PRINCIPIOLOGIA JURÍDICA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS Renata Corrêa Severo1 Eliane Pereira da Silva2 Resumo: Este estudo aborda a principiologia especifica aplicável aos Serviços Públicos de maneira geral. Para atingir o objetivo proposto, o estudo trata primeiramente da conceituação de Serviço Público, das hipóteses de concessão e permissão, para, a partir destes parâmetros examinar a principiologia jurídica aplicável aos Serviços Públicos. Palavras-chave: Direito. Direito Administrativo Brasileiro. Serviços Públicos. Principiologia. INTRODUÇÃO O presente estudo trata da principiologia aplicada à prestação do chamado serviço público, muitas vezes gratuito ou subsidiado. Os princípios que regulamentam essa relação são extremamente importantes, pois indicam os caminhos através dos quais o Estado se utiliza para disponibilizar os serviços públicos à todos, sem marginalizar os usuários dos serviços, que podem ser onerados excessivamente se não houver tal controle. Num país de desigualdade social como o Brasil, são freqüentes as dificuldades de grande parcela da população para usufruírem certos serviços públicos por conta da excessiva onerosidade, ainda mais quando o serviço é prestado por particular. Este visa o lucro, mas no caso do serviço público, deverá haver limitações no preço a fim de atender os princípios do Direito Administrativo. 1 Advogada, formada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, São Leopoldo/RS, especialista em Direito da Administração Pública pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU, Uberlândia/MG, Professora de Direito Administrativo da Universidade Professor Antônio Carlos – UNIPAC/Araguari/MG 2 Aluna do 10º período do Curso de Direito do Centro Universitário do Triângulo - UNITRI - Uberlândia – MG 1 O estudo abordará a importância dos princípios aplicáveis ao serviço público, na atuação como fiscalizador/normatizador, das atividades do Estado, discriminando os casos concretos das atividades de serviço público através de se seus agentes. Para este fim, passaremos à conceituação de serviço público e suas peculiaridades, concessão e permissão, e a seguir o rol de princípios aplicáveis ao caso sob exame. 1. Conceituação de Serviço Público A fim de que se compreenda os princípios que regulamentam a prestação do serviço público, necessária se faz a visualização do conceito de serviço público, sendo este, peça chave para o prosseguimento deste raciocínio. Em assim sendo, serviço público para Mário Masagão.(1968:p.252) “é toda atividade que o Estado exerce para cumprir os seus fins.” O serviço público é quando o Estado intervém nas atividades econômicas, exerce o poder de polícia, presta serviço público e fomenta atividades de interesse público não privativo. Para Maria Sylvia Zanella di Pietro (2004:p95), serviço público consiste em: “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob o regime jurídico total ou parcialmente público.” Celso Antônio Bandeira de Mello (2004:p.619) ilustra bem a distinção: 2 “enquanto o serviço público visa ofertar ao administrado uma utilidade, ampliando, assim, o seu desfrute de comodidades, mediante prestações feitas em prol de cada qual, o poder de polícia, inversamente (conquanto para proteção do interesse de todos), visa a restringir, limitar, condicionar, as possibilidades de sua atuação livre.” No entanto, o conceito de serviço público parte do principio de que o poder de polícia de serviço público envolve a restrição e o condicionamento das atividades privadas aos interesses coletivos, serviço público geralmente compreende atividade estatal de caráter prestacional, na qual o Estado supre diretamente necessidades coletivas. Enquanto no serviço público o Estado proporciona utilidade e por isso ele tem caráter positivo ou prestacional, no poder de polícia o Estado geralmente atua de forma negativa, de modo a fiscalizar determinadas atividades que comprometam interesse coletivo. Por isso o serviço público, tem o controle permanente sobre a gestão do serviço, por se tratar de atividade titularizada pelo Poder Público, nos termos do artigo 175 da Constituição Federal: “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviço público”. Ao Estado incumbe a titularidade dos serviços públicos, mas o exercício tem que ser direto, por meio de seus agentes, ou indireto, sob o regime de concessão ou permissão no qual há a delegação do serviço público cuja titularidade é estatal, a pessoa privada que detém a licitação. É necessário observar os critérios que identificam a definição de Serviço Público, quais sejam: 3 - critério subjetivo ou orgânico, segundo o qual serviço público seria o prestado pelo Estado ou por órgão público; - critério material: a partir do qual se compreende que o serviço público é atividade que tem por finalidade a satisfação de necessidades coletivas; - critério formal: de acordo com o qual o serviço público seria o exercido em regime jurídico de direito público, com disposições exorbitantes. Assim, o que se observa a partir das definições e conceitos de serviço público é que a Administração Pública tem que satisfazer as necessidades coletivas, supridas por meio da prestação de serviços públicos direta ou indiretamente. 2. Concessão e Permissão de Serviço Público Este estudo tem como finalidade apresentar conceitos sobre a concessão e permissão de serviços públicos, suas particularidades, características, e algumas questões polêmicas sobre o assunto para melhor ilustrar a questão dos princípios jurídicos aplicáveis ao serviço público. A concessão e permissão do serviço público encontra-se amparada no artigo 175 da Constituição Federal. A concessão da delegação de prestação de serviço público é feita pelo poder concedente, mediante licitação de concorrência à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que tenha capacidade para o desempenho da atividade – com eficiência, por sua conta e risco. O Estado direciona pessoas para trabalhar nas Agências Executivas para administrar as empresas privadas, com autonomia, desenvolvendo as atividades de serviço público. Maria Sylvia Zanella di Pietro (2004,p.75), afirma “... que o conceito da lei não contém todos os elementos necessários para caracterizar adequadamente a concessão, pois o dispositivo não se refere à concessão como contrato e não indica a 4 forma de remuneração que lhe é característica, a saber, a tarefa pelo usuário ou outra fonte de receita ligada à exploração do serviço.” Ocorre que, as permissões e concessões são atribuições reguladas pelas Agências Reguladoras, com permissão e autorização para prestação do serviço público através de contratos ou atos de delegação. Há critérios que devem ser obedecidos pelo concedente, tais como os procedimentos licitatórios para a escolha do concessionário, permissionário ou autorizado, celebrar o contrato de concessão ou permissão, praticar ato unilateral de outorga da autorização; definir o valor das tarifas e da sua revisão de reajuste; controlar a execução de serviços; aplicar sanções; encampar; decretar a caducidade; intervir; fazer a rescisão amigável; promover a reversão de bens ao término da concessão e exercer o papel de ouvidor de denúncias e reclamações dos usuários, atendendo todas as prerrogativas que a lei outorga ao Poder Público na concessão, permissão e autorização. Contudo, a lei, ao criar a Agência Reguladora, acaba por tirar do Poder Executivo todas essas atribuições para dispor em favor da Agência, podendo as mesmas exercerem o poder de policia, fiscalizando o cumprimento das normas e aplicando sanções administrativas. Para ilustrar melhor a concessão e permissão dos serviços públicos cita-se o caso das delegações no âmbito dos transportes coletivos, usualmente, denominados pela Administração Pública como permissões/concessões, pois são assegurados prazos mínimos e impostos/deveres ao delegatário, cuja execução pressupõe investimentos que somente se amortizarão, se a exploração do serviço permanecer durante o período de vigência originalmente previsto no contrato. Sendo assim, o serviço público deve ter suas funções separadas de forma a otimizar sua prestação, a fim de proporcionar sua capacidade de auto administração, o que lhe confere o direito de exercer, com independência, o serviço, que foi 5 outorgado por lei, podendo opor esse direito à pessoa política que as instituiu, no entanto, o dever de desempenhar esse serviço, os coloca sob a fiscalização do Poder Público. O Poder Público precisa assegurar-se de que a atividade que era sua e foi transferida a outra pessoa jurídica, e a prestação deste serviço tem que ser executada de forma adequada e eficiente. 3. Principiologia aplicável aos Serviços Públicos Os princípios que regem os serviços públicos, são como engrenagens que tem como objetivo fazer o sistema funcionar mais próximo da perfeita harmonia, se complementam para atingir um fim, ou seja, a prestação do serviço com eficácia máxima. Partindo desta afirmação, passamos a identificar e tratar cada um deles a seguir. 3.1. Princípio da obrigatoriedade na prestação do serviço eficiência A obrigatoriedade do Estado em prestar um serviço com eficiência é um encargo inescusável que deve ser prestado pelo Poder Público de forma direta ou indireta. A Administração Pública responderá pelo dano causado em decorrência de sua omissão. Através deste princípio, o constituinte derivado trouxe as novidades da avaliação periódica de desempenho para o servidor estável (Art. 41, § 1º, III CRFB/1988); da aplicação de recursos orçamentários provenientes da economia com despesas correntes na qualificação, reciclagem e treinamento de pessoal (Art. 39, § 7º CRFB/1988); a co-participação do usuário no controle da máquina pública por meio do direito de representação contra ilegalidade, omissão ou abuso de poder (Art. 37, 3º CRFB/1988); escolas de formação e aperfeiçoamento de pessoal, nos termos do Art. 39, § 2º, CRFB/1988 entre outras medidas inovadoras. Todas elas de 6 cunho essencialmente administrativo, mas visando a efetivação do cumprimento do dever jurídico de eficiência. Di Pietro (2009:p. 334) assim leciona: “ o princípio apresenta dois aspectos, podendo tanto ser considerado em relação à forma de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, para lograr os resultados melhores, como também em relação ao modo racional de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, idem quanto ao intuito de alcance de resultados na prestação do serviço público.” Ela acrescenta que a eficiência é princípio que se soma aos demais princípios impostos à Administração, “não podendo sobrepor-se a nenhum deles, especialmente ao da legalidade, sob pena de sérios riscos à segurança jurídica e ao próprio Estado de Direito”. De fato, almeja-se que os serviços públicos sejam realizados com adequação às necessidades da sociedade que contribui, de forma efetiva e incondicional, para a arrecadação das receitas públicas. Entretanto, tem sido discutida a qualidade das obras e serviços executados pelo Poder Público. A eficiência, pelo senso comum, deveria ser sempre fator determinante para atuação da máquina administrativa, mas a prática tem revelado inquinada dissonância. Eficiência aproxima-se da ideia de economicidade. Visa-se a atingir os objetivos, traduzidos por boa prestação de serviços, do modo mais simples, mais rápido, e mais econômico, elevando a relação custo/benefício do trabalho público. 7 Contudo o Administrador deve sempre procurar a solução que melhor atenda ao interesse público do qual é curador. Mesmo sem estar explícito anteriormente, o princípio da eficiência estava presente na ordem político-jurídica, por ser conseqüência lógica do Estado de Direito organizado. Alexandre de Moraes (2002: p. 109), em obra citada no item seguinte, define o princípio da eficiência como “aquele que impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia, e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e garantir-se uma maior rentabilidade social." Com proficiência, acrescenta que urge a interligação deste princípio com princípios da razoabilidade e da moralidade, pois o Administrador deve se utilizar de critérios razoáveis na realização de sua atividade discricionária. 3.2. Princípio da Supremacia do Interesse Público - Impessoalidade Os serviços devem atender as necessidades da coletividade. Associado ao princípio da finalidade faz ressaltar a questão do interesse público. Eis que a conduta da Administração deve ser impessoal, seja quanto ao agente, seja quanto ao destinatário, pois em qualquer hipótese o que se objetiva como finalidade última é atender o interesse público, sem qualquer tipo discriminação entre os usuários. Entende-se que qualquer agente público, seja ele eleito, concursado ou indicado está ocupando seu posto para servir aos interesses do povo. Assim, seus atos obrigatoriamente deverão ter como finalidade o interesse público, e não próprio 8 ou de um conjunto pequeno de pessoas conhecidas ou com quem se mantém relações sociais ou de amizade, ou seja, deve ser impessoal. Se o Administrador decide construir ou asfaltar uma determinada rua, deve fazê-lo para beneficiar o conjunto da população, não porque a rua passa em frente a um terreno seu ou de algum correligionário. Nesta situação, teríamos um ato pessoal. Lembre-se que o Administrador é um mero representante temporário dos interesses do povo, e não pode se desvirtuar dessa finalidade. No entanto, os atos não serão imputados a quem os pratica, mas sim à entidade à qual está vinculado. No caso de um Agente Fiscalizador da Receita Federal lavrar um Auto de Infração contra determinada pessoa jurídica pelo não pagamento de tributo devido, não é ele que estará exigindo o tributo, mas sim à Secretaria da Receita Federal, em face da lei que assim estipula. Neste caso, o Agente representa a mera materialização do ente Secretaria da Receita Federal. Como é a Secretaria da Receita Federal quem autua na hipótese exemplificada, qualquer outro seu Agente poderá rever de ofício ou manter a cobrança, ainda que aquele servidor autor do Auto em debate tenha sido desligado dos quadros da referida Secretaria. No exemplo anterior, a rua não foi feita pelo Prefeito, mas sim pela Prefeitura. O Prefeito não passa de um representante temporário da Prefeitura. Veja o que diz o art. 37, §1º, da CF/88, que representa a garantia de observância desse princípio: “ A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.” 9 Contudo, os exemplos citados deixam claro os critérios de objetividade no atendimento do interesse público, sendo vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades. 3.3. Princípio da adaptabilidade O Princípio da Adaptabilidade preceitua que a autoridade pública pode e deve alterar a organização e o funcionamento do serviço para adaptar-se às novas necessidades. Nem o concessionário do serviço nem seus usuários têm direito de mantê-lo na situação em que se encontra, caso não atenda às necessidades básicas do público usuário. A aplicação deste princípio não elide os problemas relacionados ao seu cenário de aplicação. Por um lado, o sentido das mudanças a serem operadas pode dar margem à discussão, especialmente quando são invocadas considerações de rentabilidade recusadas por certos defensores do serviço público. Por outro, a efetiva aplicação dessas mudanças nem sempre é imposta facilmente, diante de certas reações corporativas. Como se vê, os princípios de funcionamento do serviço público às vezes têm mais o caráter de objetivos a serem perseguidos que o de regras efetivamente respeitadas. Contudo, nem por isto sua existência é menos essencial, refletindo o grau de exigência da nação em relação às atividades exercidas em seu nome. O Estado tem o dever de adequar os serviços públicos à modernização e atualização das necessidades dos administrados. 3.4. Princípio da Universalidade - Igualdade 10 O Princípio da universalidade se apresenta de duas maneiras: igualdade de acesso ao serviço público para todos os cidadãos, e igualdade de tratamento pelo serviço público de todos os cidadãos. Tem ele um componente social (não pode haver desigualdade em função da origem social) e um componente territorial (não pode haver desigualdade entre as regiões). O segundo é certamente mais facilmente observado que o primeiro, pois as camadas sociais privilegiadas sempre se mantêm, quaisquer que sejam os esforços empreendidos para assegurar uma real igualdade, em melhor posição para fazer bom proveito das possibilidades de acesso e dos meios do serviço. É o que acontece, por exemplo, no terreno da educação. A igualdade de acesso ao serviço é permitida por sua gratuidade ou quase-gratuidade, tratando-se de serviços administrativos e sociais, e pela prática de preços acessíveis no caso de serviços econômicos. Desse modo, o fornecimento do serviço pode ser assegurado a todos, mesmo nas regiões mais distantes do território, o que, naturalmente, não seria possível se estivesse submetido às regras comuns do mercado. Em suma, os serviços devem estar disponíveis à todos de igual maneira. 3.5. Princípio da Transparência - Publicidade O Princípio da Transparência, também entendido como Princípio da Publicidade traz ao conhecimento público e geral dos administrados a forma como o serviço foi prestado, os gastos e a disponibilidade de atendimento. Para honrar com o seu dever, cumpre à Administração dar conhecimento aos administrados sobre sua gerência e condução dos negócios públicos. Cumpre ao servidor público a obrigação de dar publicidade, levar ao conhecimento de todos os seus atos, contratos ou instrumentos jurídicos como um todo. 11 Isso dá transparência e confere a possibilidade de qualquer pessoa questionar e controlar toda a atividade administrativa que, repito, deve representar o interesse público, por isso não se justifica, de regra, o sigilo. Há determinados casos que pode ser relativizado esse princípio, quando o interesse público ou segurança o justificarem. A própria Constituição Federal de 1988 prevê diversas exceções. Vejamos algumas, todas presentes no Art. 5º: Art. 5º. (...) XIV – é assegurado à todos, o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; (...) XXXIII – todos têm direito a receber os órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; XXXIV - são à todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal; (...) 12 LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; (...) LXXII – conceder-se-á “habeas data”: a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.” Citamos ainda outras regras da legislação infraconstitucional, que conferem sigilo em casos especiais: art. 20 CPP, art. 155 CPC, art. 3º, § 3º, da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações). A publicidade surte os efeitos previstos somente se feita através de órgão oficial, que é o jornal, público ou não, que se destina à publicação de atos estatais. Dessa forma, não basta a mera notícia veiculada na imprensa, conforme se pode observar em recente julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal3. Mediante a publicação, presume-se o conhecimento dos interessados em relação aos atos praticados e inicia-se o prazo para interposição de recurso, e também os prazos de decadência e prescrição. A publicidade, assim, coroa a atividade da Administração Pública como corolário da moralidade pública. Torna-se, mesmo, condição de validade jurídica para a verificação de efeitos de toda a atividade administrativa. 3 RE 71.652, STF. 13 3.6. Princípio da Motivação - Continuidade O serviço público deve ser garantido, custe o que custar, aconteça o que acontecer. Este princípio indica que os serviços públicos não devam sofrer interrupção, para tanto a continuidade deve estimular o Estado ao aperfeiçoamento e à extensão do serviço, recorrendo, quando necessário, às modernas tecnologias, adequadas á adaptação da atividade às novas exigências sociais. Mas também é fato que o exercício do direito de greve pode comprometer a continuidade do serviço público. Pode-se fazer debates sobre a possibilidade e os meios de conciliar a aplicação de um meio alternativo, por exemplo estabelecendo a obrigação da prestação de um serviço mínimo. O Estado tem que fundamentar as decisões referentes aos serviços públicos. Os serviços não devem ser suspensos ou interrompidos afetando o direito dos usuários. Para Celso Ribeiro de Bastos (2004,p2) conceitua: "O serviço público deve ser prestado de maneira continua, o que significa dizer que não é passível de interrupção. Isto ocorre pela própria importância de que o serviço público se reveste, o que implica ser colocado à disposição do usuário com qualidade e regularidade, assim como com eficiência e oportunidade". O Princípio da continuidade afirma que o patrimônio da Entidade, na sua composição qualitativa e quantitativa, depende das condições em que provavelmente se desenvolverão as operações da Entidade. A suspensão das suas atividades pode provocar efeitos na utilidade de determinados ativos, com a perda, 14 até mesmo integral, de seu valor. A queda no nível de ocupação pode também provocar efeitos semelhantes. A modificação no estado de coisas citado pode ocorrer por diversas causas, entre as quais ressaltam as seguintes: a) modificações na conjuntura econômica que provoquem alterações na amplitude do mercado em que atua a Entidade. Exemplo neste sentido é a queda de poder aquisitivo da população, que provoca redução no consumo de bens, o que, a sua vez, resulta na redução do grau de ocupação de muitas Entidades; b) mudanças de política governamental, como, por exemplo, na área cambial, influenciando diretamente o volume das exportações de determinados ramos econômicos, com efeito direto nos níveis de produção de determinadas Entidades; c) problemas internos das próprias Entidades, consubstanciados em envelhecimento tecnológico dos seus processos ou produtos, superação mercadológica destes, exigência de proteção ambiental, falta de capital, falta de liquidez, incapacidade administrativa, dissensões entre os controladores da Entidade e outras causas quaisquer que levem a Entidade a perder suas condições de competitividade, sendo gradativamente alijada do mercado; d) causas naturais ou fortuitas que afetem a manutenção da Entidade no mercado, tais como inundações, incêndios, ausência de materiais primários por quebras de safras. Deste modo, os serviços públicos devem ser prestados de forma contínua, evitando prejuízos aos administrados, causados por suspensão ou interrupção de sua prestação, por serem serviços de caráter públicos, cuja prestação é atribuição do Estado ou de seus prepostos habilitados a fazê-lo, na forma da lei. 3.7. Princípio da Modicidade das tarifas O Princípio da Modicidade das tarifas preceitua que os valores das tarifas devem facilitar o acesso ao serviço posto a disposição do usuário. 15 Valores módicos como contraprestação do serviço público, muitas vezes gratuito ou subsidiado. Este princípio é extremamente importante, pois é um dos caminhos que o Estado pode abrir para a disponibilidade do serviço a todos, sem marginalizar alguns particulares que podem ser onerados excessivamente se não houver tal controle. Num país de diferenças sociais como o Brasil, são correntes as dificuldades de grande parcela da população de usufruírem certos serviços públicos por conta da excessiva onerosidade. Ainda mais quando o serviço é prestado por particular. Este visa o lucro, mas no caso do serviço público, deverá haver limitações no preço a fim de atender o princípio acima enumerado e garantir o acesso de todos. 3.8. Princípio do Controle – Moralidade Deve haver um controle rígido e eficaz sobre a correta prestação dos serviços públicos, isto é o que enuncia o Princípio do Controle ou da Moralidade Administrativa. A moral administrativa age em dois sentidos para orientar a conduta do Administrador Público, a saber, interno e externo. Assim, sob o ângulo interno, quando da tomada de providências administrativas o Administrador deverá consultar sua consciência profissional, orientado pelos valores e princípios do Direito Público, e aquilatar qual deva ser a postura mais adequada a seguir diante da ocorrência administrativa. Tendo de obedecer a esse princípio, o Administrador, além de seguir o que a lei determina, pautar sua conduta na moral comum, fazendo o que for melhor e mais útil ao interesse público. Tem que separar, além do bem do mal, legal do ilegal, justo do injusto, conveniente do inconveniente, também o honesto do desonesto. É a moral interna da instituição, que condiciona o exercício de qualquer dos poderes, mesmo o discricionário. 16 Citamos um exemplo dado pela doutrina: determinado prefeito, após ter sido derrotado no pleito municipal, às vésperas do encerramento do mandato, congela o Imposto Territorial Urbano, com a intenção de reduzir as receitas e inviabilizar a administração seguinte. Ainda que tenha agido conforme a lei, agiu com inobservância da moralidade administrativa. A Constituição Federal faz menção em diversas oportunidades a esse princípio, prevista no art. 5º, LXXIII, trata da Ação Popular contra ato lesivo à moralidade administrativa. Em outra, o constituinte determinou a punição mais rigorosa da imoralidade qualificada pela improbidade (art. 37, § 4º). Há ainda o art. 14, § 9º, onde se visa proteger a probidade e moralidade no exercício de mandato, e o art. 85, V, que considera a improbidade administrativa como crime de responsabilidade. 3.9. Princípio da Cortesia Os usuários têm direito a um bom atendimento do Agente Público. Este enunciado traduz o Princípio da Cortesia. Não podem os administrados ficarem expostos ao alvedrio e caprichos do Agente Público. Advirta-se, não se trata de preceito puramente moral. Reveste-se do atributo da coercitividade, na medida em que se trata de norma jurídica, revestida de base principiológica. Contudo, no próprio ordenamento jurídico encontram-se positivadas manifestações do referido princípio. É o caso do art. 175 da Constituição Federal, que, em seu parágrafo único, inciso IV, lembra que todos os serviços públicos, diretos ou indiretos, devem ser prestados, também, de modo adequado. Já o art. 6º, § 1º, da Lei nº. 8.987/95, sinala que o serviço, para ser adequado, deve satisfazer, inclusive, as condições de cortesia. Ainda, registre-se o art. 37, § 3º, I e III, da Constituição Federal, enunciando formas de participação do administrado na Administração Pública, por meio de reclamações e representações, quanto ao atendimento prestado. Isso sem notar que os regimes jurídicos a que submetidos os 17 Agentes Públicos, não raras vezes, trazem expressos (em seus estatutos) severas sanções disciplinares para o infrator negligente e desatento ao primado de bom atendimento, estreitamente relacionado com o princípio da eficiência (art. 37, “caput”, da CF/88). Portanto, já é tempo, também sob o viés ora proposto, de exercitarmos a cidadania, denunciando a atuação falha e desmedida de agentes públicos despreparados, que desprezam o atendimento cortês, como se estivessem a prestar meros favores à massa de administrados, movidos por descaso ou dissabores pessoais e profissionais, estranhos ao interesse público. Por fim, a par das providências na seara administrativa, se for o caso, em advindo lesão ou ameaça de lesão do mau atendimento prestado, em desalinho com as exigências de boa administração, cabe levar a pretensão ao Estado Juiz para a devida reparação (art. 5º, XXXV, da CF/88). 3.10. Princípio da Autonomia – Legalidade Princípio da autonomia da vontade não encontra amparo no Direito Administrativo Público; “enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei determina. O princípio da legalidade encontra-se ordenamento jurídico pátrio, e é consagrado no inciso II do artigo 5º da Constituição Federal, dispondo que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, de modo a impedir que toda e qualquer divergência, os conflitos, as lides se resolvam pelo primado da força, mas, sim, pelo império da lei. Está amparado sob a forma escrita, de autoridade competente surgida após tramitar por processos previamente traçados pelo Direito, prescrevendo condutas estabelecidas como justas e desejadas, dotada ainda de sanção jurídica da imperatividade. 18 Contudo, a lei nada mais é do que uma espécie normativa munida de caráter geral e abstrato, normalmente expedida pelo órgão de representação popular, o Legislativo, ou excepcionalmente, pelo Poder Executivo. Por ora, concluí-se que a expressão lei possui dois sentidos, um em sentido amplo e outro em sentido formal: - Lei em sentido amplo é toda e qualquer forma de regulamentação, por ato normativo, oriundo do Estado, tais como as leis delegadas, nas medidas provisórias e nos decretos; - Lei em sentido formal são apenas os atos normativos provenientes do Poder Legislativo. No entanto, aplica-se em nosso país, apenas a lei, em seu sentido formal, é apta a inovar, originariamente, na ordem jurídica. Logo, não é possível pensar em direitos e deveres subjetivos sem que, contudo, seja estipulado por lei. É a submissão e o respeito à lei. Para Celso Ribeiro Bastos,(2004.p.78) “... o princípio da legalidade mais se aproxima de uma garantia constitucional do que de um direito individual, já que ele não tutela, especificamente, um bem da vida, mas assegura, ao particular, a prerrogativa de repelir as injunções que lhe sejam impostas por uma via que não seja a da lei.” Pode-se entender de um modo mais simplificado, que nenhum brasileiro ou estrangeiro pode ser compelido a fazer, a deixar de fazer ou a tolerar que se faça alguma coisa senão em virtude de lei. Desta feita, os princípios acima expostos traduzem a essência dos critérios a serem aplicados com relação aos serviços públicos, sejam eles prestados diretamente pelos servidores públicos, sejam eles prestados por intermediários. Cabe à Administração Pública a responsabilidade de zelar pela sua prestação, continuidade e eficiência, garantindo o acesso de todos os usuários ao 19 serviço, não importando se sua prestação se dá de forma direta ou indireta aos administrados. CONCLUSÃO Tecidas as devidas considerações e ponderações, pode-se concluir que a prestação de serviço público, seja de forma direta, seja de forma indireta, envolve a relação Estado e cidadão, em uma manifesta relação regida pelo direito administrativo. Sendo assim, essa atividade possui características que lhes são próprias, não existentes na prestação de serviço comum. Por isso, a necessidade de serem levadas em consideração quando da aplicabilidade de diplomas normativos diversos. Conforme foi mencionado, as características dos serviços públicos sofrem variações segundo as necessidades e contingências políticas, sociais e culturais de cada comunidade, em cada época, baseando-se nos princípios que norteiam a atividade administrativa como um todo. Para todo serviço público estão todos submetidos a alguns princípios gerais comuns de funcionamento que lhes impõem uma ética do interesse geral, diferenciando-os das atividades privadas lucrativas. Os princípios são as ideias centrais de um sistema, ao qual dão um sentido lógico, harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de organizarse. A enunciação dos princípios de um sistema tem a utilidade de ajudar o ato de conhecimento do sistema jurídico que o ordenam e possuem caráter normativo, pois são usados para resolverem casos concretos. 20 Princípios estes voltados aos membros da coletividade, que devem ser observados pelo Estado e/ou seus delegados. Os princípios constituem-se nas idéias fundamentais, amparo do instituto jurídico, são eles a base da organização jurídica, possuindo as seguintes funções: - informadora, tendo em vista que, de forma direta ou indireta, inspiram o legislador, servindo-lhe como fundamento do ordenamento jurídico; - normativa, dado o fato de atuarem de forma supletiva, no caso de ausência de lei, ou seja, funcionam como elemento de integração da norma jurídica; - interpretadora, eis que funcionam como um critério de orientação do juiz ou do intérprete da lei. Percebe-se, pois, que os princípios possuem tríplice função dentro da ciência jurídica, possuindo o condão de informar o legislador na época da elaboração da norma jurídica, bem como servir de critério para a integração e aplicação da lei aos casos concretos. Resta, assim, revelada a gigantesca importância dos princípios no sistema jurídico, pode-se concluir que, ao se ferir uma norma, diretamente estar-se-á ferindo um princípio daquele sistema, eis que tal norma, direta ou indiretamente, está embutida em sua essência. 21 REFERÊNCIAS ALESSI, Renato. Sistema Instituzionale del Diritto Amministrativo Italiano. Milão: Giuffre, 1960. BACELAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios Constitucionais do Processo Administrativo. São Paulo: Max Limonad, 1998. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 1994. CAETANO, Marcelo. Princípios Fundamentais do Direito Administrativo. Coimbra: Almedina, 1996. COSTA, Nelson Nery. Processo Administrativo e suas espécies. Rio de Janeiro: Forense, 1997. CRETELLA JÚNIOR, José. Revista de informação legislativa, v. 97:7. CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1986. DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2004. 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