As notificações
dos países latinoamericanos ao acordo
de medidas sanitárias e
fitossanitárias (sps) da
omc: protecionismo ou
adequação?
Orlando Monteiro da Silva
Marcela Olegário Santos
Documento presentado en la conferencia Comercio agrícola y América
Latina: Cuestiones, controversias y perspectivas, celebrada del 19 al 20
de septiembre en Buenos Aires, Argentina.
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AS NOTIFICAÇÕES DOS PAÍSES
LATINO-AMERICANOS AO ACORDO
DE MEDIDAS SANITÁRIAS E
FITOSSANITÁRIAS (SPS) DA OMC:
PROTECIONISMO OU ADEQUAÇÃO?
Orlando Monteiro da Silva e Marcela Olegário Santos1
Resumo: O crescimento e a dispersão das medidas nãotarifárias no comercio internacional é evidente. Nicita e
Goudon (2013) mostram que 30% de todos os produtos
comercializados no mercado internacional são afetados
por medidas não-tarifárias, com as sanitárias e fitossanitárias sozinhas correspondendo a 15% do total. No
caso dos produtos agrícolas, que tem grande importância para os países da América Latina (AL), as medidas
sanitárias e fitossanitárias afetam 60% do comércio total. A adequação dos países a essas exigências aumenta
os custos de produção e varia de acordo com sua participação no mercado internacional. Esse estudo analisou
todas as notificações SPS emitidas pelos países da América Latina, no período entre 1995 e 2012, descrevendoas por países emissores, por objetivos, por distribuição
temporal e por classificação das mercadorias. Estimouse, também, um modelo que relaciona as exportações
dos principais produtos agrícolas dos países latino-americanos, com as medidas SPS questionadas por eles junto ao Comitê SPS da OMC. Os resultados mostraram
1 Respectivamente, Professor Titular e Estudante (Bolsista de I.C. do CNPq)
do Departamento de Economia. Universidade Federal de Viçosa. 36570-000.
Viçosa, MG. Brasil. [email protected]
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grande assimetria na emissão das notificações regulares
com Brasil, Peru, México, Chile e Argentina, sendo os
maiores emissores. Os principais motivos declarados foram os de proteção à saúde vegetal (954), humana (467)
e animal (428) e os produtos mais afetados foram os das
seções 01 (animais vivos), 02 (carnes e miudezas), 06
(plantas vivas e produtos da floricultura) e 08 (frutas). A
estimação do modelo proposto indicou que as medidas
SPS atuam como barreiras às exportações dos produtos
analisados, com efeito maior do que o das barreiras tarifárias. A explicação está na queda e nas preferências
tarifárias que alguns dos países têm dos importadores e
no efeito restritivo que algumas das medidas não tarifárias têm sobre os produtos considerados. A emissão das
notificações na América Latina sugere mais uma adequação às exigências internacionais do que a imposição
de restrições ao comércio.
Palavras-chave: América Latina, medidas sanitárias e fitossanitárias,
notificações à OMC
JEL: F13, F14, Q17
1. Introdução
Ao longo dos anos, as negociações multilaterais e mesmo as bilaterais ajudaram a reduzir substancialmente as
tarifas ao comércio, que no caso da agricultura caíram
de um patamar médio de 19,9% em 1995 para 7,4%,
em 2008. Basu et.al (2012) mostraram que a queda ocorrida no setor não agrícola foi ainda mais acentuada,
variando de 6,7% para 2,4% no mesmo período. Esse
declínio aumentou a importância das medidas não-tarifárias, cujo crescimento e dispersão são evidentes. Publicação recente da UNCTAD (2013) mostra que 30%
de todos os produtos comercializados no mercado internacional são afetados por medidas não-tarifárias, com
as sanitárias e fitossanitárias (SPS), sozinhas, correspondendo a 15% do total.
Uma medida SPS engloba regras, controles, restrições
e procedimentos que os países impõem no intuito de
impedir a propagação de doenças e pestes e a contaminação de alimentos e, dessa forma, resguardar a saúde
humana, animal e vegetal e a inocuidade alimentar dentro do seu território (COZENDEY, 2010).
Ao criar um Acordo que cuidasse especificamente das
Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS), a OMC teve
como objetivo estabelecer os critérios que deveriam nortear as ações dos governos na adoção das normas sanitárias e fitossanitárias, evitando que elas se tornassem
restrições disfarçadas ao comércio internacional (WTO,
2012). Antes da entrada em vigor do Acordo SPS, em
1995, os governos podiam recorrer ao Código de Nor-
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mas aprovado na Rodada de Tóquio (1973/79), ou podiam recorrer ao artigo XX (b) do GATT, para adotar
medidas comerciais restritivas para proteger a saúde e a
vida. No entanto, os negociadores da Rodada do Uruguai entenderam que o quadro legal definido por essas
normas era impreciso e, portanto, insuficiente para estabelecer princípios de funcionamento, claros o suficiente
para orientar as ações dos governos na adoção de normas ou controles (SILVA; SANTOS, 2013).
rimentos exigidos pelos mercados importadores. Usualmente, esses países não têm informação sobre todas as
medidas que afetam suas exportações, não sabem se
elas são consistentes com o acordo SPS da OMC e ainda, não conhecem o impacto das mesmas sobre suas exportações, desde que as medidas SPS envolvem normas
e regulamentos com efeitos diversos, tais como, exigências de rotulagem, embalagem, limites máximos de resíduos, processos de inspeção e certificação, etc.
O Acordo SPS encoraja, mas não obriga, os países membros basearem suas medidas em padrões aprovados pelas
organizações internacionais de referência (FAO/WHOCodex Alimentarius, Organização Mundial de Saúde
Animal e Convenção Internacional para a Proteção de
Plantas). Se os países consideram que essas normas não
garantem um nível adequado de proteção à saúde, eles
podem definir suas próprias normas, que podem ser mais
exigentes. A única condição que se impõe é que haja uma
avaliação científica dos riscos que as justifiquem. Também, os países devem informar os parceiros, por meio
de notificações à secretaria da OMC, sobre as suas legislações e propostas normativas em matéria SPS, disseminando o conhecimento das suas exigências sanitárias e
permitindo possíveis comentários e/ou contestações acerca das medidas a serem impostas.
Os trabalhos de Bureau et. al.(2007) e de Disdier et. al.
(2008), analisaram os efeitos das barreiras enfrentadas
pelos países da America Latina e pelos países do grupo da África, Caribe e Pacífico (ACP), nas exportações
de produtos tropicais, e mostraram, inclusive, que são
os pequenos e médios produtores os que têm as maiores dificuldades em se adequar aos requerimentos sanitários e fitossanitários. Especificamente, para o caso
dos 11 países da América Latina que são membros do
grupo de produtos tropicais da OMC, aqueles autores
mostraram que a combinação de vários acordos preferenciais tais como: o Sistema Geral de Preferências, da
União Européia (EU-GSP); o Acordo dos Estados Unidos com os países dos Andes, sobre a aplicação da lei
das drogas (ATPDEA); e, o Acordo Centro Americano
de Livre Comércio, resultou na eliminação das tarifas
para a maioria dos produtos, nos mercados dos Estados Unidos e da União Européia. Contudo, são, atualmente, as barreiras não tarifárias os principais impedimentos às exportações dos países da América Latina.
Utilizando uma equação de gravidade eles mostraram
que as exportações tanto dos países da ACP quanto da
Contudo, de acordo com Zarrilli e Musselli (2004), a
maioria dos países em desenvolvimento não está apta
para participar efetivamente dos processos de adoção
de padrões internacionais relacionados às medidas SPS
e, portanto, enfrentam dificuldades em adotar os reque-
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América Latina, são afetados significativamente pelas
medidas SPS.
A participação da América Latina e do Caribe na produção global de cereais atingiu um recorde histórico
com 8,2% (ALADI, 2012). Com relação às exportações
de alimentos, houve um aumento na participação desses países de 14,9% no período 1990/99 para 17,8% no
período 2000/09. Esse estudo mostrou, também, a importância que o comércio intra-regional dos países da
ALADI tem no comércio agro – alimentar, com 40% das
importações tendo origem nos países membros. Contudo, alega-se que esse comércio é limitado pela existência
de muitas barreiras não-tarifárias, com destaque para as
exigências sanitárias e fitossanitárias. A CEPAL (2008),
também reconhece esse problema e sugere uma harmonização das normas sanitárias como uma das medidas
para facilitação do comércio intra-regional.
Uma questão importante é que a adequação dos países
a essas exigências, afeta diretamente os custos de produção e varia de acordo com a participação de cada um
no mercado internacional. Elas podem beneficiar o comércio, na medida em que, uma harmonização das medidas SPS, estimula a demanda pelos produtos, mas podem, também, ser protecionistas, quando nas suas mais
diferentes formas, elevam muito os custos, ou discriminam o comércio entre os países.
Portanto, uma avaliação constante das medidas sanitárias e fitossanitárias que afetam os países da América
Latina e, daquelas adotadas por eles, permitiria não só
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o conhecimento da relação existente entre elas, possibilitando inferências sobre a sua utilização das mesmas
como medidas protetora ou de adequação às condições
dos mercados internacionais, mas também, avaliar seu
efeito nos fluxos de comércio.
Esse é o objetivo desse estudo, que além dessa introdução, está dividido em três outras seções. Na segunda seção faz-se uma descrição de todas as notificações
SPS (regulares e emergenciais), emitidas pelos países da
América Latina, no período de 1995 até 2012. A seção
três utiliza um modelo de regressão para estimar, para
os principais produtos agrícolas exportados, o relacionamento existente entre as notificações recebidas e os
fluxos de comércio, enquanto a seção quatro traça algumas considerações finais sobre os resultados desse
estudo.
2. A emissão de notificações SPS nos
países da América Latina
É importante ressaltar que todos os países da América Latina são membros da Organização Mundial do
Comércio e, portanto, signatários do Acordo de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS) e das instituições
vinculadas: Organização Internacional de Epizootias
(OIE); Convenção Internacional de Proteção de Plantas
(IPPC); e, CODEX Alimentarius. Também, em observância ao princípio da transparência, todos os países
têm estabelecido e em funcionamento, pelo menos um
ponto focal (enquiry point), órgão responsável por res-
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ponder as questões e disseminar informações referentes
às regulamentações nacionais para os demais signatários do Acordo SPS.
A Figura 1 mostra a evolução do total de notificações
regulares e emergenciais do acordo de medidas sanitárias e fitossanitárias (SPS) emitidas pelos países da
América Latina, entre os anos de 1995 e 2012. Para as
notificações regulares, há uma tendência clara de crescimento, com um pico no ano de 2008, que foi marcado
por dois acontecimentos no mercado internacional. O
primeiro deles foi uma alta recorde nos preços dos produtos agrícolas e o segundo foi o início da crise financeira internacional, que reduziu drasticamente o comércio
no ano de 2009. Certamente, o comportamento das notificações emitidas pelos países da América Latina tem
ligação direta com esses acontecimentos, sem que haja
como precisar a importância relativa de cada um daqueles eventos. Pode-se supor que o aumento recorde dos
preços estimulou a adequação das normas domésticas
àquelas dos países importadores e, ao mesmo tempo,
assumir que a queda da atividade econômica mundial
no terceiro trimestre do ano, incentivou o instinto protetor, com o aumento das exigências sanitárias e fitossanitárias. Contudo, a queda na emissão das notificações
em 2009 tem explicação direta na redução do comércio
em função do pior ano da crise. Nos anos posteriores, a
emissão das notificações voltou a subir e se manteve em
um patamar mais elevado.
função do surgimento de doenças e pragas que possam
contaminar o homem, os vegetais e os animais. Vê-se
na Figura 1, que o maior número de notificações de
emergência ocorreu nos anos entre 1999 e 2006. Naquele período, surgiram os casos de febre aftosa, da
“vaca louca” e de contaminações por dioxina, na Europa, o que desencadeou a emissão de muitas notificações
emergenciais.
Figura 1 – Evolução das notificações regulares e emergenciais na América Latina. 1995/2012.
O número de notificações emitidas por cada país e a
participação de cada um deles no total está apresentado
na Tabela 1.
As notificações emergenciais têm um comportamento diferente. Elas têm um caráter protetor imediato em
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Tabela 1 – Notificações regulares e emergenciais emitidas pelos países
da América Latina. 1995-2012.
Notificações SPS
Regulares
Emergenciais
País
Número
(%)
Número
(%)
7.06
Argentina
111
6.52
18
Bolívia, Estado Plurinacional
6
.35
7
2.74
Brasil
351
20.61
6
2.35
Chile
288
16.91
23
9.02
Colômbia
98
5.75
67
26.27
Costa Rica
72
4.23
15
5.88
Cuba
11
.64
1
.39
Equador
76
4.46
6
2.35
El Salvador
54
3.17
4
1.57
Guatemala
25
1.47
10
3.92
Haiti
0
0
0
.00
Honduras
18
1.05
2
.78
9.41
México
125
7.34
24
Nicarágua
36
2.11
0
.00
Panamá
29
1.70
5
1.96
Paraguai
4
.23
2
.78
Peru
358
21.02
61
23.92
Rep. Dominicana
15
.88
0
.00
Uruguai
15
.88
4
1.57
Venezuela, Rep. Bolivariana
11
.65
0
.00
TOTAL
1.703
100
255
100
Fonte: Calculado pelos autores com dados da OMC
O total de notificações regulares foi de 1.703 e de notificações emergenciais foi de 255. Somente o Haiti não
emitiu qualquer notificação SPS no período. No geral
os países da América Latina foram responsáveis por
43,8% do total das notificações regulares e 21% das
emergenciais emitidas pelos países membros da OMC,
entre 1995 e 2012. O país que mais emitiu notificações
SPS regulares foi o Peru (358), seguido do Brasil (351),
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Chile (288), México (125), Argentina (111) e Colômbia
(98). Esses países são grandes exportadores de produtos
agropecuários e sozinhos foram responsáveis por quase 72% de todas as notificações regulares emitidas na
América Latina durante o período estudado. Existem
algumas particularidades relacionadas à emissão das
notificações por alguns desses países. O México, por
exemplo, teve que adequar suas normas àquelas dos Estados Unidos e do Canadá, quando da criação do NAFTA e, portanto, a maioria das notificações (70 de 125)
foi emitida no ano de 1995. O caso do Peru é semelhante, desde que a maioria das suas notificações foi emitida
a partir de 2010, após acordo de livre comércio assinado com os Estados Unidos. O Peru é um dos países latino-americanos que tem assinado mais acordos regionais
de comércio. Além dos Estados Unidos e da Comunidade Andina, o Peru tem acordo com o Canadá, China,
Singapura, Chile e Coréia do Sul.
Com relação às notificações de emergência, destacamse a Colômbia que emitiu 26,27% do total e o Peru,
com 23,92%. A seguir aparece México (9,41%), Chile
(9,02%) e a Costa Rica (5,88%). Haiti, Nicarágua, Republica Dominicana e a República Bolivariana da Venezuela não emitiram qualquer notificação de emergência
entre os anos de 1995 e 2012.
De acordo com os parágrafos 5 e 6 do Anexo B, do
Acordo SPS, requer-se dos países membros a indicação
dos produtos cobertos pelas medidas SPS e dos códigos relevantes do sistema harmonizado de classificação
de mercadorias. A Figura 2 mostra a distribuição dos
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produtos de acordo com os códigos HS22. Chama-se
a atenção para o fato de uma mesma notificação poder
conter produtos de diferentes capítulos, o que fornece
o total de 2.060 produtos afetados por notificações regulares e 467 produtos afetados por notificações emergenciais. Nesse caso, foram os produtos do capítulo 06
(plantas vivas e produtos da floricultura) os que mais receberam notificações regulares, com 21% do total. No
entanto, foram os animais e seus subprodutos (capítulos
de 01 a 05), os que mais apareceram nas notificações
(816 vezes), com 49,6% do total. Com grande freqüência nas notificações regulares estão, também, os produtos do capítulo 08 (Frutas) que apareceram 242 vezes
e, do capitulo 12 (Sementes e frutos oleaginosos, etc),
que apareceram 263 vezes. Em termos das notificações
emergenciais, os capítulos de animais e seus subprodutos são os grandes responsáveis pelas notificações, aparecendo em 61% do total daquelas notificações. Destacam-se nos capítulos 01 e 02 as emissões da Colômbia e
do Peru, que, em conjunto, corresponderam a 84 e 75%
do total das notificações desses capítulos. Esses dois
2 01- Animais vivos; 02 - Carnes e miudezas comestíveis; 03 - Peixes e
crustáceos, moluscos e outros invertebrados aquáticos; 04- Leite e laticínios; ovos de aves; mel natural; produtos comestíveis de origem animal, não
especificados em outros capítulos; 05 – Outros produtos de origem animal
não especificados nem compreendidos em outros capítulos; 06- Plantas vivas
e produtos de floricultura; 07- Produtos hortícolas, plantas, raízes e tubérculos, comestíveis; 08- Frutas, cascas de cítricos e de melões; 09 – Café, chá,
mate e especiarias; 10- Cereais; 11- Produtos da indústria de moagem; malte,
amidos e féculas; inulina; glúten de trigo; 12 – sementes e frutos oleaginosos;
grãos, sementes e frutos diversos;plantas industriais ou medicinais; palhas e
forragens; 13 - Gomas, resinas e outros sucos e extratos vegetais; 14- Matérias para entrançar e outros produtos de origem vegetal, não especificados ou
compreendidos em outros capítulos;15- Gorduras e óleos vegetais ou animais;
produtos da sua dissociação; gorduras alimentares elaboradas; ceras de origem animal ou vegetal.
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países foram, também, os responsáveis por 66 e 73%
das notificações de emergência dos capítulos 04 (leite
e laticínios) e 05 (outros produtos de origem animal).
Os capítulos referentes às frutas (08) e às plantas vivas
e produtos da floricultura (06), tiveram 15 e 22 notificações cada. O México sozinho emitiu 6 das 22 notificações desse último capítulo. Os capítulos de 09 a 15
completam o quadro das notificações emergenciais, sem
qualquer destaque. A maioria das notificações de emergência especifica os países afetados (165), sendo 87 para
países da América Latina e 78 para países de outras regiões. 90 notificações emergenciais foram emitidas sem
a distinção de países específicos.
Figura 2 – Distribuição das notificações regulares e emergenciais
da América Latina por capítulos do sistema harmonizado (SH).
1995-2012
A Tabela 2 apresenta as palavras chave que foram utilizadas para classificar os objetivos declarados nas notificações. Usualmente aparecem mais de uma palavra chave na mesma notificação de maneira que o número delas
é muito superior ao de notificações. Na tabela são apresentadas aquelas palavras que aparecem com maior fre-
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qüência. Elas indicam os objetivos da proteção de plantas e da proteção à saúde animal e humana, como as
principais razões das notificações regulares e emergenciais. Destacam-se entre as notificações de emergência
as questões relacionadas às doenças animais, a proteção
à saúde humana e a segurança alimentar.
Tabela 2 – Palavras chave declaradas nos objetivos das notificações
SPS. 1995-2012.
Objetivos
Regulares
Emergenciais
Total
Fitossanidade
954
48
1002
Proteção a Saúde Animal
428
175
603
Proteção a Saúde Humana
467
85
552
Adoção, public. e entrada em vigor
380
50
430
Doenças Animais
215
178
393
Segurança Alimentar
300
71
371
Pestes
283
38
321
Proteção Territorial
275
29
304
Regionalização
177
75
252
Sementes
222
4
226
Fonte: Calculado pelos autores com dados da OMC
3 – O efeito nos fluxos de comércio
Para avaliar o efeito das notificações sanitárias e fitossanitárias (SPS) sobre os fluxos de comércio da América Latina, optou-se por adotar o mesmo procedimento de Fontagné et. al. (2013) e utilizar as informações
sobre as preocupações comerciais específicas, levantadas pelos países membros da OMC, em relação às medidas adotadas pelos parceiros comerciais. Essas preocupações comerciais específicas são levantadas junto ao
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Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias e estão
disponíveis em um banco de dados da OMC (WTO,
2013). Uma vantagem em utilizá-las é que elas representam uma preocupação real dos países exportadores de
que as medidas a elas relacionadas representem barreiras ao comércio, já que a utilização de todas as notificações, não distingue entre aquelas medidas que podem
beneficiar o comércio.
O Comitê SPS atua como um fórum de discussão onde
os países membros podem discutir as medidas tomadas
por outros países; as chamadas preocupações comerciais específicas. Atualmente, o banco de dados contém
mais de trezentas preocupações que foram levantadas
desde 1995. Cada uma corresponde a uma preocupação
de um ou mais países em relação a um parceiro comercial. Para cada preocupação têm-se informações sobre:
o país ou países que levantaram a preocupação e o país
que impôs a medida; o código do produto (HS-4) envolvido na preocupação; o ano em que a preocupação foi
levantada; e, o ano em que ela foi resolvida.
De todas as preocupações específicas, 50% foram resolvidas ou parcialmente resolvidas pela OMC e a maioria
delas não precisou ser levada a um painel. O tempo médio entre a preocupação levantada e a solução foi de três
anos. A maioria das preocupações diz respeito à saúde
animal (40%) e às zoonoses, 28% à segurança alimentar, 26% à saúde vegetal e 6% a outras questões, como
o requerimento de certificações e transparência das medidas (WTO, 2013).
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Para a análise dos efeitos das preocupações comerciais
específicas sobre as exportações da América Latina,
foram consideradas as exportações de carnes, frutas e
café, por envolverem um número maior de países (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru) e por
terem maior relevância econômica no período de 1996
até 2011. Apesar de a soja ser o produto mais importante nas exportações agrícolas latino-americanas, não
houve qualquer reclamação ou preocupação comercial
específica sobre ele. Os mercados de destino selecionados e que, inicialmente, emitiram notificações SPS às
importações dos produtos selecionados foram os Estados Unidos, União Européia e Japão.
No caso das carnes, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia
e México, questionaram 32 notificações recebidas, das
quais 16 constam como casos já resolvidos. Os anos em
que ocorreram os maiores números de reclamações foram 2001(4), 2002(6) e 2009(5), com os principais motivos das notificações sendo restrições a respeito da febre aftosa (FMD), riscos da doença da vaca louca (BSE)
e gripe aviária (Influenza A).
Argentina, Brasil, Chile e México, questionaram 14 notificações recebidas para frutas, das quais somente seis
tiveram solução até agora. As reclamações foram dirigidas, principalmente, à União Européia, Estados Unidos
e Japão.
No período da análise foram recebidas três notificações
sobre o café, que foram questionadas por Brasil e Colômbia. Os questionamentos ocorreram nos anos de
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2003, 2004 e 2009 e estavam relacionadas aos níveis
máximos de Ocratoxina naquele produto.
É importante ressaltar que na maioria dos casos ocorreu um suporte dos demais países da América Latina,
quando essas preocupações comerciais específicas foram levantadas junto ao Comitê SPS.
As informações sobre as preocupações comerciais específicas permitiram que fosse montado um painel de
observações das exportações de cada um dos produtos
(carnes, frutas e café), pelos países (Argentina, Brasil,
Chile, Colômbia, México e Peru), para os principais importadores (União Européia, Estados Unidos e Japão),
no período de 1996 a 2011. Sobre esse painel estimouse o relacionamento existente entre os valores exportados daqueles produtos agrícolas e as preocupações comerciais específicas com as medidas SPS, incluindo-se,
também, algumas características dos países, como a sua
importância nas exportações totais daqueles produtos e
variáveis de controle, como as tarifas de importação e a
participação dos mercados de destino selecionados para
as exportações totais. A equação proposta assumiu a
seguinte forma:
em que, Yi,s,j,t são as exportações do produto i, do país
s, para o país j, no ano t. PCEs,j,t é uma variável dummy
que capta a existência de uma preocupação comercial
específica do país exportador s, com uma medida SPS
adotada pelo país importador j, no ano t; Expt,i,s,t são as
exportações totais do produto i, pelo país s, no ano t;
Xs,j,t é a participação das exportações do produto i, do
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país s, no total das importações do país j, no ano t;. Ti,j,t
é a tarifa cobrada pelo país j, na importação do produto i, no ano t;
representam os
efeitos fixos para os produtos e para os países exportadores, ao longo do período.
É importante ressaltar que todos os valores das exportações de carnes e de frutas foram obtidos do COMTRADE, ao no nível HS-2 do Sistema Harmonizado e,
portanto, incluem todos os tipos de carnes e frutas. No
caso do café, os valores foram coletados no nível HS4. Os valores utilizados para as tarifas foram as médias
simples de todas as linhas tarifárias de cada produto.
Uma variável dummy (d) foi utilizada para cada produto considerado e ano da série em que ocorreu uma
preocupação comercial específica. Decidiu-se utilizar
inclusive as preocupações que tinham sido resolvidas,
em função da solução para as mesmas ter demorado em
média três anos, e, portanto terem tido algum efeito sobre as exportações.
O modelo proposto foi estimado pelos métodos dos
MQO (poolling), por efeitos fixos e aleatórios e por
Poisson Pseudo Maximum-Likelihood (PPML). A utilidade do método PPML está no fato dele apresentar
usualmente estimativas mais consistentes na presença
de heterocedasticidade e devido à existência de muitos
valores zero (missing) na amostra (SOUZA & BURNQUIST, 2011). Os resultados obtidos estão apresentados na Tabela 3.
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Tabela 3. Resultados obtidos na estimação das equações de regressão.
1996-2011
Variáveis
Modelo
Pooled
Efeitos
Fixos
Ef.
Aleatórios
Poisson
d
.097
-.037
.067
-.042***
lexpt
.907***
.912***
.911***
.201***
lx
1.016***
1.015***
1.020***
.072***
ltarifa
-.142***
-.113***
-.157***
-.027***
const
.178***
.207*
.254**
-1.780***
R2
.990
.991
.991
.967
N
863
863
863
863
***, **,* indicam significância nos níveis p<. 01; p < 0; 05;e, p < 0; 1, respectivamente. Para os modelos de Efeito Fixo e Efeito Aleatório é reportado o R2 “within”.
Os resultados encontrados com os métodos poolling,
de efeitos fixos e aleatórios mostraram alguma semelhança, mas em nenhum deles a variável preocupação
comercial específica foi significativa, apresentando, inclusive, divergência de sinais. Entre os modelos de efeitos fixos e aleatórios, o teste de Hausman indicou que
o modelo de efeitos fixos seria o mais adequado. Contudo, dada a existência de 191 observações com fluxo
de comércio zero na amostra optou-se pela análise dos
resultados do método PPML. A estimação nesse caso
apresentou coeficientes significativos ao nível de 1%,
para todas as variáveis e sinais coerentes com as expectativas teóricas. O coeficiente negativo da medida SPS
indica que as mesmas atuam como barreiras ao comércio e têm o efeito de reduzir as exportações dos produtos considerados. Esse resultado é consistente com aque-
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le encontrado por Didier (2008). O coeficiente da tarifa
também é negativo e significante, com efeito menor nas
exportações do que aquele das medidas SPS. A explicação está na queda que tem ocorrido nas tarifas e nas
preferências tarifárias que alguns países têm nos mercados importadores, além do efeito restritivo que algumas
das medidas não tarifárias têm sobre os produtos considerados. No caso das frutas e vegetais e das carnes,
as barreiras SPS às importações são muito restritivas,
dado os altos custos de retenção desses produtos nos
países exportadores. As exportações de café, por outro
lado, são pouco afetadas pelas medidas SPS, e não sofreram com qualquer tarifa alfandegária nos mercados
analisados. Os coeficientes das variáveis que indicam
o tamanho do país exportador (Expt) e a visibilidade
que cada país tem no país importador (lx) foram positivos sugerindo relações diretas com as exportações.
4. Considerações Finais
Nesse estudo fez-se uma análise da emissão das notificações SPS na América Latina, caracterizando-as por
países e setores da economia. Na análise empírica foram estimados os efeitos das preocupações comerciais
específicas das medidas SPS levadas à WTO, sobre os
fluxos de exportação de carnes, frutas e café.
O número de notificações regulares emitidas apresentou
uma tendência crescente ao longo do período, com um
pico no ano de 2008. Naquele ano, ocorreu um aumento recorde nos preços dos produtos agrícolas que, acre-
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dita-se, pode ter estimulado a adequação das normas
domésticas às internacionais. O que é certo, contudo, é
que a queda da atividade econômica mundial incentivou
o instinto protetor e, o aumento das restrições comerciais, entre elas, as sanitárias e fitossanitárias (SPS).
O mesmo não se pode dizer das notificações SPS emergenciais, que são fruto da ocorrência esporádica de
doenças e pragas e que não apresentam qualquer padrão regular.
Os maiores emissores das notificações SPS regulares, na
América Latina, foram Peru, Brasil, Chile, México, Argentina e Colômbia. As particularidades dessa situação
estão relacionadas à adequação dos países às condições
dos mercados externos. Nos casos do Brasil, Argentina
e Chile, que são grandes exportadores de produtos agrícolas, essa adequação parece ter acontecido como exigência às normas dos maiores mercados importadores.
No caso do México, Peru e Colômbia, a adequação ocorreu como condição para adesão desses países aos vários acordos regionais de comércio, que tem como membros países com exigências sanitárias mais rigorosas.
Os produtos mais notificados foram, justamente, os que
apresentam maiores exigências sanitárias e fitossanitárias em nível internacional, tais como as carnes, frutas e
plantas vivas e que têm grande peso na balança comercial dos países estudados. A análise das preocupações
comerciais específicas que os países da América Latina levantaram no comitê SPS da OMC, estiveram majoritariamente relacionadas às notificações sobre esses
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produtos.
O modelo estimado mostrou relacionamento inverso
das exportações com as medidas SPS adotadas e com as
tarifas, com o efeito restritivo das medidas SPS sendo,
contudo, maior que o efeito das tarifas. Diversos acordos preferenciais de comércio e uma redução contínua
das tarifas têm tornado as medidas não tarifárias barreiras maiores às exportações.
As medidas não tarifárias distorcem o comércio e elevam os custos, mas a diversidade das mesmas torna difícil mensurar o seu grau de proteção. No geral, a emissão das notificações na América Latina sugere mais
uma adequação às exigências internacionais do que a
imposição de restrições ao comércio, sem descartar uma
preocupação com a segurança humana, vegetal e animal. Isso é claro com a ampla incidência entre os países
e setores econômicos. No entanto, é nos países menos
desenvolvidos e neles, os menores produtores, onde os
custos de adequação são relativamente maiores e para
onde uma atenção especial e um tratamento diferenciado deve estar voltado.
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