órgãos jurisdicionais nos limites de sua competência,
ressalvada às partes a faculdade de instituir juízo arbitral,
na forma da lei.”
Nada obstante a inexistência de um capítulo específico destinado ao procedimento
arbitral, o que mantém a sua regulamentação basilar fundamentada nas regras da Lei
9.327, de 1996, o projeto do novo CPC traz em seu bojo menções relevantes à
arbitragem, dignas de atenção de toda a comunidade jurídica.
Como um exemplo de menção direta do projeto do novo CPC à arbitragem, o artigo
338 exclui, em seu parágrafo 4º, a possibilidade do reconhecimento de ofício pelo juiz
de convenção arbitral pactuada entre as partes, expressão que, conforme a exposição
de motivos do projeto, abrange tanto o conceito de cláusula arbitral quanto o de
compromisso arbitral1.
Note-se que este mesmo artigo 338, em seu inciso X, estabelece a necessidade da
alegação pela parte da existência da convenção arbitral em sede de preliminar de
contestação, sob pena do processamento da lide perante a jurisdição comum:
"Art. 338. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito,
alegar:
(...)
X – convenção de arbitragem;
(...)
§ 4º Excetuada a convenção arbitral, o juiz conhecerá de
ofício da matéria enumerada neste artigo.”
Mostra-se também digna de nota a regulamentação pelo projeto do procedimento para
homologação de sentença estrangeira ou arbitral (artigos 878 à 883), que traz
significativos avanços para esta medida cada vez mais requisitada perante os
Tribunais Superiores.
1
Exposição de motivos do projeto do novo Código de Processo Civil: “Nos momentos
adequados, utilizou-se a expressão convenção de arbitragem, que abrange a cláusula arbitral e
o compromisso arbitral, imprimindo-se, assim, o mesmo regime jurídico a ambos os
fenômenos.”
Ocorre que, devido à ausência de uma parte especialmente destinada ao tratamento
da arbitragem de modo mais profundo e abrangente no texto em tramitação no
Senado Federal, observa-se o interessante fenômeno de que, em verdade, são as
lacunas do projeto do novo CPC com relação à arbitragem que poderão trazer as mais
sérias conseqüências ao procedimento arbitral com um todo.
Neste contexto, percebe-se que não são particularmente as questões diretamente
abrangidas pelo projeto do novo CPC no tocante à arbitragem que tem causado as
maiores polêmicas no meio jurídico. Ao contrário do que se poderia supor, são pontos
não regulamentados pelo projeto que geraram as maiores críticas e que culminaram
na apresentação de emendas parlamentares com vistas à realização de ajustes no
projeto do novo CPC com relação à arbitragem.
Um dos pontos mais criticados no projeto foi a falta do estabelecimento de um modo
objetivo de comunicação entre o árbitro e o juiz no curso da arbitragem. No sistema
atual, em que inexiste uma previsão desta natureza, as partes precisam recorrer ao
ajuizamento perante o judiciário de reiteradas ações cautelares para que questões
urgentes possam ser decidas e efetivadas antes do proferimento do laudo arbitral, com
a geração muitas vezes de tumulto processual prejudicial ao andamento da
arbitragem.
Outro ponto bastante criticado foi que, diante da reforma do sistema recursal constante
do projeto, a possibilidade do manejo do agravo de instrumento restou bastante
reduzida e não foi previsto no seu artigo 929 a possibilidade da interposição deste
recurso contra a decisão que rejeitar a convenção de arbitragem suscitada em
preliminar de contestação.
Neste caso, nos termos do artigo 923 do projeto do novo CPC, a parte apenas poderá
reiterar o pedido da instalação do procedimento arbitral em sede de preliminar de
recurso de apelação, em claro prejuízo à viabilização da instalação da arbitragem em
razão do longo período de tempo que se terá de esperar para que tal requerimento
seja analisado pelo tribunal; e a situação ganha contornos ainda mais graves se
considerada a possibilidade da apelação ser recebida apenas no efeito devolutivo e
executada de imediato, conforme o artigo 908 do projeto.
E foi diante da necessidade de ajustes no projeto do novo CPC com relação à
arbitragem que o Grupo de Pesquisa em Arbitragem da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo e a Comissão de Arbitragem e Procuradoria Geral da Ordem
dos Advogados do Brasil – Secção do Rio de Janeiro, como o apoio do CESA –
Centro de Estudos das Sociedades de Advogados e do IBRADEMP – Instituto
Brasileiro de Direito Empresarial, elaboraram e encaminharam ao senador Regis
Fichtner uma série de sugestões de emendas ao texto do projeto.
Estas emendas foram encaminhadas para tramitação em plenário e podem ser
consultadas na sua integralidade no site oficial do Senado Federal2. Como exemplos
de emendas relativas às críticas acima mencionadas pode-se destacar a proposta de
alteração dos artigos 54 e 194 do projeto do novo CPC, com a criação da carta
arbitral, para que os órgãos jurisdicionais nacionais promovam o cumprimento de ato
solicitado por árbitro regularmente instituído; ressalte-se ainda a proposta de alteração
dos artigos 923 e 929 do projeto, com a inclusão da previsão do cabimento de agravo
de instrumento contra a decisão que rejeita a alegação de convenção de arbitragem,
sob pena de preclusão.
2
www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=97249
Importa agora à comunidade jurídica o acompanhamento das deliberações no
Congresso Nacional com relação ao texto final a ser aprovado do novo Código de
Processo Civil Brasileiro, e as suas implicações, diretas e indiretas, à arbitragem.
Pedro Moura
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