UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Fundada em 18 de Fevereiro de 1808 Monografia Perfil clínico epidemiológico dos pacientes atendidos em ambulatório de endocrinologia pediátrica em hospital universitário Lara Damasceno Almeida Salvador - Bahia, Setembro, 2013 II Ficha catalográfica (elaborada pela bibliotecária Solange Della-Cella, Biblioteca SIBI/HUPES) A 447 Almeida, Lara Damasceno Perfil clínico epidemiológico dos pacientes atendidos em Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica em Hospital Universitário / Lara Damasceno Almeida. Salvador, 2013. VIII, 49p. Monografia de Conclusão do Curso de Medicina, Faculdade de Medicina da Bahia, Universidade Federal da Bahia. Professor Orientador: Luciana Mattos Barros Oliveira Palavras-chave: 1. Endocrinologia; 2. Pediatria; 3. Saúde-perfil. I. Oliveira, Luciana Mattos Barros. II. Universidade Federal da Bahia. III. Título. CDU: 616.43 III UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Fundada em 18 de Fevereiro de 1808 Monografia Perfil clínico epidemiológico dos pacientes atendidos em ambulatório de endocrinologia pediátrica em hospital universitário Lara Damasceno Almeida Professor orientador: Luciana Mattos Barros Oliveira Monografia de Conclusão do Componente Curricular MEDB60/2013.1, e como pré-requisito obrigatório e parcial para conclusão do curso médico da Faculdade de Medicina da Bahia da Universidade Federal da Bahia, apresentada ao Colegiado do Curso de Graduação em Medicina. Salvador - Bahia, Setembro, 2013 IV V “Que ninguém se engane: só se consegue a simplicidade através de muito trabalho.” Clarice Lispector VI A todos os meus familiares, especialmente meus pais, Antonio Francisco e Roseli, à minha irmã Lis, e ao meu amor, Flávio, por todo o carinho, compreensão e apoio. VII EQUIPE Lara Damasceno Almeida, Faculdade de Medicina da Bahia/UFBA. Correio – e: [email protected] Luciana Mattos Barros Oliveira, Instituto de Ciências da Saúde/UFBA, professora orientadora. INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) COMPLEXO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO PROFESSOR EDGAR SANTOS Ambulatório Magalhães Netto/HUPES/UFBA FONTES DE FINANCIAMENTO Recursos próprios. VIII AGRADECIMENTOS À minha orientadora, professora Luciana Mattos, pela generosidade e carinho, sempre disponível. À funcionária do SAME (Serviço de Arquivo Médico e Estatística) do Ambulatório Magalhães Netto, Edinalva Neves de Oliveira, pela ajuda e colaboração amiga. 1 ÍNDICE LISTA DE ABREVIATURAS 3 ÍNDICE DE TABELAS 5 ÍNDICE DE FLUXOGRAMAS, FIGURAS E QUADROS 6 I. RESUMO 7 II. OBJETIVO(S) 8 III. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 9 III.1. ENDOCRINOPATIAS DA INFÂNCIA 9 III.2. ANORMALIDADES DO CRESCIMENTO 9 III.3. TIREOIDOPATIAS 11 III.3.1. GERAL 11 III.3.2. HIPOTIREOIDISMO 11 III.3.3. HIPERTIREOIDISMO 13 III.4. DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO PUBERAL 14 III.4.1. DEFINIÇÃO DE DESENVOLVIMENTO PUBERAL E SUAS VARIAÇÕES 14 III.4.2. PUBERDADE PRECOCE 16 III.4.3. VARIANTES NORMAIS DA PUBERDADE 18 III.5. DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO SEXUAL 19 III.5.1. DEFINIÇÃO 19 III.5.2. DDS CROMOSSÔMICA SEXUAL III.5.2.1. SÍNDROME DE TURNER III.5.2.2. SÍNDROME DE KLINEFELTER 20 20 21 III.5.2. DDS EM INDÍVIDUOS 46,XY 22 III.5.3. DDS EM INDÍVIDUOS 46,XX 23 III.6. DISFUNÇÕES DAS GLÂNDULAS ADRENAIS 24 III.6.1. CONCEITOS 24 III.6.2. HIPERPLASIA ADRENAL CONGÊNITA 25 III.6.3. SÍNDROME DE CUSHING 26 III.6.4. INSUFICIÊNCIA ADRENAL 27 III.7. DIABETES MELLITUS TIPO 1 28 III.8. OBESIDADE 29 IV. METODOLOGIA 31 V. RESULTADOS 32 VI. DISCUSSÃO 37 VII. CONCLUSÕES 40 2 VIII. SUMMARY 41 IX. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 42 X. ANEXOS 47 ANEXO 1: Tabela utilizada para preenchimento dos dados coletados 47 ANEXO 2: Parecer do Comitê de Ética e Pesquisa 48 3 LISTA DE ABREVIATURAS OMS Organização Mundial de Saúde NCHS National Center of Health Statistics BEF Baixa estatura familial BEC Baixa estatura constitucional BEM Baixa estatura mista GH Hormônio do crescimento TSH Hormônio estimulador da tireoide TH Tireoidite de Hashimoto DG Doença de Graves HHG Hipotalâmico-hipofisário-gonadal GnRH Hormônio liberador de gonadotrofina LH Hormônio luteinizante FSH Hormônio folículo-estimulante PP Puberdade precoce PPC Puberdade precoce central PPP Puberdade precoce periférica DDS Distúrbios do desenvolvimento sexual ST Síndrome de Turner IGF Fator de crescimento semelhante à insulina SK Síndrome de Klinefelter AMH Hormônio anti-mulleriano DHT Di-hidrotestosterona HHA Hipotalâmico-hipofisário-adrenal CRH Hormônio liberador de corticotrofina AVP Arginina vasopressina 4 ACTH Hormônio adrenocorticotrófico HAC Hiperplasia adrenal congênita 17-OHP 17- hidroxiprogesterona FPS Forma clássica perdedora de sal (da hiperplasia adrenal congênita) FVS Forma clássica virilizante simples (da hiperplasia adrenal congênita) FNC Forma não clássica (da hiperplasia adrenal congênita) SC Síndrome de Cushing DM1 Diabetes mellitus tipo 1 IMC Índice de massa corpórea DM2 Diabetes mellitus tipo 2 5 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Características gerais dos pacientes atendidos no ambulatório ..................... 32 Tabela 2 - Procedência e naturalidade ............................................................................ 33 Tabela 3 - Distribuição dos pacientes por faixa etária.................................................... 34 Tabela 4 - Diagnósticos mais frequentes ........................................................................ 35 Tabela 5 - Diagnósticos sindrômicos e etiológicos mais frequentes .............................. 35 6 ÍNDICE DE FLUXOGRAMAS, FIGURAS E QUADROS Figura I - Classificação de Tanner para mamas femininas ............................................. 15 Figura II – Classificação Tanner genitália masculina e pelos pubianos ......................... 16 Quadro I - Classificação Etiológica da Puberdade Precoce ........................................... 17 Fluxograma I - Estereoidogênese ................................................................................... 26 7 I. RESUMO PERFIL CLÍNICO EPIDEMIOLÓGICO DO AMBULATÓRIO DE ENDOCRINOLOGIA PEDIÁTRICA DO MAGALHÃES NETTO HUPES - UFBA NO PERÍODO DE 2009 A 2012 Introdução: Segundo o perfil do ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Hospital Presbiteriano em Nova York, as disfunções endócrinas mais prevalentes entre os pacientes pediátricos são: anormalidades do crescimento, tireoidopatias, distúrbios do desenvolvimento e da diferenciação sexual e disfunções das glândulas adrenais. Não é conhecido o perfil dos ambulatórios de Endocrinologia Pediátrica no estado da Bahia. Objetivo: Determinar o perfil clinico-epidemiológico de um Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Magalhães Neto, HUPES - UFBA, na cidade de Salvador, Bahia. Metodologia: Foram incluídos os pacientes com idade inferior ou igual a 18 anos, atendidos no ambulatório entre janeiro de 2009 a dezembro de 2012. Foram revisados os prontuários e avaliados: gênero, data de nascimento, procedência, naturalidade, raça, idade na primeira consulta, diagnóstico sindrômico e etiológico e data da última consulta. Foram excluídos os pacientes maiores de 18 anos. Dados analisados pelo SPSS. Resultados: Foram incluídos 387 pacientes (56,8% do sexo feminino e 43,2% do masculino). A maioria dos pacientes foi identificada como parda. No tocante à procedência, foram encontrados 92 municípios, quanto à naturalidade, foram encontrados 77. Salvador foi o município mais frequente de procedência e naturalidade. A idade média na primeira consulta foi 8,4 anos. E na última consulta, a maioria dos pacientes tinham entre 10 e 14 anos (30,23% dos pacientes). O diagnóstico mais prevalente foi o de baixa estatura, em 117 pacientes (30,2% da amostra). O segundo mais frequente foi obesidade, em 94 pacientes (24,3% da amostra). Discussão: Assim como no nosso trabalho, no Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Hospital Presbiteriano em Nova York, em 1999, o diagnóstico de baixa estatura foi o mais prevalente. Quanto à etiologia, também há concordância, sendo a forma constitucional a mais comum. A obesidade também obteve alta prevalência. Esse achado está em consonância com dados mundiais. Conclusão: O diagnóstico de baixa estatura é o mais frequente entre os pacientes. Sobre esse diagnóstico, a maioria ainda está em investigação, ou não foi associada à etiologia específica. Obesidade é o segundo diagnóstico mais frequente. Palavras-chaves: Endocrinologia, pediatria, perfil de saúde. 8 II. OBJETIVO(S) PRINCIPAL: Determinar o perfil clinico-epidemiológico de um Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Serviço de Endocrinologia Geral do Magalhães Neto, Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgar Santos - UFBA, na cidade de Salvador, Bahia. SECUNDÁRIO: Confrontar prevalência dos diagnósticos encontrados no ambulatório com a prevalência dos mesmos na literatura. 9 III. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA III.1. ENDOCRINOPATIAS DA INFÂNCIA As doenças endócrinas na faixa etária pediátrica não estão entre as mais prevalentes. Têm prevalência menor, por exemplo, que as doenças infecciosas, respiratórias e do trato gastrointestinal. No entanto, é importante reconhece-las e tratalas adequadamente1. Existem poucos trabalhos na literatura que apresentem perfis de ambulatórios de Endocrinologia Pediátrica. Dessa forma, há uma relativa dificuldade em localizar dados sobre as endocrinopatias mais prevalentes nos serviços de saúde. Além disso, os diagnósticos mais prevalentes podem variar de um serviço a outro em função de características locais e do próprio serviço (objetivos do mesmo, se atendimento privado ou público, por exemplo). Em um trabalho realizado no Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Hospital Presbiteriano em Nova York, no ano de 1999, foram levantados os diagnósticos mais comuns naquele serviço, em um período de cinco anos (de 1994 a 1999)2. Foram identificadas as seguintes desordens endócrinas (ordenadas da mais a menos prevalente) como os diagnósticos mais comuns: anormalidades do crescimento, tireoidopatias, distúrbios do desenvolvimento e diferenciação sexual, disfunções das glândulas adrenais e outros distúrbios relacionados ao sistema endócrino (obesidade, hipertensão, dislipidemia, entre outros). Pacientes com disfunções no metabolismo dos carboidratos, na pituitária anterior, distúrbios minerais e ósseos compreenderam um pequeno grupo. Doenças da pituitária posterior foram raras. III.2. ANORMALIDADES DO CRESCIMENTO As anormalidades do crescimento incluem tanto a baixa quanto a alta estatura. Queixas relacionadas ao crescimento são muito frequentes, e o acompanhamento do crescimento é um bom método de avaliação da saúde e nutrição de crianças, rotina recomendada pela OMS3. A baixa estatura é queixa muito mais usual nos ambulatórios de endocrinologia pediátrica do que a alta estatura. A baixa estatura é definida como uma estatura, em relação à idade, abaixo do percentil 3 na curva do NCHS (National Center of Health Statistics) ou abaixo do percentil 2,5 na curva de Marcondes, ou ainda, como altura abaixo de dois desvios-padrão da média para sexo e idade no escore Z4. Na população pediátrica em geral, a maioria das crianças com queixa de baixa estatura são caracterizadas como variante normal de baixa estatura, que por sua vez é composta por: baixa estatura familial (BEF), baixa estatura constitucional (BEC) e a forma mista (BEM). No primeiro caso, a criança tem estatura abaixo dos valores esperados, com peso e altura de nascimento geralmente abaixo da média, sua velocidade de crescimento é adequada, a idade esquelética é compatível coma idade cronológica e o exame físico encontra-se normal. Na baixa estatura constitucional, a criança tem peso e altura de nascimento na média populacional, pais com altura dentro da média populacional, e o estirão pubertário é tardio em relação à média populacional, constata- 10 se um atraso na maturação do crescimento ósseo, a fusão epifisária ocorre mais tardiamente, e nenhuma anormalidade é constatada ao exame físico. Consequentemente, a altura potencial geralmente está preservada e a maioria dos indivíduos atinge estatura adequada, para o canal familiar na idade adulta. Pode também ocorrer uma combinação das duas formas citadas anteriormente caracterizando a forma mista5. A forma nosológica de baixa estatura corresponde à cerca de 30% dos casos, com velocidade de crescimento abaixo do esperado5. As principais etiologias são: doenças genéticas (como a Síndrome de Turner e a trissomia do cromossomo 21), endocrinológicas (principalmente as diversas causas de insuficiência do hormônio do crescimento - GH, tais como hipopituitarismo ou resistência ao GH), desnutrição, doenças do esqueleto, retardo do crescimento intrauterino, carência psicossocial, entre outras5. O diagnóstico diferencial entre estas várias formas de baixa estatura exige uma anamnese rigorosa, um exame físico cuidadoso, uma vigilância sistemática do crescimento e um cálculo da velocidade de crescimento (cm/ano). Depois de realizados todos esses passos, seguidos por uma avaliação radiológica e laboratorial (que pode incluir avaliação da sensibilidade ao GH), testes genéticos podem ser realizados, caso suspeite-se de uma doença genética6. A queixa de alta estatura é muito menos frequente que a de baixa estatura, nos serviços de saúde. Esse fato é em parte explicado pelo entendimento cultural de que crescimento acima da média é um bom indicador de nutrição, bem-estar social e outras qualidades positivas7. Alta estatura é definida como altura acima de dois desvios-padrão da média para sexo e idade8. Ela pode ser tanto resultado de uma expressão normal de fatores genéticos e familiares, como pode ter uma causa patológica. Crianças que crescem acima do canal de crescimento correspondente à sua altura-alvo, que tenham velocidade de crescimento excessiva ou que apresentem dismorfismos são aquelas nas quais há uma maior probabilidade de doença subjacente9. A alta estatura é classificada em primária, secundária ou idiopática. As desordens primárias são causadas por defeitos intrínsecos nos ossos ou no tecido conjuntivo. Muitas vezes são de origem genética, podendo estar associadas a anomalias cromossômicas, desordens monogênicas ou síndromes de causa desconhecida. Nesses casos, a alta estatura geralmente tem início no período pré-natal, caracterizando-se por crescimento desproporcional e presença de dismorfismos10. Compreendidas nesse grupo, estão as Síndromes de Super Crescimento que englobam um grande número de doenças genéticas que tem crescimento excessivo e/ou alta estatura como característica central no seu fenótipo. Podemos citar: síndrome de Klinefelter, síndrome de Marfan, síndrome de Beckwith-Wiedemann, entre outras11. As causas secundárias são, em geral, de origem hormonal, ocorridas por mudanças na velocidade de crescimento. Enquanto que as idiopáticas, que representam as causas mais comuns de alta estatura, incluem a alta estatura constitucional e a familiar10. 11 Os distúrbios do crescimento caracterizam-se por uma elevada repercussão na autoestima e autoimagem da criança e do adolescente, tanto na baixa quanto na alta estatura. A detecção e o tratamento precoce da condição subjacente são essenciais para minimizar as consequências comportamentais, físicas e hormonais em alguns casos. Em crianças com baixa estatura, por exemplo, pequenos ganhos de altura adquiridos com o tratamento são superestimados tanto pelos próprios afetados quanto pelos familiares12. III.3. TIREOIDOPATIAS III.3.1. GERAL No tocante às tireoidopatias, distintamente do que ocorre com o adulto, o hipertireoidismo não é frequente na infância e na adolescência; sendo o hipotireoidismo muito mais comum na faixa etária pediátrica. As doenças da tireoide podem ter graves e irreversíveis efeitos no sistema nervoso e levar ao atraso do desenvolvimento. Isso é percebido de forma especial na primeira infância, quando o sistema tireoidiano é imaturo e o organismo é extremamente vulnerável às disfunções da tireoide13. III.3.2. HIPOTIREOIDISMO O hipotireoidismo é entendido como uma produção inadequada de hormônios tireoidianos em face à necessidade do organismo. Ele pode classicamente ser dividido em primário, secundário e terciário (central). O hipotireoidismo central é resultado de uma estimulação insuficiente da tireoide pelo Hormônio Estimulador da Tireóide (TSH), podendo ocorrer ao nível da hipófise (hipotireoidismo secundário) ou do hipotálamo (hipotireoidismo terciário)14. O hipotireoidismo primário é resultante de desordens que afetam diretamente a glândula tireoide. Em oposição ao hipotireoidismo secundário e terciário, que são raros, a afecção primária da glândula tireoide é a forma mais comum da doença15. Na criança, além da classificação citada acima, todos os tipos de hipotireoidismo (primário e central) podem ser divididos em: congênito ou adquirido, temporário ou permanente16. O hipotireoidismo congênito é tido como uma urgência pediátrica. Ele ocorre em 1: 2.000 a 4.000 nascidos vivos e afeta duas vezes mais o sexo feminino17. O diagnóstico precoce e o tratamento iniciado nas primeiras semanas de vida são fundamentais para o desenvolvimento intelectual normal da criança afetada. A maioria dos recém-nascidos mostra-se normal ao nascer. O feto hipotireóideo está de certo modo protegido pela transferência placentária de hormônio tireoidiano materno (T4) para a circulação fetal. Soma-se a isso o aumento das concentrações cerebrais de tiroxina desiodase, enzima que converte o T4 em T3, fazendo com que a produção de T3 cerebral fique próxima do normal, em detrimento de outras estruturas, como o esqueleto, o que determina atraso na maturação óssea. Diante desse fato, tornase essencial a realização de testes de triagem neonatal, objetivando a detecção o mais 12 previamente possível do hipotireoidismo congênito. A triagem neonatal deve ser realizada 48 horas após o nascimento e até o 5º dia de vida em recém-nascidos a termo. O teste recomendado é a dosagem de TSH por imunofluorimetria em amostra de sangue em papel-filtro18. No Brasil, a partir da década de 80 do século passado foram iniciados alguns desses programas de triagem e a história natural do hipotireoidismo congênito tem se modificado drasticamente nos últimos anos, graças a esse acontecimento16. Os quadros clínicos resultantes da deficiência dos hormônios tireoidianos dependerão do grau e do tempo de duração desta deficiência, afetando praticamente todos os tecidos em maior ou menor intensidade. Entretanto, é já em vida intrauterina que a falta de produção adequada determina consequências mais danosas, uma vez que tais hormônios têm papel importante no desenvolvimento cerebral normal do feto. Os sinais mais precoces são: icterícia prolongada ou recorrente, atraso na queda do funículo umbilical e hérnia umbilical. O choro é rouco, e os sons emitidos são graves. Nos primeiros meses, outros sinais tornam-se presentes: dificuldade alimentar, ganho de peso insuficiente, respiração ruidosa, congestão nasal, distúrbios respiratórios, obstipação, letargia, pele seca, fria, pálida e com livedo reticularis. Contudo, como dito acima, esses sinais e sintomas nem sempre se apresentam de modo evidente, podendo dificultar a detecção precoce e perdendo um tempo precioso para o início do tratamento. Como consequência há atraso do desenvolvimento neuropsicomotor e do crescimento, e as proporções corpóreas são desarmônicas com membros inferiores curtos em comparação ao tronco19. Outra entidade clínica, a doença autoimune da tireoide, manifesta-se em várias formas, sendo as mais comuns a Doença de Graves (causa de hipertireoidismo, relatada no tópico seguinte) e a Tireoidite de Hashimoto (TH) que cursa com hipotireoidismo. A TH é nas crianças, a forma mais frequente de tireoidite e a principal causa de hipotireoidismo em regiões sem carência de iodo20. Tireoidite é definida como a presença de infiltração linfocitária na glândula tireoide, com ou sem evidência de destruição folicular. Existem dois tipos de tireoidite autoimune (ou tireoidite linfocítica crônica): a TH e a tireoidite atrófica (considerada o estágio final da TH, com destruição importante do tecido glandular). A TH é marcada pela presença de bócio, e é a forma mais comum de tireoidite autoimune. Acredita-se que o evento inicial na fisiopatologia da doença seja a ativação de linfócitos T CD4 específicos para antígenos da tireoide. Uma vez ativados, esses linfócitos recrutaram tanto células CD8 (responsáveis por citotoxicidade direta) quanto células B auto reativas que induzem a produção de anticorpos. Os principais alvos desses auto anticorpos são a tireoglobulina (proteína essencial para a síntese e armazenamento dos hormônios tireoidianos), a tireoperoxidase (enzima que participa da síntese dos hormônios tireoidianos), e o receptor do TSH (anticorpo anti-TSHr). O espectro clínico varia desde crianças assintomáticas e oligossintomáticas a crianças com hipotireoidismo franco, com mudanças no padrão de sono, intolerância ao frio, diminuição da performance escolar, diminuição do crescimento, irregularidades menstruais nas meninas, e outras alterações puberais, constipação, ganho de peso, entre outros. Ainda, 13 no início da apresentação, pode haver quadro de tireotoxicose (elevação dos hormônios tireoidianos) devido à descarga de hormônios pré-formados. Na criança é importante investigar a presença de outras doenças autoimunes que podem estar associadas como diabetes mellitus, doença celíaca e doença de Addison, por exemplo21,23. III.3.3. HIPERTIREOIDISMO É importante diferenciar dois termos que comumente são utilizados como sinônimos: hipertireoidismo e tireotoxicose. Esta é uma condição referente a um estado clínico resultante da ação inapropriada dos hormônios tireoidianos nos tecidos, normalmente como resultado de taxas elevadas dos mesmos. O termo hipertireoidismo corresponde a uma forma de tireotoxicose resultante da síntese e liberação de altos níveis dos hormônios tireoidianos. Em síntese, o hipertireoidismo pressupõe hiperatividade da glândula tireoide, enquanto a tireotoxicose refere-se à exacerbação dos efeitos dos hormônios tireoidianos. A tireotoxicose pode ou não ser causada por hipertireoidismo22. O hipertireoidismo (assim como a tireotoxicose em geral) é pouco comum na faixa etária pediátrica. A forma autoimune, chamada de doença de Graves (DG) ou doença de Von Basedow, é a doença da tireoide mais comum em regiões com abundância de iodo e corresponde a pelo menos 95% dos casos de hipertireoidismo em crianças. Estudos mostram uma incidência de 1: 10.000 do hipertireoidismo autoimune em crianças20. Dados semelhantes exprimem que apenas 1% - 5% das doenças tireoidianas que cursam com hipertireoidismo iniciam antes dos 16 anos. Dessa forma, a incidência do hipertireoidismo aumenta na infância com o passar dos anos, sendo raro antes dos 5 anos, e atinge seu pico na adolescência13. O hipertireoidismo em Graves é causado por anticorpos estimulantes da tireoide, que se ligam aos receptores do TSH, ativando-os. A ativação desses receptores leva à hiperplasia dos folículos tireoidianos e hipersecreção dos hormônios da tireoide com as consequentes manifestações clínicas. A infiltração linfocítica e de glicosaminoglicanos de natureza inflamatória no tecido conectivo orbital e na pele causa as manifestações extra tireoidianas da doença: a oftalmopatia e dermopatia respectivamente23. Os sinais e sintomas da Doença de Graves são semelhantes aos apresentados pelos adultos, mas em contraste aos adultos, a Doença de Graves é quase sempre diagnosticada tardiamente em crianças. Esse atraso normalmente não acarreta graves repercussões, mas pode estar associado a distúrbios do desenvolvimento neurológico e da maturação esquelética, incluindo craniossinostose e idade óssea avançada em crianças mais jovens. Queda no desempenho escolar também pode ser observada nas crianças em idade escolar e particularmente pré-adolescentes24. A apresentação da DG em crianças quase sempre é insidiosa, e a investigação dos sintomas geralmente se passa meses após o surgimento dos primeiros sintomas. Os sinais e sintomas são extremamente variados e resultam de alterações em diversos sistemas e tecidos. Distúrbios comportamentais são mais frequentes nas crianças que 14 nos adultos. Podem surgir, tais como: dificuldade de concentração, labilidade emocional, irritabilidade, hiperatividade e insônia. Achados cardiovasculares típicos incluem: taquicardia, palpitações, pressão de pulso alargada e precórdio hiperativo. A despeito do aumento do apetite, a criança normalmente perde peso e pode haver diarreia. Fadiga, tremores, intolerância ao calor e queda de cabelo também são comuns. O bócio pode estar presente. Nas garotas pós-púberes normalmente ocorrem irregularidades menstruais. O edema tibial frequentemente visto em adultos é raro em crianças. Oftalmopatia e dermopatia são mais raras do que em adultos e tendem a ser menos graves. Quando presentes, normalmente desaparecem com o tratamento. Manifestações do hipertireoidismo exclusivas à pediatria são o aceleramento do crescimento e da maturação óssea, associados ao hipertireoidismo crônico 23,24. Alguns estudos acreditam que existem diferenças na apresentação clínica da DG de acordo à faixa etária. Por essa corrente, crianças pré-púberes apresentar-se-iam mais comumente com diminuição do ganho de peso e com menos alterações de comportamento que os adolescentes. Isso pode explicar porque crianças mais jovens teriam maior atraso no diagnóstico que os adolescentes. Entretanto, não há consenso, e alguns autores acreditam que as variações nos quadros clínicos devem-se somente às características individuais24. III.4. DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO PUBERAL III.4.1. DEFINIÇÃO DE DESENVOLVIMENTO PUBERAL E SUAS VARIAÇÕES A puberdade é o período de transição biológica entre a infância e a vida adulta e tem como objetivo final a maturação sexual. É caracterizada pelo amadurecimento dos caracteres sexuais primários (genitais e gonádicos), pelo surgimento dos caracteres sexuais secundários (mamas, pelos pubianos e axilares) e pelo rápido crescimento (conhecido como estirão da puberdade)25. A esse período de rápido crescimento, seguese um período de desaceleração e finalmente parada do crescimento resultante do fechamento das epífises ósseas26. O eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal (HHG) é ativado durante o desenvolvimento fetal e neonatal e depois entra em uma fase de latência que dura o resto da infância até a puberdade. A puberdade normal começa com a ativação do eixo, quando sob a influência do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), o hormônio luteinizante (LH) e o hormônio folículo-estimulante (FSH), que são as gonadotrofinas, juntamente com os esteroides sexuais estradiol ou testosterona orquestram todas as manifestações da puberdade. Essas manifestações são tanto externas (desenvolvimento de mamas em meninas e da genitália em ambos os sexos) quanto internas (útero, ovários e testículos). Os pelos pubianos desenvolvem-se independentemente da ativação do eixo HHG, através da ação dos androgênios secretados pelas glândulas adrenais. O início da produção desses hormônios pelas adrenais é chamado de adrenarca27. 15 O acompanhamento do desenvolvimento puberal costuma ser feito utilizando a classificação de Tanner. Essa classificação sistematiza o desenvolvimento puberal em cinco etapas, considerando no sexo feminino, o desenvolvimento mamário e a distribuição e quantidade de pelos pubianos; e no sexo masculino, o aspecto dos órgão genitais e a distribuição e quantidade de pelos pubianos28. A Figura I exibe a classificação de Tanner para as mamas femininas e a Figura II ilustra a classificação para a genitália masculina e pelos pubianos em ambos os sexos. Nas meninas, o primeiro sinal da puberdade costuma ser o aparecimento dos pelos pubianos que corresponde ao estágio P2 de Tanner. Em seguida ocorre o desenvolvimento das mamas, inicialmente em estágio M2 de Tanner com palpação da auréola até uma mama feminina completamente desenvolvida (estágio M4 ou M5 de Tanner). A realização de uma ultrassonografia nesse início da puberdade revela um aumento do volume uterino e desenvolvimento de cistos foliculares ovarianos. Por fim, ocorre a menarca27. Figura I - Classificação de Tanner para mamas femininas Fonte: Adaptada de Menezes et al. 2008 Nos meninos, o desenvolvimento puberal inicia-se com aumento do volume testicular. Depois disso, aparecem os pelos pubianos (estágios P2 a P5 de Tanner), pelos faciais, agravamento da voz e aumento no tamanho peniano (estágio G2 a G5 de Tanner). Por fim, a última etapa do desenvolvimento puberal no sexo masculino é a produção de espermatozoides viáveis27. 16 Figura II – Classificação Tanner genitália masculina e pelos pubianos Fonte: Adaptada de Menezes et al. 2008 A descrição realizada acima é uma descrição da puberdade normal. Existem variações desse desenvolvimento que podem ser classificadas como variações normais do desenvolvimento puberal ou variações patológicas do desenvolvimento puberal25. As variantes normais incluem atraso ou aceleração constitucional do crescimento e desenvolvimento puberal, telarca precoce isolada, pubarca precoce isolada e ginecomastia puberal. As variantes patológicas incluem principalmente a puberdade precoce e a ausência de puberdade. As variantes da puberdade mais comumente vistas serão exploradas um pouco mais abaixo. III.4.2. PUBERDADE PRECOCE Existem algumas controvérsias quanto a definição do ponto de corte para puberdade precoce, especialmente em meninas. Alguns autores estadunidenses consideram normal o desenvolvimento sexual que se inicia após os 6 anos em garotas afro-americanas e após os 7 anos em garotas caucasianas. Excluindo-se as controvérsias, a puberdade precoce (PP) é comumente definida como o surgimento progressivo de caracteres sexuais secundários antes dos 8 anos de idade em meninas e antes dos 9 anos de idade em meninos29. O surgimento de tais caracteres é representado pelo estágio 2 de Tanner (Figura I e Figura II). Ou seja, de acordo com essa definição clássica, PP é a presença do estágio 2 de Tanner antes dos 8 anos em meninas e dos 9 anos em meninos.30. Nas últimas décadas o critério etário para PP tem sido discutido em razão de um estudo americano publicado em 1999 que propôs a adoção de novos critérios: a idade de 6 anos para o sexo feminino e 7 anos para o sexo masculino em crianças brancas e afro-americanas31. Apesar dessa publicação e de inúmeras outras, não houve consenso e o critério definido anteriormente prevalece até hoje26,30. 17 Algumas consequências indesejadas advêm da PP. Podemos citar: rápida maturação óssea com redução da altura final, aparência física inapropriada e alterações psicológicas e de comportamento32. A redução da altura final é resultante da fusão prematura das epífises ósseas decorrentes do alto nível de esteroides observado em todos os tipos de PP26. Tipicamente a PP é dividida em duas formas: central ou periférica. A puberdade precoce central (PPC) é também chamada de dependente de gonadotrofina (GnRHdependente) ou de puberdade precoce verdadeira. Esse tipo de PP é causado pela ativação prematura do eixo HHG e assemelha-se ao desenvolvimento puberal normal, diferindo-se deste basicamente pela idade precoce de apresentação. Nos garotos, um aumento no volume testicular de mais de 4 ml representa a primeira manifestação da PPC. Nas garotas, a telarca é o evento inicial. Em ambos os sexos ocorre aumento da velocidade de crescimento33. A PPC é mais comum em garotas32. Na grande maioria dos casos a PPC é idiopática. Em uma minoria podem ser detectados tumores e/ou lesões do sistema nervoso central, tais como astrocitoma e hamartoma hipotalâmico. A frequência de causas orgânicas é maior no sexo masculino que no feminino32. A puberdade precoce periférica (PPP) é também conhecida como pseudopuberdade precoce, ou puberdade precoce independente de gonadotrofina (GnRH-independente). Assim como na PPC, existe uma liberação precoce de hormônios esteroide, mas nesse caso, essa liberação é independente da ativação do eixo HHG. Diferentemente da PPC, a PPP pode ocasionar uma puberdade precoce heterossexual, com virilização em meninas e feminização em meninos. As principais causas de PPP são cistos ovarianos, tumores gonadais, tumores adrenais, administração de esteroide exógeno e mutações gênicas originando defeitos enzimáticos da esteroidogênese33. O Quadro I resume as principais causas e a classificação da puberdade precoce. Quadro I - Classificação Etiológica da Puberdade Precoce Puberdade Precoce Classificação Idiopática (familiar/não-familiar) Tumores do SNC Astrocitoma, glioma óptico Deficiência de GH Hamartoma hipotalâmico Craniofaringioma, ependimoma Abscesso, encefalite, trauma Central (Dependente de Gonadotrofina) Hidrocefalia Outras Lesões do SNC Cisto Aracnóide Radiação craniana Quimioterapia Puberdade Precoce Combinada Síndrome de McCune-Albright, (secundária) Hiperplasia Adrenal Congênita Gonadal Síndrome de McCune-Albright Periférica ou 18 Puberdade Precoce Pseudopuberdade Precoce (Independente de Gonadotrofina) Adrenal Tumores produtores de gonadotrofina Coriônica Humana Outras Classificação Puberdade precoce familiar limitada ao sexo masculino Tumores ovarianos Tumor de células de Leydig Hiperplasia Adrenal Congênita Virilizante Adenoma/carcinoma funcional de Adrenal SNC: Corioepitelioma, disgerminoma, teratoma Coriocarcinoma, hepatoma, teratoma Hipotireoidismo Primário Iatrogenia Telarca prematura Variantes normais da Familiar puberdade Adrenarca prematura SNC: sistema nervoso central Fonte: Adaptada de Berberoğlu, 2009. III.4.3. VARIANTES NORMAIS DA PUBERDADE Adicionalmente a essas duas formas de puberdade, existem as variantes normais do desenvolvimento puberal. Tais são: telarca precoce isolada, pubarca precoce e menarca precoce. A telarca precoce normalmente ocorre antes dos 2, 3 anos de idade. A idade óssea é normal e a velocidade de crescimento é adequada para a idade. Não existem outros sinais de secreção de estrógeno e o crescimento mamário pode ser uni ou bilateral. Comumente regride em alguns meses, ou persiste até a puberdade. A condição é geralmente benigna, mas as garotas necessitam de acompanhamento, pois pode representar o primeiro sinal de PP32,33. A pubarca precoce consiste no surgimento de pelos pubianos antes dos 8 anos no sexo feminino e antes dos 9 anos no sexo masculino. Assim como na telarca, outros sinais da puberdade não podem estar presentes (tais como telarca e crescimento testicular). Surgimento de pelo axilar e avanço da idade óssea com aumento da velocidade de crescimento podem ser vistos, mas não é o usual. No geral não ocorre avanço para PP e altura final é preservada33. Alguns estudos apontam a prematuridade, tamanho pequeno para idade gestacional, sobrepeso e obesidade como fatores associados à pubarca precoce34. Em todos os casos suspeitos de pubarca precoce é essencial descartar a hiperplasia adrenal congênita que pode apresentar quadro semelhante. A maioria dos casos de pubarca precoce é explicada pela adrenarca precoce que consiste no início de produção de androgênios pelas suprarrenais. Essa é uma variante da puberdade normal e não oferece riscos35. A menarca precoce isolada é uma variante extremamente rara. É definida como a presença de sangramento menstrual antes dos oito anos de idade, sem outros sinais de 19 puberdade e sem avanço da idade óssea. Gonadotrofinas e estradiol encontram-se nos níveis esperados para idade pré-púbere. Quando há suspeita clínica, é necessário considerar e afastar outras causas de sangramento genital tais como trauma, infecções, neoplasia ou corpo estranho e manipulação indevida, assim como abuso sexual26,33. III.5. DISTÚRBIOS DO DESENVOLVIMENTO SEXUAL III.5.1. DEFINIÇÃO A diferenciação sexual é resultado de uma série de complexos eventos que acontecem sob a influência de genes e hormônios. Esses eventos direcionam a gônada indiferenciada e bipotencial a se tornar um testículo ou ovário. Na sexta ou sétima semana de vida fetal, fetos de ambos os sexos possuem dois tipos de ductos urogenitais: os ductos de Wolff e os ductos de Muller. O desenvolvimento e a regressão de um ou outro ducto nos passos seguintes do desenvolvimento determinam o sexo do indivíduo. Nesse período a genitália externa se assemelha à uma genitália feminina e contém o tubérculo genital, as pregas genitais, as pregas uretrais e uma abertura urogenital36. O termo distúrbios do desenvolvimento sexual (DDS) designa um grupo de condições congênitas no qual o desenvolvimento sexual é anômalo, seja por anormalidades cromossômicas, gonadais ou anatômicas37. O resultado do desenvolvimento sexual anormal é muitas vezes a formação de uma genitália ambígua, e por isso os DDS já foram chamados de intersexo38. Pode-se afirmar que existem várias formas de se classificar o sexo de um indivíduo, a depender do parâmetro utilizado. A partir desse conceito surge a definição de sexo genético, sexo gonadal e sexo fenotípico. O sexo genético é aquele determinado pela constituição cromossômica do sujeito. Todos os que apresentarem cariótipo 46, XX são indivíduos do sexo genético feminino; os que tiverem 46, XY são do sexo genético masculino. O sexo gonadal é condicionado pelo desenvolvimento de um ou outro tecido gonadal (testículo ou ovário), ou ambos. Já o sexo fenotípico é baseado na aparência física do indivíduo, e quando recém-nascidos, basicamente na genitália externa. Na população em geral, normalmente não há dificuldade em estabelecer-se o sexo de uma pessoa, já que as três classificações de sexo acima coincidem. Entretanto, nos DDS ocorre uma discordância entre esses diversos sexos, e daí a dificuldade, às vezes presente, de definir a pessoa como do sexo masculino ou feminino38. Recentemente foi proposta uma nova classificação dos DDS, juntamente com a proposta da nova nomenclatura. Seguindo essa classificação, os DDS são divididos em três tipos: 1- DDS cromossômica sexual; 2- DDS em indivíduos 46,XY e 3- DDS em indivíduos 46,XX. O primeiro grupo inclui todos os indivíduos com anomalias no número de cromossomos sexuais, tais como Síndrome de Turner (45,X) e Síndrome de Klinefelter (47,XXY). O segundo grupo inclui indivíduos com anomalias no desenvolvimento testicular, distúrbios na síntese e ação dos hormônios androgênios. Por 20 fim, o último grupo compreende aqueles com distúrbios no desenvolvimento ovariano, excesso de hormônios androgênios e outros39. III.5.2. DDS CROMOSSÔMICA SEXUAL Esse tipo de DDS é causado por anormalidade no número de cromossomos sexuais com consequente desenvolvimento gonadal anormal. Antigamente era utilizado o termo disgenesia gonadal para descrever esses distúrbios. Se há um testículo mal formado ele é denominado testículo disgenético; um ovário mal formado é denominado ovário vestigial36. Os DDS´s cromossômicas sexuais mais comuns são a Síndrome de Turner e a Síndrome de Klinefelter. III.5.2.1. SÍNDROME DE TURNER Estima-se que 1 em cada 2.500 crianças do sexo feminino nascidas vivas seja afetada pela Síndrome de Turner (ST)40. Essa síndrome é caracterizada pela ausência ou anormalidade de um cromossomo sexual X em algumas ou todas as células da garota afetada41. O espectro clínico é amplamente variável. As características mais comuns são baixa estatura, falência ovariana (disgenesia gonadal) com caracteres sexuais infantis e infertilidade. Dismorfismos como cubitus valgo, fácies típica, implantação baixa de cabelos, pescoço alado, mandíbula pequena, múltiplos nevos pigmentados, quarto dedo do pé curto, palato ogival, dobras da nuca, edema de mãos e pés também são comuns e conferem fenótipo característico. Anomalias cardíacas e renais também são comumente vistas. Essas alterações estão associadas à maior morbidade e diminuição da expectativa de vida42. A baixa estatura que é a principal característica da síndrome reflete um normal, mas pequeno tamanho no nascimento, diminuição da velocidade de crescimento precocemente (durante os três primeiros anos de vida) e estirão pubertário insignificante. Os níveis de GH e do fator de crescimento semelhante à insulina (insulin-like growth factor – IGF) são normais. Acredita-se que a baixa estatura deva-se á haploinsuficiência do gene SHOX (short stature homebox gene)43. A função ovariana em pacientes com ST é variável. Os ovários podem degenerar já na vida intrauterina, na infância ou nos primeiros anos da vida adulta. A amenorreia primária está presente em cerca de 85% das pacientes, a infertilidade em cerca de 98%. Como consequência, a gravidez não assistida é rara, com taxa de 2-5%44. O diagnóstico é feito pelo cariótipo. Dados revelam que metade das pacientes portadores da síndrome tem um cariótipo 45,X; 20-30% tem mosaicismo (45,X em pelo menos uma linhagem de células) e o restante tem anormalidades cromossômicas estruturais45. 21 III.5.2.2. SÍNDROME DE KLINEFELTER O termo Síndrome de Klinefelter (SK) refere-se a um grupo de doenças com distúrbios cromossomais nas quais existe pelo menos um cromossomo X extra adicionado ao cariótipo masculino normal (46, XY). A forma mais comum é a que possui somente um cromossomo X adicionado, resultando no cariótipo 47,XXY. Outras variantes são conhecidas, tais como 48,XXYY; 48XXXY e 49,XXXXY46. O cariótipo 47,XXY ocorre em 1 a cada 500 crianças do sexo masculina nascidas vivas, e é a anomalia cromossômica mais comum do ser humano47. A SK tem um número relativamente moderado de manifestações clínicas. Isso provavelmente deve-se a inativação da maioria dos genes supranumerários do cromossomo X48. O fenótipo da SK é tipicamente marcado pela presença de alta estatura, ombros estreitos, quadris largos, poucos pelos esparsos pelo corpo, ginecomastia e testículos pequenos e firmes. Esses sinais podem passar despercebidos e na maioria das vezes não resultam em uma investigação clínica. Assim, a principal queixa que leva a uma consulta médica e ao consequente diagnóstico é a infertilidade e/ou azoospermia. Por essa razão, a maior parte dos afetados só é diagnosticada na idade adulta49. Disfunção sexual e comorbidades como doenças endócrinas, metabólicas e cardiovasculares, osteoporose e doenças autoimunes também podem conduzir ao diagnóstico49. Em razão dos efeitos da testosterona no tecido adiposo, na sensibilidade insulínica e na função endotelial, a SK pode estar associada à incidência elevada de síndrome metabólica, diabetes mellitus e doenças cardiovasculares. Além disso, os hormônios sexuais desempenham um papel importante na formação de músculo, ossos e tecido adiposo. Dessa forma, os níveis mais altos de estrógenos associados a baixos níveis de andrógenos estão relacionados a um aumento da massa gorda e diminuição da massa magra corpórea, assim como risco aumentado de osteoporose e início precoce de osteopenia50. Na maioria dos pacientes adultos com SK os níveis de testosterona sérica caem para valores abaixo dos normais, enquanto que os valores do estradiol são normalmente mais altos do que o normal49. Também ocorre aumento de LH e FSH, principalmente na puberdade, como consequência da ausência do feedback negativo da testosterona. A diminuição da testosterona nesses casos é definida como hipogonadismo hipergonadotrófico. O hipogonadismo refere-se à diminuição da atividade da gônada: no caso da gônada masculina, identificada pela diminuição da produção de testosterona. Já o termo hipergonadotrófico refere-se a uma causa primária, da própria gônada, estando o eixo HHG em funcionamento normal. Esse termo se opõe ao hipogonadotrófico que determina causa secundária (ou hipotalâmica ou hipofisária), não havendo alteração primária na gônada em questão51. 22 III.5.2. DDS EM INDÍVIDUOS 46,XY O desenvolvimento do fenótipo sexual masculino pode ser entendido como um processo de duas etapas. A primeira é a formação do testículo a partir da gônada primitiva (determinação sexual) e a segunda é a diferenciação da genitália interna e externa devido a fatores secretados pelos testículos fetais (diferenciação sexual)52. Para a formação do testículo fetal, que ocorre por volta da sexta semana de gestação, o gene SRY localizado no cromossomo Y codifica um único fator de transcrição que ativa a via de formação testicular, dando início à cascata da determinação sexual. Além do gene SRY, vários outros genes e fatores estão envolvidos no processo, que é bastante complexo. Depois de formados os testículos, a produção de hormônio anti-mulleriano (AMH) pelas células de Sertolli e de testosterona pelas células de Leydig induzem a diferenciação sexual. O AMH age nos ductos de Mullerian levando a sua regressão. A testosterona age nos ductos de Wollf induzindo a formação de epidídimo, ductos deferentes e vesículas seminais. As células de Leydig também produzem o fator semelhante à insulina 3, que ocasiona a descida dos testículos. A testosterona é transformada em di-hidrotestosterona (DHT) que age nos receptores androgênicos da próstata e genitália externa para causar sua masculinização36. Os indivíduos 46,XY portadores de DDS sofrem uma masculinização intrauterina incompleta, por falhas nos processos de determinação sexual e diferenciação sexual. Como resultado, exibem ao nascimento uma genitália ambígua (antigamente chamado de pseudohermafroditismo masculino) ou completamente feminina. A genitália feminina ocorre se houver ausência completa de virilização. Nesses casos, ao nascimento e durante a infância, normalmente não é notada nenhuma alteração, e a busca por atenção médica só ocorre com na idade puberal devido à ausência de desenvolvimento mamário e/ou amenorreia primária37. O defeito primário na 46,XY DDS pode estar localizado em qualquer passo do complexo processo de diferenciação sexual. Assim, existem inúmeros tipos de 46,XY DDS. Os principais tipos estão relacionados a anormalidades no desenvolvimento gonadal (agenesia e disgenesia gonadal), defeitos na síntese e secreção de testosterona, defeitos na ação androgênica (resistência androgênica), persistência dos ductos de Mullerian, condições não genéticas e outras formas37. Dentre as anormalidades no desenvolvimento gonadal, a agenesia gonadal é uma condição rara, caracterizada pela ausência completa de testículos. Defeitos nos genes essenciais ao desenvolvimento da gônada bipotencial parecem estar envolvidos. A disgenesia gonadal é muito mais comum e existe em duas formas: completa ou parcial. A forma completa é caracterizada por genitália feminina interna e externa, ausência de caracteres sexuais secundários e presença de gônadas disgenéticas bilaterais. A forma parcial é caracterizada pela genitália externa ambígua com ou sem persistência dos ductos de Mullerian. Acredita-se que até 20% da disgenesia gonadal 46,XY é causada por mutações no gene SRY. Outros genes estão envolvidos nos outros casos37. 23 III.5.3. DDS EM INDÍVIDUOS 46,XX Na ausência do SRY, a diferenciação sexual feminina começa a ocorrer. Primeiro com a diferenciação das células da granulosa que iniciam a via de desenvolvimento do ovário. Os ductos de Muller dão origem às tubas uterinas, útero e os dois terços superiores da vagina. O tubérculo genital da origem ao clitóris, as pregas genitais originam os grandes lábios, e as pregas uretrais os pequenos lábios36. Existem vários tipos de DDS em indivíduos 46,XX. Assim como no tópico anterior, eles são classificados de acordo ao defeito primário. Dessa forma, existem os distúrbios do desenvolvimento ovariano, excesso de androgênios (anteriormente chamado de pseudohermafroditismo feminino) e outros DDS`s como atresia vaginal e anormalidades uterinas53. Entre os distúrbios do desenvolvimento ovariano podemos destacar o DDS ovotesticular e a disgenesia gonadal. O DDS ovotesticular foi chamado inicialmente de hermafroditismo verdadeiro e é um distúrbio muito raro caracterizado pela presença de tanto ovário quanto testículos normais e funcionais na infância. Entretanto, na idade adulta o tecido testicular regride, havendo presença de fibrose e ausência de espermatogênese. A genitália externa é ambígua e com diferentes graus de virilização. 1/3 dos pacientes com esse distúrbio apresentam anomalamente o gene SRY (que usualmente é restrito ao cromossomo Y). Muitas hipóteses são propostas na tentativa de explicar os casos negativos para SRY, a exemplo de mutações autossômicas ou presença de SRY precocemente com desaparecimento depois54. Na disgenesia ovariana, os pacientes apresentam fenótipo feminino, mas na idade puberal não exibem caracteres sexuais secundários e não iniciam a puberdade propriamente dita. Os níveis de gonadotrofinas são elevados e os ovários são vestigiais, não funcionantes. Essa condição é bastante heterogênea, com muitas causas: mutações do cromossomo X, mutações no receptor do FSH entre outras55. Várias condições podem ser responsáveis pelo excesso androgênico culminando com uma virilização indesejada. A hiperplasia adrenal congênita é um distúrbio da esteroidogênese imperfeita. A deficiência de aromatase é outro distúrbio que resulta em excesso androgênio e é rara. A aromatase é uma enzima que converte os hormônios androgênicos em estrógenos, principalmente estriol, estrona e estradiol. A aromatização dos andrógenos fetais é realizada principalmente pela placenta e sua ineficiência leva à exposição do feto do sexo feminino a elevado grau de andrógenos culminando com virilização. Causas maternas como medicamentos ou luteomas ativos secretores de andrógenos também podem levar à virilização fetal53. 24 III.6. DISFUNÇÕES DAS GLÂNDULAS ADRENAIS III.6.1. CONCEITOS As glândulas adrenais ou suprarrenais são divididas em duas porções: o córtex e a medula. O córtex é objeto privilegiado de estudo e da prática clínica, pois secreta hormônios essenciais para a vida. A medula adrenal sintetiza catecolaminas (epinefrina e norepinefrina) e essa função é vista como menos nobre das glândulas adrenais, e tida como menos importante56. O córtex adrenal é por sua vez dividido em três zonas: a zona glomerulosa, mais externa, a zona fasciculada (intermediária) que corresponde a mais de 70% do córtex e a zona reticular, mais interna. Todas as zonas do córtex adrenal produzem hormônios esteroides elaborados a partir do colesterol. A zona glomerulosa produz a aldosterona, hormônio responsável pelo aumento da reabsorção do sódio e estimulação da excreção de potássio pelos rins. A aldosterona é um mineralocorticoide, e é importante para a regulação do volume do líquido extracelular. A zona fasciculada é a principal responsável pela produção dos glicocorticoides, hormônios essenciais para a homeostasia corpórea. A zona reticular também produz glicocorticoides e os hormônios androgênios56. A produção dos glicocorticoides é realizada sob influência do eixo hipotalâmicohipofisário-adrenal (HHA). O hormônio liberador de corticotrofina (CRH), produzido e secretado pelo hipotálamo induz a liberação do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) pela hipófise anterior, que por sua vez estimula a secreção dos glicocorticoides pelo córtex adrenal. A arginina vasopressina (AVP) sintetizada no núcleo paraventricular do hipotálamo estimula a secreção do CRH e em menor escala do ACTH também. Tanto o CRH quanto o AVP são secretados num ritmo circadiano e pulsátil, em situações de não estresse. Ambos têm pico de secreção pela manhã gerando um pico de concentração do cortisol por volta de oito horas da manhã. O cortisol realiza papel regulador do eixo à medida que exerce feedback negativo sob o mesmo57. Os glicocorticoides representados pelo cortisol desempenham uma variedade de papéis no organismo. O cortisol é conhecido como hormônio do estresse e está aumentado em situações de estresse emocional e também físico, tais como atividade física intensa e doença. Suas funções mais conhecidas são anti-inflamatórias e hiperglicemiantes. Secundariamente, ele influencia os níveis pressóricos do indivíduo, a distribuição de gordura, entre outros57. A secreção dos mineralocorticoides não é influenciada pelo eixo HHA. A secreção de aldosterona é estimulada pela concentração de potássio e pela angiotensina II. A redução da pressão de perfusão glomerular, o aumento do tono simpático e a diminuição da carga filtrada de sódio no túbulo próximo renal estimulam a secreção de renina. A renina, por sua vez, promove clivagem do angiotensinogênio produzido pelo fígado em angiotensina I, a qual é transformada no pulmão em angiotensina II. Além desse sistema, a hipercalemia estimula a secreção de aldosterona enquanto a 25 hipocalemia leva à redução da resposta das células da zona glomerulosa à angiotensina II58. III.6.2. HIPERPLASIA ADRENAL CONGÊNITA A hiperplasia adrenal congênita (HAC) é um grupo de distúrbios da esteroidogênese adrenal. Como já foi citado em tópicos anteriores, tem como uma de suas consequências a virilização exacerbada em meninos e meninas, sendo por isso incluída entre os DDS. Sendo, entretanto, uma doença das adrenais, foi escolha discutila nesse tópico. A HAC consiste um erro inato de metabolismo dos esteroides adrenais, transmitido geneticamente e de caráter autossômico recessivo. O termo hiperplasia refere-se ao aspecto histológico do córtex suprarrenal, resultante da ação do ACTH que se encontra cronicamente elevado nesses casos, em vista da ausência do feedback negativo do cortisol58. Mais de 90% dos casos de HAC são devido à deficiência da enzima 21hidroxilase. Essa enzima exerce papel fundamental na síntese de mineralocorticoides e glicocorticoides. A depender da gravidade da mutação, têm-se graus variáveis de inabilidade de produção de glicocorticoides e dos mineralocorticoides, cuja síntese pode ou não estar diminuída. A interrupção da via esteroidogênica leva a acúmulo dos precursores esteroides. O acúmulo de progesterona e 17-hidroxiprogesterona (17-OHP), os principais precursores acumulados na deficiência da 21-hidroxilase, associado à elevação do ACTH estimulam a via de produção androgênica com consequente aumento na síntese de androstenediona e dehidroepiandrosterona que são perifericamente convertidos em testosterona59. O Fluxograma I ilustra a esteroidogênese. A HAC compreende três formas principais: a forma clássica perdedora de sal (FPS), a forma clássica virilizante simples (FVS) e a não clássica (FNC). O que diferencia as formas clássicas é o comprometimento da secreção de aldosterona, presente na FPS, mas não na FVS. Na forma perdedora de sal o defeito enzimático é completo ou quase completo e não ocorre produção de aldosterona. Já na virilizante simples, a deficiência enzimática é parcial e há produção de aldosterona diante da secreção reflexamente aumentada de renina pelo organismo. A forma não clássica não se apresenta na infância, diferentemente das outras duas formas que comumente são diagnosticadas na primeira infância, com manifestações clínicas logo ao nascimento; sendo diagnosticada somente na adolescência60. 26 Fluxograma I - Estereoidogênese Fonte: Dauber A, Kellogg M, Majzoub JA. Monitoring of therapy in congenital adrenal hyperplasia. Clin Chem. 2010 Aug;56(8):1245-51. O quadro clínico é resultado da deficiência de glicocorticoide e excesso de andrógenos em todos os casos, além de deficiência de mineralocorticoide na FPS. A carência de glicocorticoides tem inúmeras repercussões clínicas, mas o mais importante é que ela pode levar à chamada crise adrenal, com hipotensão e hipoglicemia no curso de uma doença ou estresse fisiológico (assim como o próprio nascimento). A falta de mineralocorticoides culmina com a perda de sais pelos rins o que pode gerar uma profunda desidratação. Já o excesso de andrógenos causa virilização no sexo feminino com hirsutismo, clitoromegalia, e em casos mais severos masculinização da genitália externa. No sexo masculino, a característica mais evidente do excesso androgênico é o aparecimento precoce de pelos, mas pode passar despercebido. Em ambos os sexos, o aumento da produção de andrógenos leva à aceleração do crescimento, assim como fechamento prematuro das epífises ósseas, com redução da altura final59. III.6.3. SÍNDROME DE CUSHING A Síndrome de Cushing (SC) não é comum em crianças e adolescentes. Ela é resultado de altos níveis circulantes de glicocorticoide, seja por síntese endógena ou administração exógena61. Em crianças e adolescentes, a SC pode ser classificada em dois grupos: com causa dependente de ACTH e com causa independente de ACTH. As dependentes de ACTH são a doença de Cushing (adenoma pituitário secretor de ACTH) e síndrome de secreção ectópica de ACTH. As independentes são por administração exógena de glicocorticoide, tumores adrenais ou hiperplasia adrenocortical primária. Muito comumente na criança, a hiperplasia adrenocortical primária está relacionada à 27 Síndrome de McCune-Albright que é uma desordem esporádica causada por mutações genéticas. Essa síndrome ocorre predominantemente no sexo feminino, e além da SC costuma apresentar outras desordens endócrinas associadas tais como hipertireoidismo ou puberdade precoce; e distúrbios não endócrinos como nefrocalcinose, anomalias cardíacas e hepatobiliares. Na Síndrome de McCune-Albright, a SC é usualmente severa e potencialmente letal, devendo ser tratada com adrenectomia bilateral62. As altas concentrações plasmáticas de glicocorticoide levam a um grande número de sinais típicos. Face em lua cheia, corcova de búfalo, estrias violáceas e hematomas na pele, retardo no crescimento, ganho de peso, hipertensão e alterações de comportamento como ansiedade e nervosismo são alguns dos sinais mais comumente apresentados63. III.6.4. INSUFICIÊNCIA ADRENAL Essa é uma condição caracterizada por produção ineficaz de hormônios glicocorticoides e mineralocorticoides. Se não diagnosticada e tratada a tempo é potencialmente fatal. A insuficiência adrenal pode ser classificada em primária ou secundária e em congênita ou adquirida. A insuficiência primária é causada por um distúrbio das próprias glândulas e ambas as produções de mineralocorticoides e glicocorticoides estão prejudicadas. Na forma secundária, há uma hipofunção das adrenais por diminuição da secreção de ACTH pelo hipotálamo ou de CRH pela hipófise. Neste caso a secreção de mineralocorticoides está preservada64. A insuficiência adrenal primária é também chamada de Doença de Addison e é uma patologia rara em adultos e ainda mais rara em crianças e adolescentes. Em adultos, a causa mais comum de doença de Addison em países desenvolvidos é autoimune, com formação de auto anticorpos anti- 21-hidroxilase, sendo infiltração da glândula pela tuberculose a segunda causa mais frequente no mundo65. Em crianças, a hiperplasia adrenal congênita é a principal causa de insuficiência adrenal primária, seguida pela etiologia autoimune 66. A forma secundária da insuficiência adrenal é muito mais comum. A principal causa é interrupção brusca de tratamento medicamentoso com glicocorticoides, ou inadequação da dose em intercorrência por doença ou estresse. Esse tipo de insuficiência das glândulas adrenais é cada vez mais comum devido ao largo uso desses medicamentos nos tempos atuais64. Os sintomas de ambos os tipos são semelhantes e normalmente apresentam-se distintamente em caso de insuficiência crônica ou aguda. Em casos de insuficiência adrenal aguda os sintomas típicos são: desidratação aguda, hipoglicemia, hipotensão e estado mental alterado. Apesar de a desidratação ser típica da insuficiência primária pela síntese prejudicada de mineralocorticoides, também pode ocorrer na forma secundária devido à retenção hídrica ocasionada pela ausência do cortisol para antagonizar o efeito da secreção de vasopressina. Na insuficiência crônica normalmente são apresentados: fadiga crônica, anorexia, náusea, vômitos, perda de apetite, perda de 28 peso e dor abdominal recorrente. Além desses, na insuficiência adrenal primária ocorre hiperpigmentação da pele devido à elevação do pro-opiomelanocortina e do hormônio estimulador de melanócitos, derivado da pro-opiomelanocortina 64. III.7. DIABETES MELLITUS TIPO 1 O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é uma das patologias mais sérias da infância e da adolescência. Um bom controle glicêmico realizado nesses pacientes está relacionado a menores níveis de complicações crônicas e melhor qualidade de vida67. Diabetes mellitus é uma síndrome metabólica caracterizada por deficiência absoluta ou relativa na produção e/ou ação da insulina nos tecidos. Caracteriza-se por hiperglicemia crônica68. A classificação do diabetes inclui quatro categorias clínicas: diabetes tipo 1, diabetes tipo 2, diabetes gestacional e outros tipos específicos de diabetes devidos a outras causas, como por exemplo defeitos genéticos na produção e ação da insulina, e induzida por drogas (tais como antirretrovirais). O DM1 é o tipo mais comum em crianças e resulta da destruição das células β-pancreáticas usualmente conduzindo a um estado de deficiência total de insulina. O tipo 2 é resultado de um defeito progressivo de secreção de insulina devido a aumento da resistência insulínica nos tecidos. O DM1 ainda pode ser dividido em tipo 1A, se a destruição das células pancreáticas for causada por processo autoimune, e tipo 1B, se a destruição for causada por outros processos de natureza idiopática69. O DM1 A (imune mediado) é a forma mais comum de DM1 e acredita-se que exista uma predisposição genética para desenvolvê-lo. Da predisposição genética para o desenvolvimento da doença seria necessária a existência de um evento precipitante, como um estresse emocional ou físico, uma doença infecciosa, por exemplo. Do início do desenvolvimento da doença sucedem-se fases de diminuição progressiva da secreção de insulina até o estágio final de falência pancreática completa70. Geralmente pessoas com DM1 apresentam-se com sintomas agudos logo após o surgimento da hiperglicemia. Sintomas comuns são perda de peso, poliúria, polidipsia e polifagia. Deficiência de crescimento e susceptibilidade a infecções podem estar presentes em estados de hiperglicemia crônica. Os níveis de glicose sanguínea também são marcadamente elevados. Os critérios diagnósticos são os mesmos para o tipo 2 da doença, que são: hemoglobina glicada superior à 6,5%, ou glicemia 2 horas após a administração oral de 75g de glicose superior a 200mg/dl, ou glicemia de jejum superior a 126 mg/dl ou na presença de sintomas clássicos, dosagem de glicemia em qualquer momento do dia superior à 200mg/dl. Esse último critério é o mais comumente utilizado no diagnóstico69. O tratamento do diabetes objetiva a manutenção de níveis glicose adequados proporcionando equilíbrio metabólico e bem estar ao paciente. Normalmente o tratamento medicamentoso é feito baseado em aplicações de insulina, mas também exige uma série de mudanças comportamentais. Essas mudanças incluem: auto 29 monitoramento da glicose sanguínea capilar três a quatro vezes por dia, mudanças nos hábitos alimentares, prática de atividades físicas planejadas e ajuste das doses de insulina de acordo com a ingestão alimentar e exercícios67. Níveis glicêmicos persistentemente elevados estão relacionados a complicações em longo prazo, como nefropatia, retinopatia e neuropatia. Essas complicações estão relacionadas ao comprometimento da micro e macrovasculatura presentes na doença71. A retinopatia diabética é uma importante causa de cegueira no mundo, e os pacientes diabéticos têm mais chances de desenvolver cegueira que aqueles que não apresentam o diabetes. As alterações oculares vistas na doença são encontradas no fundo do olho e são resultantes da microangiopatia. Esta é caracterizada, nos estágios iniciais, por microaneurismas e oclusões vasculares e nos estágios tardios por formação de cicatrizes vasculares. A retinopatia diabética inicia-se na forma não proliferativa e pode evoluir para a forma proliferativa. A prevalência da retinopatia aumenta com o tempo de duração da doença. Os pacientes com DM1 dificilmente apresentam manifestações oftálmicas nos primeiros anos da doença. A retinopatia manifesta-se principalmente na vida adulta e diante de um controle glicêmico inadequado72. Assim como a retinopatia, a nefropatia diabética é uma complicação tardia do DM1 e em estágios avançados conduz a doença renal crônica em estágio terminal. Além disso, é responsável por complicações cardiovasculares e mortalidade. Controle glicêmico pobre é o principal fator de risco, mas a suscetibilidade genética pode representar um importante fator no desenvolvimento dessa complicação. O marcador da nefropatia é o acúmulo de matriz extracelular nos rins, que se manifesta com expansão mesangial, glomeruloesclerose e fibrose tubulointersticial. Essas lesões morfológicas correlacionam-se com o declínio progressivo da função renal73. A neuropatia diabética exibe manifestações bastante variadas, com sintomas, padrões do envolvimento neurológico e alterações patológicas variáveis de paciente para paciente. O envolvimento nervoso pode ser generalizado, focal ou multifocal. A forma típica é crônica, simétrica, iniciando em extremidades e com prejuízo sensitivo e motor. Hiperglicemia crônica é tida como o principal fator de risco74. III.8. OBESIDADE A obesidade é uma doença crônica, multifatorial, com sobreposição de fatores genéticos e ambientais. A obesidade exógena é responsável por 95% a 98% dos casos, sendo o restante dos casos causado por síndromes genéticas que evoluem com obesidade (Prader-Willi, Bardet-Biedl), tumores como o craniofaringeoma ou distúrbios endócrinos tais como a síndrome de Cushing 75. Atualmente, a obesidade é um dos problemas mais graves de saúde pública. Ela foi considerada pela OMS uma epidemia global em razão do crescimento acentuado de sua prevalência nas últimas décadas, tanto em países desenvolvidos, quanto nos países em desenvolvimento, onde a obesidade convive com a desnutrição76. 30 O conceito de obesidade é o acúmulo excessivo de tecido adiposo que leva a um aumento no risco presente e futuro de apresentar patologias associadas assim como de mortalidade. A quantificação da quantidade de gordura em crianças e adolescentes, necessária para a definição de obesidade pode ser feita de maneira direta por técnicas de bioimpedanciometria, densitometria de absorção de raios-X de dupla energia (DEXA) ou hidrodensitometria. Esses métodos são pouco acessíveis e de alto custo financeiro e por essa razão a porcentagem de gordura corpórea é estimada pelo cálculo do índice de massa corpórea (IMC), embora o mesmo não tenha sido planejado em um primeiro instante para a faixa etária pediátrica77. Diferentemente do paciente adulto, não existe um ponto de corte padrão para sobrepeso e obesidade, sendo comum encontrar valores diferentes em variadas referências78,79. Segundo a OMS, na faixa etária de 0 a 5 anos, considera-se sobrepeso um IMC superior ao p97 e inferior ao p99, 9 de IMC para idade e sexo; e obesidade os valores de IMC acima do p99,9. Já para as crianças de 5 a 10 anos incompletos, e também para os adolescentes, um IMC entre o p85 e o p97 já é considerado sobrepeso, e obesidade acima de p97, sendo acima do p99,9 classificado como obesidade grave. Além do IMC, outros índices antropométricos são utilizados para classificar obesidade, como por exemplo, o índice peso/estatura80. Os efeitos deletérios da obesidade são muito conhecidos e ocorrem mais frequentemente na vida adulta. A hiperinsulinemia é uma alteração metabólica bastante encontrada na obesidade. Comumente é encontrada uma hiperinsulinemia basal e póssobrecarga de glicose com glicemia normal ou elevada nos pacientes obesos, o que significa resistência insulínica. A resistência insulínica está associada ao desenvolvimento de diabetes mellitus do tipo 2 (DM2). A obesidade também está relacionada a dislipidemias com aumento do LDL e colesterol total e diminuição do HDL. Essa alteração da composição dos lipídios corporais está associada a eventos aterogênicos em doenças cardiovasculares. Outra associação conhecida é entre a obesidade e hipertensão arterial, sendo que em crianças, a maior parte dos casos de hipertensão arterial é secundária à obesidade; mas pouco se sabe sobre os mecanismos que promovem essa associação. Complicações ortopédicas devido ao excesso de peso nas articulações, alterações da função pulmonar e renal, e dermatológicas são outras das inúmeras complicações atribuídas ao excesso de gordura corporal 75. 31 IV. METODOLOGIA Este foi um estudo transversal, descritivo e quantitativo. Foram incluídos todos os pacientes com idade inferior ou igual a 18 anos, atendidos em um Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Serviço de Endocrinologia Geral do Magalhães Neto, pertencente ao Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgar Santos (C-HUPES) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), no período de janeiro de 2009 a dezembro de 2012 para preenchimento de protocolo digitalizado (ANEXO 1: Tabela utilizada para preenchimento dos dados coletados). Foram revisados os prontuários e avaliados os seguintes parâmetros: registro HUPES, gênero, data de nascimento, procedência, naturalidade, raça, idade na primeira consulta, diagnóstico sindrômico e etiológico e data da última consulta. Foram excluídos os pacientes adultos, que ainda são acompanhados neste ambulatório, já que o mesmo pertence ao serviço de Endocrinologia de adultos. Não foram avaliados prontuários de pacientes atendidos no ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Centro Pediátrico Professor Hosannah de Oliveira (CPPHO) também pertencente ao CHUPES e em nenhuma outra instituição do estado da Bahia. Os dados foram coletados durante todo o ano de 2012, de forma retrospectiva quanto aos pacientes atendidos nos anos de 2009 a 2011 e prospectivamente quanto aos pacientes do ano de 2012. Os dados obtidos foram analisados pelo IBM SPSS Statistics, em sua 21ª versão para determinar os diagnósticos mais prevalentes e o perfil dos pacientes atendidos no ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do HUPES – UFBA. A análise dos dados foi realizada a partir de variáveis qualitativas (sexo, procedência, naturalidade, diagnósticos sindrômicos e etiológicos) e quantitativas (data de nascimento e idade, idade na primeira consulta, idade na última consulta), utilizando medida de tendência central (média) e medida de dispersão (desvio padrão). O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia (ANEXO 2: Parecer do Comitê de Ética e Pesquisa). 32 V. RESULTADOS Foi atendido no ambulatório, no período de 2009 a 2012, um total de 387 pacientes. Desses, 56,8% foram do sexo feminino e 43,2% do sexo masculino. A Tabela 1 resume as características gerais dos pacientes atendidos no ambulatório. Tabela 1 - Características gerais dos pacientes atendidos no ambulatório Gênero Raça Características Feminino Masculino Total Parda Negra Branca Outras Sem resposta Total Idade na 1ª consulta Procedência Naturalidade Média (desvio padrão) Salvador Lauro de Freitas Camaçari Simões Filho Outros Sem resposta Total Salvador Lauro de Freitas Camaçari Santo Amaro Valença St Antonio de Jesus Feira de Santana Outros Sem resposta Total Resultados 220 (56,8%) 167 (43,2%) 387 (100%) 120 (31%) 91 (23,5%) 34 (8,8%) 47 (12.1%) 95 (24,5%) 387 (100%) 8,45 (4,16) 226 (58,4%) 11 (2,8%) 8 (2,1%) 6 (1,5%) 121 (31,2%) 15 (3,87%) 387 (100%) 227 (58,6%) 11 (2,8%) 6 (1,5%) 6 (1,5%) 6 (1,5%) 6 (1,5%) 5 (1,3%) 94 (24,3%) 26 (6,7%) 387 (100%) Quanto à raça, utilizamos como parâmetro o que estivesse escrito no próprio prontuário. Em caso de mais de uma raça descrita, em pontos distintos do prontuário, prevaleceu à observada em maior número de vezes, ou em caso de empate, a que estivesse presente na consulta mais atualizada. Dessa forma, de acordo ao descrito nos prontuários, a maioria dos pacientes são pardos (31%), seguidos pelos negros que perfazem 23,5% e os brancos 8,8%. Outros termos referentes à raça também foram encontrados nos prontuários: mulato, mulato claro, mulato médio e mulato escuro. 33 Essas denominações, entretanto obtiveram menores frequências (totalizando 12,1%). Em 24,5% dos prontuários não foi possível identificar uma raça, ou por ausência de resposta (maioria dos casos) ou ilegibilidade. Em relação à procedência, foram encontrados 92 municípios, todos do estado da Bahia. O município de procedência de maior frequência foi Salvador que responde pela procedência de 226 pacientes (58,4%). Em segundo lugar o município de Lauro de Freitas (2,8%), seguido por Camaçari e Simões Filho, com 2,1% e 1,5% respectivamente. Já em questão à naturalidade, foram encontrados 77 municípios, havendo 8 municípios de outros estados (Sergipe, Pará, Maranhão, Alagoas e São Paulo). São Paulo é o estado, excluindo-se a Bahia, que responde pela maior naturalidade dos pacientes, com um total de 5 pacientes. Entre os municípios do estado, Salvador registra maior naturalidade (58,6%), seguida de Lauro de Freitas (2,8%), Camaçari, Santo Amaro, Valença, Santo Antônio de Jesus (todos com 1,5%) e Feira de Santana (1,3%). A Tabela 2 indica a procedência e naturalidade dos pacientes, destacando o município de Salvador. Tabela 2 - Procedência e naturalidade Características Salvador Interior da Bahia Procedência Sem resposta Total Salvador Outros estados Naturalidade Interior da Bahia Sem resposta Total Resultados 226 (58,4%) 146 (37,7%) 15 (3,9%) 387 (100%) 227 (58,6%) 10 (2,6%) 127 (32,8%) 23 (5,9%) 387 (100%) Em relação à idade na primeira consulta, registrou-se uma média de 8,4 anos, com desvio padrão de 4,16. Já na última consulta, a média de idade foi 11,22 com desvio padrão de 4,72 anos. Quanto à faixa etária a maioria dos pacientes tinha na última consulta entre 10 e 14 anos contabilizando 30,23% dos pacientes. Dos restantes 4,9% tinham menos de um ano, 6,45% entre 1 e 4 anos, 28,94% entre 4 e 10 anos e 29,45% entre 14 e 18 anos. A Tabela 3 exibe a composição etária da amostra. 34 Tabela 3 - Distribuição dos pacientes por faixa etária Idade na última consulta Menores de 1 ano Entre 1 e 4 anos Entre 4 e 10 anos Entre 10 e 14 anos Entre 14 e 18 anos Total % da amostra 19 (4,9%) 25 (6,45%) 112 (28,94%) 117 (30,23%) 114 (29,45) 387 (100%) Os diagnósticos mais prevalentes na amostra foram baixa estatura e obesidade (a Tabela 4 indica os principais grupos de diagnósticos encontrados). No total, 117 pacientes receberam o diagnóstico de baixa estatura, perfazendo 30,2% dos pacientes. Entre esses, 60,7% não tiveram etiologia atribuída, enquanto 11,1% foram considerados quadros de baixa estatura constitucional, 6,8% por deficiência de GH, 4,3% por Síndrome de Turner, 4,3% por raquitismo hipofosfatêmico e o restante por outras causas. A idade na primeira consulta variou de 8 meses a 17 anos entre os pacientes de baixa estatura, com média de 9,1 anos e desvio padrão de 4 anos. Em relação à idade na última consulta, a maioria dos pacientes encontra-se na faixa etária entre 14 e 18 anos. A distribuição por gênero foi 52 (44,5%) do sexo feminino e o masculino 65 (55,5%). O diagnóstico de obesidade por sua vez, foi dado a 98 pacientes, totalizando 25,3% da amostra. A idade na primeira consulta dos pacientes obesos variou de 3 meses a 16 anos, com média de 8,7 anos e desvio padrão de 3,9. Em relação à idade na última consulta, a maioria dos pacientes com obesidade encontra-se na faixa etária entre 10 e 14 anos. A distribuição por gênero foi de 53 (54,1%) do sexo feminino e 45 (45,9%) masculino. Proporcionalmente, o diagnóstico de sobrepeso não foi tão frequente, tendo sido dado a 23 pacientes, contabilizando 6% da amostra. 35 Tabela 4 - Diagnósticos mais frequentes Diagnóstico Baixa Estatura Obesidade Distúrbios do Desenvolvimento Puberal Dislipidemia Tireoidopatias N % amostra 117 30,2% 98 25,3% 86 22,2% 51 13,1% 50 12,9% Dislipidemia também foi um diagnóstico bastante frequente na amostra. Cinquenta e um pacientes, representando 13,1% da amostra, exibiam alguma anormalidade nos níveis séricos de lipídios. A maioria não tinha etiologia definida nos prontuários, apenas 3 pacientes tiveram causa relacionada a uso de antirretrovirais, e 2 causa familiar. Se analisados em grupo, os distúrbios do desenvolvimento puberal foram mais frequentes que dislipidemias. Um total de 22,2% da amostra, o que equivale a 86 pacientes apresentavam algum distúrbio puberal, dentre eles, os mais comuns foram: puberdade precoce (8% da amostra) e pubarca precoce isolada (também 8% da amostra). Entre as tireoidopatias, o hipotireoidismo obteve maior expressividade que o hipertireoidismo. Em ambas as patologias, a forma clínica foi mais frequente que a variante subclínica. Em relação ao hipertireoidismo, a etiologia mais frequente foi por Doença de Graves (5 pacientes). Quanto ao hipotireoidismo, a maioria dos casos foi por tireoidite de Hashimoto (7 pacientes). A Tabela 5 exibe os diagnósticos sindrômicos com os principais diagnósticos etiológicos encontrados. Tabela 5 - Diagnósticos sindrômicos e etiológicos mais frequentes Diagnósticos e etiologias mais frequentes Em investigação Constitucional Deficiência de GH Baixa Estatura Síndrome de Turner Raquitismo hipofosfatêmico Outros Total Puberdade precoce Pubarca precoce isolada Distúrbios do Telarca precoce Desenvolvimento Atraso do desenvolvimento puberal Puberal Outros Total Uso de antirretrovirais Dislipidemias Familiar N (%) 71 (60,7%) 13 (11,1%) 8 (6,8%) 5 (4,3%) 5 (4,3%) 15 (12,8%) 117 (100%) 31 (36%) 31 (36%) 11 (12,8%) 8 (9,3%) 5 (5,8%) 86 (100%) 3 (5,9%) 2 (3,9%) 36 Diagnósticos e etiologias mais frequentes Glomerulonefrite pós-estreptocócia Glicogenose tipo 1 Sem etiologia definida Total Hipotireoidismo subclínico Hipotireoidismo: Tireoidite de Hashimoto Pós-iodoterapia Ingesta de iodo pela amamentação Congênito Tireoidopatias Sem etiologia definida Hipertireoidismo subclínico Hipertireoidismo Outras alterações da função tireoidiana Total N (%) 1 (2%) 1 (2%) 44 (86,3%) 51 (100%) 8 (16%) 7 (14%) 3 (6%) 2 (4%) 2 (4%) 11 (22%) 25 (50%) 2 (4%) 7 (14%) 8 (16%) 50 (100%) 37 VI. DISCUSSÃO Esse trabalho encontrou como principal dificuldade a falta de qualidade nos registros dos dados em prontuários. Dados como raça, naturalidade e procedência não foram localizados em um número considerável de prontuários, como pôde ser visto na Tabela 1. Quanto à raça, há uma dificuldade ainda maior de padronização, pois esse registro não segue nenhum sistema de classificação existente, sendo realizado de forma praticamente aleatória e inconsistente. Quanto aos diagnósticos encontrados, também existe falta de padronização, havendo registro de patologias utilizando-se termos diferentes em prontuários diferentes. Importante ressaltar que o ambulatório de Endocrinologia no qual realizou-se esse trabalho é um ambulatório de Endocrinologia voltado a pacientes adultos, e não pediátricos, e que realiza atendimentos pediátricos em um de seus turnos, com médicos e residentes de Endocrinologia Geral. Esse fato pode interferir nos resultados, considerando-se a existência de outros ambulatórios de Endocrinologia Pediátrica no CHUPES conduzidos por médicos pediatras. De fato, pode haver um viés de encaminhamento dos pacientes para um ou outro ambulatório. Os distúrbios do crescimento estão entre as patologias mais estudadas na Endocrinologia Pediátrica, devido a sua alta prevalência. Dentre eles, a baixa estatura, sem dúvidas constitui-se a mais comum. Assim, não foi grande surpresa, detectar que no nosso serviço a baixa estatura é o diagnóstico mais prevalente, em consonância com dados da literatura que apontam a baixa estatura como queixa mais frequente nos ambulatórios de Endocrinologia Pediátrica6. Nosso resultado também se assemelha ao perfil do Ambulatório de Endocrinologia Pediátrica do Hospital Presbiteriano em Nova York, onde, no ano de 1999, o diagnóstico de baixa estatura foi o mais prevalente em sua população2. Embora a maioria dos diagnósticos de baixa estatura não tenha sido atribuída a uma etiologia específica, muitos estando ainda em investigação, os casos de baixa estatura constitucional foram em maior número que as demais causas de baixa estatura. Isso está de acordo com dados previamente descritos, assim como o resultado de Poiati e Botelho5, referente a características antropométricas e diagnósticas dos pacientes com queixa de baixa estatura em um hospital universitário de São José do Rio Preto; no qual, a maioria dos pacientes (45%) apresentava variantes normais do crescimento (a baixa estatura constitucional está entre elas). Um consenso europeu sobre baixa estatura idiopática (ou variantes normais da baixa estatura) publicado em 2008, afirma que essas variantes da baixa estatura são responsáveis por aproximadamente 60-80% de todos os casos da patologia81. Um novo estudo que analise a altura média dos pacientes com baixa estatura no ambulatório, relacionando-a com a altura alvo do paciente poderia detalhar se os pacientes do nosso serviço, assim como relatado em diversos estudos, apresentam altura observada muito próxima da altura alvo, havendo por vezes, superestimação da altura final por pais e pacientes5, 81. 38 Em relação a faixa etária, a média de idade com que os pacientes com queixa de baixa estatura procurou o serviço foi de 9,1. Essa idade coincide com as proximidades da puberdade, o que pode explicar a maior preocupação da própria criança com a altura, e também dos pais ao comparar os filhos com outras crianças que já vivenciam o estirão pubertário. Houve uma predominância do sexo feminino em relação ao masculino. Apesar de discreta, essa predominância se opõe ao registrado na literatura, na qual a queixa de baixa estatura era mais frequente no sexo masculino. Entretanto, alguns estudiosos já apontaram essa tendência na homogeneização da frequência de baixa estatura entre os sexos, justificando que a preocupação dos atuais pais em relação a baixa estatura independe do sexo, e que as garotas preocupam-se cada vez mais com altura, na tentativa de atingir um padrão midiático de beleza da mulher alta e magra5,82. Nossa semelhança, quanto à frequência dos diagnósticos, em relação ao perfil do Hospital Presbiteriano em Nova York, restringe-se ao diagnóstico de baixa estatura. Em contraposição ao nosso serviço, onde obesidade, dislipidemia, distúrbios do desenvolvimento puberal e tireoidopatias são em ordem decrescente de frequência, os mais comumente diagnosticados (excetuando-se baixa estatura); no serviço estadunidense as tireoidopatias perfazem em conjunto, o segundo diagnóstico sindrômico mais comum, seguidas pelos distúrbios da diferenciação e desenvolvimento sexual, patologias das adrenais, e só em 5º lugar em frequência, a obesidade. Diferentemente do estudo citado no parágrafo anterior, em nosso serviço, a obesidade obteve alta prevalência, sendo de fato, o segundo diagnóstico em prevalência. A obesidade infantil é uma patologia que vem despertando crescente interesse nos estudiosos de todo mundo. A Pesquisa sobre Orçamentos Familiares (POF) - 2008-2009 - realizada em parceria do IBGE com o Ministério da Saúde, analisando dados de 188 mil brasileiros - mostrou que a obesidade e o sobrepeso têm aumentado rapidamente nos últimos anos, em todos os grupos etários. Comparando-se os dados de 1974-1975 com os de 2008-2009, na faixa etária entre 10 a 19 anos, o excesso de peso aumentou de 3,7% para 21,7% nos meninos e de 7,6% para 19% nas meninas, oscilando entre 16% e 18% no Norte e no Nordeste e entre 20 e 27% no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste. Foram considerados obesos 6% dos meninos e 4% das meninas83. As causas para explicar esse aumento da obesidade no mundo estão ligadas aos hábitos de vida e estilos alimentares, cada vez mais relacionados ao sedentarismo e alimentos industrializados com alto teor calórico, à custa de gordura saturada e colesterol75. A faixa etária associada a maior índice de obesidade foi entre 10 e 14 anos. Dados da literatura apontam a maior frequência da obesidade no primeiro ano de vida, entre 5 e 6 anos e na adolescência84,85. Não se sabe ao certo a razão dessa distribuição etária. Quanto ao sexo, houve prevalência discretamente maior da obesidade no sexo feminino. Esse dado mais provavelmente indica que a obesidade é uma patologia de incidência crescente em ambos os sexos e todas as faixas etárias. O diagnóstico de sobrepeso foi consideravelmente menor que o de obesidade. Esse dado não reflete estatísticas nacionais nas quais o sobrepeso é maior em nossa 39 população do que a obesidade81. Talvez reflita a especialização do ambulatório, pois provavelmente, casos de sobrepeso ou obesidades mais leves e de mais fácil manejo sejam tratadas e acompanhadas pelo pediatra geral. Outra análise possível seria considerar obesidade e sobrepeso em conjunto. Nesse caso, poderíamos afirmar que 31,2% dos pacientes atendidos no ambulatório exibem excesso de peso. Esse número é de grande magnitude, pois ultrapassa a porcentagem dos pacientes com baixa estatura. Isso significa que o aumento do peso corpóreo é a principal causa de consultas no ambulatório. No nosso estudo, entre os pacientes com baixa estatura e aqueles com obesidade, apenas 3 apresentam os dois diagnósticos. Isso significa que 54,8% dos pacientes atendidos no ambulatório apresentam um destes diagnósticos. A outra metade dos pacientes distribui-se por todas as outras endocrinopatias detectadas. Entre as tireoidopatias, a distribuição dos diagnósticos foi condizente com a literatura, havendo predomínio de hipotireoidismo em relação ao hipertireoidismo. Além disso, o diagnóstico etiológico também foi condizente, com a tireoidite de Hashimoto sendo identificada como a principal causa de hipotireoidismo e a doença de Graves como a principal causa de hipertireoidismo20,21,23. Os outros diagnósticos encontrados em nossa população não serão discutidos. Existe uma série de correlações que poderiam ser feitas entre características da amostra e alguns diagnósticos, mas essas não serão feitas, pois fogem ao nosso propósito. Futuros trabalhos poderão ser realizados para elucidar possíveis questões sobre peculiaridades outras de nossa população de estudo. 40 VII. CONCLUSÕES 1- A população atendida no ambulatório é predominantemente composta por escolares e ainda em maior grau por adolescentes. Pré-escolares e lactentes não representaram parcela significativa dos pacientes. 2- A denominação racial parda foi a mais utilizada para descrever a raça dos nossos pacientes, seguida por negro e branco. 3- Mais de metade dos pacientes atendidos são provenientes e naturais de Salvador. A outra parcela se distribui em inúmeros municípios, com pequena representatividade, em geral do interior do estado e do recôncavo baiano. 4- O diagnóstico de baixa estatura é o diagnóstico mais frequente entre os pacientes atendidos no ambulatório. A maioria ainda está em investigação, ou não foi associada à etiologia específica. 5- Obesidade é o segundo diagnóstico mais frequente. 41 VIII. SUMMARY CLINICAL-EPIDEMIOLOGICAL PROFILE OF AN OUTPATIENT CLINIC OF PEDIATRIC ENDOCRINOLOGY – MAGALHÃES NETTO - HUPES - UFBA FROM 2009 TO 2012 Background: According to the profile of the outpatient clinic of Pediatric Endocrinology at Presbyterian Hospital in New York, the most prevalent endocrine disorders among pediatric patients are: growth abnormalities, thyroid disorders, and developmental disorders of sexual differentiation and dysfunction of the adrenal glands. Clinical outpatient of Pediatric Endocrinology profile in the state of Bahia is not known. Objective: To determine the clinical-epidemiological profile of the pediatric endocrinology clinic of Magalhães Neto, HUPES - UFBA in Salvador, Bahia. Method: We included patients that were less than or equal to 18 years old from the outpatient clinic of Pediatric Endocrinology of the Endocrinology Service – HUPES-UFBA between January 2009 and December 2012. The characteristics evaluated were: gender, date of birth, origin, nationality, race, age at first visit, syndromic and etiologic diagnosis and date of the last visit. We excluded patients older than 18 years. Data was analyzed by SPSS. Results: We included 387 patients (56.8% female and 43.2% male). The majority of patients were identified as mulatto. Regarding origin, we found 92 cities, as city of birth, were found 77 cities. Salvador was the most frequent city of origin and birth. The average age at first visit was 8.4 years old. And at last visit, most patients were between 10 and 14 years (30.23% of patients). The most prevalent diagnosis was of short stature in 117 patients (30.2% of the sample). The second most common diagnosis is obesity in 94 patients (24.3% of the sample). Discussion: the diagnosis of short stature was the most prevalent, as previously shown. Regarding etiology, the constitutional form is the most common. Obesity also obtained high prevalence. This finding is consistent with worldwide data. Conclusion: The diagnosis of short stature is the most frequent among our patients. About this diagnosis, most patients are still under investigation, and was not associated with specific etiology. Obesity is the second most frequent diagnosis. Key-words: endocrinology, pediatrics, health profile. 42 IX. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 Silva LR. Diagnóstico em Pediatria. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. New MI et al. Profile of the Pediatric Endocrine Clinic at New York – Presbiterian Hospital, New York Weill Cornell Center. J Clin Endocrinol Metab. 1999 Dec; 84 (12): 4444. Zeferino AMB, Barros Filho AA, Bettiol H, Barbieri MA. Acompanhamento do crescimento. J Pediatr (Rio de J.) 2003;79(supl 1):S23-S32. Brooks CGD, Clayton P, Brown R. Clinical Pediatric Endocrinology 2005, 5: 101. Blackwell Publishing Ltd. Poiati Junior, P; Botelho Filho, W. 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