GAZETA DO SUL • TERÇA-FEIRA 2 DE FEVEREIRO DE 2010 ESPAÇO AZ 7 [email protected] Picada de aranha requer que atendimento seja imediato ROSÂNGELA GABRIEL* ACIDENTES > ESPÉCIES COMO A MARROM SÃO COMUNS NAS CIDADES [email protected] Seguindo a lógica de um velho ditado, nem sempre tamanho é documento, especialmente quando se tratam de aranhas peçonhentas. Há 18 dias o chapeador João de Almeida Soares, de 61 anos, foi picado por um pequeno aracnídeo, muito comum nas residências: a aranhamarrom. Por causa das lesões causadas em sua mão direita pela poderosa peçonha, ele ficou 18 dias internado no Hospital Ana Nery. Soares só voltou para casa na sexta-feira. Segundo conta, o incidente aconteceu na madrugada do dia 11 em sua casa, no Bairro Arroio Grande. “Às 4 horas senti algo caminhando pelo corpo e passei a mão para tirar. Foi quando a aranha me picou entre os dedos.” O chapeador narra que uma hora depois a dor era insuportável e que às 8 horas já recebia os primeiros socorros e o soro antiveneno no Hospital Santa Cruz, de onde posteriormente foi transferido para o Ana Nery. “Cheguei a receber quatro injeções de morfina por dia para aguentar a dor.” Mesmo com a mão menos inchada, Soares ainda está sem movimento nos dedos e começou um tratamento com fisioterapia. Apesar de todos os cuidados, o dedo mínimo necrosou e pode ser amputado. A possibilidade não assusta o paciente, que chegou a pensar que iria perder toda a mão. “Minha preocupação é em ficar bom logo e não ter problemas para trabalhar”, desabafa. Um dos médicos que atendeu o chapeador, o infectologista Marcelo Carneiro, explica que o paciente foi tratado com soro antiveneno mais antibióticos para infecção secundária. Ele esclarece que a peçonha da aranha-marrom (loxosceles) provoca no organismo reação inflamatória que pode se espalhar. “No local poderão ocorrer bolhas, feridas e vermelhidão na pele. A forma de lesão cutânea é lenta, mas progressiva, evoluindo de vermelho, inchaço e dor para hematomas, placas pretas ou feridas.” O especialista alerta que pode haver disseminação e, assim, início de febre, dor de cabeça, cor amarelada da pele e insuficiência renal (diminuição da quantidade de urina). Conforme Carneiro, a reação ao veneno da aranha-marrom pode ser diferente em cada organismo, dependendo da quantidade injetada pelo animal e da resposta e intensidade da inflamação do paciente. O infectologista MICHELLE TREICHEL [email protected] Ph.D. em linguística Algumas semanas atrás, eu estava folheando o jornal quando tomei conhecimento de que mais uma edição do Big Brother Brasil estava prestes a invadir a tela da televisão, os jornais e as conversas informais. Já que estava com o jornal em mãos e tinha tempo livre (estava de férias), li o perfil resumido dos participantes e me surpreendi ao saber que uma das “brothers”, Elenita Gonçalves Rodrigues, 30 anos, de Brasília (DF), é doutora em linguística. Ser doutora em linguística aos 30 anos não chega a ser uma proeza. Também eu obtive o título de Doutor em Linguística aos 30 anos. Concluí a graduação com 23, o mestrado com 26 e o doutorado com 30 anos. É, sem dúvida, uma realização importante, tanto do ponto de vista pessoal quanto profissional, mas nada que mereça projeção nacional. Os motivos da minha surpresa foram dois: primeiro, o fato de uma pessoa com essa titulação acadêmica ter se candidatado a participar do Big Brother; em segundo, a área do doutorado: linguística. Imediatamente me veio à mente a expressão que percebo no rosto de muitos quando digo que sou linguísta. A linguística é uma área do conhecimento ainda pouco difundida no Brasil, por várias razões, e estava prestes a cair “na boca do povo” graças a uma “brother”. JOÃO Soares: 18 dias de internação por causa de uma picada de aranha Características Dentre as aranhas peçonhentas existentes no Brasil, a aranhamarrom, do gênero loxosceles (foto), é a mais comum. Tem o corpo em forma de caroço de azeitona e mede cerca de 1 centímetro (corpo) a 3 centímetros (envergadura de pernas). Essas aranhas não são agressivas e só reagem quando se sentem ameaçadas. Tanto o macho como a fêmea são venenosos. Em virtude do desmatamento e da redução dos seus predadores (lagartixa, galinha e sapo), ela adquiriu hábitos urbanos e os acidentes aumentaram. A maior incidência de picadas ocorre na primavera e no verão. Elas habitam cascas de árvores, fendas de muros, paredes, forros, tijolos, entulhos e também são comuns dentro de roupas, sapatos e atrás de móveis. destaca que as pessoas que forem picadas por aracnídeos devem procurar atendimento médico imediato, levando, se possível, a aranha junto. “Quanto maior o tempo decorrido após o acidente, menor a eficácia da soroterapia na redução da lesão local.” Dr. Caio Rossi CRM 11469 Michelle Treichel UNIVERSO DAS LETRAS Ed. Unimed - Sala 606 - Tel.: 3713-2907 / 8186-1739 A linguística é a ciência que estuda a língua(gem) em seus vários aspectos: cognitivos, formais, sociais e históricos.Todos os que leem esta coluna passaram alguns anos de suas vidas na escola e tiveram, nas aulas de língua portuguesa, noções de gramática. A gramática assume uma posição normativa em relação à língua, ou seja, dita normas de como as pessoas deveriam falar e escrever. Essas normas, que infernizam a vida dos nossos estudantes, muitas vezes não são seguidas sequer por escritores famosos, como Luis Fernando Verissimo e Moacyr Scliar (membro da Academia Brasileira de Letras), que se permitem prestar atenção à língua como ela é, de fato, usada pelos falantes e a incorporar essa forma em seus textos. E esse é o objeto de estudo da linguística: a investigação das formas da língua, dos usos da língua, do pensamento através da língua, das atividades que realizamos através da língua. Vale a pena ainda esclarecer a confusão que gera o termo “neurolinguística”, especialmente em contextos não acadêmicos. O termo é usado popularmente para denominar cursos rápidos que prometem técnicas para desenvolver liderança, motivação e pensamento positivo, partindo da hipótese de que podemos "reprogramar" a mente a fim de atingir o "sucesso". A neurolinguística ou programação neurolinguística (PNL) seria uma espécie de manual de autoajuda. Contudo, essa acepção do termo não condiz com a etimologia da palavra, sendo completamente ignorada pelo Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), que traz apenas a seguinte definição: neurolinguística é a “ciência que estuda as relações entre a estrutura do cérebro humano e a capacidade linguística, com atenção especial à aquisição da linguagem e aos distúrbios da linguagem, especialmente os que se seguem a lesões cerebrais”. No contexto científico internacional, o termo em inglês neurolinguistics está consagrado e denomina a ciência que estuda os mecanismos cerebrais subjacentes à compreensão, produção e conhecimento abstrato da linguagem, seja ela falada, sinalizada ou escrita. Portanto, a neurolinguística é uma das subáreas da linguística, ou melhor, é uma área interdisciplinar, que congrega conhecimentos advindos da linguística e da neurologia. E já que o artigo de hoje é dedicado a esclarecer confusões terminológicas, tomemos uma expressão presente no título deste texto. PhD ou Ph.D. (as duas formas estão corretas, ou ainda, em países de língua inglesa, DPhil ou Dr.Phil.) é uma abreviação da expressão, em inglês, Doctor of Philosophy, ou, em latim, philosophiæ doctor. Dizer que alguém é PhD em linguística, por exemplo, equivale a dizer, em português, que a pessoa é Doutor em linguística. Na Inglaterra, é mais comum o uso da expressão “Doctor”, ao passo que nos Estados Unidos, usa-se mais a sigla PhD. Portanto, trata-se do mesmo título, aliás o mais alto título acadêmico que alguém pode receber, concedido a um doutorando após a defesa de uma tese perante uma banca de, no mínimo, cinco avaliadores. Cursos de doutorado, como os que existem na Unisc, em Desenvolvimento Regional e em Direito, têm por objetivo, dentre outros, formar pesquisadores. Pesquisadores são pessoas curiosas, inquietas, viciadas em fazer perguntas para as quais ninguém ainda sabe as respostas, e que acabam desenvolvendo projetos de pesquisa e estágios de pós-doutoramento para continuarem estudando e poderem contribuir para o avanço do conhecimento e da qualidade de vida da comunidade. Voltando ao Big Brother Brasil, soube (de novo, pelo jornal!) que Elenita foi para o paredão e que Pedro Bial leu anotações que a “brother” havia feito nas margens de um livro, as quais, como a própria Elenita esclareceu, são de autoria de Martha Medeiros, outra escritora atenta à língua e à vida como ela é. * Doutora em linguística, professora e pesquisadora do Programa de PósGraduação em Letras da Unisc