ANÁLISE DA ACURÁCIA E HARMONIZAÇÃO DOS RESULTADOS DO ENSAIO RASTREÁVEL VITAMINA D TOTAL ADVIA CENTAUR E DETERMINAÇÃO DO PONTO DE CORTE DA 25-HIDROXIVITAMINA D ASSOCIADOS À ELEVAÇÃO DO PARATORMÔNIO DIAS, A. C.; TOMIYAMA, L.; BARBOSA, A. L.; CARIDADE, W.S. LABORATÓRIO SABIN DE ANÁLISES CLÍNICAS – BRASÍLIA-DF [email protected] INTRODUÇÃO O hormônio esteroide vitamina D (VD) e o paratormônio (PTH) atuam como importantes reguladores da homeostase do cálcio e do metabolismo ósseo. A VD pode ser encontrada sob as formas de ergocalciferol ou vitamina D2 e de colecalciferol ou vitamina D3. A vitamina D2 pode ser obtida a partir de leveduras e plantas, sendo produzida para uso comercial, por meio da irradiação do ergosterol presente em cogumelos. A vitamina D3 pode ser obtida a partir do óleo de fígado de bacalhau e peixes gordurosos (salmão, atum, cavala), ou por meio da síntese cutânea endógena, que representa a principal fonte para a maioria dos seres humanos. Tanto a vitamina D2 quanto a vitamina D3 são metabolizadas pelo fígado em 25-hidroxivitamina D (25OHD2 e 25OHD3) e depois convertidas no fígado ou rins na forma biologicamente ativa 1,25-diidroxivitamina D [1,25(OH)2D2 e 1,25(OH)2D3]. A hipovitaminose D causa diminuição na eficiência do intestino em absorver cálcio e fósforo proveniente da dieta, resultando em aumento da concentração sérica de PTH. O aumento do PTH aumenta a fosfatúria e mantém o cálcio sérico dentro do intervalo de referência, à custa da sua mobilização a partir do esqueleto. O incremento da atividade osteoclástica, mediado pelo PTH, resulta em osteopenia e osteoporose. O aumento da fosfatúria resulta em fosfato sérico normal ou baixo, resultando em um inadequado produto cálcio-fósforo sérico, que causa defeito na mineralização óssea na criança e no adulto, classicamente denominados de raquitismo e osteomalácia, respectivamente. Estudos recentes apontam que a hipovitaminose D também está associada a câncer, diabetes, doenças cardiovasculares, doenças auto-imunes e infecções, mas a evidência quanto a causalidade ainda é inconclusiva. A 25-hidroxivitamina D total (25OHD) é o melhor indicador para monitorar o status de VD, porque ela é a principal forma circulante, sua síntese não é regulada pelo PTH e possui uma maior meia-vida na circulação (2 a 3 semanas). Existem controvérsias quanto à concentração sérica adequada de 25OHD. Em 2011, a Endocrinology Society dos Estados Unidos publicou uma diretriz com o objetivo de fornecer orientações aos clínicos para a avaliação, tratamento e prevenção da deficiência de VD. Ela sugere classificar como deficiência, insuficiência e suficiência de VD os resultados de 25OHD menores que 20ng/mL, entre 21 a 30 ng/mL e entre >30 a 100ng/mL, respectivamente. Em 2014, o Departamento de Metabolismo Ósseo da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia desenvolveu a diretriz para o diagnóstico e tratamento da hipovitaminose D, que adota as definições de deficiência, insuficiência e suficiência supracitadas. Para definir o valor ideal de 25OHD para o status de suficiência de VD, essas diretrizes basearam em diversos estudos que encontraram uma redução e/ou normalização e/ou formação de um platô na concentração sérica de PTH, e a maioria encontrou resultados entre 28 e 40 ng/mL. Em alguns desses estudos, a 25OHD foi determinada utilizando os métodos de radioimunoensaio e diluição isotópica-cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massas em tandem (ID-LC-MS/MS). Portanto, a aplicação dessas diretrizes na assistência ao paciente exige medições realizadas individualmente que sejam comparáveis às utilizadas nos estudos que serviram de base para o desenvolvimento de tais diretrizes. A variabilidade intra e entre métodos e laboratórios tem muitas vezes comprometido o diagnóstico correto e a capacidade de comparar resultados de diferentes estudos nacionais e internacionais, uma vez que ainda existem diferenças na extração da vitamina D de sua proteína ligadora, reação cruzada de 25OHD2, 25OHD3 e outros metabólitos além da falta de padronização. Objetivando melhorar o diagnóstico, tratamento e prevenção de doenças e distúrbios, garantindo resultados de 25OHD clinicamente acurados e confiáveis, foi estabelecido o Vitamin D Standardization Program (VDSP), uma iniciativa do National Institutes of Health Office of Dietary Supplements (NIH ODS), Centers for Disease Control and Prevention (CDC), National Institute for Standards and Technology (NIST) e Universidade de Ghent na Bélgica. O VDSP desenvolveu protocolos, utilizando um material de referencia padrão, para a padronização de procedimentos para medir a 25OHD e, eventualmente, harmonizar os resultados de pacientes. O ensaio ADVIA Centaur Vitamina D Total (VitD) é certificado pelo CDC e foi padronizado utilizando padrões internos que são rastreáveis ao Método Referência ID-LC-MS/MS, que é rastreável ao Material de Referência Padrão 2972 do NIST. O ensaio ADVIA Centaur VitD é um imunoensaio competitivo de 18 minutos com anticorpos que utiliza um anticorpo anti-fluoresceína monoclonal de rato covalentemente associado a partículas paramagnéticas, um anticorpo anti-vitamina D 25OH monoclonal de rato marcado com éster de acridina e um análogo da vitamina D marcado com fluoresceína. OBJETIVOS Os objetivos do estudo foram avaliar o desempenho analítico do ensaio rastreável Vitamina D Total ADVIA Centaur, determinar o valor ideal de 25OHD associado à supressão do PTH e a prevalência de hipovitaminose D na amostra populacional do Distrito Federal. MATERIAL E MÉTODOS CASUÍSTICA O estudo dividiu em 3 partes. Primeiro, 25 amostras de pacientes foram processadas e os resultados comparados entre 7 equipamentos ADVIA Centaur Xp, no período de Janeiro à Maio de 2015. Foi comparado os resultados da 25OHD do Centaur Xp (AAH-16) com a ID-LC/MS/MS, utilizando 45 amostras de pacientes, processados no período de 01 a 09 Janeiro/2015. Foi calculado o erro total analítico na comparabilidade entre os múltiplos equipamentos. A comparação entre resultados do Centaur Xp e ID-LC/MS/MS objetivou estimar o erro sistemático médio analítico. Posteriormente, realizou-se um estudo transversal com 294 pacientes, 67% do sexo feminino e 33% do sexo masculino, com idades de 1 à 89 anos, que realizaram os exames PTH intacto e 25OHD nos equipamentos Immulite Xpi e ADVIA Centaur Xp, respectivamente, no período de Janeiro/2014 a Fevereiro/2015. Finalmente, determinamos a prevalência de hipovitaminose D, baseado no ponto de corte da 25OHD associado ao aumento do PTH, utilizando os 2933 resultados de 25OHD disponíveis no banco de dados do sistema informatizado laboratorial. MÉTODOS As dosagens de 25OHD foram feitas utilizando o ensaio quimioluminescente ADVIA Centaur Vitamina D Total no equipamento ADVIA Centaur Xp. As dosagens de PTH intacto foram feitas utilizando o ensaio imunométrico quimioluminescente IMMULITE 2000 PTH intact no equipamento Immulite Xpi. ANÁLISE ESTATÍSTICA A análise estatística incluiu regressão de Deming, análise de concordância de Bland-Altman, teste Kappa, curva ROC, correlação Pearson, teste de Kruskal-Wallis e teste Tukey. As análises estatísticas foram realizadas pelo programa Microsoft Excel e pelo programa MedCalc (Medcalc Software bvba, Mariakerke, Belgium) , versão 14.12.0. Para a rejeição de hipótese de nulidade, foi considerado estatisticamente significativo α<0,05. Deficiência, Insuficiência e suficiencia de 25OHD foram definidas como resultados < 20ng/mL, entre 20 e 30ng/mL e > 30ng/mL, respectivamente. Resultados de PTH intacto entre 12 e 65pg/mL foram considerados normais. Foram utilizadas as recomendações de Stockl, Sluss e Trienpont para as especificações da qualidade analítica (EQA) da 25OHD que são 5% de bias médio e 10% de imprecisão. O erro total máximo utilizado foi 25% (5 + 2x10), que é igual ao limite de aceitabilidade do Vitamin D External Quality Assessment Scheme (DEQAS). RESULTADOS E CONCLUSÃO Os resultados dos 7 equipamentos encontram-se harmonizados, isto é, mais de 95% dos resultados individuais apresentam um erro total analítico menor que 25% (Figura 1). A comparabilidade da 25OHD entre Centaur Xp (AAH-16) e a ID-LC-MS/MS apresentou um bias médio de 4,09% (Figura 2), boa correlação (r=0,938; p<0,05) e boa concordância concordãncia (Kappa = 0,72; IC95% = 0,54 a 0,89) quanto às classificações de deficiência, insuficiência e suficiência (Figura 3). O valor de corte da 25OHD associado ao aumento do PTH foi 32,3 ng/mL (Figura 4). Os resultados de PTH não apresentam boa correlação (r = - 0,21; p=0,0002) com os de 25OHD (Figura 5) conforme indicam estudos semelhantes. Porem, pacientes com suficiência de 25OHD apresentam resultados estatisticamente mais baixos de PTH (p<0,05) quando comparado com pacientes com deficiência e insuficiência (Figura 6). Após a exclusão de 36 outliers, a prevalência de hipovitaminose D, associada ao aumento de PTH, foi de 54,22% (Figura 7). Os resultados de 25OHD liberados pelos equipamentos ADVIA Centaur Xp estão harmonizados e com erro sistemático dentro do especificado e o valor de corte da 25OHD associado ao aumento do PTH é semelhante aos estudos utilizados como referencia para a definição do status de insuficiência de vitamina D. Figura 1. Gráfico de comparação de múltiplos sistemas analíticos. Índice de Erro = Erro Total Analítico dividido pelo Erro Total Máximo (25%). Resultados maiores que +1 e menores que -1 são considerados inadequados. O resultado individual de cada equipamento é comparado com a média robusta de Huber. Figura 2. Análise da curva ROC considerando como ponto de corte para RPC e PTU24h o valor de 500 (mg/ g ou mg/mg/4h). p<0,05 indica que a área sob a curva é diferente de 0,50. Figura 3. Gráfico das Diferenças. Analise de concordância entre métodos de BlandAltman. Erros sistemáticos constante (p=0,182) e proporcional (p>0,05) não são estatisticamente significativo. Erros sistemático médio é igual a 4,09%. Figura 6. Gráfico Box-Plot dos resultados de PTH estratificados Figura 4. A curva ROC foi utilizada para determinação do valor de corte associado ao aumento do PTH. Ponto de corte de 32,3ng/mL. p<0,05 indica que a área sob a curva (ASC) é diferente de 0,50. Figura 5. Gráfico de dispersão indicando a correlação entre resultado de 25OHD e PTH. p<0,05 indica que a correlação é diferente de zero. conforme a classificação de deficiência, insuficiência e suficiência de 25OHD. O Teste de Kruskal-Wallis compara da mediana dos resultados de PTH (entre parêntese intervalo interquartílico). p < 0,05 indica diferença estatística significativa. Figura 7. – Histograma informando a distribuição dos resultados de 25OHD na amostra populacional de 2897 pacientes, após a exclusão de 36 outliers pelo teste de Tukey. A prevalência de hipovitaminose D, baseado no valor de corte de 32,3ng/mL é de 54,22%. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. MAEDA, Sergio Setsuo et al . 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