LUIS GUSTAVO TIRADO LEITE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMBIENTAL: PARCERIA PÚBLICOPRIVADA ALTERNATIVA NA GESTÃO DE RESIDUOS SÓLIDOS URBANOS MARÍLIA 2011 LUÍS GUSTAVO TIRADO LEITE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMBIENTAL: PARCERIA PÚBLICOPRIVADA ALTERNATIVA NA GESTÃO DE RESIDUOS SÓLIDOS URBANOS Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília, como exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito, sob orientação da Profa. Dra. Marlene Kempfer. MARÍLIA 2011 Autor: LUÍS GUSTAVO TIRADO LEITE Título: DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMBIENTAL: PARCERIA PÚBLICOPRIVADA ALTERNATIVA NA GESTÃO DE RESIDUOS SÓLIDOS URBANOS Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília, área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social, sob orientação da Profa. Dra. Marlene Kempfer. Aprovada pela Banca Examinadora em: 14/10/2011 _______________________________________ Profa. Dra. Marlene Kempfer Orientadora _______________________________________________ Prof.(a) Dr.(a) Jussara Suzi Assis Borges Nasser Ferreira __________________________________________ Prof.(a) Dr.(a) Soraya Regina Gasparetto Lunardi Dedico este trabalho em primeiro lugar a Deus que sempre me abençoou com sabedoria, graças, força e com oportunidades de trabalho que me possibilitaram enfrentar essa empreitada. Dedicação especial a minha esposa Francyni que muito me incentivou, apoiou e estimulou nos momentos mais difíceis, se fazendo onipresente como companheira perfeita, símbolo de amor, cumplicidade, amiga e mulher. Dedico também esse trabalho aos meus pais José Luís e Maria Cecília, os quais desde o início de minha vida demonstraram a importância do amor familiar, do bom convívio e especialmente a educação, por meio da qual podemos alcançar todos os nossos objetivos, sendo esse o maior legado e herança que eles poderiam me deixar. Aos meus irmãos Flávia e Guilherme pela união e companheirismo durante toda a vida, em especial ao Guilherme o apoio oferecido nas pesquisas e socorros do dia a dia durante a elaboração desse trabalho. Agradeço a todos os meus amigos e companheiros de trabalho que me socorreram e oportunizaram-me tempo e disponibilidade (Ricardo Maravalhas, Ricardo Marques, Wladir Buim, Tatiane, Guilherme, Marcus e Gabriela). A Professora Doutora Marlene Kempfer pelo desempenho, paciência e dedicação nas nossas orientações; Aos queridos Professores do Mestrado, pelos ensinamentos; Aos meus queridos amigos que ao longo do mestrado e da vida conquistei; E a toda família Unimar pela excelência nos seus cursos e acolhida. Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar; Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar; Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar; Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora; Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar; Tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz. Que proveito tem o trabalhador naquilo em que trabalha? Tenho visto o trabalho que Deus deu aos filhos dos homens, para com ele os exercitar. Tudo fez formoso em seu tempo; também pôs o mundo no coração do homem, sem que este possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até ao fim. Eclesiastes 3, 1-11 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMBIENTAL: PARCERIA PÚBLICOPRIVADA ALTERNATIVA NA GESTÃO DE RESIDUOS SÓLIDOS URBANOS Resumo: A pesquisa tem por escopo analisar o desenvolvimento sustentável nas suas perspectivas econômica, social e ambiental. Destacar o aspecto ambiental, especialmente voltado ao regime jurídico da recente Lei 12.305 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. O recorte metodológico será para os resíduos denominados sólidos urbanos tendo em vista que até a aprovação desta Lei, não havia um disciplinamento legal. Em razão desta ausência a gestão se dava de forma ineficiente o que resulta em grave prejuízo para a preservação do meio ambiente. Esta nova Lei possibilita a proteção prevista no Art. 225 da CF/88. Neste sentido propõe-se pesquisar a responsabilidade do Estado, Município, empresa e consumidores na gestão destes resíduos diante da coleta e destinação. Considerando-se os caminhos da administração direta ou administração indireta, sempre observando o regime jurídico administrativo do Art. 37 CF/88, pode-se destacar a prestação destes serviços públicos por meio de contratos administrativos de concessões previstos no Art. 175 da CF/88 e na Lei 8.987/95, apresentando a nova alternativa trazida pela Lei 11.079/05. Deste modelo de participação com a iniciativa privada, aprofunda-se o estudo no contrato de parceria público-privada disciplinado pela Lei 11.079/2004, por oferecer um regime que atrai investimento privado em razão das vantagens que oferece ao parceiro investidor, como o equilíbrio econômico financeiro do contrato, a criação da sociedade de propósito especifico, a existência do Fundo Garantidor e o prazo de duração dos contratos. Este contrato tem entre seus fundamentos o valor da eficiência que também integra a racionalidade econômica. Com isso busca-se demonstrar a possibilidade e viabilidade da solução de um problema contemporâneo prestigiado pelo regime constitucional brasileiro. Palavras-chave: Desenvolvimento Sustentável. Parceria Público-Privada. Resíduos Sólidos Urbanos. ENVIRONMENTAL SUSTAINABLE DEVELOPMENT: PUBLIC-PRIVATE PARTNERSHIP AS AN ALTERNATIVE TO THE MANAGMENT OF THE URBAN SOLID WASTE Summary: This research has the objective to analyze the sustainable development in its economic, social and environmental perspectives. Highlight the environmental aspect, specially turned to the juridical regime of the recent Law 12.305 from august of 2010, which instituted the National Solid Waste Policy. The methodological approach will be to the waste called urban solid keeping in mind that until the approval of this Law, there was no legal discipline of it. Because of its absence the management was made in an inefficient way, which resulted in a serious prejudice to the environment preservation. This new Law allows the protection brought by the Article 225 of the CF/88. In this point is proposed research the responsibility of the State, City, company and consumers in the management of this waste in its collect and destination. Considering the paths of the direct or indirect administration, always looking to the juridical-administrative regime of the Article 37 CF/88, we can highlight the way that the public services are given through administrative contracts of concessions brought by the Article 175 of the CF/88 and in the Law 8.987/95, showing the new alternative brought by the Law 11.079/05. From this model of private initiative participation, the study in the public-private partnership contract treated by the Law 11.079/2004 is deepened, because it offers a regime that attracts the private money by the reason of its advantages which offers to the investor partner, as economical and financial equilibrium of the contract, the creation of the specific purpose partnership, the existence of the Guaranty Fund and the duration time of the contracts. This contract has in its foundations the value of the efficiency which also takes part in the economic rationality. With it is tried to search the possibility and viability of the solution to a contemporaneous problem protected by the Brazilian constitutional regime. Key-words: Sustainable Development. Public-Private Partnership. Urban Solid Waste. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 12 1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SOB OS ASPECTOS ECONÔMICO, SOCIAL E AMBIENTAL .....................................................................................................14 1.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ECONÔMICO .............................................20 1.2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SOCIAL ...................................................... 26 1.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMBIENTAL ............................................28 2 A ORDEM JURÍDICA BRASILEIRA AMBIENTAL E A LEI 12.305/2010 ............. 31 2.1 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA POLÍTICA AMBIENTAL ............................. 38 2.2 POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS IMPLEMENTADAS POR MEIO DA LEI 12.305/2010 ..............................................................................................................44 2.2.1 A origem da Política Nacional de Resíduos Sólidos .....................................................49 2.2.2 Princípios Norteadores da Política Nacional de Resíduos Sólidos ................................51 2.2.3 Aspectos Gerais da Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos................................61 3 POLÍTICA MUNICIPAL PARA GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS: PARCERIA PÚBLICO PRIVADA ...........................................................................................................69 3.1 CONTRATO ADMINISTRATIVO ................................................................................ 71 3.2 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS .......................................................................79 3.3 PARCERIA PÚBLICO PRIVADA E SUA EFETIVIDADE ........................................103 3.4 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS E SUAS VANTAGENS ............................ 109 3.5 SUGESTÃO DE PPP ....... ............................................................................................. 112 CONCLUSÃO .....................................................................................................................116 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................119 ANEXO I – LEI 11.079/2004 ............................................................................................ 125 ANEXO II – LEI 112.305/2010 ......................................................................................... 139 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABRELPE - Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias art. - artigo BB - Banco do Brasil CC - Código Civil CF/88 - Constituição Federal de 1988 CGPE - Comitê Gestor do Programa Estadual CMN - Conselho Monetário Nacional CPL - Comissão Permanente de Licitação COMPESA - Secretaria de Recursos Hídricos e da Companhia Pernambucana de Saneamento CVM - Comissão de Valores Mobiliários DBFOT - Design, Build, Finance, Operate and Transfer EC - Emenda Constitucional FGP - Fundo Garantidor das Parcerias Público-Privadas IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística In - em ISO - Organização Internacional para Padronização nº - número ONG - Organização Não Governamental PEPPP - Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas PL - Projeto de Lei PNRS - Política Nacional dos Resíduos Sólidos PPP - Parceria Público-Privada RSU - Resíduos Sólido Urbano SCO - Sociedade Civil Organizada SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio as Micros e Pequenas empresas SEPLAG - Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado de Pernambuco SISNAMA - Sistema Nacional de Meio Ambiente TCE - Tribunal de Contas do Estado INTRODUÇÃO Desde os primórdios o homem acreditou que a capacidade de renovação dos recursos naturais seria infinita, fundado nesse pensamento buscou o crescimento econômico com perspectivas de uma maior geração de riqueza. No entanto restou comprovado que esse processo de extração dos recursos naturais, sem qualquer preocupação, bem como o nível de atividade econômica que se atingiu, passou a influenciar diretamente no aspecto ambiental e social. O surgimento desses problemas demanda transformações nas teorias das políticas de desenvolvimento, uma vez que existia e ainda existe uma busca pelo crescimento econômico fundado nas idéias do desenvolvimento econômico e sustentável O Estado passou a agir e influenciar diretamente na sociedade e na atividade econômica, chamando para si a responsabilidade de determinados setores e a prestação de serviços considerados de utilidade e necessidade pública. Todavia com o aumento significativo da própria sociedade o Estado não conseguiu atender a todas as necessidades e cumprir com todas as obrigações por ele mesmo assumidas. Ante essa incapacidade de suprir e prestar todos os serviços a que se obrigou, foi necessária a busca por alternativas que viabilizassem a sua atuação, desde a diminuição da própria estrutura do Estado que se deu por meio das concessões e privatizações até chegar a alternativa de uma nova modalidade de contratação, a Parceria Público-Privada. Aos 30 de dezembro de 2004, foi publicada a Lei n. 11.079 que regula a Parceria Público-Privada, justificando-se no fato do Estado não ter mais condições de realizar os investimentos necessários em infra-estrutura, tão pouco prestar os serviços que a sociedade espera e que são de sua responsabilidade conforme a própria organização Estatal. Essa nova modalidade de contratação possibilitou ao Estado realizar e firmar contratos para suprirem as necessidades e anseios da sociedade. Atualmente um dos problemas que assolam a humanidade é a questão do lixo ou resíduos sólidos, os quais são gerados por toda a sociedade, porém nem sempre essa se compromete com a sua gestão e destinação final adequada. Ante essa preocupação e problemática crescente foi promulgada em 02 de agosto de 2010 a Lei 12.305 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, alterando a Lei n. 9.605 de 12 de fevereiro de 1998. Com este marco legal veio para a ordem jurídica a Política Nacional de Resíduos Sólidos, no entanto, não sendo possível sua implementação ser realizada unicamente pelo Estado ou pelo setor privado, apresenta-se alternativamente a Parceria Público-Privada. Esse modelo de participação com a iniciativa privada oferece um regime que atrai investimentos com retorno garantido, como a garantia do equilíbrio econômico financeiro do contrato, a criação do Fundo Garantidor, a Sociedade de Propósito Específico, o prazo de duração dos contratos, a vinculação de receitas. São caminhos cujos fundamentos priorizam o valor da eficiência que também integra a racionalidade econômica. Busca -se demonstrar a possibilidade e viabilidade da solução do problema dos resíduos sólidos urbanos, apresentando ao final uma sugestão de Parceria Público-Privada a ser implementada, capaz de contemplar o desenvolvimento sustentável ambiental, social e econômico, com a garantia da prestação de um serviço público eficiente. 1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SOB OS ASPECTOS ECONÔMICO, SOCIAL E AMBIENTAL O homem sempre acreditou que os recursos naturais seriam eternos e infinitos, o que possibilitaria uma exploração sem qualquer controle ou preocupação com a escassez ou o futuro. Foi constatado que nesse processo de extração dos recursos naturais sem qualquer preocupação e o nível de atividade econômica que se atingiu, passou a influenciar diretamente no aspecto ambiental e social. Com o surgimento desses problemas demandou-se transformações nas teorias das políticas de desenvolvimento, uma vez que existia e ainda existe uma busca infindável pelo crescimento econômico fundado nas idéias do desenvolvimento econômico e sustentável. Sobre essa evolução e o desenvolvimento Marçal Justen Filho escreve: O postulado do desenvolvimento não estará satisfeito tão-somente pelo acréscimo quantitativo da produção e circulação econômica. Essa universalidade material, abstratamente considerada, será insuficiente para cumprir a exigência jurídica do desenvolvimento. Será preciso apurar a extensão e o efeito da redistribuição de riquezas no seio da sociedade não sob parâmetros fundamentalmente econômicos, mas sim em moldes compatíveis com a satisfação das necessidades fundamentais de seus integrantes.1 Enquanto o extrativismo e a exploração do meio ambiente se davam somente nos períodos anteriores à revolução industrial, ainda era possível a sua manutenção da maneira em que se dava, haja vista o baixo nível de consumo da própria humanidade. Por volta dos anos de 1800 surgia a revolução industrial, com a máquina a vapor e as inovações mecânicas, com a transformação radical no domínio das idéias e a própria mudança nos meios de produção, escala e utilização de matérias-primas. Surgia então o capitalismo industrial, momento em que a economia atingiu alto nível de progresso, com a divisão do trabalho, o crescimento do comércio, produção de riquezas, o que sinalizava o surgimento da Era Moderna, e com ela a busca do crescimento econômico.2 Nesse novo processo de produção com a implantação de novos métodos de industrialização e o aumento da capacidade de transformação iniciou-se a exploração 1 OLIVEIRA, Fernão Justen de. Parceria público-privada: aspectos de direito público econômico (Lei n. 11.079/2004) Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 35 2 BRUM, Argemiro J. O desenvolvimento econômico brasileiro. 27 ed. Ijuí: Ed. Unijuí, Petrópolis, Vozes, 2010. p. 33. desenfreada dos recursos naturais. Esse modo de exploração no decorrer do tempo desencadeou problemas de ordem ambiental de grandes proporções como exemplo o desmatamento, poluição de rios, mares, aquecimento global dentre outros. Atualmente existe uma grande preocupação de todos os setores da sociedade com o meio ambiente como um todo. Especialmente, pelo modo de sua utilização, quer seja no presente quer como será no futuro. Antes mesmo da abordagem expressa no texto constitucional de 1988 já existiam inúmeras Leis Federais e Estaduais que tutelavam o meio ambiente o que será demonstrado de forma mais ampla mais adiante do trabalho. Porém a positivação constitucional de forma expressa na defesa do direito ambiental é recente, tendo em vista que somente a partir da Constituição Federal de 1988, em seus artigos 170 e 225 abordou-se de forma objetiva o tema meio ambiente. Artigo 170: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) VI – defesa do meio ambiente , inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (...) Artigo 225: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações: (...) omissis Em razão da precisão constitucional sobre o tema, ressalta-se o desenvolvimento sustentável que visa garantir a satisfação das necessidades das gerações atuais e futuras, sem comprometer o esgotamento dos recursos naturais. Com o passar do tempo e a importância que o tema foi ganhando surgiu a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pelas Nações Unidas para discutir e propor meios de harmonizar dois objetivos: o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental. Nessa comissão surgiu a definição para desenvolvimento sustentável que é: “o desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações. É o desenvolvimento que não esgota os recursos para o futuro.” 3 Após a adoção da definição da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento sobre o que seria o desenvolvimento sustentável, diversos autores passaram a escrever sobre o tema, dentre eles pode-se citar Welber Barral e Gustavo Assed Ferreira, os quais definem desenvolvimento sustentável como: [...] promover a harmonia entre os seres humanos e entre a humanidade e a natureza. No contexto específico das crises do desenvolvimento e do meio ambiente surgidas desde os anos 1980, a busca do desenvolvimento sustentável requer: (i) um sistema político que assegure a democracia representativa; (ii) um sistema econômico que possa gerar excedentes e desenvolvimento técnico em base constante; (iii) um sistema social que possa resolver as tensões causadas pela opção de crescimento a qualquer custo; (iv) e um sistema de produção que respeite a obrigação de preservar a base ecológica do desenvolvimento, evitando o agravamento do processo de entropia global.4 Escreve também sobre o tema Adriana Migliorini Kieckhöfer: Desenvolvimento sustentável é compreendido como a busca harmônica entre diversos segmentos da sociedade – econômico social e ambiental – para tornar o desenvolvimento mais adequado à vida das atuais e futuras gerações.5 Ainda sobre o assunto Peter H. May: O conceito de desenvolvimento sustentável é um conceito normativo que surgiu com o nome de ecodesenvolvimento no início da década de 1970. Ele surgiu num conceito de controvérsia sobre as relações entre crescimento econômico e meio ambiente, exacerbada principalmente pelo relatório do Clube de Roma que pregava o crescimento zero como forma de evitar a catástrofe ambiental. Ele emerge desse contexto como uma proposição conciliadora, em que se reconhece que o progresso técnico efetivamente relativiza os limites ambientais mas não os elimina, e que o crescimento 3 http://www.wwf.org.br/informacoes/questoes_ambientais/desenvolvimento_sustentavel/ acesso em 12 fev. 2011. 4 BARRAL, Welber; FERREIRA, Gustavo Assed. Direito Ambiental e Desenvolvimento. In: BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio (organizadores). Direito Ambiental e Desenvolvimento, Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006. p. 13-45. 5 KIECKHÖFER, Adriana Migliorini. Do Crescimento Econômico ao Desenvolvimento Sustentável: uma retrospectiva histórica – REVISTA UNIMAR – EMPREENDIMENTOS ECONOMICOS E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL p. 11-34. econômico é a condição necessária, mas não suficiente para a eliminação da pobreza e disparidades sociais.6 O conceito de sustentável surgiu para acrescer a idéia de desenvolvimento econômico, verifica-se que o desenvolvimento sustentável é baseado no próprio princípio do Desenvolvimento Sustentável, o qual também é citado por Welber Barral e Gustavo Assed Ferreira como: Princípio do Desenvolvimento Sustentável: este princípio reflete a preocupação em alcançar o desenvolvimento sustentável, utilizando para tanto ações racionais que preservem os processos e sistemas essenciais à vida e à manutenção do equilíbrio ecológico. Nesse sentido, é necessário pensar em construir uma sociedade mais sustentável, socialmente justa e ecologicamente equilibrada. A compatibilização entre a utilização dos recursos naturais e a conservação do meio ambiente pode ser concretizada por meio de formas de produção que satisfaçam às necessidades do ser humano, sem destruir os recursos necessários às futuras gerações.7 Almeja-se a existência e a relação harmônica entre progresso, crescimento econômico e utilização dos recursos naturais, tornando inclusive uma obrigação do Estado em regulamentar e promover a garantia desse desenvolvimento. Pois, como bem ressalta Paulo de Bessa Antunes: Os Estados devem tomar, em nível nacional, todas as medidas necessárias para a realização do direito ao desenvolvimento e devem assegurar, inter alia, igualdade de oportunidade para todos, no acesso aos recursos básicos, educação, serviços de saúde, alimentação, habitação, emprego e distribuição equitativa da renda.8 Na mesma vertente o artigo 225 da Constituição Federal impõe ao Poder Público o dever de defender e de preservar o meio ambiente. Com isso, objetiva-se um equilíbrio entre economia e ecologia, pois, embora todos reconheçam que o desenvolvimento é uma meta desejável, nos últimos anos cresceu a preocupação em saber se as limitações ambientais virão a restringi-lo e se o desenvolvimento causará graves danos ao meio ambiente prejudicando a qualidade de vida. 6 MAY, Peter H. LUSTOSA, Maria Cecília. VINHA, Valéria da (org.). Economia do Meio Ambiente: teoria e prática. Ed. Elsevier: São Paulo, 2003, p. 5-6. 7 BARRAL, Welber; FERREIRA, Gustavo Assed. Direito Ambiental e Desenvolvimento. In: BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio (organizadores). Direito Ambiental e Desenvolvimento, Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006. p. 13-45. 8 ANTUNES, Paulo de Bessa. Princípios do Direito Ambiental. In: TORRES, Ricardo Lobo; KATAOKA, Eduardo Takemi; GALDINO, Flávio. (Organizadores). Dicionário de Princípios Jurídicos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p. 361-377. Verifica-se a problemática levantada pelo trabalho ora desenvolvido, haja vista que em razão desse desenvolvimento da sociedade, principalmente no aspecto econômico, cria-se uma grande cadeia de consumo com uma grande e descontrolada geração de resíduos sólidos urbanos, o chamado lixo. Para equalizar esse processo de geração, destinação e processamento desses resíduos sólidos urbanos é necessário que haja um desenvolvimento sustentável econômico, ambiental e social, pois caso isso não ocorra, continuaremos alimentando a realidade atual, descartando esses resíduos de forma irregular e sem qualquer comprometimento com o meio ambiente, o que sobremaneira cria enormes prejuízos para toda a humanidade. Apesar do progresso registrado desde a última geração, mais de 1 bilhão de pessoas ainda vivem em extrema pobreza, sem acesso aos recursos de educação, saúde, infraestrutura, terra e crédito. A tarefa essencial do desenvolvimento é propiciar oportunidades para que essas pessoas e para outras centenas de milhões que se encontram em condições não muito diferentes, precariamente assistidas possam desenvolver seu potencial humano. O novo paradigma tecnológico e econômico vai exigir, contudo, uma revisão profunda na ordem econômica e social.9 Sobre o tema escreve Paulo Affonso Leme Machado: O homem não é a única preocupação do desenvolvimento sustentável. A preocupação com a natureza deve também integrar o desenvolvimento sustentável. Nem sempre o homem há de ocupar o centro da política ambiental, ainda que comumente ele busque um lugar prioritário. Haverá casos em que para se conservar a vida humana ou para colocar em prática a “harmonia com a natureza” será preciso conservar a vida dos animais e das plantas em áreas declaradas inacessíveis ao próprio homem. Parece paradoxal chegar-se a essa solução do impedimento do acesso humano, que, a final de contas, deve ser decidida pelo próprio homem.10 Esse fenômeno é uma das conseqüências ou etapas, como quer que seja, para se alcançar o desenvolvimento sustentável. Para isso é necessário demonstrar a diferença existente entre crescimento e desenvolvimento. O crescimento não conduz automaticamente à igualdade nem à justiça social, porque não leva em consideração nenhum outro aspecto da qualidade de vida a não ser o acúmulo de riquezas, que se faz nas mãos apenas de alguns indivíduos da população. O desenvolvimento preocupa-se com a geração de riquezas, mas com o objetivo de distribuí-las 9 SOUZA, Paulo Roberto Pereira de. O direito ambiental e a construção da Sociedade sustentável. <http://www.abaa.org.br/artigos_070501_dirsochtml.html>. Acesso em 10 mar. 2011. 10 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 18ª. Edição revista, atualizada e ampliada. Malheiros Editores. 2010. p. 63 de forma a melhorar a qualidade de vida de toda a população, levando em consideração, portanto, a qualidade ambiental do planeta. Os estudiosos da economia Roberto Luis Troster e Francisco Mochón11 escrevem que “o crescimento econômico é um processo sustentado ao longo do tempo, no qual os níveis de atividade econômica aumentam constantemente”. Nessa linha o que se busca, efetivamente, para equalizar esse processo é o desenvolvimento sustentável e não única e exclusivamente o crescimento econômico. No Brasil, como país emergente que é, a implantação de um desenvolvimento sustentável, apresenta-se como um grande desafio, como expõe Flávia Piovesan: [...] emerge o desafio da construção de um novo paradigma, pautado por uma agenda de inclusão, que seja capaz de assegurar um desenvolvimento sustentável, mas igualitário e democrático, nos planos local, regional e global. A prevalência dos direitos humanos e do valor democrático há de constituir a tônica deste novo paradigma global, que demanda o enfoque das ordens local, regional e global a partir da dinâmica de sua interação e impacto. Ao imperativo da eficácia econômica deve ser conjugada a exigência ética de justiça social, inspirada em uma ordem democrática que garanta o pleno exercício dos direitos civis, políticos, sociais econômicos e culturais.12 Quiçá para que esse desenvolvimento sustentável seja alcançado, necessário, para tanto, a adoção de estilos de vida, muitas vezes diferentes daqueles que as pessoas querem viver ou estão acostumadas a viver, inclusive com a implantação de políticas públicas direcionadas ao consumo consciente e a destinação correta de todos os resíduos sólidos urbanos produzidos. O que dificulta sobremaneira a implantação de um modo de desenvolvimento sustentável é a própria cultura do consumismo exacerbado e a imagem de realização e felicidade transmitida por esse modo de vida. Esse fato ocorre em razão da busca pela satisfação pessoal se dar em detrimento do consumo e dos bens materiais. Esse consumo ilimitado enseja a criação de grande quantidade de resíduos que são descartados de forma indevida, gerando assim problemas de ordem econômica, social e ambiental. 11 TROSTER, Roberto Luis; MOCHÓN, Francisco. Introdução à economia. Ed. Ver. At. São Paulo: Makron Books, 2002, p.317. 12 PIOVESAN, Flávia. Desafios e perspectivas dos direitos humanos: a inter-relação dos valores liberdade e igualdade. In: RIBEIRO, Maria de Fátima e MAZZUOLI, Valério de Oliveira, coord. Direitos internacionais dos Direitos Humanos – estudos em homenagem à Professora Flávia Piovesan. Curitiba: Juruá, 2004, p.169. 1.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ECONÔMICO Para tratar do assunto específico desenvolvimento sustentável econômico, apresenta-se um relato sobre a evolução do pensamento econômico para entender o atual modo de pensar e agir do homem com relação à economia de acordo com os ensinamentos trazidos por Robert Heilbroner.13 Na pré-história a economia era primitiva ou natural, limitando-se as questões da própria sobrevivência humana, através da caça, pesca e colheita sem maiores preocupações com o que seria no futuro ou mesmo com organização de produção comércio. Já na antiguidade surgiu o trabalho escravo, a atividade econômica era autárquica, pois o meio rural produzia todos os meios necessários para sua sobrevivência e abastecia as necessidades das cidades. No entanto nem todas as sociedades eram capazes de produzir tudo que demandavam, como exemplo da Grécia Antiga, a qual não tinha produção suficiente de alimentos. Isso fez com que ela comprasse esses produtos no exterior e pagava com azeite e vinho. Começava então a surgir o comércio e o interesse pela produção em maior escala daquela necessária para o próprio consumo. O grande Império Romano desenvolveu bastante o comércio haja vista que na época dominava grande parte do mundo, o nível de desenvolvimento do comércio pelos Romanos foi tão avançado que começaram a negociar com países distantes como China e Índia. Na Idade Média a atividade econômica manteve-se essencialmente agrária (feudalismo). Ocorriam trocas naturais. Apareceu a figura do intermediário. Obs: Feudalismo: caracterizado pelo sistema de grandes propriedades territoriais (feudos), pertencentes a nobreza e ao clero e trabalhado pelos servos. A Idade Moderna foi caracterizada por atividades econômicas mercantis (mercantilismo ou capitalismo comercial), o que se baseava na comercialização dos excedentes de produção. Nesse momento dava-se ênfase no nacionalismo econômico que fazia da riqueza o fim principal do Estado. Surgiu então na Idade Moderna a primeira escola: o mercantilismo, que continha alguns princípios de como fomentar o comércio exterior e entesourar riquezas. Essa escola considerava que o governo de um país seria mais forte e poderoso, quanto maior fosse o seu estoque de metais preciosos, o que acabou estimulando guerras. 13 HEILBRONER, Robert. História do Pensamento Econômico. 6ª. Ed. São Paulo. Nova Cultural. 1996. Esse período foi conhecido como sendo a revolução comercial ocorrida nos séculos XVI à XVIII e é marcado pela desintegração do feudalismo e pela formação dos estados nacionais. A Idade Contemporânea foi marcada pelo aparecimento de várias escolas do pensamento econômico, tais como: Escola Fisiocrática: Liderada por François Quesnay, pregando que a terra e a natureza representam o fator econômico produtivo; a ordem natural ou governo da natureza conduzem a vida econômica; só a terra tinha a capacidade de multiplicar a riqueza. Para os fisiocratas, a riqueza consistia em bens produzidos com a ajuda da natureza, em atividades econômicas como: a lavoura, a pesca e a mineração. Escola Clássica ou Liberal: Liberada por Adam Smith (1723-1790) e David Ricardo (1772-1823), estabelecendo que a verdadeira fonte de riqueza é o trabalho; a produtividade decorre da divisão do trabalho, e essa, decorre da tendência de troca, que é estimulada, pela ampliação dos mercados; o papel do Estado na economia, deveria corresponder a proteção da sociedade e que a iniciativa individual deveria ser incentivada. Escola Socialista: Surgiu na Alemanha (1872). O termo socialismo foi empregado pela primeira vez em 1827, por Roberto Owen. A Escola Socialista estabelecia que o Estado deve ter em suas mãos, a propriedade e os meios de produção; o Estado regula a distribuição riquezas econômicas (bens e/ou serviços) e promove reformas em busca do bem-estar social. A atualidade é marcada pelas recomendações de John Keynes (1883-1946), por meio da “Teoria Geral do Emprego, Juros e Moeda”, que objetivou explicar as causas das variações que ocorrem na produção e no nível de emprego. Segundo Keynes, as variações do sistema econômico dependem da qualidade de moeda disponível no mercado; da preferência pela liquidez ou velocidade de troca da moeda em relação a sua garantia ou lastro (riqueza econômica existente); do incitamento ao investimento; da propensão ao consumo. Após apresentado o relato sobre a história do pensamento econômico e a evolução de acordo com o estudo realizado por Robert Heilbroner14, passamos a evolução dentro do modelo atual econômico. Com esse modelo atual, conciliar valores como o desenvolvimento econômico, pautado na livre iniciativa e livre concorrência e ao mesmo tempo a proteção do meio ambiente, do consumidor e da valorização do trabalho humano, passou a ser uma necessidade 14 HEILBRONER, Robert. História do Pensamento Econômico. 6ª. Ed. São Paulo. Nova Cultural. 1996. moderna advinda da constatação de que, no que tange ao meio ambiente os recursos naturais são limitados e que esta limitação constitui obstáculos. A partir desse reconhecimento limitativo, verifica-se que os recursos naturais são esgotáveis e desta feita, destaca-se a preocupação com a sua positivação nas esferas material e processual, bem como a elevação à condição de princípio fundamental, pois, o direito ambiental está inserido até mesmo na ordem econômica nacional, conforme se verifica no artigo 170 inciso VI da Constituição Federal. O desenvolvimento econômico é também um direito fundamental e que se deve moldar de forma sustentável, porque os valores fundamentais devem coexistir de forma equitativa. No momento em que um valor fundamental é preterido, o desequilíbrio começa a ser gerado e passa a corroer as vigas do próprio sistema. José Afonso da Silva define: São dois valores aparentemente em conflito que a Constituição de 1988 alberga e quer que se realizem no interesse do bem estar e da boa qualidade de vida dos brasileiros. Antes dela, a Lei 6.938, de 31.08.1981 (arts. 1º e 4º) já havia enfrentado o tema, pondo corretamente, como principal objetivo a ser conseguido pela política nacional do meio ambiente, a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do \meio ambiente e do equilíbrio ecológico. A conciliação dos dois valores consiste, assim, nos termos deste dispositivo, na promoção do chamado desenvolvimento sustentável, que consiste na exploração equilibrada dos recursos naturais, nos limites das necessidades e do bem-estar da presente geração, assim como de sua conservação no interesse das gerações futuras. 15 Com isso constata-se que o desenvolvimento econômico não pode se dar pela viabilização do acúmulo do capital, do avanço tecnológico a qualquer custo e mediante a ilusória pretensão de que tais recursos tecnológicos impediriam que a humanidade, um dia, viesse a padecer em razão de um colapso dos recursos que a natureza é capaz de ofertar. Também pode ser definido como aquele que, dentro da realidade nacional, permita a conciliação dos princípios estabelecidos nos incisos do artigo 170 da Constituição Federal. Implementar o chamado desenvolvimento sustentável, conduzindo a uma consciente utilização dos recursos naturais, no que diz respeito ao meio ambiente, é a questão e que supera o campo teórico e vai além da positivação de valores pelo poder constituinte, implicando na internalização desses valores pelos seres humanos em todo o mundo. Em boa parte dos incisos do artigo 225 da Constituição Federal é possível verificar limites à iniciativa privada, atividades que para o seu desenvolvimento se faz necessária a autorização estatal após estudo de possíveis impactos ao meio ambiente, com o 15 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 7 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 8-9. estabelecimento de áreas de proteção ambiental deixando clara a relativização do direito de propriedade. Artigo 225 da Constituição Federal: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. A preocupação ambiental alcançou também os empreendedores, senão por concebê-la como um direito humano, mas como um fator do ciclo econômico que, se deixado de lado conduzirá irreversivelmente ao colapso. Rui Otávio Bernardes de Andrade destaca a questão ecológica: A questão ecológica não questiona a ideologia do crescimento econômico, que é a principal força motriz das atuais políticas econômicas e, tragicamente, da destruição do ambiente global. Rejeitar essa ideologia não significa rejeitar a busca cega do crescimento econômico irrestrito, entendido em termos puramente quantitativos como maximização dos lucros ou do PNB. A gestão ecológica implica o reconhecimento de que o crescimento econômico ilimitado em um planeta finito só pode levar a um desastre. Dessa forma, faz-se uma restrição ao conceito de crescimento, introduzindo-se a sustentabilidade ecológica como critério fundamental de todas as atividades de negócios. 16 (destaque nosso) A questão ambiental destacada no texto Constitucional de 1988, de forma expressa e contundente a fim de não pairar dúvidas acerca de se tratar de um princípio fundamental é, 16 ANDRADE, Rui Otávio Bernardes de; TACHIZAWA, Takeshy; DE CARVALHO, Ana Barreiros. Gestão Ambiental – Enfoque Estratégico Aplicado ao Desenvolvimento Sustentável. 2 ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2002, p. 12. sem dúvida um grande passo, entretanto, a concretização da norma demanda esforço constante de toda a coletividade, dos entes políticos e públicos. Verifica-se que as medidas elencadas no artigo 225 da Constituição Federal de 1988 reclamam eficiência do serviço público no cumprimento, especialmente, da função fiscalizatória. A questão é que nem sempre essa função fiscalizatória é eficiente, como menciona Ricardo Carneiro: No entanto, os órgãos ambientais responsáveis institucionalmente pela fiscalização e pela aplicação efetiva desse arcabouço legal não escapam às mazelas e deficiências que normalmente caracterizam a Administração Pública no País, fazendo com que a opção representada pelos instrumentos econômicos assuma cada vez mais um papel de destaque, como meio de implementação racional, eficiente e viável de um modelo concreto de desenvolvimento equilibrado. 17 Os instrumentos econômicos de que trata o autor acima citado, seriam mecanismos econômicos em sintonia com a regulação direta; por exemplo, estabelecendo um custo para a utilização de um recurso natural, cuja redução possa se dar à medida em que esta utilização predatória vá sendo minimizada. O autor relaciona alguns desses instrumentos lamentando a sua pouca utilização no País como tributos ambientais, sistemas de cobrança pelo uso de recursos ambientais, subsídios públicos, sistemas de devolução de depósitos, licenças ou créditos negociáveis e seguro ou caução ambiental. Com a criação desses instrumentos sugeridos pelo autor Ricardo Carneiro, seria possível o Estado atuar diretamente e de forma efetiva na proteção e preservação do meio ambiente, quer seja por meio de políticas públicas de preservação, exploração sustentável, fiscalização efetiva das áreas a serem protegidas, em fim, realmente dar condições e aparelhar o Estado para cumprir essa função. Escreve André Ramos Tavares: Mas a disciplina constitucional do meio ambiente não se esgota no capítulo mencionado. O inc. VI do art. 170 eleva a condição de princípio da ordem econômica a proteção ao meio ambiente. Fica certo, dessa forma, que a exploração dos recursos ambientais necessários ao desenvolvimento econômico do país deve ser pautada pelas diretrizes do chamado desenvolvimento sustentável, opondo-se à devastação ambiental inconseqüente e desmedida. É, pois, um limite expresso ao desenvolvimento econômico (embora dependa de concretização em cada caso). Nesse sentido, Habermas (2002: 58-59) lembra da dificuldade em estimar a capacidade terrestre em absorver os poluentes, bem como em 17 CARNEIRO, Ricardo. Direito Ambiental: uma abordagem econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2003. estimar os limites de um crescimento exponencial da população. Contudo, alerta para os limites de um consumo crescente de energia, na medida em que esta gera um aumento da temperatura global (clima), que tem limites demonstráveis com maior segurança. Essa defesa do meio ambiente, no entanto, no contesto do Capítulo I do Título VII (Da Ordem Econômica e seus Princípios), anteriormente analisado nesta obra, exprime a necessidade de conciliação entre o desenvolvimento econômico e as práticas de preservação do meio ambiente, e não apenas esta última. Assim, nem o desenvolvimento há de ser impedido pela proteção ambiental, nem o meio ambiente poderá ser desconsiderado pelo desenvolvimento econômico. Essa conciliação, de conformidade com a doutrina constitucional contemporânea, há de ser alcançada pela utilização do critério da ponderação e da proporcionalidade, em cada caso concreto.18 (grifo do autor) A conciliação entre desenvolvimento econômico e proteção do meio ambiente, mediante a relativização de direitos subjetivos individuais em favor dos direitos metaindividuais, é simples questão de garantia da vida humana, razão de ser de todos os sistemas, inclusive o jurídico e econômico. Dessa forma almeja-se um desenvolvimento capaz de gerar obtenção do lucro consubstanciado no consumo da população, porém sem que explore o meio ambiente. Segundo André Ramos Tavares o direito econômico ambiental pode ser assim abordado. Não se poderia sustentar, pois, a proibição de obter lucro a partir da exploração do meio ambiente, sob o argumento de que tal proibição visa a protegê-lo em sua integralidade, no estágio em que se encontre. Pretende-se “implantar fórmulas sustentáveis de desenvolvimento, tendo em vista a necessidade de que a evolução não despreze a manutenção de um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. A busca por uma boa qualidade de vida é o objetivo último tanto do Direito econômico quanto do Direito ambiental. Ocorre que, além da finalidade comum, também os meios de alcançá-la devem guardar correspondência entre si. É que, dada a escassez dos recursos naturais, ou mais propriamente, sua quantidade finita, e tendo em vista as infinitas necessidades humanas, é preciso uma abordagem desenvolvimentista consciente com relação ao meio ambiente , sob pena de, invocando-se a busca de uma suposta melhoria da qualidade de vida, gerar efeitos exatamente opostos.19 Consoante ao princípio e ao entendimento acima mencionado, qualquer atividade a ser desenvolvida há de estar vocacionada para a preservação da vida e, consequentemente, ao próprio meio ambiente, pois caso seja desempenhada diferentemente do aqui apresentado poderíamos falar em atividade com intuito único e exclusivo de crescimento econômico, 18 TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2ª. Edição. Editora Método. 2006. p. 188. 19 TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2ª. Edição. Editora Método. 2006. p. 190-191. voltada ao acúmulo de riquezas sem a preocupação com o verdadeiro desenvolvimento econômico. 1.2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL SOCIAL O crescimento mundial ao longo do tempo não é verificado tão somente em si próprio, mas, principalmente, em sua qualidade que é fator determinante para o aprimoramento da vida nas sociedades. O desenvolvimento é a capacidade de livremente optar por uma melhor distribuição de renda, plena democracia, saúde e educação, enfim acessibilidade a tudo aquilo que é proporcionado por ele como um todo. Com isso pode ser dito que sem incluir o aspecto social dificilmente haverá o desenvolvimento econômico satisfatório. No entanto, o maior obstáculo enfrentado para a não implementação efetiva do aspecto social é a busca pelo lucro. Assim, apesar de estar ligado diretamente com o econômico, em alguns casos, tenta-se afastar o social em favor desse. Setores vulneráveis da sociedade são vítimas em favor do processo produtivo econômico, alude Paulo de Bessa Antunes: A proteção ao meio ambiente brasileiro está fadada ao insucesso se não houver um acréscimo nos níveis de renda da população brasileira e uma melhora substancial na sua distribuição. Qualquer análise que se faça do estado do meio ambiente no Brasil – e, nisto, nada temos de diferente dos demais países do mundo – demonstrará que os principais problemas ambientais se encontram nas áreas mais pobres e que as maiores vítimas do descontrole ambiental são os chamados setores vulneráveis da sociedade. De fato, há uma relação perversa entre condições ambientais e pobreza. Assim, parece óbvio que as condições ambientais somente poderão ser melhoradas com uma mais adequada distribuição de renda entre membros de nossa sociedade. A propósito, o Brasil é signatário da Declaração dobre o Direito ao Desenvolvimento que, no parágrafo 1º. do artigo 1º. Dispõe: O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados.20 20 ANTUNES, Paulo de Bessa. Princípios do Direito Ambiental. In: TORRES, Ricardo Lobo; KATAOKA, Eduardo Takemi; GALDINO, Flávio. (Organizadores). Dicionário de Princípios Jurídicos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p. 361-377. A exploração e a alienação do trabalho pela divisão e subdivisão de tarefas; o desemprego estrutural e tecnológico; a mudança dos trabalhadores rurais para as grandes cidades, muitas vezes, ou melhor, na sua grande maioria, despreparados e desqualificados para competir com os trabalhadores urbanos é uma realidade que se busca combater com o desenvolvimento sustentável social. O que pode se verificar é que o crescimento econômico exclusivamente é concentrador da riqueza e também estéril, por não gerar empregos na proporção de seu crescimento e da necessidade de todos, pelo menos para eliminar as perdas típicas da tecnologia. Para garantir um desenvolvimento sustentável social, necessita-se também de esforços conjuntos de todas as áreas, quer seja econômica, jurídica, ambiental propriamente dita, entre outras. Isso em razão de que somente com essa preocupação voltada para o social que as pessoas poderão obter e usufruir de forma igualitária ou menos diferenciada dos lucros gerados pelo desenvolvimento econômico. Dentre as externalidades pode-se citar a melhora na distribuição de renda, acesso a saúde, aos bens de consumo, melhora na qualidade de vida, enfim, uma participação de todos nos resultados da cadeia produtiva. Importante trazer a tona que toda essa evolução não depende somente das próprias pessoas interessadas, mas sim de uma postura dos agentes econômicos e governamentais, os quais poderão implementar políticas públicas e programas capazes de implementar e atingir esse desenvolvimento sustentável social. Escreve Paulo Roberto Pereira de Souza: [...] que para a viabilização da sociedade sustentável faz-se mister uma nova postura por parte dos agentes econômicos, que devem passar a incorporar as denominadas externalidades, e também dos juristas, que devem gerar um conjunto adequado de normas para tornar efetivas as proposições advindas das áreas técnicas. Face à gravidade do problema, a resposta dos juristas veio rápida, por meio da consagração do direito a um meio ambiente equilibrado e sadio capaz de proporcionar qualidade de vida, alçado a direito fundamental do cidadão. 21 Não basta uma ação isolada em determinado ramo da economia, do direito, das políticas públicas, mas, indispensável será uma ação conjunta e interligada de todos, 21 SOUZA, Paulo Roberto Pereira de. O direito ambiental e a construção da Sociedade sustentável. <http://www.abaa.org.br/artigos_070501_dirsochtml.html>. Acesso em 18 set. 2010. principalmente da sociedade, pois essa será a maior responsável e beneficiada por esse modelo de desenvolvimento. 1.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL AMBIENTAL Como dito anteriormente, o desenvolvimento sustentável deve ser buscado por todos. Entretanto, o mesmo possui diversas maneiras para atender e suprir as necessidades dos seres humanos, uma dessas formas é a busca pelo desenvolvimento pautado no uso racional dos recursos naturais de forma a preservar o aspecto ambiental. O Brasil, país com características continentais, repleto de recursos naturais, detentor de uma grande biodiversidade, possuindo dentro do seu território a Floresta Amazônica, deve prezar por um desenvolvimento sustentável ambiental, no entanto, o modo como ocorre nos dias atuais não é capaz de atender a todas às exigências internacionais, deixando dessa forma a desejar. Essa falta de atendimento aos índices que considerariam o desenvolvimento como sustentável de forma ambiental está ligada diretamente ao modo de produção e utilização dos recursos naturais. Especialmente no caso do Brasil verifica-se a carência de políticas públicas e a própria conduta do consumidor, uma vez que o consumidor brasileiro volta-se tão somente ao preço do produto, que sejam capazes de garantir um desenvolvimento sustentável ambiental. Assim é muito difícil de ser implementado esse desenvolvimento, por diversos motivos: I - pelo fato das pessoas buscarem a satisfação pessoal através do consumo; II – em razão da inexistência de produtos produzidos com tecnologia ecologicamente correta, que gerem o menor impacto ambiental possível e por terem um custo elevado, o que ainda não é absorvido pelos consumidores, uma vez que se guiam na sua maioria das vezes pelo preço dos produtos. É preciso conseguir implantar a mudança do paradigma sobre a forma e modo de consumo, criando o chamado consumo sustentável. Neste sentido escreve o Professor José Geraldo Brito Filomeno: A Resolução ONU n.º153/1995 demonstra a preocupação mundial da ciência consumerista com o chamado consumo sustentável. Tendo em vista que o próprio consumo de produtos e serviços pode, por vezes ser concebido como atividade predatória dos recursos naturais e, sabendo-se que, enquanto as necessidades do ser humano, incrementadas pelos meios de comunicação em massa e pelas técnicas de marketing são infinitas, os recursos provenientes da natureza, sobretudo os não renováveis, são finitos, a nova acepção do consumerismo busca, em especial, o necessário equilíbrio entre essas duas realidades, para que se possa preservar os recursos naturais, e, via de conseqüência, a própria sobrevivência do ser humano no planeta.22 A educação para o consumo sustentável é imprescindível, quer seja para o exercício da economia respeitando-se a natureza ou para a sociedade que dela depende; e é claro para a preservação do meio ambiente. Somente por meio de uma ação conjunta que envolva o Estado, a iniciativa privada, as organizações não governamentais e a sociedade, não só do Brasil, mas do mundo como um todo, será possível atingir metas que conduzam ao desenvolvimento sustentável. É imprescindível ação conjunta do Brasil e dos demais Estados soberanos porque o consumo e a economia são interligados de forma mundial, o que significa dizer que muitos países produtores, podem não serem os consumidores, porém independentemente disso, os resíduos são produzidos em todas as fases da cadeia produtiva até o consumo final e a destinação final desses resíduos, o que é objeto do presente trabalho. O que se verifica é que existe uma preocupação premente dos governos, em buscarem alternativas e meios que possam garantir um desenvolvimento ambiental sustentável. No entanto, esses esforços governamentais não ocorrem na velocidade e intensidade necessárias. Sobre o tema escreve Cristiane Derani: Em resumo, um ponto em comum de onde parte toda a sociedade contemporânea seria o seguinte: natureza é recurso (matéria a ser apropriada) natural, e o homem, sujeito apartado do objeto a ser apropriado, não é mais natureza. Sujeito e objeto vivem dois mundos: mundo social e mundo natural. Meio ambiente, seria toda a “entourage” deste solitário sujeito. Não somente a natureza “bruta” em sua forma primitiva é meio ambiente, porém todo o momento de transformação do recurso natural, ou seja, todo movimento deste objeto que circunda o homem, que sobre ele age com seu poder, querer e saber, construindo o meio ambiente. Meio ambiente é um conceito que deriva do homem e a ele está ligado, porém o homem não o integra. O fato de o homem não constituir o conceito de meio ambiente não significa que este conceito seja menos antropocêntrico, muito pelo contrário, ele mostra exatamente o poder de subordinação e dominação do “mundo exterior” objeto de ação do “eu ativo”. Isto significa que o tratamento legal destinado ao meio ambiente permanece necessariamente numa visão antropocêntrica porque esta visão está no cerne do conceito de meio ambiente.23 22 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – comentado pelos autores do anteprojeto.Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2001, p. 20. 23 DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico.São Paulo: Max Limonad, 2.ed. 2001, p. 98. Abordando o mesmo tema escreve o Professor Paulo Roberto Pereira de Souza: Os recursos renováveis representam as mais importantes fontes de vida para a humanidade. Neles podemos incluir o solo, a água, os produtos retirados em estado natural, como madeira, alimentos, plantas medicinais, peixes, carne e couro de animais selvagens e espécies domesticadas. Se tais recursos forem usados de forma sustentável, renovar-se-ão para sempre; para isto é necessário permanecer nos limites da capacidade de suporte do Planeta Terra. As atividades humanas vêm provocando alterações substanciais nesses processos através da poluição ou da destruição dos ecossistemas. Comprovam isso, por exemplo, o aquecimento global do planeta através do chamado efeito estufa, a destruição da camada de ozônio, principalmente pelo uso intensivo de CFCs – clorofluorcarbonetos. Em boa parte da Europa e da América do Norte, as chuvas ácidas poluem as águas, comprometem a vida aquática, acidificam o solo, destroem as florestas, além de corroer construções e materiais. Solos e lençóis freáticos são contaminados por metais pesados e componentes orgânicos persistentes, tornando-se quase inutilizáveis. O desmatamento intensivo, o uso inadequado de pesticidas vem comprometendo as águas superficiais, além do grande número de represamentos para o uso energético das águas. Em suma, a ação do homem sobre a natureza vem acelerando o esgotamento e a extinção de espécies, e modificando as condições para evolução. 24 A realidade que se apresenta, pois, não é nada animadora. Cresce na sociedade a preocupação com todos os fatores descritos acima, sendo objeto de investimento por parte dos governos mundiais a preservação do meio ambiente. Mas, ainda de forma bastante incipiente, pois as maiores economias do planeta ainda não respeitam de forma efetiva as políticas e diretrizes ambientais mundiais. Uma das grandes preocupações da atualidade, inclusive é o objeto do presente trabalho é a questão dos resíduos sólidos urbanos, oriundos desse processo de desenvolvimento, o qual na sua maioria das vezes não recebe o tratamento adequado, conforme será mostrado adiante, inclusive com uma sugestão para a gestão desse problema. 24 SOUZA, Paulo Roberto Pereira de. O direito ambiental e a construção da Sociedade sustentável. <http://www.abaa.org.br/artigos/artigos_070501_dirsochtml.html>. Acesso em 20 out. 2010. 2 A ORDEM JURÍDICA BRASILEIRA AMBIENTAL E A LEI 12.305/2010 É recente a preocupação dos povos em positivar e criar mecanismos para proteção e efetiva defesa do ambiente. Direito de terceira geração ou de terceira dimensão, fazendo uso das palavras do Professor Paulo Bonavides, não adveio para suplantar os direitos das gerações anteriores, mas para estabelecer um novo degrau na escala de valores que norteiam a vida humana na terra. Força é dirimir, a esta altura, um eventual equívoco de linguagem: o vocábulo “dimensão” substitui, com vantagem lógica e qualitativa, o termo “geração”, caso este último venha a induzir apenas sucessão cronológica e, portanto, suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade. Ao contrário, os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda geração, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia; coroamento daquela globalização política para a qual, como no provérbio chinês da grande muralha, a Humanidade parece caminhar a todo vapor, depois de haver dado o seu primeiro e largo passo. 25 No Brasil a tutela jurídica ambiental sofreu profunda transformação. Durante muito tempo dominou a idéia de não intervenção na tutela ambiental, tendo notícia das primeiras normas de natureza ambiental por volta de 1910, com o tema abordado no Código Civil de 1916. De sorte que norma alguma coibia a devastação de florestas, exploração sem qualquer regramento de terras, águas e pela ameaça de um desequilíbrio ecológico. Essa ausência de proteção se deu em razão da forte idéia de supremacia da propriedade privada, o que acaba por dificultar e até mesmo impedir a atuação do Poder Público na proteção do meio ambiente, haja vista que necessariamente deverá haver a limitação do direito particular de propriedade para poder atuar diretamente e fixar regras de proteção do meio ambiente. As primeiras normas protetoras surgem, na composição dos conflitos de vizinhança contidos no artigo 554 do Código Cível de 1916, o qual atribui ao proprietário ou ao inquilino de um prédio o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que habitam. Tal postura possibilitou forte entendimento jurisprudencial que ampliava o conceito de vizinhança e também passou a fundamentar a ação cominatória visando a impedir a contaminação do meio ambiente por parte de indústrias. Nesse momento pode-se verificar o 25 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 525. interesse de terceiros ou mesmo o interesse difuso passando a prevalecer sobre o direito de propriedade, até então soberano sobre todos. No mesmo Código Civil também pode ser encontrado como ponto importante sobre o tema o artigo 584 o qual proíbe construções capazes de poluir ou inutilizar para o uso ordinário, a água de poço ou fonte alheia, a elas preexistente. Posteriormente ao Código Civil adveio o Regulamento de Saúde Pública, instituído pelo Decreto 16.300 de 31/12/1923, o qual criou a Inspetoria de Higiene Industrial e Profissional, dentre as suas finalidades tinha a de licenciar todos os estabelecimentos industriais novos e bem assim as oficinas, exceto os de produtos alimentícios; impedir que as fábricas e oficinas prejudicassem a saúde dos moradores de sua vizinhança, possibilitando o isolamento e o afastamento das indústrias nocivas ou incomodas. Foi nesse período que iniciou a abordagem pela legislação da proteção ao meio ambiente, ainda mesmo que de forma indireta e isolada em alguns artigos de lei diversa. No entanto surgiu legislação com normas específicas de direito ambiental a partir do ano de 1934, tal como o Código Florestal (Decreto 23.793 de 23/01/1934), substituído pelo vigente; o Código de Águas (Decreto 24.643 de 10/07/1934), ainda em vigor; o Código de Pesca (Decreto-lei 794, de 19/10/1938) o qual trouxe algumas normas protetoras das águas. Essa tutela jurídica ambiental aparecia circunstancialmente nesses diplomas legais. Porém só recentemente se tomou consciência da gravidade da degradação ambiental e seus efeitos, onde todos passaram a pleitear de forma direta por políticas destinadas a proteção e prevenção. Na esfera Federal iniciou-se a criação de políticas de proteção ao meio ambiente com o Decreto-lei 248 de 28/02/1967 que instituiu a Política Nacional de Saneamento Básico, compreendendo o conjunto de diretrizes destinadas à fixação de programa governamental a aplicar-se nos setores de abastecimento de água e esgotos sanitários, e também criou o Conselho Nacional de Saneamento Básico, ao qual cabia definir aquela política e elaborar o Plano Nacional de Abastecimento de Água e Esgotos Sanitários. No mesmo período adveio o Decreto-lei 303 o qual criou o Conselho Nacional de Controle da Poluição Ambiental, junto ao Ministério da Saúde, como único órgão de âmbito nacional com a finalidade específica de promover e coordenar as atividades de controle da poluição ambiental, conforme se verifica no artigo 5º. do referido decreto. O Conselho foi criado para funcionar como órgão normativo e planejador, sendo o único coordenador específico no assunto junto ao Governo Federal e aos órgãos executores da Política da Poluição Ambiental, de acordo com o previsto no artigo 6º. do Decreto-lei 303. Já a execução dessa Política cabia aos Estados e Municípios segundo princípios e critérios definidos nos artigos 8º. ao 13, os quais também estabeleciam os conceitos básicos de poluição e as penalidades a serem aplicadas aos infratores das normas antipoluição. Esses dois decretos-leis continham as linhas gerais de uma Política do Meio Ambiente, embora ainda que incipiente e insuficiente. Entretanto não foram aplicados, haja vista que após oito meses de sua edição foram revogados pela Lei 5.318 de 26/09/1967, que instituiu a Política Nacional de Saneamento Básico, com a criação do Conselho Nacional de Saneamento, esse conselho estava ligado ao Ministério do Interior, no qual se englobaram as diretrizes relativas tanto ao saneamento básico, aos esgotos pluviais e à drenagem, quanto às ligadas ao controle da poluição ambiental, das modificações artificiais de massa de água e das inundações e erosões. Somente em 1973 que retomou-se a sistematização da matéria, iniciando-se pelo Decreto 73.030 de 30/10/1973, no âmbito do Ministério do Interior, da Secretaria Especial de Meio Ambiente – SEMA, a qual foi criada e orientada para a conservação do meio ambiente e o uso racional dos recursos naturais, junto a qual funcionava o Conselho Consultivo do Meio Ambiente – CCMA, a ser integrado por nove membros de notória experiência e competência em assuntos relacionados com a utilização racional dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente, de resto esse decreto só trouxe de importante a definição de poluição de águas. No decorrer dessa evolução da legislação que tutela o meio ambiente pode-se dizer que o mais importante foi o II Plano Nacional de Desenvolvimento, o qual traçou as diretrizes e prioridades sobre a preservação do meio ambiente. Posteriormente foram expedidos três diplomas legais importantes para a tutela jurídica do meio ambiente, quais sejam: o Decreto-lei 1413 de 14/08/1975, o qual dispõe sobre o controle da poluição do meio ambiente provocada por atividade industrial; o Decreto 76.389 de 03/10/1975, que dispõe sobre medidas de prevenção e controle da poluição industrial, de que trata o decreto-lei acima mencionado; a Portaria do Ministério do Interior 13 de 15/01/1976, a qual fixa os parâmetros para a classificação das águas interiores nacionais de acordo com as alternativas de consumo e dispondo sobre o controle da poluição. Completando esse quadro de legislação federal sobre a tutela do meio ambiente o Código Penal de 1940 definiu em seu artigo 271 o crime de corrupção ou poluição de água potável, porém teve pouca aplicação, pois não havia a definição do que seria água potável, gerando assim limitações interpretativas. Já na esfera constitucional, no Brasil, a Constituição Federal de 1988 tratou da questão ambiental de forma não antes abordada por nenhuma outra Carta Política, elevando a questão ambiental ao patamar de Garantia Fundamental. Existem diversas referências explícitas ao meio ambiente na Constituição Federal inicialmente pode se verificar no artigo 5º. LXXIII, o qual confere legitimação a qualquer cidade para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Posteriormente o artigo 20, II considera entre os bens da União as terras devolutas indispensáveis à preservação do meio ambiente. Já no artigo 23 se reconhece a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para proteger as paisagens naturais notáveis e o meio ambiente, combater a poluição em qualquer de suas formas e preservar as florestas, a fauna e a flora. O artigo 24, VI, VII e VIII, por seu lado confere competência à União, aos Estados e ao Distrito Federal para legislar sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da Natureza, defesa do meio ambiente e controle da poluição, sobre a proteção do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico, bem como sobre a responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Mais adiante no artigo 91, § 1º. III, inclui entre as atribuições do Conselho de Defesa Nacional opinar sobre o efetivo uso das áreas indispensáveis à segurança do território nacional, especialmente na faixa de fronteira e nas áreas relacionadas com a preservação e a exploração dos recursos naturais de qualquer tipo. Depois o artigo 129, III, que declara também ser uma das funções do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Mais relevante ainda, no artigo 170, a Constituição Brasileira de 1988, estabelece: Art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: Omissis VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42/2003); VII, VIII, IX e parágrafo único - omissis26 26 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. AASP, 2008, p. 122 Verifica-se que a defesa do meio ambiente é também princípio da ordem econômica nacional, ao lado da propriedade privada, da livre iniciativa, da livre concorrência. A iniciativa é livre e a concorrência também, desde que respeitados os direitos dos consumidores e do meio ambiente. O desenvolvimento econômico há de se estabelecer desde que fundado no respeito ao trabalho humano, na existência humana digna e a esta está estreitamente ligada à defesa do meio ambiente, na qualidade de direito humano. Além dos artigos mencionados, outras disposições sobre meio ambiente estão inseridas em diversos títulos e capítulos, em especial o Título VIII, Da Ordem Econômica e Social, no seu Capítulo VI, artigo 225 e seus parágrafos, onde trata do meio ambiente. Importante verificar que foi usado a palavra “todos” têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, isso porque o direito ao meio ambiente equilibrado é de cada um, de toda e qualquer pessoa humana, independentemente de, raça, sexo, idade, profissão, estado de saúde, posição financeira ou local de residência. Pode-se afirmar que o meio ambiente é um bem coletivo tutelado juridicamente, porém que apesar de ser um bem coletivo é de desfrute individual e geral, ou seja, o meio ambiente ao mesmo tempo em que é de uma única pessoa, também o é de todos. Por isso se diz que é um direito transindividual e enquadrado na categoria de interesse difuso. Sobre a tutela do meio ambiente escreve José Afonso da Silva: O objeto de tutela jurídica não é tanto o meio ambiente considerado nos seus elementos constitutivos. O que o Direito visa proteger é a qualidade do meio ambiente, em função da qualidade de vida. Pode-se dizer que há dois objetos de tutela, no caso: um imediato – que é a qualidade do meio ambiente – e outro mediato – que é a saúde, o bem estar e a segurança da população, que se vêm sintetizando na expressão “qualidade de vida”. O artigo sob nossas vistas declara que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”. Veja-se que o objeto do direito de todos não é o meio ambiente em si, do direito é o meio ambiente qualificado. O direito que todos temos é à qualidade satisfatória, ao equilíbrio ecológico do meio ambiente. Essa qualidade é que se converteu em um bem jurídico. Isso é que a Constituição define como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Teremos que fazer especificações depois, mas, de um modo geral, pode-se dizer que tudo isso significa que esses atributos do meio ambiente não podem ser de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos pertençam a particulares.27 (grifo do autor). 27 SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 4ª. Edição. Editora Malheiros. 2007. p. 836837 Isso significa que o proprietário, quer seja ele pessoa física, jurídica ou ente público não pode dispor da qualidade do meio ambiente a seu bel-prazer, pois o mesmo é indisponível. Existem elementos físicos do meio ambiente que não são suscetíveis de apropriação privada, como o ar e a água, que isso, como a qualidade não são bens públicos nem particulares. São bens de interesse público, dotados de um regime jurídico especial, enquanto essencial à sadia qualidade de vida e vinculados, assim, a um fim de interesse coletivo. Diversas são as definições de meio ambiente, dentre elas pode-se citar a definição legal dada pela Lei Federal n. 6.938/81 é “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.”28 Importante fazer uma análise da abrangência da definição de meio ambiente, veja-se que aborda o conjunto de condições na esfera legal, influências de interações de ordem física (clima, tempo), química, biológica (aqui entende-se a fauna, flora, biodiversidade). A doutrinadora Cristiane Derani define meio ambiente como: Assim, meio ambiente deixa-se conceituar como um espaço onde se encontram recursos naturais, inclusive aqueles já reproduzidos (transformados) ou degenerados (poluídos), como no caso do meio ambiente urbano.29 Ressalta-se que o conceito de meio ambiente não se reduz somente a ar, terra, água, mas deve ser definido como o conjunto das condições de existência humana, o qual integra e influencia o relacionamento entre os homens, a natureza, sua saúde e o próprio desenvolvimento. Continua a doutrinadora Cristiane Derani: O conceito de meio ambiente deriva do movimento da natureza dentro da sociedade moderna: como recurso-elemento e como recurso-social. Sintetizando, este conceito, extremamente novo, tem sua base contemporânea relação social com a natureza. Justamente por refletir uma – dentre as inúmeras possíveis – relação com a natureza, seu conteúdo tornase tão pantanoso e turvo, à proporção que as sociedades tornam-se mais complexas e diferenciadas. A possível universalização do conceito de meio ambiente deve-se ao fato de que as sociedades contemporâneas estão, de certo modo, unificadas culturalmente, sobretudo motivadas pela unificação da produção (produção internacionalizada), o que nivela a cultura – e 28 Lei Federal n. 6.938/81, artigo 3º. Inciso I – Lei que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente. 29 DERANI, Cristiane.Direito Ambiental Econômico. 3ª. Edição 2008, 2ª. Tiragem 2009, Editora Saraiva, p. 52. logicamente o modo de relacionar-se com a natureza – das sociedades que integram o mercado mundial.30 Sobre o tema do meio ambiente também escreve André Ramos Tavares: O meio ambiente, no Brasil, há de ser preservado pelo Poder Público, por força de imposição constitucional. Há de estar contida na mencionada tutela a proteção de fauna e flora, sua manutenção e, pois, dos respectivos ecossistemas. Este comando constitucional legitima e obriga o Poder Público a editar legislação específica sobre o tema, normatizando, promovendo e participando da tutela do meio ambiente.31 (grifo do autor) O conceito de meio ambiente pode ser resumido como ponto de partida da sociedade contemporânea que a natureza é o recurso natural a ser apropriado pelo homem, e esse, é o sujeito apartado do objeto a ser apropriado, não se considerando dessa forma como natureza. Com essa preocupação de se garantir e positivar normas de proteção ao meio ambiente como um todo começou a surgir por todo o mundo legislação sobre o tema, inclusive passando a fazer parte dos textos constitucionais. Além da previsão constitucional, inúmeras são as leis específicas que se acumulam na tentativa de regulamentar o assunto. Deve ficar demonstrado que as normas de proteção do meio ambiente não se destinam necessariamente as modificações radicais da relação homem-natureza. Na grande maioria das vezes essas normas trazem prescrições de caráter quantitativo. Isto significa dizer que a preocupação dominante gira em torno do quanto de poluente, quanto de abstenção ou de exploração será fixado ou tutelado no texto legal. Conforme já mencionado anteriormente o conceito de meio ambiente e consequentemente sua proteção, só podem ser pensados e articulados dentro da base social onde se desenvolve a relação homem-natureza. A relação com o direito está na manutenção da ordem social e, por conseguinte, da ordem produtiva. Com isso busca-se a normatização do modo de apropriação dos recursos naturais e as diretrizes normativas que serão aplicadas. Eros Roberto Grau escreve: “Princípio da ordem econômica constitui também a defesa do meio ambiente (art.170, VI). Trata-se de princípio constitucional impositivo 30 DERANI, Cristiane.Direito Ambiental Econômico. 3ª. Edição 2008, 2ª. Tiragem 2009, Editora Saraiva, p.45 31 TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2ª. Edição. Editora Método. 2006. p. 188. (Canotilho), que cumpre dupla função, qual os anteriormente referidos. Assume também, assim, a feição de diretriz (Dworkin) – norma-objetivo – dotada de caráter constitucional conformador, justificando a reivindicação pela realização de políticas públicas. Também a esse princípio a Constituição desde logo, especialmente em seu artigo. 225 e parágrafos – mas também nos seus arts. 5º., LXXIII; 23, VI e VII; 24, VI e VIII; 129, III; 174, § 3º.; 200, VIII e 216, V – confere concreção. A Constituição, destarte, dá vigorosa resposta às correntes que propõem a exploração predatória dos recursos naturais, abroqueladas sobre o argumento, obscurantista, segundo o qual as preocupações com a defesa do meio ambiente envolvem proposta de “retorno à barbárie”. O Capítulo VI do seu Título VIII, embora integrado por um só artigo e seus parágrafos – justamente o art. 225 – é bastante avançado.”32 Especialmente sobre o tema do trabalho, resíduos sólidos, foi editada a Lei n. 12.305 de agosto de 2010, a qual instituiu a Política Nacional dos Resíduos Sólidos, dispondo sobre seus princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos aplicáveis. 2.1 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DA POLÍTICA AMBIENTAL A Constituição Federal de 1988 atribuiu ao Poder Público diversas obrigações, dentre elas o dever de preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e de prover o manejo ecológico das espécies e dos ecossistemas. O governo brasileiro manifestou o reconhecimento da necessidade de instituir políticas públicas em favor do processo de desenvolvimento. Porém, sobre o tema há um problema a ser enfrentado, como pode o Brasil sendo um país de economia emergente compor os índices de desenvolvimento humano preocupando-se com os recursos naturais? A questão acima suscitada pode ser respondida por Welber Barral e Gustavo Assed Ferreira: Analisando a evolução da gestão ambiental no Brasil, o poder público vem conduzindo a política ambiental exclusivamente por meio de instrumentos de controle e comando, seja na administração dos recursos naturais, ou mesmo no controle da poluição ambiental e no planejamento territorial. Trata-se de uma intervenção centralizada, regulamentadora e fiscalizadora. 32 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 13ª. Edição revista e atualizada. Malheiros Editores. 2008 p. 251-252. Todavia, estas políticas não têm se mostrado eficientes, notadamente porque o Estado costuma atuar de maneira seccionada e sem integração entre seus principais órgãos. Tanto na esfera da administração pública direta quanto na indireta a tomada de decisões ocorre de forma pouco integrada com os demais setores afins, Há uma notória divisão fragmentada da questão ambiental pelo poder público, o que torna o gerenciamento inócuo e até mesmo prejudicial, tanto para a questão ambiental quanto para a premência pelo desenvolvimento. 33 O que se verifica é que o Estado deve criar uma política pública ambiental, pela qual será possível criar um modelo de desenvolvimento sustentável. Com isso, o legislador quando da elaboração da Constituição Federal de 1988, acertadamente amplia a tutela aos recursos ambientais mediante previsões de posturas e condutas de caráter preventivo e reparatório, sempre com vistas à defesa dos direitos fundamentais da sociedade. Nos termos já referidos o texto constitucional ao trazer um capítulo específico para a proteção do meio ambiente, capítulo VI, dada a relevância do bem jurídico tutelado e a preocupação mundial sobre o meio ambiente, corroboram. Salienta Antonio Herman Benjamim: Firma-se também uma nova postura (= nova ética), através da qual a fria avaliação econômica dos recursos ambientais perde sua primazia exclusivista e individualista, uma vez que precisa ser, sempre, contrabalançada com a saúde dos cidadãos, as expectativas das futuras gerações, a manutenção das funções ecológicas, os efeitos a longo prazo da exploração. Muitos países, entre eles o Brasil, já ambientalizaram suas constituições. A nossa constituição, em matéria de meio ambiente, situa-se em posição pioneira, dotada que está de um dos sistemas mais abrangentes e atuais do mundo.34 Como pode ser auferido da determinação legal ora estudada ainda prevê que é dever do poder público e da coletividade defender e preservar o meio ambiente para a presente e futuras gerações. Isso evidencia que o sentido dado ao termo cooperação pelo legislador é o de que as normas criadas para a tutela ambiental e as políticas públicas implementadas sempre contemplem a participação e colaboração da sociedade em todas as decisões. Com isso pode-se dizer que as políticas públicas quando implementadas sempre deverão levar em consideração os aspectos sociais, ambientais e econômicos. 33 BARRAL, Welber; FERREIRA, Gustavo Assed. Direito Ambiental e Desenvolvimento. In: BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio (organizadores). Direito Ambiental e Desenvolvimento, Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006. p. 13-45. 34 BENJAMIM, Antonio Hermam. Meio Ambiente e Constituição: uma primeira abordagem. In:_____. 10 Anos da Eco-92: o direito e o desenvolvimento sustentável. São Paulo: IMESP, 2002, p. 101. Verifica-se ainda no referido artigo o caráter interdisciplinar do direito ambiental, na medida em que não se pretende apenas proteger o direito fundamental da geração presente, mas também de uma geração que ainda está por vir. Pode-se dizer que a idéia central é preservar o patrimônio natural hoje, principalmente levando-se em conta que se trata de recursos finitos, para que as gerações futuras possam ter o devido acesso a ele. No entanto, para isso é necessária uma postura intervencionista do Estado capaz de gerar, além de medidas que busquem resultados imediatos, voltadas para o presente e que envolvam o uso racional e adequado dos recursos naturais, um planejamento de atividades realizado com o intuito de garantir os interesses e o bem estar das gerações seguintes. Essa intervenção Estatal ocorre em razão das políticas públicas implementadas na área do meio ambiente, relacionando-se com todas as esferas da sociedade, não ficando restrita única e exclusivamente no ramo do direito, muito menos aos interesses individuais. Fernando Magalhães Modé afirma que: O tratamento das questões ambientais transcende a análise das necessidades individuais. Num contexto em que se compreende o desenvolvimento sustentável, tal transcendência ocorre também não apenas entre indivíduo e coletividade, mas entre coletividades. [...] está-se colocando como impositiva a equivalência entre as capacidades de desenvolvimento da geração presente, e das gerações futuras, que, por serem futuras, não se encontram presentes (dado o distanciamento temporal) para discutir suas necessidades e torná-las efetivas, tornando indispensável a presença do Estado como mediador desse processo.35 Em análise pode-se afirmar que o mesmo prescreve normas de conduta, destinadas a assegurar a efetividade do direito previsto e que ressaltam o dever de o Estado desenvolver políticas públicas voltadas à compatibilização do desenvolvimento econômico e do equilíbrio ambiental. Verifica-se nos parágrafos e incisos do artigo 225 da Constituição Federal que estão prescritas ações a serem desenvolvidas pelo poder público, sempre em busca da melhoria da qualidade de vida da população. Estas obrigações imputadas ao poder público compreendem basicamente, a proteção e manutenção dos ecossistemas mediante a adoção de programas governamentais de suporte e restauração, visando à garantia de sua integridade, ao uso sustentável dos recursos naturais a ser alcançado pelo ajuste de medidas que organizem a necessária exploração com o aumento da produção econômica e da riqueza social, à fixação de medidas preventivas e 35 MODÉ, Fernando Magalhães. Tributação Ambiental: a função do tributo na proteção do meio ambiente. Curitiba: Juruá, 2004, p. 46. compensatórias, além da responsabilização daqueles que causarem qualquer tipo de degradação. Outro ponto a destacar é que o artigo 170 da Constituição Federal, principalmente no que se refere aos fundamentos, aos objetivos e aos princípios da ordem econômica e financeira, está diretamente relacionado à política ambiental prevista no artigo 225. Até porque os princípios constitucionais devem ser aplicados de forma sistemática. Para tanto a Constituição Federal de 1988 criou as competências ambientais, com o intuito de disseminar em todas as esferas de poder do Estado a proteção ao meio ambiente. Esta sistematização foi feita através da divisão de competências e poderes entre União, Estados e Municípios. Lembrando-se sempre que essa divisão se deu com base nos princípios constitucionais. Importante entender a competência, e também é necessário salientar o que é este poder atribuído aos entes públicos separadamente. O poder é uma porção, parte, que a Constituição Federal outorga às suas entidades governamentais para assim compor e delimitar seu campo de atuação. Já a competência podese dizer que são as modalidades do poder a ser exercido com o propósito de realizar suas funções. A classificação que interessa para o trabalho é a classificação das competências ambientais. Pode-se dizer que a classificação dessas competências é feita sob dois prismas, primeiro em relação a seu aspecto e em relação à sua abrangência. Com relação ao seu aspecto, podem ser executivas, administrativas ou legislativas. As executivas determinam as diretrizes, estratégias ou políticas de exercer o poder relacionado ao meio ambiente. Já as administrativas, incidem sobre os aspectos de implementação e fiscalização das medidas protetivas e preventivas ao meio ambiente. É o caráter de polícia. Finalmente, as legislativas cuidam das possibilidades de cada ente para legislar sobre questões que dizem respeito ao assunto. Quanto à sua abrangência, podem ser exclusivas, privativas, comuns, concorrentes ou suplementares, dependendo a quem cabe o seu exercício. As exclusivas são aquelas inerentes a somente um ente, excluindo os demais. As privativas também têm caráter exclusivo, porém pode ter seu poder delegado a outro. É a suplementariedade. A competência comum, também classificada como cumulativa ou paralela, é aquela que é de dever de todos os entes, igualitariamente. Concorrente é quando diferentes entes podem definir de diversas formas a atuação quanto a um procedimento, sendo que a fixação da União é superior e, por isso, deve ser respeitada pelos demais entes. Por fim, a suplementar é a que permite que entes subsidiados ao ente maior (União) criem regras pormenores para preencher o que a União, propositalmente, não regulou. Escreve André Ramos Tavares sobre competência em matéria ambiental: Cumpre assinalar, inicialmente, que o art. 24 da Constituição dispõe a respeito das competências concorrentes das entidades federativas, enunciando em seu inc. VI que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre “VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição”. Está determinado no art. 225, em complementação, que: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. [...] A grande maioria, como se nota, é de atribuições materiais, dirigidas ao Poder Público, que tanto pode ser o federal como o estadual e o municipal ou distrital. É o que se depreende da leitura combinada desse dispositivo com o art. 23, VI.36 Continua em seu texto Heline Silvini Ferreira: Existe ainda uma outra divisão das competências levando em consideração como estão presentes na constituição. As enumeradas são aquelas que expressamente encontram-se no texto constitucional. Já as chamadas remanescentes são aquelas que não se encontram e que, justamente por esse fato, são "jogadas" de um ente para outro como se fosse um resíduo.37 Sobre as divisões de competência quanto a esfera da União, Estados, Municípios e ao Distrito Federal, ou seja, a competência executiva, deve-se discorrer sobre cada uma. A Constituição Federal em seu artigo 21, incisos IX, XVIII, XIX, XX e XXIII, indica quais são as competências executivas exclusivas da União. É importante ressaltar que em tais competências a União deve sempre observar com precisão a atuação do interesse nacional. De acordo com o texto constitucional é de competência executiva exclusiva da União elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social; planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e inundações; instituir um sistema nacional de 36 TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2ª. Edição. Editora Método. 2006. p. 188-189. 37 FERREIRA, Heline Silvini. Política Ambiental Constitucional. p. 260-289. gerenciamento de recursos híbridos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso; instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; e explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer o monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos princípios e condições estabelecidos pela própria Constituição. Já a competência legislativa privativa da União está prevista no artigo 22 da Constituição Feral e determina que a União deve legislar sobre águas e energia; jazidas, minas e outros recursos minerais; e atividades nucleares de qualquer natureza. No entanto, quando houver Lei Complementar que assim estabeleça, os Estados também poderão legislar sobre esses assuntos. Essa é a conhecida regra da delegação. Mesmo sendo dever da União zelar pelo meio ambiente, os Estados, Municípios e o Distrito Federal, como entes públicos, também devem se guiar pelo mesmo norte. A competência executiva exclusiva do Estado não é enumerada, a Constituição somente as faz com relação aos Municípios e a União. Dessa forma a competência que lhe sobra é a remanescente, ou seja, aquelas que não foram designadas para outro ente público. Assim sendo, toda matéria que não for de competência federal ou municipal será, de forma residual, competência estadual. Com relação à competência legislativa exclusiva sua aplicabilidade é igual a da competência executiva, ou seja, cabe ao Estado legislar sobre tudo aquilo que a Constituição não atribuiu aos Municípios ou à União. Em contrapartida aos Municípios são poucas as competências executivas exclusivas. Uma delas é promover o adequado ordenamento territorial, o que deve ser feito mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano. Essa competência é dividida com a da União de executar planos elaborados para a ordenação do território regional. É ainda dever do Município, proteger o patrimônio histórico-cultural local com observância da legislação e da ação fiscalizadora da União e dos Estados. A competência legislativa exclusiva dos Municípios está contida no artigo 30, inciso I da Constituição onde estabelece que é competência municipal legislar sobre assuntos de interesse local. Vladimir Freitas levanta alguns questionamentos: "(...) qual o assunto ambiental de interesse federal ou estadual que não interessa à comunidade? Então, raciocinando em sentido contrário, tudo é do interesse local e, portanto, da competência municipal?". 38 Levando-se em consideração essa interpretação, seria o município capaz de legislar sobre todos os assuntos ambientais que desse por importante. É evidente que não foi essa a intenção do dispositivo legal. Contudo, uma visão oposta também não é cabível. A competência do Município não pode ser excessivamente restrita. Aos Municípios ainda é imputada a competência legislativa suplementar, onde a Constituição possibilita aos Municípios preencher lacunas de normas estaduais ou federais ou adaptá-las ao contexto local. A suplementação envolve tanto o próprio caráter supletivo, que é o de erradicar as lacunas, como o complementar, que é o de detalhar as normas existentes. Pode-se dizer também que outro limite à competência legislativa suplementar municipal é que os mesmos podem criar normas sobre assuntos que não existem nas esferas superiores. 2.2 POLITICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS IMPLEMENTADAS POR MEIO DA LEI 12.305/2010 A função que o Estado desempenha em nossa sociedade sofreu inúmeras transformações ao passar do tempo. No século XVIII e XIX, seu principal objetivo era a segurança pública e a defesa externa em caso de ataque inimigo. Com a expansão da democracia, as responsabilidades do Estado se diversificaram. Atualmente, é comum afirmar que a função do Estado é promover o bem-estar da sociedade, porém, esse bem estar torna-se difícil de ser mensurado. O passar dos tempos e o acréscimo das responsabilidades ao Estado, o mesmo passou a ser cada vez mais provedor e intervencionista. Sobre essa necessidade, escreve Fernão Justen de Oliveira: Em outras palavras, o serviço público coloca-se dentre as atividades instrumentais concretas de natureza econômica (como a exploração de atividade econômica, a atividade regulatória e de fomento) pelas quais o Estado realiza os valores humanos fundamentais. O desenvolvimento econômico se conecta à satisfação desses valores fundamentais através da 38 FREITAS, Vladimir Passos de. A Constituição Federal e a efetividade das normas ambientais. p. 61-63. implementação de políticas públicas pelo Estado, cuja concepção, planejamento e aplicação subsumem-se ao regime consagrado explicitamente no art. 170 da Constituição.39 Para o Estado garantir esse bem-estar, necessita-se desenvolver uma série de ações e atuações em diferentes áreas, tais como saúde, educação e meio ambiente. Para atingir resultados em diversas áreas e promover o bem-estar da sociedade, os governos se utilizam das Políticas Públicas que podem ser definidas como um conjunto de ações e decisões governamentais, voltadas para a solução de problemas da sociedade. Embora não haja um único significado para definir políticas públicas, escreve Thiago Lima Breus: [...] um conceito amplo às políticas públicas, como sendo o principal mecanismo de ação estatal com vistas à realização dos direitos sociais, econômicos e culturais, significa tomá-las como um veículo privilegiado de realização desses direitos, tendo em vista serem eles os fins do Estado Constitucional.40 Também escreve Guilherme Amorim Campos da Silva: De início, cumpre revelarmos nossa definição de política pública, como sendo o instrumento de ação do Estado e de seus poderes constituídos, em especial o Executivo e o Legislativo, de caráter vinculativo e obrigatório, que deve permitir divisar as etapas de concreção dos programas políticos constitucionais voltados à realização dos fins da República e do Estado Democrático de Direito, passíveis de exame de mérito pelo Poder Judiciário.41 Em outras palavras, são a totalidade de ações, metas e planos que os governos (nacionais, estaduais ou municipais) traçam para alcançar o bem-estar da sociedade e o interesse público. A estrutura em questão sobre as políticas públicas está no fato que essa forma de atuação estatal, que relaciona o aspecto político e exige participação popular, propicia o exercício efetivo da cidadania e possibilita a realização dos fins delineados do Estado Constitucional. 39 OLIVEIRA, Fernão Justen de. Parceria público-privada: aspectos de direito público econômico (Lei n. 11.079/2004) Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 36 40 BREUS, Thiago Lima. Políticas Públicas no Estado Constitucional – Problemática da concretização dos Direitos Fundamentais pela Administração Pública brasileira contemporânea. Ed Fórum. 2007. 1ª. Ed. p. 204. 41 SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004. p. 104. Esse modelo de ação estatal, a qual integra a participação popular na tomada da decisão política tem referência na Constituição Federal de 1988, que buscou promover uma descentralização do Poder-Público e a promoção de uma regulação social das políticas, com o escopo de possibilitar a interação entre a sociedade e o Poder Público, quer seja no planejamento, no monitoramento e na avaliação das políticas públicas. As ações que os dirigentes públicos (os governantes ou os tomadores de decisões) selecionam (como sendo suas prioridades) são aquelas que eles entendem serem as demandas ou expectativas da sociedade, ou seja, o bem-estar da sociedade é sempre definido pelo governo e não pela sociedade. Isso ocorre porque a sociedade não consegue se expressar de forma integral. A forma com que a sociedade expressa suas necessidades no modelo de governo atual se dá por meio de solicitações (pedidos ou demandas) para os seus representantes (poder legislativo) e estes mobilizam os membros do Poder Executivo, que também foram eleitos (tais como prefeitos, governadores e inclusive o próprio Presidente da República) para que atendam as demandas da população. As demandas da sociedade são apresentadas aos dirigentes públicos por meio de grupos organizados, no que se denomina de Sociedade Civil Organizada (SCO), a qual inclui, conforme apontado acima, sindicatos, entidades de representação empresarial, associações de moradores, associações patronais e ONGs em geral. As sociedades se caracterizam pela diversidade, tanto em termos de idade, religião, etnia, língua, renda, profissão, como de idéias, valores, interesses e aspirações. Dessa forma os recursos para atender a todas as demandas da sociedade e seus diversos grupos (a SCO) são limitados ou escassos. Portanto os bens e serviços públicos desejados pelos diversos indivíduos se transformam em motivo de disputa, haja vista que o que é disponibilizado não é suficiente para todos. Em razão da necessidade e demanda que os indivíduos passam a se organizar para conseguirem algum progresso e implementação de Políticas Públicas que realmente atendam as suas necessidades. Essa possibilidade de implementar os fins públicos do Estado por meio do mecanismo das políticas públicas, além de permitir a participação social, também diminui a crise de legitimidade estatal, tendo em vista que muitas vezes com a expansão do Estado e realizando medidas com decisões unilaterais, acabam por afastar a participação democrática. Escreve Thiago Lima Breus: As políticas públicas, nessa linha, apresentam-se como um mecanismo efetivo de gestão pública. Na atualidade, porém, as políticas públicas, ainda que utilizadas como um dos principais instrumentos da ação estatal, não são realizadas de forma convergente, integrada e articulada a fim de realizar os Direitos Fundamentais e os objetivos da República. E isso não apenas porque há uma pluralidade de formas de políticas públicas, desde políticas distributivas, políticas redistributivas, políticas regulatórias e políticas constitutivas, mas porque é necessária uma alteração no padrão das políticas públicas que precisam atuar de forma mais agregada e unificada, com vistas a promover o desenvolvimento social. 42(grifo do autor). Fica demonstrado que quem elabora as políticas públicas é o próprio governo com a participação da sociedade na sua maioria das vezes, ao menos esse seria o modelo mais adequado. Já a execução será responsabilidade do governo, pois por meio deste será possível implementar, executar e conferir os meios necessários para tanto. Sobre o tema estudado no presente trabalho o que interessa é a Política Pública na área Ambiental em especial àquelas voltadas para os resíduos sólidos urbanos, na qual podem ser inseridas diversas políticas públicas para que se consiga atingir as metas ambientais impostas e exigidas por lei. José Carlos Barbieri conceitua política pública ambiental e seus instrumentos de ação como sendo: O conjunto de objetivos, diretrizes e instrumentos de ação que o poder público dispõe para produzir efeitos desejáveis sobre o meio ambiente [...] Esses instrumentos pode ser explícitos ou implícitos. Os primeiros são criados para alcançar efeitos ambientais benéficos específicos, enquanto os segundos alcançam tais efeitos pela via indireta, pois não foram criados para isso. Por exemplo, uma lei para ordenar o trânsito de veículos numa grande cidade e evitar congestionamentos, acabará indiretamente melhorando a qualidade do ar, reduzindo o nível de ruído e a utilização de recursos, pois os veículos podem trafegar com marchas mais leves. Investimentos em educação tornam as pessoas mais conscientes dos problemas ambientais.43 Os instrumentos de políticas públicas ambientais são classificados em três grupos, quais sejam: os de comando e controle, os econômicos e outros de acordo com a classificação de José Carlos Barbieri44. No grupo de comando e controle podem ser classificadas levando42 BREUS, Thiago Lima. Políticas Públicas no Estado Constitucional – Problemática da concretização dos Direitos Fundamentais pela Administração Pública brasileira contemporânea. Editora Fórum. 2007. 1ª. Edição. p. 207-208. 43 BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 71-72. 44 BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007 p. 73-75. se em consideração o padrão de emissão de poluentes, de qualidade, de desempenho, padrões tecnológicos, proibições e restrições sobre produção, comercialização e uso de produtos e processos, licenciamento e zoneamento ambiental e estudo prévio de impacto ambiental. No grupo econômico podem ser classificadas como tributação sobre poluição, tributação sobre uso de recursos naturais, incentivos fiscais para reduzir emissões e conservar recursos, remuneração pela conservação de serviços ambientais, financiamentos em condições especiais, criação e sustentação de mercados de produtos ambientalmente saudáveis, permissões negociáveis, sistema de depósito-retorno e poder de compra do Estado. Também no grupo de outros como mencionado as políticas publicas ambientais podem ser classificadas como sendo de apoio ao desenvolvimento, educação ambiental, unidades de conservação e apoio ao público. Ainda, segundo José Carlos Barbiere, os instrumentos de comando traduzidos por padrões de emissão, qualidade, desempenho, são vinculados às normas enquanto o de controle é associado aos órgãos fiscalizadores, impondo limites ao uso dos recursos naturais. As suas espécies são definidas como: - Padrões de qualidade ambiental – referem-se a um dado entorno ou segmento do meio ambiente. - Padrões de emissão – dizem respeito à emissão de poluentes individualizados por fontes (veículos, embarcações, fábricas etc), estabelecendo uma quantidade aceitável de cada qual dos poluentes. - Padrões de desempenho – demonstram cumprimento das obrigações ambientais dentro da normatização de cada caso. - Padrões tecnológicos – definido de acordo com as fontes utilizadas, como máquinas, ferramentas, elementos físicos etc. - Proibições de produtos – referem-se aos chamados banimentos da produção, comercialização e uso de produtos. - Licenciamento ambiental, Zoneamento ambiental e Estudo prévio de impacto ambiental – trazem restrições ao uso da propriedade, por estabelecer categorias de zonas destinadas à instalação de unidades produtivas, com estudo dos impactos que serão eventualmente trazidos ao meio ambiente.45 Por sua vez os instrumentos econômicos, têm por escopo determinar a mudança de comportamento das pessoas e das organizações quer públicas ou privadas traz em seu contexto princípios como o do poluidor-pagador, determinante para que aquele que polui deve pagar pela poluição gerada por suas atividades. É a forma encontrada para que as 45 Ibidem, p. 73. organizações desestimulem-se em poluir ou praticar atos que importem em degradação ambiental. O terceiro grupo denominado de instrumentos de políticas públicas outros, traz a presença do Estado em apoio à iniciativa privada visando o desenvolvimento econômico sustentável, sem se dissociar da educação ambiental com informações ao público. 2.2.1 A origem da Política Nacional de Resíduos Sólidos A Política Nacional de Resíduos Sólidos foi instituída pela Lei nº 12.305 de 02 de agosto de 2010, recentemente regulamentada pelo Decreto nº 7.404, em 23 de Dezembro de 2010. A origem do problema que levou a criação dessa política e da própria lei é o fato de que é crescente a preocupação de toda a sociedade contemporânea com o crescimento da geração dos resíduos sólidos urbanos. Os efeitos negativos, sobretudo os ambientais causados pelos resíduos sólidos e pela sua disposição inadequada, são motivos para que todos desde o cidadão comum até o formulador de políticas públicas busquem alternativas ajustadas à realidade atual. Alguns fatores, em especial, o aparecimento de grandes cidades, o aumento populacional, o consumo exponencial na busca de satisfação de desejos humanos ilimitados e a corrida do setor produtivo para atendê-lo, têm gerado cada vez mais resíduos inerentes à produção e ao consumo. A quantidade de resíduos sólidos tem sido superior à capacidade que o próprio ambiente tem de absorver ou diluir. O acúmulo de resíduos sólidos tem efeitos negativos diretos e indiretos tanto sobre a saúde humana quanto sobre a resiliência do meio ambiente, a exemplo da contaminação dos lençóis freáticos pela deposição do chorume, a infestação de ratos e baratas, a coleta de alimentos deteriorados para alimentação de populações economicamente necessitadas, alagamentos, mau cheiro, etc.46 No Brasil esses efeitos são ainda mais graves, haja vista não existir uma gestão eficaz e eficiente desses resíduos. Segundo pesquisa realizada por Teixeira, Murilo e Marques, Telma Maria47, verifica-se que no ano de 1989, indicadores nacionais mostraram que 78% da 46 DEON SETTE, Marli T. Direito ambiental. Coordenadores: Marcelo Magalhães Peixoto e Sérgio Augusto Zampol Pavani. Coleção Didática jurídica, São Paulo: MP Ed., 2009, p. 575 47 TEIXEIRA, Murilo e MARQUES, Telma Maria. Perspectivas De Reciclagem Para A Preservação Ambiental Sustentavel. Trabalho realizado durante o curso de Mestrado em Sistema de Gestão, Laboratório de população urbana brasileira tinham acesso ao serviço de coleta de lixo. Todavia, 50% dos resíduos coletados foram depositados em lixões ou vazadouros a céu aberto, ou áreas alagadas, sem qualquer cuidado ou obediência à regras e leis para evitar a contaminação. Os 50% restantes receberam algum tipo de tratamento, sendo que 22% foram encaminhados a aterros controlados e 23% a aterros sanitários. Uma pequena parcela dos resíduos foi objeto de compostagem ou reciclagem. Se for considerada a soma dos resíduos dispostos em aterro controlado e em vazadouros a céu aberto, verifica-se que 72% do lixo coletado foram dispostos sem controle sanitário e ambiental. A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, realizada em 1991 pela Fundação Nacional de Saúde, demonstrou que eram geradas diariamente 241 mil toneladas de resíduos sólidos, das quais 130 mil eram domiciliares e os restantes 111 mil eram industriais, de serviços de saúde, comerciais e públicos. Deste total, 76% eram dispostos a céu aberto e apenas 24% recebiam tratamento adequado (13% iam para aterros controlados, 10% para aterros sanitários, 0,9% para usinas de compostagem e 0,1% para usinas de incineração). Essa realidade ficou ainda mais preocupante nos quase vinte anos desde a realização da Pesquisa. Atualmente mais da metade dos municípios brasileiros abandona o lixo a céu aberto. O Projeto de Lei que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos - PNRS fundamentou suas justificativas com a informação de que indicadores oficiais mostram que no ano 2000, cerca de 60% dos resíduos coletados foram depositados inadequadamente em lixões, 17% em aterros controlados e 13% em aterros sanitários. Além disso, afirmou que em uma década houve um aumento de cerca de 12% dos resíduos dispostos inadequadamente no solo. Em 2009, o Ministério do Meio Ambiente constatou que no Brasil, cerca de 97% do lixo eram coletados das residências. Todavia, quase 60% dos municípios depositavam seus resíduos em lixões e apenas pouco mais de 15% depositavam-nos em aterros sanitários controlados. Outro dado relevante do Projeto de Lei que Instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos diz respeito à presença de catadores nas áreas de disposição final. Eles somavam cerca de 25.000 em 2000, dos quais 22,3% tinham até 14 anos de idade. É de se mencionar que além desses, existiam ainda os catadores nas ruas das grandes cidades brasileiras.48 Tecnologia, Gestão de Negócios e Meio Ambiente – LATEC – da Universidade Federal Fluminense, localizado no dia 05.08.2011, no endereço eletrônico http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:N2Nvdf1oY3gJ:www.aedb.br/seget/artigos04/140_RE CICLAGEM%2520DE%2520PET%2520NO%2520BRASIL.doc+QUANTIDADE+DE+LIXO+DEPOSITADO 48 BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Ações do MMA para os municípios. Coordenação Ronie Lima, Projeto Gráfico Rodrigo Braga, Edição e redação Daniela Mendes e Suelen Gusmão e Assistência de Produção Desta feita verifica-se, historicamente, que há um descaso no Brasil com o tratamento dos resíduos sólidos, desde a coleta até a disposição final. Em razão desse descaso tem-se alagamentos, inundações, condições desumanas de sobrevivência dos catadores. Os efeitos indiretos também parecem ser ignorados, apesar de significativos: vetores de doenças, doenças decorrentes de alimentação e contato dos catadores com os resíduos, entre outros. Esses efeitos diretos e indiretos têm gerado enormes dispêndios financeiros, sociais e emocionais, sem falar, nos problemas ambientais, tais como poluição por chorume, poluição de águas, cheiro, uso desregrado de recursos ambientais, para mencionar apenas os mais importantes. É indiscutível a necessidade de alternativas que sejam capazes de suportar e dar o tratamento adequado a todos os resíduos gerados. 2.2.2 Princípios Norteadores da Política Nacional de Resíduos Sólidos Para se destacar os princípios norteadores da Lei n. 12.305/2010 é importante trazer o conceito e definição de princípio. Segundo o escritor Ricardo Luiz Lorenzetti ao destacar que se pode conceituar princípio como “uma regra geral e abstrata que se obtém indutivamente, extraindo o essencial de normas particulares, ou como uma regra geral preexistente”. 49 Cabe lembrar ainda que a palavra “princípio”, em sua raiz latina última, significa “aquilo que se torna primeiro” (primum capere), designado início, começo, ponto de partida e segundo José Cretella Júnior, princípios de uma ciência são “as proposições básicas, fundamentais, típicas, que condicionam todas as estruturas subseqüentes”50. Pode ser conceituada como alicerce, a base ou o fundamento de alguma coisa, tendo o sentido de aquilo que se torna primeiro. Exercendo função extremamente importante frente às outras fontes do Direito porque, conforme disposto em artigo por Talden Farias51, além de incidir como regra de aplicação do Direito no caso prático, também influencia na produção das demais fontes do Direito, ou seja, é com base nos princípios jurídicos que são feitas as Paula Ramos e Rebecca Celso.Brasília, DF. Assessoria de Comunicação, 2009. p.10-13. texto Disponível emhttp://www.mma.gov.br/estruturas/182/_arquivos/cartilha_182.pdf Acesso em 10 mar. 2011. 49 LORENZETTI, Ricardo Luis. Fundamentos do direito privado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998. p. 312. 50 CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. vol. I, p.129. 51 FARIAS, Talden: Princípios gerais do direito ambiental. Prim@facie – ano 5, n. 9, jul/dez. 2006, p. 126-148. Disponível em: www.direito.ufop.br/dep/~carlos/Principios%20de%20Direito%20Ambiental.pdf. Acesso em 01 fev. 2011. leis, a jurisprudência, a doutrina ou tratados e convenções internacionais, já que eles traduzem os valores mais essenciais da Ciência Jurídica. Os princípios ambientais têm como função a interpretação das normas legais, sua integração e harmonização do sistema jurídico e de aplicação ao caso concreto. Ressalta-se que referidos princípios “[...] trazem recomendações e não normas específicas de efeito vinculante e coercitivo, elas são fontes de direito internacional, na medida em que constituem diretrizes a serem observadas pelos Estados nos tratos das questões pertinentes.”52 Antônio Herman de Vasconcellos53 aponta as quatro principais funções dos princípios do Direito Ambiental no tocante a sua compreensão e aplicação: a) são os princípios que permitem compreender a autonomia do Direito Ambiental em face dos outros ramos do Direito; b) são os princípios que auxiliam no entendimento e na identificação da unidade e coerência existentes entre todas as normas jurídicas que compõem o sistema legislativo ambiental; c) é dos princípios que se extraem as diretrizes básicas que permitem compreender a forma pela qual a proteção do meio ambiente é vista na sociedade; d) e, finalmente, são os princípios que servem de critério básico e inafastável para a exata inteligência e interpretação de todas as normas que compõem o sistema jurídico ambiental, condição indispensável para a boa aplicação do Direito nessa área. O direito ambiental é norteado por vários princípios gerais, que têm seu foco na sustentabilidade do meio ambiente. A lei da PNRS, além de respeitar os princípios gerais, traça alguns específicos. Antes de adentrar nos princípios específicos, importante discorrer sobre os princípios gerais do direito ambiental de forma objetiva. Para isso se adota os princípios elencados pela maioria dos doutrinadores, dentre eles Edis Milaré54 cujos são os mais completos. O Princípio do Ambiente Ecologicamente Equilibrado como direito fundamental da pessoa humana, o qual a par dos direitos e deveres individuais e coletivos elencados no art. 5º., acrescentou o legislador constituinte, no caput do art. 225, um novo direito fundamental da pessoa humana, direcionando ao desfrute e usufruto de adequadas condições de vida na terra, ou seja, em um ambiente saudável ou ecologicamente equilibrado. Sem dúvida o princípio transcendental de todo o ordenamento jurídico ambiental, ostentando, no entendimento do autor o status de verdadeira cláusula pétrea. 52 DANTAS, Marcelo Buzaglo. LEITE, José Rubens Morato. Aspectos processuais do direito ambiental. Editora Forense Universitária: Rio de Janeiro, 2010, p. 28. 53 Apud MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Princípios fundamentais do direito ambiental. Revista de Direito Ambiental, ano 1, n. 2, abr/jun. 1996, p. 52. 54 MILARÉ, Edis. Direito ao Ambiente. Revista do Tribunais. 3ª. Edição Revista e Atualizada 2004. p. 136-152 Segundo o próprio autor Edis Milaré veja-se: O reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio configura-se, na verdade, como extensão do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer tanto ao aspecto da dignidade dessa existência – a qualidade de vida - , que faz com que valha a pena viver.55 O Princípio da Natureza Pública da Proteção Ambiental decorre da previsão legal que considera o meio ambiente como um valor a ser necessariamente assegurado e protegido para uso de todos, ou ainda como alguns doutrinadores dizem para fruição humana coletiva. Pode dizer com isso que o reconhecimento do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado não resulta nenhuma prerrogativa privada, mas apenas na fruição em comum e solidária do mesmo ambiente com todos os seus bens. Ainda para o autor o princípio em exame mantém estreita vinculação com princípio geral de Direito Público (da primazia do interesse público) juntamente com o princípio do Direito Administrativo (da indisponibilidade do interesse público). Isso ocorre pelo fato do interesse da proteção do meio ambiente, por ser de natureza pública, deve sempre prevalecer sobre os direitos individuais privados. Na Constituição Federal de 1988 encontra-se no artigo 227 menção que remete à esse Princípio, veja-se: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.56 O Princípio do Controle do Poluidor pelo Poder Público resulta das intervenções necessárias à manutenção, preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente que o Poder Público realiza. As ações dos órgãos e entidades públicas se concretizam por meio do exercício do poder de polícia administrativa, ou seja, a faculdade inerente à administração pública de limitar o exercício dos direitos individuais, visando sempre assegurar o bem-estar da coletividade. 55 MILARÉ, Edis. Direito ao Ambiente. Revista do Tribunais. 3ª. Edição Revista e Atualizada 2004. p. 158-159. 56 BRASIL, Constituição Federal de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 13 mar. 2011. No Brasil esse princípio encontra respaldo em vários pontos da lei ordinária como exemplo o artigo 5º., § 6º., da Lei 7.347/85 e na própria Constituição Federal de 1988 no artigo 225, § 1º. V. Importante também o Princípio da Consideração da Variável Ambiental no Processo Decisório de Políticas de Desenvolvimento, que consiste na elementar obrigação de se levar em conta a variável ambiental em qualquer ação ou decisão, quer seja ela pública ou privada, que possa causar algum impacto negativo sobre o meio. Esse princípio tem ligação direta com a questão do desenvolvimento econômico, uma vez que não pode se prezar somente a questão da geração de riquezas, somente voltado para o crescimento. Não sendo exclusivo do Direito Ambiental tem-se o Princípio da Participação Comunitária, o qual expressa a idéia que para a resolução de problemas do ambiente deve haver uma cooperação mútua entre Estado e a sociedade, por meio da participação de diferentes grupos sociais na formulação e na execução da política ambiental. Seguindo esse raciocínio e ciente do monopólio da gestão e do poder de polícia ambiental em mãos do Poder Público não tem evitado o abuso ecológico, a Constituição Federal de 1988 traz em seu texto mecanismos capazes de assegurar à cidadania o pleno exercício desses direitos relativos à qualidade do meio e aos recursos ambientais (artigo 5º., XIV, XXXIII, XXXIV, LXXI, LXXIII, artigo 129, III e § 1º., artigos 220, 225, § 1º., VI e outros). O Princípio do Poluidor-Pagador aqui assenta-se a vocação redistributiva do Direito Ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo precisam ser internalizados. Isso quer dizer que se busca imputar ao poluidor o custo social da poluição por ele gerada, engendrando um mecanismo de responsabilidade por dano ecológico abrangente dos efeitos da poluição não somente sobre bens e pessoas, mas sobre toda a natureza, em termos econômicos seria a internalização dos custos externos. Veja-se o que escreve Danny Monteiro da Silva: [...] não se trata apenas de um instituto que objetiva a compensação dos danos causados pela deterioração, não se resumindo na fórmula “poluiu, pagou”. Seu alcance é mais amplo, incluindo os custos de prevenção, reparação e repressão do dano ambiental.57 Importante evidenciar que esse princípio não se traduz em uma autorização para poluir, mas sim na imposição de um custo ou indenização é a conseqüência do dano causado 57 SILVA, Danny Monteiro da. Dano ambiental e sua reparação. 1ª. Ed. Curitiba: Juruá, 2009. p. 69. ao meio ambiente. O objetivo desse princípio é a busca de instrumentos capazes de racionalizar o uso de um bem ecológico, primando sempre pelo combate a degradação do meio ambiente e seus recursos naturais. O Princípio da Prevenção ou Princípio da Precaução é basilar para o Direito Ambiental, concernindo à prioridade de que deve ser dada às medidas que evitem o nascimento de atentados ao ambiente, de modo a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade58. A tal ponto a idéia de prevenção se tornou importante que a Conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente e desenvolvimento realizada em 1.992 na cidade do Rio de Janeiro, adotou, em sua declaração de princípios o denominado princípio da precaução. Princípio 15 Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.59 Em análise e cumprimento à esse princípio, os Estados devem tomar medidas urgentes e eficazes para antecipar, prevenir e combater, na origem, as causas da degradação ambiental. O Princípio da Função Socioambiental da Propriedade trata que apesar da propriedade de sido considerada como direito fundamental, não é ilimitada e intangível, isso quer dizer que a propriedade deve ter seu uso condicionado ao bem estar social. Isso quer dizer que a propriedade não ostenta mais a concepção individualista do Código Civil de 1916, o qual foi direcionado a uma sociedade rural e agrária, com a maior parte da população vivendo no campo. Atualmente com o domínio de uma sociedade urbana aberta aos imperativos da socialização do progresso, afirma-se cada vez mais forte o seu sentido social, tornando-se não um instrumento de ambição e desunião dos homens, mas fator de progresso, desenvolvimento e bem estar de todos, o que na legislação contemporânea está previsto na Constituição Federal de 1988 no artigo 5º., XXII e XXIII. Dessa forma verifica-se que a propriedade privada tem uma função social, na verdade ao proprietário se impõe o dever de exercer o seu direito de propriedade, não mais unicamente 58 MILARÉ, Edis. Direito ao Ambiente. Revista do Tribunais. 3ª. Edição Revista e Atualizada 2004. p. 136-152. 59 Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em: http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/31/Documentos/Declara%C3%A7%C3%A3o%20do%20RJ %20sobre%20meio%20ambiente%20e%20desenvolvimento%20-%201992.pdf. Acesso em: 13 mar. 2011. em seu próprio e exclusivo interesse, mas em benefício da coletividade, sendo precisamente o cumprimento da função social que legitima o exercício do direito de propriedade pelo seu titular. O Princípio do Direito ao Desenvolvimento Sustentável infere-se na necessidade de um duplo ordenamento, com profundas raízes no Direito Natural e no Direito Positivo: o direito do ser humano de desenvolver-se e realizar as suas potencialidades, individual ou socialmente,e o direito de assegurar aos seus próximos as mesmas condições favoráveis.60 Nesse princípio dentre todos pode-se dizer que é o que contém mais evidente a reciprocidade entre direito e dever, porquanto o desenvolver-se e usufruir de um planeta plenamente habitável não é apenas direito, é dever precípuo das pessoas e da sociedade. No Brasil a introdução deu-se primeiramente por ocasião do estabelecimento de diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição pela Lei 6.803 de 02/07/1980. A preocupação com o desenvolvimento sustentável aparece logo no artigo 1º. desse diploma o qual traz “Nas áreas críticas de poluição (...) as zonas destinadas à instalação de indústrias serão definidas em esquema de zoneamento urbano, aprovado por lei, que compatibilize as atividades industriais com a proteção ambiental”. Mais adiante atendendo essa nova ordem, veio o conceito a ser instrumentalizado sob a forma de uma Política Nacional do Meio Ambiente, a qual elegeu primordialmente, a avaliação dos impactos ambientais como meio de preservar os processos ecológicos essenciais. De cunho internacional o Princípio da Cooperação Entre os Povos estabelecido na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 4º., IX, sugere que o princípio das relações internacionais da República Federativa do Brasil a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade. Uma das áreas de interdependência entre as nações é a relacionada com a proteção do meio ambiente, uma vez que as agressões a ele infligidas nem sempre se circunscrevem aos limites territoriais de um único país. Após a explanação sobre os Princípios que regem o Direito Ambiental passa-se agora a discorrer sobre os Princípios específicos arrolados na Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, os quais estão contidos no artigo 6º., incisos I a XI da Lei 12.305 de 2010 o segue: Art. 6o São princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos: I - a prevenção e a precaução; II - o poluidor-pagador e o protetor-recebedor; 60 MILARÉ, Edis. Direito ao Ambiente. Revista do Tribunais. 3ª. Edição Revista e Atualizada 2004. p. 136-152. III - a visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública; IV - o desenvolvimento sustentável; V - a ecoeficiência, mediante a compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta; VI - a cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade; VII - a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; VIII - o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania; IX - o respeito às diversidades locais e regionais; X - o direito da sociedade à informação e ao controle social; XI - a razoabilidade e a proporcionalidade. Para fazer uma explanação sobre esses princípios veja-se o que escrevem alguns doutrinadores O Principio da Prevenção impõe ao empreendedor a obrigação de tomar medidas que possam evitar ou minimizar a ocorrência de dano ambiental, utilizando medidas mitigadoras e preventivas. Tem na sua essência a idéia de “agir antecipadamente” e, para tanto, é necessário que o empreendedor tenha conhecimento do que sua atividade pode causar para poder prevenir. 61 O Princípio da Precaução sugere cautela, pois prega que, se nos estudos realizados para desenvolver determinada atividade, não se consegue obter conhecimento suficiente sobre os efeitos que a atividade possa causar ao ambiente, deve-se evitar o seu desenvolvimento. Diferencia-se do Princípio da Prevenção, pois naquele busca-se minimizar os efeitos e, nesse, evita-se a implementação da atividade. 62 Ainda, apesar de já mencionado nos princípios gerais do direito ambiental, novamente aparece o Princípio do Poluidor-pagador o qual dispõe que as pessoas naturais ou jurídicas, sejam regidas pelo direito público ou pelo direito privado, devem pagar os custos das medidas que sejam necessárias para eliminar a contaminação ou para reduzí-la ao limite fixado pelos padrões ou medidas equivalentes que assegurem a qualidade de vida, inclusive os fixados pelo Poder Público competente. 61 DEON SETTE, Maria Terezinha, NOGUEIRA, Jorge Madeira. Política Nacional de Resíduos Sólidos – Uma avaliação inicial acerca dos aspectos jurídicos e econômicos. Artigo publicado no endereço eletrônico <http://pt.scribd.com/doc/48461738/Politica-Nacional-Residuos-Solidos-02082010> acesso em 08 ago. 2011. 62 Ibidem. O Princípio do Poluidor-pagador busca evitar a ocorrência de danos ambientais, na medida em que atua como estimulante negativo ao poluidor do meio ambiente e o faz agindo com cunho preventivo – quando internaliza as externalidades, e repressivo – quando determina a responsabilidade civil de reparar o dano, independentemente da apuração da culpa, preferencialmente devolvendo o statu quo ante e, em não sendo isso possível, indenizando. O Princípio do Protetor-recebedor sugere que aquele agente público ou privado que protege um bem natural em benefício da comunidade deve receber uma compensação financeira como incentivo pelo serviço de proteção ambiental prestado. 63 Trata-se de um fundamento da ação ambiental que pode ser considerado o avesso do princípio usuário-pagador, que postula que aquele que usa um determinado recurso da natureza deve pagar por tal utilização. Sua aplicação destina-se à justiça econômica, valorizando os serviços ambientais prestados generosamente por uma população ou sociedade, e remunerando economicamente essa prestação de serviços porque, se tem valor econômico, é justo que se receba por ela. O Princípio da Visão Sistêmica na Gestão dos Resíduos Sólidos a visão sistêmica consiste na habilidade em ter o conhecimento do sistema como um todo, com ciência dos conceitos e características de cada parte, de modo a permitir a análise e/ou a interferência no todo. Especificamente, no caso dos resíduos sólidos, o todo é o conjunto de “resíduos” e as partes, também chamadas variáveis, são a ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e saúde pública. A problemática ambiental de um país subdesenvolvido é totalmente diferente da que existe nos países desenvolvidos. Neste contexto a gestão dos resíduos sólidos todas as variáveis devem ser abordadas para o sucesso da implementação do projeto, estudando minuciosamente os aspectos do grupo ao qual será direcionado o mesmo. A mudança do comportamento do consumidor é um processo que requer sensibilização e mobilização social, sendo a educação fundamental desse processo. Dar preferência a produtos de empresas que têm uma clara preocupação com o meio ambiente, não compactuar com a ilegalidade, não consumir de forma a prejudicar as gerações futuras, sempre pautado na consciência e educação do consumidor, todavia, conforme também já 63 DEON SETTE, Maria Terezinha, NOGUEIRA, Jorge Madeira. Política Nacional de Resíduos Sólidos – Uma avaliação inicial acerca dos aspectos jurídicos e econômicos. Artigo publicado no endereço eletrônico <http://pt.scribd.com/doc/48461738/Politica-Nacional-Residuos-Solidos-02082010> acesso em 08 ago. 2011. mencionado toda essa mudança implica em custos de produção agregados ao produto que nem sempre o consumidor está disposto a pagar. O Princípio do Desenvolvimento Sustentável visa à racionalização na utilização dos recursos naturais renováveis e não renováveis, com vistas a harmonizar a antiga idéia da existência de dicotomia entre “crescimento e meio ambiente”, buscando realizar trade-offs eficientes. O conteúdo desse princípio é a manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens, e desses com o meio ambiente, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição. Princípio da Ecoeficiência prima pela busca simultânea da eficiência da produção e descarte dos bens necessários a uma boa qualidade de vida e a observados valores ecológicos. Dito de outra forma, o princípio busca a compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida com o consumo de recursos naturais a um nível equivalente à capacidade de sustentação do planeta, reduzindo-se os impactos ambientais. 64 Também tem-se o Princípio da Cooperação Entre as Diferentes Esferas do Poder Público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade o qual significa um trabalho concatenado e em cadeia entre a União, Estados, Distrito Federal, Municípios, setor empresarial e demais segmentos da sociedade, com o fim de cooperar técnico e financeiramente entre si para a gestão integrada de resíduos sólidos, com vistas à elevação das escalas de aproveitamento, diminuição de rejeitos e, concomitantemente, redução dos custos envolvidos. Um dos mais importantes é o Princípio da Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida dos Produtos o qual consiste em estruturar um conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores e titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, com vistas a minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos. 65 O Princípio do Reconhecimento do Resíduo Sólido Reutilizável e Reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania tem 64 DEON SETTE, Maria Terezinha, NOGUEIRA, Jorge Madeira. Política Nacional de Resíduos Sólidos – Uma avaliação inicial acerca dos aspectos jurídicos e econômicos. Artigo publicado no endereço eletrônico <http://pt.scribd.com/doc/48461738/Politica-Nacional-Residuos-Solidos-02082010> acesso em 08 ago. 2011. 65 Ibidem. como finalidade dotar de valor econômico, ou seja, atribuir preço aos resíduos sólidos passíveis de reutilização ou de reciclagem, com vistas a reaproveitar os recursos disponíveis nos resíduos sólidos e, conseqüentemente, economizar recursos naturais in natura e, ainda, gerar emprego e renda, incrementando e promovendo o reconhecimento da cidadania. Sobre o assunto veja-se os comentários de Alexandre Arico Rathsan, Gina Rizpah Besen e Jacques Dermajorovice para identificar-se de forma clara o significado do princípio em discussão: O reconhecimento do valor econômico agregado dos resíduos sólidos, a ampliação do mercado de reciclagem e o aumento do desemprego a partir da década de 1990 alteraram significativamente o mercado de produtos recicláveis no Brasil. Além da implementação de políticas públicas que possibilitaram o aumento da quantidade de iniciativas de gestão compartilhada, contemplando parcerias entre governos municipais e cooperativas de catadores, expandiu-se significativamente o número de catadores de rua, sucateiros, empresas recicladoras e outros empreendimentos privados interessados na coleta e comercialização de resíduos sólidos recicláveis.66 O desafio é estruturar uma Política que responsabilize o setor privado quanto à destinação dos resíduos gerados, ao mesmo tempo, promovendo a inserção dos catadores em toda cadeia produtiva. Tem-se ainda o Princípio do Respeito às diversidades locais e regionais que busca à valorização dos aspectos locais/regionais no direcionamento da forma de gerenciar os resíduos sólidos. Ou seja, de acordo com as especificidades locais e/ou regionais, quanto ao tipo de lixo predominante associado ao tipo de sensibilidade ambiental, os planos de gerenciamento dos resíduos devem definir qual é o tipo de reaproveitamento ou disposição mais adequada para o resíduo sólido naquele local ou região. Não menos importante o Princípio do Direito da Sociedade à informação e ao controle social que relaciona-se com o princípio da informação ambiental e garante o direito de acesso tanto às informações ambientais internas, quanto externas. O princípio garante à sociedade o direito ao acesso às informações acerca dos resíduos sólidos, reunidas em banco de dados alimentado por todos os entes federados, dados estes que devem ser considerados quando do 66 BESEN, Gina Rizpah. DERMAJOROVICE, Jacques. RATHSAN, Alexandre Arico. Os desafios da gestão compartilhada de resíduos sólidos face à lógica do mercado. Disponível em: http://www.anppas.org.br/encontro_anual/encontro2/GT/GT11/jacuqes_demajorovic.pdf. Acesso em: 27 mar. 2011. planejamento da gestão dos resíduos sólidos. O órgão responsável pela gestão da informação ambiental no âmbito dos resíduos sólidos é o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir). Por fim o Princípio da Razoabilidade e da Proporcionalidade, também conhecido pela doutrina como princípio da razoabilidade nos remete a noção de coerência, ou seja, uma relação harmônica. No direito ambiental, o princípio da proporcionalidade deriva do princípio da precaução, pois, em algumas situações considera-se o dano tão grave e irreversível que a aplicação de uma pena grave não se justifica. Afinal, o dano se concretizou e o mesmo, diante da sua gravidade, em nada poderá se minimizado com a aplicação de uma grave pena. Consideram-se como elementos deste princípio: a adequação, a necessidade e o princípio da proporcionalidade em sentido estrito (ou lei da ponderação) como citado acima. É entendido, que na atualidade, o princípio da proporcionalidade deve ser aplicado pelo intérprete do Direito como dever, sob pena da inconstitucionalidade da decisão jurídica tomada. Referido princípio poder ser utilizado pelos operadores do direito em qualquer área, haja vista que pode ser visto como um imperativo a ser utilizado por àqueles. No caso das normas ambientais, o princípio da proporcionalidade pode e deve ser utilizado com maior clareza, pois imposto o direito ao ambiente sadio em face de outras normas de caráter fundamental, não vindo a anular o princípio de legalidade, mas sim fortalecê-lo, amenizando a generalidade fria da lei. Para os resíduos sólidos, os princípios devem pautar-se nas decisões relativas ao seu uso e disposição, considerando os parâmetros de necessidade e adequação. 2.2.3 Aspectos Gerais da Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos Além dos princípios mencionados se faz necessário discorrer sobre os aspectos gerais da Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos. Nela encontram-se: i) a definição, ii) a classificação, iii) a gestão, iv) o ciclo de vida dos resíduos, v) a responsabilidade dos seus geradores. Necessário uma introdução no tema dos resíduos sólidos propriamente dito, atualmente, o mundo confronta-se com uma imensa degradação ambiental, provocada pela própria ação humana que, utilizando-se desenfreada e indevidamente dos recursos naturais, vem provocando uma ação predatória ao meio ambiente, ferindo o princípio da sustentabilidade e, conseqüentemente, comprometendo a qualidade de vida dos seres, conforme já mencionado anteriormente. A ação predatória do homem em relação à natureza tem se apresentado como um sério risco para o equilíbrio ecológico da própria pessoa humana e da qualidade de vida dos seres vivos. Nesse ínterim, a questão do lixo urbano está intimamente ligada à ação do ser humano e ao descontrolado processo de urbanização, atingindo, além da saúde pública, os valores ambientais. Seguindo essa linha, destaca-se o posicionamento de Celso Antonio Pacheco Fiorillo, segundo o qual: (...) o lixo urbano atinge de forma mediata e imediata os valores relacionados com saúde, habitação, lazer, segurança, direito ao trabalho e tantos outros componentes de uma vida saudável e com qualidade. Além de atingir o meio ambiente urbano, verificamos que o lixo é um fenômeno que agride também o próprio meio ambiente natural (agressão do solo, da água, do ar), bem como o cultural, desconfigurando valores estéticos do espaço urbano. 67 A falta de consciência ecológica, combinada com o desinteresse pela maioria da população e das autoridades públicas quanto à destinação final do lixo produzido, temos como consequências drásticas e diretas o agravamento de problemas de ordem ambiental, como também da saúde pública. Nos termos do inciso XVI, do artigo 3º, da Lei n. 12.305/2010 resíduos sólidos são: XVI - resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível; Os resíduos sólidos são os detritos resultantes das atividades diárias do homem, podendo ser encontrados tanto em estado sólido, líquido e gasoso. Para José Afonso da Silva, os “resíduos podem ser líquidos, gasosos ou sólidos provenientes de atividades humanas domésticas, profissionais, agrícolas, industriais ou nucleares”. 68 Sobre o tema escreve Cristina Lucia Silveira Sisinno: 67 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p 257. 68 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 202. O lixo apresenta um elemento que não deve ser desprezado no estudo da estrutura epidemiológica, uma vez que, pela sua variada composição, poderá conter agentes biológicos patogênicos ou resíduos químicos tóxicos que poderão alcançar o homem direta ou indiretamente, afetando-lhe a saúde. 69 Facilmente se verifica a necessidade de uma atenção especial para a destinação e controle dos resíduos, visto que as conseqüências negativas de sua inobservância trazem riscos à própria saúde dos homens. A expressão “resíduos sólidos urbanos”, que vulgarmente é denominada “lixo urbano” – este espécie daqueles – resulta das atividades comerciais e domésticas dos povos. Nas palavras de Celso Antonio Pacheco Fiorillo: Constituem toda substância resultante da não-interação entre o meio e aqueles que o habitam, ou somente entre estes, não incorporada a esse meio, isto é, que determina um descontrole entre os fluxos de certos elementos em um dado sistema ecológico. Em outras palavras, é o “resto”, a “sobra” não reaproveitada pelo próprio sistema, oriunda de uma desarmonia ecológica. 70 A classificação dos resíduos sólidos se dá por meio do artigo 13 da Lei 12.305/2010, a mesma é importante para saber qual o tratamento e a destinação que será dispensada a cada tipo, bem como a idéia de alcançar os padrões sustentáveis de produção e consumo. Quanto a origem, os resíduos sólidos são classificados como: I - resíduos domiciliares (os originários de atividades domésticas em residências urbanas); II - resíduos de limpeza urbana (os originários da varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana); III - resíduos sólidos urbanos (os englobados nas alíneas “a” e “b”); resíduos de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços (os gerados nessas atividades, excetuados os referidos nas alíneas “b”, “e”, “g”, “h” e “j” do artigo 13); IV resíduos dos serviços públicos de saneamento básico (os gerados nessas atividades, excetuados os referidos na alínea “c”); V - resíduos industriais (os gerados nos processos produtivos e instalações industriais); VI - resíduos de serviços de saúde (os gerados nos serviços de saúde, conforme definido em regulamento ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS); VII - resíduos da construção civil (os gerados nas 69 SISINNO, Cristina Lucia Silveira. In. Resíduos sólidos, ambiente e saúde: uma visão multidisciplinar. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2000. p. 42. 70 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p 255. construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis); VIII - resíduos agrossilvopastoris (os gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades); IX - resíduos de serviços de transportes (os originários de portos, aeroportos, terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira); X - resíduos de mineração (os gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios). Quanto a sua periculosidade, os resíduos sólidos são classificados como: I - resíduos perigosos (aqueles que, em razão de suas características de inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, teratogenicidade e mutagenicidade, apresentam significativo risco à saúde pública ou à qualidade ambiental, de acordo com lei, regulamento ou norma técnica); II - resíduos não perigosos (aqueles não enquadrados na alínea “a” do artigo 13 da Lei 12.305/2010). Na gestão e no gerenciamento dos resíduos sólidos pretende-se observar a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos (como a compostagem, por exemplo) e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos (artigo 9º, da Lei n. 10.305/2010), com valorização de políticas coleta seletiva, recuperação e aproveitamento energético quando comprovada a viabilidade técnica e ambiental, tudo com constante envolvimento social. Para alguns tipos de resíduos foi instituída a responsabilidade compartilhada a qual está prevista no artigo 30 da Lei n. 12.305/2010: Artigo 30: É instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, a ser implementada de forma individualizada e encadeada, abrangendo os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, consoante as atribuições e procedimentos previstos nesta Seção. Parágrafo único. A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos tem por objetivo: I - compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais e os processos de gestão empresarial e mercadológica com os de gestão ambiental, desenvolvendo estratégias sustentáveis; II - promover o aproveitamento de resíduos sólidos, direcionando-os para a sua cadeia produtiva ou para outras cadeias produtivas; III - reduzir a geração de resíduos sólidos, o desperdício de materiais, a poluição e os danos ambientais; IV - incentivar a utilização de insumos de menor agressividade ao meio ambiente e de maior sustentabilidade; V - estimular o desenvolvimento de mercado, a produção e o consumo de produtos derivados de materiais reciclados e recicláveis; VI - propiciar que as atividades produtivas alcancem eficiência e sustentabilidade; VII - incentivar as boas práticas de responsabilidade socioambiental. A responsabilidade compartilhada visa uma maior integração entre todos aqueles participantes da cadeia produtiva, da origem ao consumo final do produto, com a finalidade de se evitar que aquele que tenha auferido lucro, no caso o produtor, com o produto em si, repasse os custos e o ônus do seu passivo ambiental para terceiros. A Política Nacional de Resíduos Sólidos tem diversos objetivos para sua implementação, esses objetivos estão contidos no artigo 7º. da Lei 12.305 de 2010, dos quais se destacam: A proteção da saúde pública e da qualidade ambiental, o qual pode-se dizer que é um dos mais importantes objetivos, tendo em vista que com o tratamento e a destinação adequada dos resíduos sólidos urbanos estaria atingindo diretamente um problema de saúde pública. Diz-se que estaria atingindo diretamente um problema de saúde pública, pois nos atuais lixões e aterros sanitários irregulares, encontram-se uma das maiores causas de doenças e contaminações da sociedade, quer seja de forma direta àquelas pessoas que ali exploram a atividade de cata de resíduos, ou ainda, por meio da poluição de lençóis freáticos, rios, solo e ar. Importante aqui relembrar os dados estatísticos apresentados quando da exposição de motivos que levaram a elaboração da Lei 12.305/2010. A não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. Estimular a adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais. Buscar a redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos, isso acaba influenciando diretamente no resultado final da quantidade de resíduos gerados. Incentivar a indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de matérias-primas e insumos derivados de materiais recicláveis e reciclados, o que além de trazer uma solução direta aos resíduos sólidos urbanos propriamente ditos, também tem uma grande importância no aspecto social e econômico, face ao seu objetivo que gera empregos, recursos para aqueles que anteriormente viviam nos chamados “lixões” e aterros sanitários irregulares e ainda, fazendo valer a inclusão social desses indivíduos. Propiciar a gestão integrada de resíduos sólidos, efetuando a articulação entre as diferentes esferas do poder público, e destas com o setor empresarial, com vistas à cooperação técnica e financeira para a gestão integrada de resíduos sólidos, buscando a capacitação técnica continuada na área de resíduos sólidos. Outro objetivo muito importante é o de manter a regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção de mecanismos gerenciais e econômicos que assegurem a recuperação dos custos dos serviços prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade operacional e financeira, observada a Lei nº 11.445, de 2007. O governo dar prioridade, nas aquisições e contratações governamentais, para produtos reciclados e recicláveis, bem como bens, serviços e obras que considerem critérios compatíveis com padrões de consumo social e ambientalmente sustentáveis. Realizar a integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, estimulando a implementação da avaliação desse ciclo. Incentivar o desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético e dar estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável. Para se atingir esses e outros objetivos enumerados na legislação ora tratada, são utilizados diversos instrumentos definidos na própria lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Destaca-se a implementação da política da logística reversa, a qual foi definida pelo artigo 3º, inciso XII, da Lei 12.305 como o instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada. A logística reversa, portanto, constitui mecanismo pelo qual se pretende restituir determinados resíduos ao setor produtivo, por meio de um encadeamento de atos em sentido inverso ao da produção. As finalidades da logística reversa são diversas. A mais direta consiste na promoção do recolhimento de resíduos que, de outra forma, contaminariam o meio ambiente. Busca-se, portanto, dar uma destinação aos resíduos produzidos, evitando-se o acúmulo de substâncias que poderiam contaminar o meio ambiente. A outra finalidade consiste no reaproveitamento dos materiais recolhidos. Com isso, esses materiais ingressam novamente no ciclo produtivo do agente que o produziu anteriormente, ou em outros ciclos produtivos, reduzindo assim a necessidade do emprego de novas matérias-primas. Dessa forma, constitui diretriz básica da Lei 12.305 e do Decreto 7.404 o fato de que a logística reversa se aplica a produtos que contaminem o meio ambiente e (ou) possam ser aproveitados em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos. A ideia é que a utilização de um determinado produto pode acabar com a sua utilidade para o consumidor, mas, ao se transformar em um resíduo, não só continuará tendo um impacto sobre o meio ambiente, como também poderá continuar apresentando um valor econômico que justifique a sua destinação a um novo ciclo produtivo. Na sociedade atual, aliás, muitos resíduos não deixam de ter um valor econômico, que pode perfeitamente ser aproveitado. É importante destacar que a logística reversa não segue um modelo absolutamente fechado. O fabricante, importador, comerciante ou distribuidor poderão se valer de uma série de medidas, tais como a implantação de procedimentos de compra de produtos ou embalagens usados, a disponibilização de postos de entrega de resíduos reutilizáveis ou recicláveis, a atuação em parceria com cooperativas, catadores de materiais recicláveis, entre outras. Não basta estar previsto em lei quais são os objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Se faz necessário criar instrumentos para a implementação, os quais encontram-se elencados no artigo 8º da Lei 12.305/2010, sendo eles os planos de resíduos sólidos; os inventários e o sistema declaratório anual de resíduos sólidos; a coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; o monitoramento e a fiscalização ambiental, sanitária e agropecuária; a cooperação técnica e financeira entre os setores público e privado para o desenvolvimento de pesquisas de novos produtos, métodos, processos e tecnologias de gestão, reciclagem, reutilização, tratamento de resíduos e disposição final ambientalmente adequada de rejeitos; a pesquisa científica e tecnológica; a educação ambiental; os incentivos fiscais, financeiros e creditícios; o Fundo Nacional do Meio Ambiente e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir); o Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa); os conselhos de meio ambiente e, no que couber, os de saúde; os órgãos colegiados municipais destinados ao controle social dos serviços de resíduos sólidos urbanos; o Cadastro Nacional de Operadores de Resíduos Perigosos; os termos de compromisso e os termos de ajustamento de conduta. Destaque-se o objetivo do incentivo à adoção de consórcios ou de outras formas de cooperação entre os entes federados, com vistas à elevação das escalas de aproveitamento e à redução dos custos envolvidos. No final do presente trabalho será apresentado um modelo de negócio com uma sugestão de PPP sustentável capaz de gerar recursos para o município, bem como gerar empregos e inclusão social, e principalmente oferecendo um tratamento adequado aos resíduos sólidos urbanos. 3 POLÍTICA MUNICIPAL PARA GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS: PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA Os Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos estão previstos na Lei 12.305/2010 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. A elaboração do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, nos termos previstos na lei, é condição para o Distrito Federal e os Municípios terem acesso a recursos da União, ou por ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à limpeza urbana e ao manejo de resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade, o que está previsto no artigo 55 da Lei 12.305/2010. Art. 55 (...) § 1o Serão priorizados no acesso aos recursos da União referidos no caput os Municípios que: I - optarem por soluções consorciadas intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, incluída a elaboração e implementação de plano intermunicipal, ou que se inserirem de forma voluntária nos planos microrregionais de resíduos sólidos referidos no § 1o do art. 16; II - implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda. § 2o Serão estabelecidas em regulamento normas complementares sobre o acesso aos recursos da União na forma deste artigo. O plano municipal deverá conter alguns requisitos mínimos, tais como: a necessidade do diagnóstico da situação dos resíduos sólidos gerados no respectivo território; a identificação de áreas favoráveis para disposição final ambientalmente adequada de rejeitos, observando o plano diretor; a identificação das possibilidades de implantação de soluções consorciadas ou compartilhadas com outros Municípios. Também deverá conter a identificação dos resíduos sólidos e dos geradores sujeitos ao plano de gerenciamento específico nos termos do art. 20 da Lei 12.305/2010; o sistema de logística reversa; procedimentos operacionais e especificações mínimas a serem adotados nos serviços públicos de limpeza; utilização de indicadores de desempenho operacional e ambiental dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos; implantação de regras para o transporte e outras etapas do gerenciamento de resíduos sólidos; definição das responsabilidades quanto à sua implementação e operacionalização; criação e implantação de programas e ações de capacitação técnica voltados para sua implementação e operacionalização; utilização de mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda, mediante a valorização dos resíduos sólidos; definição de metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem; adoção de ações preventivas e corretivas a serem praticadas, incluindo programa de monitoramento; identificação dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos. Existem alguns municípios que apresentaram sua Política Municipal de Resíduos Sólidos. A título exemplificativo tem-se os municípios de São Paulo-SP, São Carlos-SP e Embu das Artes-SP. O Município de São Paulo sugeriu projeto que institui Política Municipal de Resíduos Sólidos71, o qual foi de autoria do vereador Ítalo Cardoso (PT) estabelecendo diretrizes para a implantação da Política Municipal de Resíduos Sólidos e a elaboração do Plano Municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, o qual foi aprovado no dia 10/11/2010. No Município de São Carlos o projeto que institui Política Municipal de Resíduos Sólidos72 de autoria do vereador Dé Alvim. O projeto institui os seguintes princípios norteadores da Política Municipal de Resíduos Sólidos: I) da prevenção e da precaução; II) do poluidor pagador e do protetor recebedor; III) o desenvolvimento sustentável; IV) a cooperação entre as diferentes esferas do Poder Público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade; V) a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; VI) o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania; VII) a razoabilidade e a proporcionalidade. Na justificativa do projeto de Lei apresentado consta que a cidade tem boas iniciativas neste sentido, como a Lei nº 13.867 de 12 de Setembro de 2006 (Lei Municipal) que institui o Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil e o Sistema para a Gestão desses resíduos; as PPPs (Parcerias Público-Privadas) para a coleta de lixo, onde a empresa São Carlos Ambiental será responsável pela implantação de um novo aterro sanitário e também deverá oferecer estrutura física para a cooperativa do programa de coleta seletiva e reciclagem do lixo, reduzindo o volume encaminhado ao aterro sanitário. Para a implantação dessa Política ou Plano Municipal para Gestão dos Resíduos Sólidos, será necessário o Município firmar contratos de concessões do serviço público, as 71 Câmara Municipal de São Paulo <http://www.camara.sp.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3105:projeto-institui-politicamunicipal-de-residuos-solidos&catid=63:projetos&Itemid=65> acesso em 12 ago. 2011. 72 Sitio Oficial da Prefeitura Municipal de São Carlos http://www.saocarlosoficial.com.br/noticias/?n=De+Alvim+propoe+politica+municipal+e+plano+de+gestao+de +residuos+solidos_VLSVLJP2KI acesso em 12 ago. 2011 quais podem ocorrer na forma tradicional conforme previsto no artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal de 1988, ou então na modalidade da concessão especial, conhecida como Parceria Público-Privado, de acordo com a Lei 11.079/2004. 3.1 CONTRATO ADMINISTRATIVO O contrato é um negócio jurídico fonte de obrigações formadas por acordo de vontades em que as partes estão vinculadas reciprocamente, em regra, tem caráter bilateral, consensual, comutativo e oneroso. Neste sentido é que os contratos firmam lei entre as partes (lex inter partes), devendo por elas ser cumprido (pacta sunt servanda). As relações jurídicas das quais fazem parte o Poder Público e terceiros não se resumem apenas a atos unilaterais e imperativos. Na atualidade, em face de um Estado mais democrático e consensual, tem-se a utilização de contratos administrativos entre este e particulares para persecução do interesse da coletividade. Sobre o tema escreve Onofre Alves Batista Junior: Nas últimas duas décadas, o advento de uma administração pública democrática e consensual, que possibilita a participação do administrado na tomada de decisões administrativas, veio consolidar a tendência de valorização dogmática dos contratos administrativos, que, entretanto, nem sempre foram aceitos pacificamente no Direito Administrativo. 73 Dentre os contratos existe uma modalidade específica denominada de contratos da administração e é utilizada de maneira ampla, abrangendo todos os contratos celebrados pela Administração Pública e terceiros, firmando compromissos recíprocos pelas partes, seja na seara do direito público ou do direito privado. Existem duas espécies de contratos dessa categoria. Os chamados contratos privados da Administração e os Contratos Administrativos propriamente ditos. Esta primeira espécie de contrato regula-se pelo regime do direito privado, tornando, evidentemente, a relação contratual igualitária, como, por exemplo, nos contratos de compra e venda, seguro, locação, doação etc. Tem-se em regra que a Administração não terá vantagens sobre o terceiro, desta maneira é comum pela doutrina a concepção de horizontalidade na 73 BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves – Transações Administrativas: um contributo ao estudo do contrato administrativo como mecanismo de prevenção e terminação de litígios e como alternativa à atuação administrativa autoritária, no contexto de uma administração pública mais democrática. Quartier Latin, 2007, pág. 255. relação contratual, diferente do que ocorre nos contratos Administrativos em que prevalece uma verticalidade entre a Administração Pública e o particular, submetendo-se às regras do direito público. Escreve Maria Sylvia Zanella Di Pietro: A expressão contratos da Administração é utilizada, em sentido amplo, para abranger todos os contratos celebrados pela Administração Pública, seja sob regime de direito público, seja sob regime de direito privado. E a expressão contrato administrativo é reservada para designar tão-somente os ajustes que a Administração, nessa qualidade, celebra com pessoas físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, para consecução de fins públicos, segundo regime jurídico de direito público. Costuma-se dizer que, nos contratos de direito privado, a Administração se nivela ao particular, caracterizando-se a relação jurídica pelo traço da horizontalidade e que, nos contratos administrativos, a Administração age como poder público, com todo o seu poder de império sobre o particular, caracterizando-se a relação jurídica pelo traço da verticalidade. (grifo do autor) 74 Apesar desta aparente igualdade na relação contratual regulada pelo direito privado, há que se ressalvar que as regras do regime do direito público tornam-se usuais, vez que a Administração pode tomar medidas unilaterais objetivando a supremacia dos interesses públicos sempre que se fizerem necessárias. Deste modo, na maioria dos negócios em que atuar a Administração Pública, será observado um regime jurídico mais específico que regerá sobre o direito comum, mas sem perder o caráter de regime privado. Já os Contratos Administrativos também integram as espécies de contratos da Administração, mas são regulados por normas distintas das que regulam os contratos privados celebrados pelo Poder Público. Tendo caráter de contratos tipicamente Administrativos, se submetem às regras especiais de direito público, utilizando-se apenas supletivamente dos princípios da teoria geral dos contratos e das regras do direito privado75. Tais regras publicísticas versam sobre as prerrogativas da Administração Pública, que protegem tanto algumas atividades públicas quanto cláusulas contratuais tidas como exorbitantes. Ressalta-se que tais regras reputam-se implícitas, independente de previsão contratual ou mesmo previsão na própria ordenação normativa. Ainda que de regimes jurídicos diversos, os contratos privados da Administração e os contratos administrativos podem não ser tão fáceis de distinguir, pois não basta apenas a 74 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 15ª. Edição. Editora Atlas .2003, pág. 240. 75 Art. 54 da Lei nº 8.666 de 21/06/1991. presença da Administração Pública, tão pouco ater-se exclusivamente ao objetivo do interesse da coletividade, visto que este é indispensável para qualquer ato administrativo, para esclarecer o tema Hely Lopes Meirelles escreve: [...] mas o que tipifica o contrato administrativo e o distingue do contrato privado é a participação da Administração na relação jurídica bilateral com supremacia de poder para fixar as condições iniciais do ajuste. (grifo do Autor) 76 A Constituição de 1988, de maneira ampla, dispõe a competência para legislar sobre contrato. Em seu Art. 22, inciso XXVII, com redação dada pela EC 19/98, prescreve competir privativamente à União legislar sobre “normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecendo o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III”. Salienta-se que a competência da União abrange apenas em estabelecer normas gerais, cabendo aos Estados e Municípios editar normas específicas, assim, para disciplinar o art. 37, XXI, da Constituição Federal é que editou-se a Lei nº 8.666/93. Mas há doutrinadores que entendem haver verdadeiro excesso de competência legislativa federal de tal lei, asseverando que esta não possui regras gerais, e sim específicas77, e doutrinadores que entendem ser exorbitante ao estabelecer normas que se aplicam a todas as esferas do governo 78. Nos contratos administrativos sendo um instrumento para implementar a supremacia do interesse Público, possui certas prerrogativas que lhe asseguram uma vantagem na relação contratual, propiciando ferramentas para fazer prevalecer o interesse da coletividade, como as cláusulas exorbitantes, implícitas ou explícitas. Dessa forma segue entendimento de José Renato Gaziero Cella: Como visto, para aqueles que negam a existência dos contratos administrativos, a ausência de igualdade entre as partes é um dos elementos essenciais que justificariam essa negativa. Tal desigualdade decorreria do princípio de Direito Administrativo da supremacia do interesse público sobre os interesses particulares. Ocorre que a supremacia é do interesse público e não da Administração Pública que, tal qual os particulares, também a ele está submetida. A confusão inicia quando se equipara interesse público com Administração 76 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 15ª. Edição, Malheiros Editores - 2010, p. 248. 77 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª. Edição, Editora Lúmen Juris, 2011, p. 161. 78 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 15ª. Edição. Editora Atlas .2003, p. 248. Pública, quando em verdade esta é apenas o instrumento por excelência para a realização daquele. 79 Os atos e contratos da Administração devem ter uma finalidade pública. Mesmo para que em casos que a utilidade direta seja atingida pelo particular (v.g. concessão de uso de espaço público para evento particular), indiretamente, cumpridas todas as formalidades, uma concessão de uso de espaço público agregará à receita pública, o que faz atingir o interesse da coletividade, bem como, a finalidade pública. Os contratos firmados pela Administração possuem regulamentações gerais e específicas em lei, que devem ser seguidas a rigor. Assim escreve Hely Lopes Meirelles: A ausência de contrato escrito, a falta de requisitos essenciais e outros defeitos de forma podem viciar a manifestação de vontade das partes e comprometer irremediavelmente o conteúdo obrigacional do ajuste. Igualmente nulo é o contrato administrativo omisso em pontos fundamentais, ou firmado sem licitação quando exigida, ou resultante de licitação irregular ou fraudada no seu julgamento. 80 As cláusulas dos Contratos Administrativos são estabelecidas de maneira unilateral pela Administração Pública e pelo instrumento convocatório da licitação, a Administração faz sua oferta a todos os interessados, já preestabelecidas as condições da celebração, e pelas propostas dos licitantes equivale-se à aceitação da oferta do Poder Público. Ainda que não haja licitação, fica a cargo da Administração estabelecer as cláusulas contratuais, pela ocorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público. Os contratos firmados em licitação ocorrem em função das melhores condições que em tese apresenta o contratado. Sendo vedada, por força da Lei nº 8.666/93, art. 78, inciso VI, a subcontratação total ou parcial, a associação do contratado com terceiro, a cessão ou a transferência, apenas sendo possível tais medidas se assim dispor o edital de licitação e o contrato. Nos casos do contrato administrativo o mesmo possuí a característica de conter cláusulas abusivas, tais cláusulas são prerrogativas81 conferidas à Administração Pública nos contratos Administrativos atribuindo a esta supremacia em relação à parte contratada82. 79 CELLA, José Renato Gazieroa. Contrato Administrativo: equilíbrio Econômico-Financeiro. 1ª. Edição 2004 – 6ª. Tiragem 2009, Editora Juruá, p. 26. 80 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 15ª. Edição, Malheiros Editores - 2010, p. 280. 81 Art. 58 da Lei nº 8.666 de 21/06/1993. O princípio da igualdade entre as partes, que importa a regra da imutabilidade dos contratos, cede passo ao da desigualdade, ao predomínio da vontade da Administração sobre a do outro contratante. Essas cláusulas são verdadeiros princípios do direito público, e vêm prescritas nos incisos do art. 58 da Lei 8.666/9383. Há, contudo, doutrinadores, em especial internacionais, que entendem que as cláusulas exorbitantes ao passo que garantem o interesse da coletividade, trazem ao particular garantias que não se vislumbram no bojo do regime privado, como por exemplo, das garantias econômicas, neste sentido Jean Rivero: Esta desigualdade fundamental tem um limite do lado financeiro: o contratante, neste terreno, se beneficia de garantias que o Direito Privado ignora e que tendem a lhe assegurar de todo modo e qualquer que seja o uso feito pela Administração, de suas prerrogativas, uma remuneração conforme às previsões iniciais. 84 (grifo do autor) A mutabilidade unilateral, também conhecida por parte da doutrina como alteração unilateral, consiste na modificação das disposições contratuais administrativas de maneira unilateral por parte da Administração, em uso da supremacia dos interesses públicos que esta possui como prerrogativa. Diferente do que se vê dos contratos do direito privado em que prevalecem os princípios do lex inter partes e o pacta sunt servanda, no regime contratual de direito público a regra é o jus variandi, conferindo para a consecução do interesse público a prerrogativa de modificação unilateral do contrato85. De maneira mais específica, esta modificação pode ocorrer em dois casos, previstos no Art. 65, inciso I, alíneas “a” e “b” da Lei 8666/9386. Da prerrogativa da Administração Pública, em alterar unilateralmente os contratos, surge ao contratado o direito de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, 82 Neste sentido, esclarece Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que as cláusulas exorbitantes possuem este caráter por não serem comuns ou seriam ilícitas na contratação entre particulares, justamente por atribuir privilégios de uma parte em detrimento da outra (2003, p 256). 83 Mutabilidade unilateral; Rescisão unilateral; Fiscalização da execução do contrato; Aplicação motivada de sanções; Tratando-se de serviços essenciais, ocupação provisória de bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato. 84 ‘Droit Administratif’, 3ª Ed., Dalloz, 1965, pág. 108, grifo do autor, apud BANDEIRA DE MELLO, 2004, p. 576. 85 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 15ª. Edição, Malheiros Editores - 2010, p. 259. 86 Quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos objetivos do contrato; Quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos em lei. que assegurará a regular remuneração dos encargos assumidos pelo particular87, que será analisado com maior profundidade oportunamente. Como já é de conhecimento, a Administração possui posição de supremacia em relação ao particular contratado, representada pelas cláusulas exorbitantes. Esta prerrogativa do Poder Público permite que este rescinda o contrato com o particular de maneira unilateral, nas hipóteses em que ocorram tanto a inadimplência do contratado quanto o interesse público na cessação da execução do contrato, mas sempre se exigindo justa causa para a rescisão, não se tratando de atuação discricionária, mas sim de estrito cumprimento das exigências legais ou das cláusulas que foram previamente estipuladas no contrato. Sobre o tema escreve Hely Lopes Meirelles: Do mesmo modo que a Administração tem a possibilidade de promover a alteração unilateral da avença, o poder de rescisão unilateral do contrato administrativo é preceito de ordem pública, decorrente do princípio da continuidade do serviço público, que a Administração compete assegurar. A rescisão unilateral ou administrativa pode ocorrer tanto por inadimplência do contrato como por interesse público na cessação da normal execução do contrato, mas em ambos os casos se exige justa causa para o rompimento do ajuste, pois não é ato discricionário, mas vinculado aos motivos que a norma legal ou as cláusulas contratuais consignam como ensejadores desse excepcional distrato.88 (grifo do autor) O jurista Edmir Netto de Araújo esclarece as duas modalidades de rescisão contratual unilateral pela Administração, sendo elas a rescisão administrativa e a rescisão de pleno direito, veja-se: A primeira (rescisão administrativa) ocorre por ato unilateral da Administração, seja por motivo de interesse público, seja por infração, em qualquer dos casos previstos pelas leis de contratações administrativas como causas de rescisão (Lei n. 8.666/93, art. 78, I a XII e XVIII), usualmente mencionadas no próprio contrato ou caderno de encargos. No segundo caso, acompanhada de penalidades suplementares, como multas e até suspensão ou declaração de idoneidade para licitar e/ou contratar com a Administração. Por sua vez, a rescisão de pleno direito é a que se verifica pela simples ocorrência do fato extintivo do contrato, previsto no ajuste, expressamente, ou implicitamente, em decorrência de lei ou regulamento, sem necessidade de manifestação de qualquer das partes ou do Judiciário. 89 87 CELLA, José Renato Gaziero Cella. Contrato Administrativo: equilíbrio Econômico-Financeiro. 1ª. Edição 2004 – 6ª. Tiragem 2009, Editora Juruá, p. 89. 88 Ibidem. p. 260. 89 ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. Editora Saraiva, 5ª. Edição, 2010, p. 686. Desta primeira modalidade, da rescisão administrativa, extingue-se o contrato unilateralmente pelo Poder Público, motivados pelo interesse público ou por infração, admitindo-se apenas em casos previstos em lei. No caso de infração, acompanha ainda de penalidades, multas e inclusive suspensão ou declaração de inidoneidade para licitação e contratação com o Poder Público90. Em relação à rescisão de pleno direito, o autor esclarece que esta se observa por simples ocorrência do fator extintivo do contrato, já previsto no contrato ou por decorrência da lei independente de manifestação das partes ou do Judiciário. Nesta medida, quanto aos efeitos das mencionadas rescisões, certifica José dos Santos Carvalho filho: No caso de inadimplemento pelo contratado, a Administração nada tem a pagar-lhe, sendo, ao contrário, credora de indenização, provados que fiquem os prejuízos causados pelo descumprimento. Afinal, indeniza quem, por culpa, deu causa à rescisão. O fato enseja, ainda, para a Administração, o direito de reter créditos, executar garantia contratual para ressarcimento dos prejuízos, assumir imediatamente o objeto do contrato e ocupar os locais necessários à execução [...]. Diferentemente se passa com a hipótese de rescisão por razões de interesse público. Como no caso não há culpa do contratado, tem esse direito á reparação dos prejuízos que a rescisão ocasionou.91 A fiscalização da execução contratual trata-se de prerrogativa da Administração, conferindo a esta o poder-dever de que a execução do contrato seja acompanhada e fiscalizada por um representante da própria Administração92, cabendo a este determinar o necessário para sanar as irregularidades por este constatadas, cabendo rescisão unilateral do contrato pela Administração sem prejuízo de eventuais sanções administrativas. Sem necessidade de provocação às vias judiciais, tendo em vista seu poder de autoexecutoriedade, a Administração Pública assume a prerrogativa de aplicar sanções ao contratado pelos motivos elencados nos art. 86 e 87 da Lei 8.666/93, sendo eles o atraso injustificado na execução do contrato ou pela inexecução total ou parcial do contrato. 90 ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. Editora Saraiva, 5ª. Edição, 2010, p. 686. 91 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª. Edição, Editora Lúmen Juris, 2011, p. 181. 92 Arts. 58, III, e 67, e §§ da Lei nº 8.666/93. As sanções previstas acima podem ser aplicadas juntamente com a multa, como dispõe o § 2º do referido art. 87, ficando vedada, implicitamente, em qualquer outra hipótese, a acumulação de sanções administrativas93. Ressalta-se que sempre deve estar assegurado o direito de defesa, como preceitua o art. 5º, LV da Constituição Federal e art. 87, caput, da Lei nº 8.666/93. art. 87: I – advertência; II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato; III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos; IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior. O equilíbrio econômico-financeiro é a relação de adequação formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe corresponderá94. Desta maneira estará assegurada a regular remuneração dos encargos assumidos pelo contratado. Há entendimento na doutrina95, que este princípio de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro está previsto na própria Constituição, sendo esta interpretação colhida dos arts. 37, XXI e 175, “as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta”. Mas há quem entenda ser uma norma restrita, por não abranger todas as modalidades de contratação do Poder Público96. Sendo seguro e pacífico que este princípio encontra-se na Lei nº 8.666/93 arts. 58, § 2º e 65, II, “d”, §§ 5º e 6º. No contrato administrativo, a Administração busca atender as necessidades públicas, e o particular contratado, visa o lucro. De modo que este lucro deve ser assegurado e garantido, 93 Como bem assevera Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ob. cit., 2003, p. 260. 94 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. Editora Malheiros, 17ª. Edição 2004, p. 593. 95 CELLA, José Renato Gaziero. Contrato Administrativo: equilíbrio Econômico-Financeiro. 1ª. Edição 2004 – 6ª. Tiragem 2009, Editora Juruá, pág. 73-74 e CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24ª. Edição, Editora Lúmen Juris, 2011, p. 183. 96 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Curso de Direito Administrativo 2003, pág. 270, ainda sim a autora faz ressalva de que essa norma possa ser interpretada como fazendo referência ao equilíbrio econômico-financeiro. pois se assim não o for, não haverá interesse do particular em colaborar com a o Poder Público na persecução do interesse da coletividade97. Quadro comparativo com as principais características das concessões comum e especial de serviços públicos. CONCESSÃO COMUM - Disciplinada na Lei 8.987/95; CONCESSÃO ESPECIAL - Disciplinada pela Lei 11.079/2004 mais a Lei 8.987/95 naquilo que couber; - Delegação negocial a título vinculado; - Prazo mais dilatado; maior que 5 anos limitado a 35 anos, podendo ser prorrogado; - Contrato – prazo certo; - Valor acima de R$ 20.000.000,00; - Mediante licitação somente na modalidade concorrência pública; - Objeto de grande vulto; - Só feita à pessoa jurídica ou consórcio de empresas; - Riscos compartilhados; - Hipótese de extinção de uma concessão. - Mitigação de cláusulas exorbitantes. 3.2 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS 97 Conclusão lógica, visto a insegurança em contratar com a Administração sem esta garantia, cf. CARVALHO FILHO, ob. cit., 2011, pág. 183. A formação histórica do Estado brasileiro remete à descrição das sucessivas transições na forma de relacionamento entre o Poder Público e a sociedade. Esse modelo de organização estatal adequava-se de acordo com a conjuntura social e econômica de cada etapa do desenvolvimento nacional. 98 Para entender como se deu a origem do Estado, escreve João Ribeiro Junior: [...] É uma criação necessária da exigência de coexistência e cooperação entre os homens, que não pode realizar-se, de modo satisfatório, se o grupo social não se organiza sob uma autoridade, reconhecida por todos e com força de impor-se. Esta autoridade dá ao grupo o ordenamento jurídico indispensável para realizar a convivência pacífica e a atuação dos fins coletivos, garantindo, ainda que coativamente, a observância daquele ordenamento.99 O Estado passou por diversas formas de estruturação e foi se adequando ao longo do tempo, desde o autoritarismo do Estado absolutista, passando-se pelo Estado liberal e Estado social. Sobre essa relação de modelos de Estado Paulo Bonavides sugere a seguinte ordem: Primeiro, o Estado liberal; a seguir, o Estado socialista; depois, o Estado social das Constituições pragmáticas, assim batizadas ou caracterizadas pelo teor abstrato e bem-intencionado de suas declarações de direitos; e de último, o Estado social dos direitos fundamentais, este, sim, por inteiro capacitado da juridicidade e da concreção dos preceitos e regras que garantem estes direitos.100 No decorrer do tempo e com as mudanças sofridas pelo Estado em sua organização, lhe foram imputadas diversas responsabilidades, as quais para serem cumpridas, passou a desempenhar funções que antes não as tinha, criando empresas públicas e sociedades de economia mista para prestar os serviços públicos e assim atender essas demandas e responsabilidades assumidas. Para tanto se faz necessário entender o serviço público, como sua conceituação e demais características. O conceito jurídico de serviço público depende de uma análise complexa, levando-se em consideração o regime jurídico proposto e a demarcação no campo material do objeto. A doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro conceitua o serviço público como: 98 OLIVEIRA, Fernão Justen de. Parceria público-privada: aspectos de direito público econômico (Lei n. 11.079/2004) Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 53 99 RIBEIRO JUNIOR, João. Curso de teoria geral do Estado. São Paulo: Acadêmica, 1995, p. 113. 100 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 9. Ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 29. O serviço público é toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público.101 Para completar o conceito de serviço público Celso Antonio Bandeira de Mello escreve: Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assue como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais -, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo. 102 Existem conceitos mais atualizados de acordo com a realidade e configuração do Estado, conceituando-se o serviço público de maneira um pouco diferente as quais se dão pelos doutrinadores Marçal Justen Filho e Paulo Modesto. Para o primeiro o serviço público é uma atividade administrativa de satisfação concreta de necessidades individuais ou transidividuais, materiais ou imateriais, vinculadas diretamente a um direito fundamental, destinada a pessoas indeterminadas e executada sob regime de direito público 103. Para o segundo o serviço público é a atividade de prestação administrativa material, direta e imediatamente a cargo do estado ou de seus delegados, posta concretamente à disposição de usuários determinados ou indeterminados, sob regime de direito público, em caráter obrigatório, igualitário e contínuo, com vistas a satisfazer necessidades coletivas, sob titularidade do Poder Público 104. O serviço público é toda atividade que ofereça comodidade material para os administrados, sociedade, prestados pelo Estado ou por terceiros a quem tenha sido delegada a função sob o regime de Direito Público, atendendo dessa forma os fins do Estado. 101 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23. Ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 102. 102 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 671. 103 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 105. 104 MODESTO, Paulo. Reforma do Estado, formas de prestação de serviços ao público e parcerias públicoprivadas: demarcando as fronteiras dos conceitos de “serviço público”, “serviços de relevância pública” e “serviços de exploração econômica” para as parcerias público-privadas. In: SUNDFELD, Carlos Ari (coord.). Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 452. No período compreendido entre o final da I Guerra Mundial e a Reforma do Estado, havia a idéia de que o Estado deveria nutrir todas as necessidades da sociedade, onde tudo isso deveria ser gerido pelo aparelhamento público. Com esse pensamento o Estado passou a exercer funções para as quais não estava capacitado ou nem mesmo com condições financeiras capazes de suportar todo esse custo. Mesmo assim implantou e manteve a prestação de diversos serviços públicos entendidos como obrigatórios face a sua própria organização estatal, dentre os quais podemos citar saúde, educação, segurança, geração de energia, telecomunicações, infra-estrutura, transporte, limpeza pública, ou seja, tornou-se um mega empresário. Face a esse inchaço administrativo criado e por muitas vezes não contando com agentes públicos capacitados para desenvolver atividades de caráter empresarial e privada, começou então a sofrer prejuízos e acumular déficit financeiro na execução desses serviços. Esse modelo acabou desencadeando crises econômicas que ensejou no movimento mundial da privatização e consequentemente a descentralização do Estado. Sobre essa crise estatal apresentada escreve Luiz Carlos Bresser Pereira: Em parte em conseqüência da incapacidade de reconhecer os fatos novos que ocorriam no plano tecnológico, em parte devido à visão equivocada do papel do Estado como demiurgo social, e em parte, finalmente, porque as distorções de qualquer sistema de administração estatal são inevitáveis à medida que transcorre o tempo, o fato é que, a partir dos anos 70 e principalmente nos anos 80, a economia mundial irá enfrentar uma nova grande crise.105 Diante desse fenômeno o Estado passou por uma transformação, transferindo atribuições e descentralizando a burocracia de suas atividades, sobre esse tema discorre Odete Medauar: [...] a descentralização administrativa significa a transferência de poderes de decisão em matérias específicas a entes dotados de personalidade jurídica própria. Tais entes realizam, em nome próprio, atividades que, em princípio, têm as mesmas características e os mesmos efeitos das atividades administrativas estatais. A descentralização administrativa, implica, assim, a transferência de atividade decisória e não meramente administrativa.106 105 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle. Caderno MARE da reforma do Estado. V. 1. Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997. p. 11. 106 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno. 14. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 63. No Brasil essa desburocratização por meio da descentralização administrativa, ocorreu com os entes da administração indireta, que são: as empresas públicas, as autarquias, as sociedades de economia mista e as fundações públicas. Surge então o Plano Nacional de Desestatização/privatizações a partir da década de 90 do século passado, edição da Lei nº. 8.031, de 1990, cujo objetivo era reordenar a posição do Estado na economia, admitindo a transferência de atividades para o setor privado. A lei supracitada foi substituída pela Lei nº. 9.491/97, regulamentada pelo Decreto nº. 2.594/98. A Constituição Federal de 1988 aborda o assunto – Serviços Públicos – de forma genérica no Art. 175. O dispositivo constitucional atribui ao poder público a titularidade dos serviços públicos de um modo geral. Estatui, ainda, que o poder público pode prestar esses serviços diretamente ou indiretamente, nesse último caso, mediante concessão ou permissão. A própria Constituição Federal, em outros dispositivos, prevê também a autorização como forma de delegação de serviços públicos (ex.: Art. 21, XI e XII). Contudo, cumpre frisar que ordinariamente a delegação de serviços públicos deve ocorrer mediante concessão ou permissão: a delegação de serviços públicos mediante autorização é possível em alguns casos, mas deve, em tese, ser medida excepcional, transitória e é um modo precário e unilateral de delegação. O artigo 22, XXVII, da CF/88 confere à União competência legislativa para a edição de normas gerais – de obrigatória observância pelos órgãos e entidades administrativos de todos os níveis da Federação – sobre licitações e contratos, em todas as modalidades. Dessa forma, a regulamentação geral acerca das concessões e permissões de serviço público que se dão a partir de licitações caberá a esta unidade federativa. Já o parágrafo único do art. 175 da Constituição Federal de 1988 prevê a edição de lei que disponha sobre o regime jurídico das concessões e permissões de serviços públicos, as condições de extinção, a fiscalização, a obrigação de manter serviço adequado, os direitos dos usuários, a política tarifária, dentre outros aspectos. Diante desses dois dispositivos constitucionais (art. 22 e 175), e diante do panorama político vivenciado no Brasil na década de noventa, a União então, editou a Lei 8.987/95. Essa é a lei de normas gerais sobre os regimes de concessão e de permissão de serviços públicos. Trata-se de uma lei de caráter nacional, ou seja, aplicável à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. Após quase dez anos, foi editada a Lei 11.079/2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parcerias público-privadas no âmbito das Administrações Públicas de todos os entes federados. O legislador atribuiu às parcerias público-privadas a natureza de contratos de concessão especiais, porque são dotados de peculiaridades que as distinguem das “concessões comuns” disciplinadas basicamente na Lei 8.987/1995. Apesar de a Lei 8.987/95 disciplinar normas gerais sobre as concessões e as permissões de serviços públicos, na verdade a preocupação maior reside nas disposições sobre as concessões. Quanto às permissões, pouco mais faz a lei do que estatuir, no parágrafo único do art. 40, que: “aplica-se às permissões o disposto nesta Lei”. Note-se que nem mesmo uma ressalva do tipo “no que couber” consta do preceito supra transcrito. Embora evidentemente tal ressalva esteja implícita no dispositivo, pensamos que ela só terá aplicação nos raros casos em que determinada regra estabelecida para as concessões se mostre manifestamente incompatível com o parco regramento específico das permissões existentes na lei. Os incisos II e IV do art. 2º. da Lei 8.987/95 definem as modalidades de delegação em: concessão de serviço público, a qual é a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado; permissão de serviço público que é a delegação à título precário, mediante licitação da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. Com essas previsões legais referente a transição de venda de empresas estatais e a delegação da prestação de serviços públicos aos particulares (concessão, permissão ou autorização), não foi suficiente para que o Estado recuperasse seu poder de investimento em infra-estrutura, tampouco conseguisse manter com eficácia a prestação dos serviços públicos a que se obriga. Devido à instabilidade econômica, financeira e social, o Estado adotou esse novo modelo de prestação de serviços, permitindo ao particular a assunção de responsabilidades públicas. Sobre o tema Adilson Abreu Dallari escreve: Acabou-se o ‘tempo das vacas gordas’, do gasto público desenfreado, dos contratos sem recursos para atender a eles, da emissão desbragada de moeda sem valor, da inflação galopante etc. Em tempos de austeridade orçamentária e financeira, em tempos de duro combate ao déficit público, é preciso que as entidades públicas busquem recursos junto ao setor privado da economia.107 Concomitantemente à privatização ocorrida, o Estado iniciou uma nova modalidade de prestação de serviços públicos a particulares, conforme escreve Raquel Dias da Silveira: [...] o Estado começou a transferir a execução de suas competências a terceiros, mediante os institutos da concessão, permissão e autorização e, agora, possibilitando outras formas de contratação com a iniciativa privada, por meio das parcerias público-privadas.108 O doutrinador Carlos Ari Sundfeld destaca que a doutrina apresentou diversos critérios para diferenciar os dois tradicionais ramos do Direito, entre esses critérios apresentados podese dizer que prevalecem o do sujeito e o do interesse. Com relação ao sujeito o doutrinador escreve “[...] o direito público é aquele que tem por sujeito o Estado, enquanto o privado é o que rege a vida dos particulares [...]”109 Já em relação ao interesse, “[...] seriam públicas as normas que tutelam interesses públicos, e privadas as normas que regulam os interesses privados.[...]”110 No entanto essa distinção não permite de forma isolada uma separação dos segmentos, e como não há critérios objetivos para a distinção deve ser levado em consideração o regime jurídico. Continua Carlos Ari Sundfeld: Assim, bem público, relação de direito público, pessoa de direito público, interesse público e obrigação de direito público se distinguirão de seus 107 DALLARI, Adílson Abreu. Parcerias em transporte público. In: SUNDFELD, Carlos Ari. Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 360. 108 SILVEIRA, Raquel Dias da. Os processos Privatizadores nos Estados Unidos, Europa e América Latina: Tentativa de Compreensão do Fenômeno das Privatizações como Política do Modelo Neoliberal no Brasil. 2004, p. 211. 109 SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 139. 110 Ibidem, p. 140. correspondentes no direito privado pelo fato de se submeterem ao regime jurídico de direito público.111 Com isso constata-se que é necessário fazer uma análise dos regimes jurídicos de cada atividade a ser implementada, quer seja do Direito Público ou do Direito Privado, haja vista os regimes jurídicos ligados aos princípios de cada área. A parceria público-privada se apresenta como instrumento que possibilita uma releitura do critério da divisão, fazendo-se sobre um prisma constitucional onde aproxima o tradicional do Direito Público e o Direito Privado. O doutrinador Jorge Miranda escreve: A unidade jurídica que o Estado constitui pode exprimir-se com o recurso à noção de pessoa coletiva, distinta de cada uma das pessoas jurídicas que compõem a comunidade e dos próprios governantes e suscetível de entrar em relações jurídicas com outras entidades, tanto no domínio do Direito interno como no do Direito internacional, tanto sob a veste do Direito público como sob a do Direito privado.112 Nesse aspecto o Estado visto como pessoa coletiva, representando a coletividade como um todo, rompe a divisão tradicional entre o Direito Público e o Direito Privado, levando-se a aplicação dos princípios constitucionais norteadores das parcerias público-privadas, os quais devem ser aplicados de forma igualitária entre os contratantes. Sobre esses princípios podemos citar o da legalidade, da autonomia da vontade das partes, moralidade administrativa, da boa-fé objetiva, da função social, da preponderância do interesse público sobre o interesse particular, da proporcionalidade, da livre concorrência, da livre iniciativa e da eficiência. 111 Idem Ibidem, p. 142. 112 MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 67. O princípio da legalidade encontra guarida no artigo 37 da Constituição Federal, por meio do qual informa que a Administração Pública somente pode praticar atos previstos em Lei, isso sugere que o único parâmetro é a lei. Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello 113 o princípio da legalidade é um dos pilares que sustentam a concepção de Estado de Direito e o regime jurídico-administrativo nacional. Já o princípio da autonomia da vontade das partes, até então previsto nas relações de Direito Privado, permite aos particulares agirem da forma que melhor lhes convier desde que não haja impedimento legal, ou seja, contrario ao princípio da legalidade. Esse princípio está garantido na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, II, o qual traz que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. O principio da moralidade administrativa, previsto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988, reza que a Administração Pública e seus servidores devem ter seus atos pautados pelos padrões éticos de conduta. Caso haja inobservância desse princípio pelos agentes e servidores públicos todos os seus atos serão considerados inválidos. Com relação ao princípio da boa-fé objetiva esse abrange o ordenamento jurídico como um todo, quer seja no campo do Direito Público como no Direito Privado. Está previsto no artigo 422 do Código Civil e prevê que os contratantes estão obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. Esse princípio compreende o significado de cláusula geral, sobre isso escreve Judith Martins Costa: A cláusula geral constitui uma disposição normativa que utiliza, no seu enunciado, de forma proposital, uma linguagem de tessitura ‘aberta’, ‘fluida’ ou ‘vaga’. Esta disposição é dirigida ao juiz que diante do caso concreto, crie, complemente ou desenvolva normas jurídicas, que poderá fazer uso de elementos que estejam fora do sistema, o que evidencia a importância da fundamentação das decisões. 114 113 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 100. 114 COSTA, Judith Martins. Boa-fé no Direito Privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 58. Veja-se que esse princípio sugere sempre a manutenção do equilíbrio contratual por todas as partes, independentemente de serem elas de natureza Pública ou Privada. O princípio da função social prima para que os contratos não sejam exclusivamente instrumentos de circulação de riquezas, mas sim de desenvolvimento social, o que garante a atendimento indispensável a sustentabilidade das atividades jurídicas. Também de muita importância para o tema é o princípio da preponderância do interesse público sobre o interesse particular, essa expressão interesse público sempre vem ligada ou associada a uma idéia de coletividade. Por muito tempo se falou que o interesse público deveria se sobrepor a todos os demais interesses ainda que sacrificasse algum interesse menor ou particular. No entanto a nova concepção é a de que o interesse público deve prevalecer, sem contudo sacrificar ou mitigar interesse algum que seja. Em se tratante de transferência de atividade do Estado para o particular, não pode ficar de fora da análise o princípio da livre concorrência, o qual de acordo com a Constituição Federal prevê uma economia de mercado pautada no modelo concorrencial, com ações efetivas do Estado sendo regulador ou agente direto da atividade econômica, o que ocorre nas parcerias público-privadas. A livre iniciativa sugere o ideal de liberdade econômica, sendo reconhecida e garantida uma ordem jurídica segura aos entes particulares ao determinar suas atividades econômicas e a atuação do Estado, sempre buscando a garantia da manutenção da ordem econômica. O princípio da eficiência surgiu com o advento da Reforma Administrativa e determina que a Administração Pública deva agir de modo rápido e preciso, a fim de atingir os interesses da coletividade. Esse principio é um dos pilares que orientam as parcerias público-privadas, haja vista que esse modelo busca a eficiência encontrada na gestão privada, atendendo aos serviços públicos até então de responsabilidade do Estado e delegados aos particulares. Após essa análise dos princípios que norteiam a parceria público-privada, verifica-se que surgiram diversas formas de parcerias do Poder Público com o setor privado, visando a melhor condição de prestar os serviços público ou de utilidade pública, buscando satisfazer as necessidades da coletividade. De acordo com Maria Sylvia Zanella di Pietro, parceria, no vocabulário jurídico de significa o mesmo que sociedade é a “reunião de duas ou mais pessoas que investem capital, ou capital e trabalho, com o fim especulativo em proveito comum”.115 Continua a autora: A palavra parceria, do latim partiarius, participante, vem sendo empregada tradicionalmente em direito para designar uma forma sui generis de sociedade em que não se dá a composição de um capital social nem a instituição de uma nova pessoa, mas, apenas, uma relação negocial, em que uma das partes assume obrigações determinadas com vistas a participação de lucros alcançados.116 A parceria público-privada surgiu no âmbito da comunidade internacional como formatação jurídica destinada a submeter a prestação do serviço público ao postulado de eficiência econômica, estando ligada às reformas de Governo em todo o mundo, na busca de maior atratividade para o setor privado em setores carentes de investimentos públicos. No cenário internacional as primeiras parcerias público-privadas se deram na Europa, especificamente no Reino Unido, onde a parceria surgiu como resultado da reforma da gestão pública na prestação dos serviços de utilidade pública, isso tudo em razão da necessidade do ente Público com a vontade do ente Privado em participar dessa prestação de serviços. Ficou constato que esse modelo de parceria proporcionava ganhos significativos para a sociedade como um todo, pelo fato da qualidade no serviço prestado em razão da experiência e eficiência do parceiro privado e em razão da garantia da prestação desse serviço oferecido pelo Estado.117 Tanto no Brasil como no Reino Unido os momentos que marcaram o inicio das parcerias público-privadas é marcado por estratégias de desestatização, de regulação e flexibilização da gestão pública. A mesma pode ser utilizada com dois enfoques distintos. Um em sentido estrito consigna-se que a palavra parceria exprime a união de pessoas que possuem interesses comuns. Já em sentido amplo, são os ajustes comerciais de procedimento duradouro que visam instituir relações entre a Administração Pública e o particular, objetivando a realização de atividades imbuídas de interesse público. 115 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: Concessão, Permissão, Franquia, Terceirização, Parceria Público-Privada e outras Formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 40. 55 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: Concessão, Permissão, Franquia, Terceirização, Parceria Público-Privada e outras Formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 40. 117 SHINOHARA, Daniel Yoshio; SAVOIA, José Roberto Ferreira. Parcerias Público-Privadas no Brasil. Barueri, SP: Manole, 2008, p. 11. Segundo o conceito dado por Carlos Ari Sundfeld118 são os múltiplus vínculos negociais de trato continuado estabelecidos entre a Administração Pública e particulares para viabilizar o desenvolvimento, sob a responsabilidade destes, de atividades com algum coefeciente de interesse geral. Ao analisar o conceito acima verifica-se a amplitude que engloba os contratos de concessão de serviço público, disciplinando pela Lei n. 8.987/95, os contratos de gestão de organizações sociais, o uso de bem público pelos particulares em atividades de interesse social e outros. Nesse sentido a lição de Floriano de Azevedo Marques Neto: Segue daí, que podemos vislumbrar parcerias em sentido amplo ( o que comportaria o campo genérico do direito das parcerias a que alude Maria Sylvia Zanella Di Pietro), contemplando hipóteses de convênios, termos de cooperação, franquias, concessões típicas, concessões de uso de bens públicos, licenciamentos, arrendamentos etc.119 Pode-se dizer segundo Carlos Ari Sundfeld, de uma forma mais ampla e genérica que a parceria público-privada como “múltiplus vínculos negociais de trato continuado estabelecidos entre a administração Pública e particulares para viabilizar o desenvolvimento, sob a responsabilidade destes, de atividades com algum coeficiente de interesse geral.” Também utilizando-se do conceito de forma a analisar o sentido amplo e restrito formaliza Diógenes Gasparini: Num sentido amplo, parceria público-privada é todo o ajuste que a Administração Pública de qualquer nível celebra com um particular para viabilizar programas voltados ao desenvolvimento socioeconômico do país e ao bem-estar da sociedade, como são as concessões de serviços precedidas de obras públicas, os convênios e os consórcios públicos. Em sentido estrito, ou seja, com base na Lei federal das PPPs, pode-se afirmar que é um contrato administrativo de concessão por prazo certo e compatível com o retorno do investimento privado, celebrado pela Administração Pública com certa entidade particular, remunerando-se o parceiro privado conforme a modalidade de parceria adotada, destinado a regular a prestação de serviços públicos ou a execução de serviços públicos precedidos de obras públicas ou, ainda, a prestação de serviços em que a Administração Pública é sua usuária direta ou indireta, respeitado sempre o risco assumido. 120 118 SUNDFELD, Carlos Ari, Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 16. 119 MARQUES, Floriano de Azevedo Neto. As parcerias público-privadas no saneamento ambiental. In: SUNDFELD, Carlos Ari. Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Melheiros, 2005, p. 280. 120 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 88 Desta feita a parceria público-privada também pode ser conceituada segundo Marçal Justen Filho como: Parceria público-privada é um contrato organizacional, de longo prazo de duração, por meio do qual se atribui a um sujeito privado o dever de executar obra pública e (ou) prestar serviço público, com ou sem direito à remuneração, por meio da exploração da infra-estrutura, mas mediante uma garantia especial e reforçada prestada pelo Poder Público, utilizável para a obtenção de recursos no mercado financeiro. 121 Não menos importante, oportuno transcrever o conceito de José Cretella Neto: Contrato de parceria público-privada é o acordo firmado entre a Administração Pública e entes privados, que estabelece vínculo jurídico para implantação, expansão, melhoria ou gestão, no todo ou em parte, e sob o controle e fiscalização do Poder Público, de serviços, empreendimentos e atividades de interesse público em que haja investimento pelo parceiro privado, que responde pelo respectivo financiamento e pela execução do objeto estabelecido. 122 A fim de se aproximar da racionalidade econômica pautada na eficiência, bem como, atrair o capital privado para a consecução de obras públicas especialmente voltadas à infraestrutura, o Estado propôs-se a criar a norma que permite essa interação financeira públicoprivada. Para Fernão Justen de Oliveira: A parceria público-privada envolve a idéia de uma economia concertada, na qual o Estado assume posição subsidiária em relação à prestação do serviço público, mas desempenha papel destacado ao figurar como coobrigado pela contraprestação ao serviço prestado ou como usuário de serviço. A crise do Estado de Bem-Estar conduziu ao exercício de criatividade para que as atribuições da Administração se realizem sem a promoção direta pelo Estado. Dentre as modalidades cogitadas está o aproveitamento pelo Estado da atividade econômica privada para realizar serviço público de forma duradoura , eficiente e desoneradora dos cofres estatais.123 O Projeto de Lei n° 2.546/03, de iniciativa do Executivo Federal, no governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva, em sua exposição de motivos assinada pelos Ministros Guido Mantega e Antônio Palocci Filho, esclarece a intenção maior, qual seja, por meio das 121 JUSTEN, Marçal Filho. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 509. 122 CRETELLA NETO, José. Comentários à Lei das Parcerias Público-Privadas – PPPs. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 1. 123 OLIVEIRA, Fernão Justen de. Parceria público-privada: aspectos de direito público econômico (Lei n. 11.079/2004) Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 61-62 parcerias propiciar o compartilhamento dos riscos com o parceiro privado, obtendo deste o financiamento para as obras e serviços. Esta nova visão de relacionamento entre Estado e particular, apresentou outras alternativas das já existentes na Lei de Concessões n° 8.666/93124 e de concessão de serviços, Lei nº 8.987/95125 e nº 9074/95126 : De acordo com a exposição de motivos do projeto de lei mencionado a parceria público-privada constitui modalidade de contratação em que os entes públicos e as organizações privadas, mediante o compartilhamento de riscos e com financiamento obtido pelo setor privado, assumem a realização de serviços ou empreendimentos públicos. Tal procedimento, em pouco tempo alcançou grande sucesso em diversos países, como a Inglaterra, Irlanda, Portugal, Espanha e África do Sul, como sistema de contratação pelo Poder Público ante a falta de disponibilidade de recursos financeiros e aproveitamento da eficiência de gestão do setor privado.127 A necessidade de investimento público e a ausência de recursos estatais, fez surgir a necessidade de se reformular e tornar mais atraente ao setor privado a contratação com o Estado128. A alternativa encontrada foi o modelo que possibilitasse ao particular a assunção de responsabilidades públicas. Em razão dessa nova maneira de se enxergar o Estado e sua estrutura, surgem, as diversas formas de parcerias do Poder Público com o setor privado que visam melhores condições de prestar os serviços públicos ou de utilidade pública, como objetivo alcançar o bem estar da coletividade. 124 BRASIL. Lei 8.666 de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI da Constituição Federal, institui Normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. 125 Idem. Lei 8.987 de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão de prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal e dá outras providências. 126 Idem. Lei 9.074 de 07 de julho de 1995. Estabelece normas para outorga e prorrogações das concessões e premissões de serviços públicos e dá outras providências. 127 BRASIL. Projeto de Lei 2546 de 10 de novembro de 2003. Institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada, no âmbito da administração pública. Disponível em http://www.camara.gov.br/sileg/integras/182910.pdf. Acesso em 11 abr. 2010. 128 As Parcerias Público-Privadas permitem um amplo leque de investimentos, suprindo demandas desde as áreas de segurança pública, habitação, saneamento básico até as de infraestrutura viária ou elétrica. Veja-se que o Projeto de Plano Plurianual do Governo, encaminhado para vigorar no período de 2004 a 2007, estima a necessidade de investimentos na ordem de 21,7% (vinte e um vírgula sete por cento) do Produto Interno Bruto PIB até 2007, como condição à retomada e sustentação do crescimento econômico do país, o que torna indispensável a existência de instrumentos de parcerias que possibilitem a sua concretização. (grifo nosso) BRASIL. Projeto de Lei 2546 de 10 de novembro de 2003. Institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada, no âmbito da administração pública. Disponível em http://www.camara.gov.br/sileg/integras/182910.pdf. Acesso em 11 abr. 2010. Nesse aspecto, levando em consideração o modelo legal existente à época, foi indispensável a Reforma do Estado para que se desenvolvesse um modelo legal que possibilitasse essa nova forma de concessão. Nesse sentido, é indispensável destacar que a legislação brasileira de parceria se desenvolveu sob a égide da Reforma do Estado e quando se dizia que o Brasil precisava de uma lei que a instituísse, almejava-se a complementação da legislação para viabilizar contratos específicos que ainda não podiam ser implementados, por escassez normativa, ou vedação legal. Surgem, assim, as concessões como ferramenta para recriação do Estado. O surgimento desse modelo de contratação não pode ser analisado de maneira isolada; em verdade, o assunto adveio da crise do Estado do Bem– Estar Social desenvolvido no Brasil a partir da década de 1990 e que teve seu apogeu no governo Fernando Henrique Cardoso, com o fomento ao chamado Terceiro Setor e as privatizações de grandes empresas federais, como por exemplo, a Vale do Rio Doce e a CSN.129 No Brasil a competência das concessões e permissões está previsto no Artigo 175 da Constituição Federal de 1988 e dentro dessa ótica as Leis nº. 8.987/1995, nº. 9.074/1995 e nº. 9.648/1998 deram cumprimento ao ditame constitucional. Foi no governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva que passou-se a defender a idéia de implantação, assim como a urgência do que se convencionou chamar de “PPP”, almejando o crescimento econômico do país e aproveitando as conseqüências positivas advindas das experiências internacionais. Nasce o sistema legal que prevê e autoriza a prática dessa modalidade de empreendimento econômico entre o Poder Público e o particular, no novo direito positivo e, assim, cria-se mais uma alternativa para a realização de empreendimentos e prestação de serviços públicos que necessitem de grande vulto de recursos financeiros e longos prazos de maturação, especialmente no tocante às obras de infraestrutura. Mesmo sem viabilidade econômico-financeira na exploração de serviços, o Estado tem o dever fornecê-los à coletividade, para a satisfação do interesse público, razão pela qual precisa buscar os meios necessários ao suporte de seus objetivos. Face a esse contexto, surgem as parcerias público-privadas (PPP) como uma forma de atuação, fixada em contrato, para realizar investimentos necessários voltados à realização de obras ou prestação de serviços de interesse coletivo, em especial o tratamento dos resíduos sólidos urbanos. 129 KURACHI, Nilton Kyioshi. A Parceria Público-privada Como Instrumento Efetivo Do Desenvolvimento Econômico E Social, Dissertação de Mestrado Marília – SP. p. 134 Nesta oportunidade, observa-se que os contratos de parceria distinguem-se do modelo de privatização. Nesta o Estado se desfaz do patrimônio, e na parceria não, haja vista que os ativos ainda não existem, pois serão criados por meio dessa parceria. A Lei nº. 11.079/2004 - disciplina as Concessões Especiais, institui o regime denominado “parceria público-privada”. São concessões de serviços públicos ou de obras públicas que envolvam a realização de investimentos pecuniários pelo poder concedente devendo observar as normas gerais fixadas pela lei supracitada. Pode ser conceituada como “contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa” (art. 2º da Lei nº. 11.079/2004). A concessão patrocinada admite a realização de investimentos pelo Poder Público (chamado de parceiro público), além de cobrança de tarifa dos usuários; já a concessão administrativa envolve apenas serviços de que a Administração Pública seja a usuária (Lei nº. 11.079/2004, art. 2º., §§ 1º e 2º), ainda que envolva a execução de obra ou o fornecimento e instalação de bens; usuário não paga. Essa lei não criou um instituto completamente novo e sim conjugou vários elementos já conhecidos do nosso ordenamento jurídico, consoante explicação supra. Sobre as perspectivas de aplicação da Lei nº. 11.079/2004, Helio Saul Mileski assevera: Na realidade, trata-se apenas de mais um instituto posto à disposição do Poder Público, cuja implantação pode ser útil diante da falta de recursos financeiros públicos, ainda mais em um país como o nosso, com rígidos controles de endividamento público e programa de ajuste fiscal em busca de equilíbrio entre receita e despesa. Até porque se sabe perfeitamente que a solução para o financiamento de obras de infra-estrutura e serviços de interesse público não se esgota em uma única forma de agir do Poder Publico. É uma conjugação de modelos, cuja alternativa deve ser utilizada de acordo com as peculiaridades de cada situação a resolver.130 A parceria público-privada veio para suprir esse vazio, suprir essa insuficiência do Estado, pois através dela se vislumbra uma possibilidade de afrontar essa problemática Estatal, o que garante a continuidade dos investimentos em infra-estrutura, saúde, tecnologia e no caso específico de interesse do presente trabalho, na área do meio ambiente, que também está diretamente ligada a infra-estrutura, saúde e também tecnologia. 130 MILESKI, Hélio Saul. Parcerias Público-Privadas: Fundamentos, Aplicação e Alcance da Lei, Elementos Definidores, Princípios, Regras Específicas para Licitações e Contratos, Aspectos Controvertidos e Perspectiva de Aplicação de Lei nº. 11.079, de 30.12.2004. Revista Interesse Público. n. 29. Porto Alegre: Notadez, jan./fev. 2005, p. 91-92. Outro ponto peculiar das parcerias público-privadas é o fato desses investimentos não serem somente nos padrões anteriormente realizados pelo Estado, nessa nova modalidade os investimentos são bem mais significativos e acabam gerando maiores benefícios em todas as esferas. Importante ressaltar que o sucesso das Parcerias Público-Privadas está diretamente relacionado ao fato de que o custo dos serviços quando executados pela iniciativa privada na sua maioria das vezes é mais baixo que o custo dos serviços quando executados pelo Estado. O que se observa na constituição da parceria público-privada, é a união de dois interesses, quais sejam o público e o privado. No entanto, se por muito tempo foram antagônicos, já há algum tempo vêm vivendo um processo de aproximação inevitável, mercê do crescimento das necessidades do Estado. Este está cada vez mais sem condições de investir e de prestar adequadamente os serviços públicos inerentes à sua função. Assim, uma alternativa viável e possível de ser aplicada é a adoção da modalidade da parceria públicoprivada. Inclusive existe o fundamento constitucional para tal modelo e o mesmo é ressaltado por Diógenes Gasparini: O fundamento constitucional, legitimador desse comportamento legislativo da União, está no inciso XXVII do Art. 22 da Constituição Federal. Deveras, compete privativamente à União, nos termos desses dispositivos, legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no Art. 37, XXI, também da Lei Maior. Portanto, a Lei federal das PPPs, editada com esse fundamento, só é obrigatória em todos os seus termos e condições para a Administração Pública Federal, enquanto apenas suas normas gerais são obrigatórias aos Estados, Distrito Federal e Municípios, na medida em que editarem suas respectivas leis sobre parcerias público-privadas. As demais normas da Lei federal das PPPs não são obrigatórias para essas entidades, [...] 131 Dessa forma a Lei 11.079/04 tem fundamento na Constituição Federal, na parte que trata das licitações e contratos, e os Estados, Distrito Federal e municípios devem obediência somente quanto às normas gerais, pois cada um poderá ter sua legislação própria que deverão ser compatíveis com a mesma, sob pena de ilegalidade. No caso de ausência legislativa, os entes federados não estão proibidos de celebrar contratos dessa natureza, observando, para tanto, as normas da Lei das PPPs. 131 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 409. Para se firmar uma parceria público-privada se faz necessário cumprir alguns requisitos mínimos para distingui-la das concessões normais, tais como: valor contratual, prazo de execução, soma de despesas e garantias. Quanto ao valor está previsto na Lei 11.079/04, em seu inciso I do § 4º do artigo 2º, fixa o valor mínimo de 20.000.000,00 (vinte milhões de reais) para a contratação de empresas privadas na modalidade de PPP. Tal requisito confere coerência ao discurso que fundamenta a adoção da parceria público-privada, na medida em que condicionam a contratação por parceria somente a projetos de grande vulto e valor econômico, sobre o argumento de que a Administração Pública não dispõe de capital suficiente para investimento. Consequentemente para o parceiro privado realizar um aporte considerável de recursos o mesmo precisará de um longo período para recuperar o investimento realizado. Nesse sentido, a interpretação do referido artigo não é pacífica pelos doutrinadores, tendo em vista a existência de posicionamento pela sua inconstitucionalidade total ou tão somente a inconstitucionalidade quanto a sua aplicabilidade. Para aqueles que adotam o posicionamento da inconstitucionalidade total deste artigo, dentre eles Toshio Mukai132, o valor estipulado trata-se de natureza contratual, os quais não poderiam ser objetos da Lei 11.079/04, por não constituírem norma geral. No entanto Gustavo Binenbojm133 defende a sua inconstitucionalidade quanto a aplicabilidade, a mesma se dá em razão de trazer limite mínimo para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, no entanto deveria ater-se somente a União. Gustavo Binenbojm traz que: (...) a ordem de grandeza dos projetos e empreendimentos levados a efeito no âmbito federal é consideravelmente maior que a da maioria dos demais entes federativos. Assim (...) entendendo que cada ente federativo deve fixar seus próprios limites mínimos, compatíveis com a realidade sócio econômica, mas sem descurar do fato de que as PPPs se destinam a situações excepcionais e que requeiram investimento iniciais vultuosos do parceiro privado.134 132 MUKAI, Toshio, et. al. Parcerias público-privadas: comentários à Lei federal n. 11.079/04, às Leis Estaduais de Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo, Distrito Federal, Goiás, Bahia, Ceará, Rio Grande do Sul e a Lei Municipal de Vitória/ES. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005. p. 06. 133 BINENBOJM, Gustavo. As parcerias público-privadas (PPPs) e a Constituição. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Salvador; n. 2, maio/julho 2005. Disponível em: HTTP://www.direitodoestado.com.br. p. 10 134 Ibidem, p. 10-11 Além dos dois posicionamentos citados existe aquele que não vislumbra qualquer restrição a regra de fixação de valor mínimo para a contratação de PPPs. Para esse argumento, veja o posicionamento de Carlos Ari Sundfeld 135, por meio do qual pode dizer que as PPPs somente devem ser utilizadas em grandes projetos de infra-estrutura, e diante dos elevados riscos fiscais que as PPPs acarretam, um número reduzido destas, torna mais fácil o seu controle e fiscalização. Com isso, aduz-se que as PPPs somente devem ser utilizadas em projetos de grande magnitude, evitando assim que pequenos Municípios se utilizem delas. Para buscar a constitucionalidade da regra que proíbe contratos de PPPs de valores inferiores a vinte milhões de reais, importante observar a natureza jurídica dessa disposição, como sendo de natureza contratual e definidora de uma modalidade de contratação pública. Pode-se concluir que é limitativa, não guardando ou se preocupando com qualquer proporção entre o tamanho e as posses dos entes políticos, fixando um valor para todos. Para tanto, veja-se os dizeres do Professor Luiz Tarcísio: As modalidades licitatórias da concorrência, tomada de preços e convite, da Lei n 8.666/93, são todas elas definidas pelo vulto estimado da futura contratação, e nenhuma dúvida existe de que Estados, Distrito Federal e Municípios podem - devem – adotar valores próprios, inferiores, compatíveis com os próprios orçamentos ou com valores a eles relativos, como é o caso da receita corrente líquida. 136 Para tanto as Parcerias Público-Privadas sempre serão vistas de forma excepcional, pois só serão inseridas diante a incapacidade do Estado de obter recursos diretamente, tendo em vista tratar-se de contrato de financiamento vultoso. O “valor mínimo” estabelecido na Lei 11.079/04 tem natureza de norma de direito financeiro, e não meramente contratual, uma vez que implica o nascimento de obrigação de pagamento, decorrendo a necessária contabilização, obrigatoriedade de planejamento orçamentário plurianual, bem como a gestão fiscal responsável. Outro requisito diz respeito ao prazo mínimo de 5 anos de prestação de serviço, previsto no inciso II do § 4º do artigo 2º da Lei nº 11.079/2004, poderá ser vista sob dois prismas, segundo explica Sundfeld 137: “(i) constituiria um período mínimo de exposição do 135 SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo, Malheiros, 2005. p. 27. 136 FERREIRA, Luiz Tarcísio Teixeira. Parcerias Público-Privadas: aspectos constitucionais. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 134-135 137 SUNDFELD, Carlos Ari (Coord.). Parcerias público-privadas. São Paulo, Malheiros, 2005. p. 29. contrato ao risco de prejuízo econômico em decorrência da má execução da infraestrutura e (ii) ofereceria à Administração um prazo mínimo para a amortização dos investimentos.”138 A primeira citada não muito é aceita, tendo em vista que os contratos de concessão geralmente diante o seu vulto por si só se estendem a um prazo maior que 5 anos, e também porque o concessionário, concedente e a sociedade, estariam sujeitos a exposição de riscos da execução da infraestrutura, independente de prazo. Oferecer a Administração um prazo mínimo para a amortização dos investimentos, seria a posição mais adequada, pois serve de alívio financeiro e fiscal ao parceiro público. Portanto, tanto as cláusulas que estipulam o “valor mínimo de investimento”, como o “prazo mínimo”, serão formalmente inconstitucionais, já que deveriam ser objetos de lei Complementar. A Lei 11.079/04, em seus artigos 22 e 28 dispõem que somente poderá contratar parceria público-privada. Quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior 1% (um por cento) da receita líquida corrente do exercício e as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 (dez) anos subsequentes não excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios. Esses artigos acima mencionados geram controversas no mundo acadêmico, alguns adotam a sua inconstitucionalidade, alegando que a União não poderia fixar limite global de gastos com operações de PPPs para Estado, Distrito Federal e Municípios, pois trata-se de norma administrativa o que acarreta a autonomia administrativa de cada ente federado. Mas a maioria dos doutrinadores entende que a norma tem caráter financeiro e não cunho administrativo, porém, para a União estabelecer limites de gastos com as PPPs, deveria ser feito por meio de lei complementar e não lei ordinária. Como bem expõem Vera Monteiro: É fato que a fixação de limites de despesas com contratos de PPP é uma decisão prudente. Mas está é uma norma de direito financeiro, de modo que, para ser válida, deveria ser instituída por meio de lei complementar. Talvez por conta dessa fragilidade jurídica a lei federal tenha imposto a obrigatoriedade de cumprimento do limite a Estados, Municípios, fazendo-o de forma indireta, por meio da criação de regra que permite o não-repasse das transferências voluntárias aos entes. Essa clara intenção sancionatória 138 FERREIRA, Luiz Tarcísio Teixeira. Parcerias Público-Privadas: aspectos constitucionais. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 134-135 na norma em apreço pode vir a ser considerada inválida, em razão de claro desvio de poder nela contido.139 Diante a falha no procedimento correto, se os Estados e Municípios quiserem, poderão ou não adotar limites próprios, subtraindo-se à Lei de Responsabilidade Fiscal – Lei Complementar nº 101/00, pois padece de inconstitucionalidade material, por desvio de poder.140 O artigo 2º, § 2º da Lei 11.079/04 prevê a modalidade de concessão administrativa, veja: Art. 2o Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa. § 2o Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. O regramento da concessão de serviços públicos é apenas objeto parcial da concessão administrativa, veja a advertência citada pelo Professor Luiz Tarcisio: Como a lei pretende que as parcerias público-privadas sejam consideradas modalidades de concessão de serviço público, obviamente seu objeto só pode ser a prestação de um serviço público (ainda que para isto necessite englobar outras atividades): vale dizer: seu objeto será necessariamente a prestação de utilidade ou comodidade material fruível singularmente pelos administrados. Assim toda tentativa de efetuar parcerias público-privadas tendo como objeto alguma atividade que não seja serviço público seria aberrante, resultando em evidente nulidade do contrato.141 Afirmar que a Lei 11.079/04 permitiria a remuneração do parceiro-privado exclusivamente pelo parceiro-público e não somente por meio de tarifa cobrada do seu usuário, estaria diante de um desvirtuamento do objeto da Lei, até mesmo diante de uma nulidade absoluta do contrato. Outro ponto que carece destaque é a figura da Sociedade de Propósito Específico SPE, que está prevista no art. 9º da Lei nº 11.079/2004. 139 MONTEIRO, Vera. Legislação de parceria público-privada no Brasil: aspectos discais desse novo modelo de contratação. São Paulo. 2008. p. 107. 140 FERREIRA, Luiz Tarcísio Teixeira. Parcerias Público-Privadas: aspectos constitucionais. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 148 141 Ibidem, p. 133 A sociedade de propósito específico para esse fim não é inédita, a mesma já vinha prevista na Lei 8.987/95 para as concessões comuns. Naquelas hipóteses, em razão da natureza, complexidade e/ou valor do contrato, faculta ao Poder Público exigir a transformação do consórcio vencedor da licitação, em sociedade empresarial, antes da celebração do contrato. A diferença básica existente entre a constituição de sociedade específica na Lei de Parcerias Público-Privadas em relação à Lei n. 8.987/95, que disciplina as concessões comuns, reside na obrigatoriedade da constituição. O mesmo fundamento que autorizava a faculdade nas concessões comuns, aplica-se à parceria público-privada, conquanto, repita-se, tenha se transformado em imposição na Lei n. 11.079/04. A sociedade de propósito específico deverá ser criada pelo parceiro antes da celebração do contrato, com o objetivo de implantar e gerir o objeto da parceria, a quem caberá a propriedade dos bens resultantes do investimento, durante a vigência do contrato e até que se dê a sua amortização. Deve obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas. A sociedade poderá dar em garantia aos financiadores os direitos emergentes da parceria, conforme requisitos e condições estabelecidas no contrato. 142 O § 1º do artigo 9º, da Lei n.8.987/95 prevê a transferência do controle da sociedade de propósito específico, condicionada a autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato, sob pena de caducidade da concessão conforme artigo 27 da Lei nº 8.987/95, tendo em vista que os contratos de concessão tem caráter intuito personae, ou seja, se não cumprir os requisitos haverá fraude licitatória, expondo a Administração aos riscos de inércia ou deficiência dos serviços contratados. A Lei nº 11.079/04 possibilita essa transferência sem licitação e sem necessidade de demonstrar os requisitos exigidos ao licitante vencedor. Mas como bem ressalta Luiz Tarcísio Teixeira Ferreira: “a nosso ver essa cláusula somente poderá ser tida como constitucional se entender que se trata de uma espécie de intervenção, protagonizada pelos financiadores objetivando exclusivamente a recuperação da concessionária, 142 BARBOSA, Marcondes Dias. Parcerias Público-Privadas <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7448>, acesso em 13 abr. 2009. (PPP) Disponível em : portanto de caráter rigorosamente temporário, pena de vir a caracterizar-se a sua inconstitucionalidade.” 143 A Lei 11.079/04 especificamente em seu artigo 8º, instituiu também as formas de garantia que o Parceiro-Público pode garantir o investimento do Parceiro-Privado, veja: Art. 8o As obrigações pecuniárias contraídas pela Administração Pública em contrato de parceria público-privada poderão ser garantidas mediante: I – vinculação de receitas, observado o disposto no inciso IV do art. 167 da Constituição Federal; II – instituição ou utilização de fundos especiais previstos em lei; III – contratação de seguro-garantia com as companhias seguradoras que não sejam controladas pelo Poder Público; IV – garantia prestada por organismos internacionais ou instituições financeiras que não sejam controladas pelo Poder Público; V – garantias prestadas por fundo garantidor ou empresa estatal criada para essa finalidade; VI – outros mecanismos admitidos em lei. Até o advento da Lei 11.079/04 a possibilidade de oferecimento de garantias pelos entes públicos aos entes privados não era possível, sendo totalmente original, não havendo qualquer indício de disposições semelhantes na legislação pátria, em qualquer tempo ou até mesmo em legislação de natureza financeira pública. O Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas tem como objetivo prestar a garantia do cumprimento das obrigações pecuniárias assumidas pelo parceiro público, garantindo aos parceiros privados uma solidez do contrato, reduzindo as incertezas e os riscos concernentes aos compromissos financeiros assumidos pelo Governo Federal em contratos de PPP. Segundo informações obtidas no sitio virtual do Banco do Brasil144, o Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas (FGP) é administrado pelo Banco do Brasil S.A. e foi constituído conforme autorizado pelo art. 16 da Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, tendo, inicialmente, como único cotista a União Federal, tem a finalidade de garantir o pagamento de obrigações pecuniárias assumidas pelos parceiros públicos federais em virtude de formalização de projetos de Parcerias Público-Privadas, respondendo por suas obrigações com os bens e direitos integrantes do seu patrimônio. 143 FERREIRA, Luiz Tarcísio Teixeira. Parcerias Público-Privadas: aspectos constitucionais. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p 188. 144 Sitio Oficial do Banco do Brasil S.A. <http://www.bb.com.br/docs/pub/gov/exe/fdr/dwn/NEsFGPFinal.pdf > acesso em 10 ago. 2011. O Banco do Brasil foi designado pela Resolução nº 1, do Comitê Gestor das Parcerias Público-Privadas, de 5 de agosto de 2005, para criar, administrar, gerir e representar judicial e extrajudicialmente o FGP. O mesmo é regido pelo seu Regulamento e Estatuto, aprovados na primeira Assembléia de Cotistas realizada em 27 de janeiro de 2006 e alterados pela Assembléia de Cotistas do dia 31 de agosto de 2006. Na primeira Assembléia, foi também autorizada a integralização inicial do Fundo, com a transferência de ações do Banco do Brasil, Vale do Rio Doce e Eletrobrás, no montante autorizado pela Portaria Ministerial do Ministério da Fazenda nº 413, de 12 de dezembro de 2005. Tais aportes ocorreram em 27 de janeiro, 14 e 22 de fevereiro de 2006, tendo o Fundo passado a operar a partir da primeira integralização. Obedece, ainda, a Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) nº 3.289, de 3 de junho de 2005, a Instrução CVM n.º 426, de 28 de dezembro de 2005, e demais normas do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que regem os fundos de investimento ou carteiras de investimento administradas. Foram transferidos para o Banco do Brasil (BB) R$ 2,9 bilhões em participações acionárias da União no Banco do Brasil, na Companhia Vale do Rio Doce e na Eletrobrás. O funcionamento do fundo é o ponto mais importante para os empresários que pretendem investir nas PPPs, uma modalidade de financiamento de obras em que setor privado e governo atuam como sócios.145 O FGP tem por objetivo proporcionar a valorização das cotas por meio da gestão e administração de uma carteira de ativos financeiros, títulos e valores mobiliários, moeda corrente, bens móveis e imóveis, ou outros direitos com valor patrimonial, buscando a manutenção da sua rentabilidade, segurança e liquidez. De acordo com o regulamento, o Administrador do Fundo está autorizado a realizar operações restritas com instrumentos financeiros derivativos. Até a data do balanço não foram efetuadas operações dessa natureza. O artigo 16 da Lei 11.079/2004 prevê que a União, suas autarquias e fundações públicas participarão, com o limite global de R$ 6 bilhões de reais para o Fundo Garantidor de PPP, que terá por finalidade garantir o pagamento das obrigações pecuniárias assumidas pelo parceiro público em virtude das parcerias firmadas. Os aspectos da estrutura do FGP segundo Taciana de Oliveira Salera: 145 As notícias sobre Economia e Finanças do FinanceOne, Fundo de PPPs começa a funcionar com R$ 2,9 bilhões. Disponível em : <www.financeone.com.br/noticia.php?lang=br&nid=15653 - 35k> acesso em 12 fev. 2011. Na Gestão Profissional e Política de Investimento: o qual será gerido pelo Banco do Brasil, que é especializada em gestão de recursos de terceiros e também credenciada pela Comissão de Valores Mobiliários, devendo-se restringir de aplicações que comprometam o patrimônio. Qualidade dos Ativos: o Banco do Brasil irá escolher a empresa independente para avaliação dos ativos no momento de sua integralização pelo Governo Federal, sendo ainda responsável pela marcação dos mesmos ao mercado, em conformidade com as práticas determinadas pelo Banco Central do Brasil e pela CVM. Assim, como definido no Decreto n° 5.411/2005, as ações que integrarão o fundo garantem sua rentabilidade e liquidez, facultando-se, ainda, o ingresso de outros tipos de ativos de equivalente qualidade. Sustentabilidade: se ocorrer inadimplemento, o FGP deverá subrogar-se nos direitos do parceiro privado, tornando a Administradora obrigada a acionar o ordenador de despesa inadimplente. 146 O Fundo Garantidor das PPPs preocupou-se também com a confiança que os Parceiros Privados depositariam, escreve Arnaldo de Mesquita Neto: I - Ausência de Alavancagem – O FGP não está impedido de outorgar nova garantia se for verificado que o valor presente de todas as garantias emitidas supera o valor dos seus ativos. Além disso, a instituição bancária encarregada de gerir o fundo (Banco do Brasil) está obrigada a reavaliar mensalmente essa relação, justificando eventual desequilíbrio e solicitando ao cotista a integralização de novos ativos no FGP, caso o desequilíbrio seja percebido como permanente. II - Qualidade da Garantia - A modalidade de garantia a ser outorgada ao parceiro privado depende do tipo de ativo na carteira do FGP, precaução contida no Regulamento como forma de evitar um descasamento entre a liquidez do ativo e a da garantia outorgada, que poderia criar dificuldades para a liquidação de compromissos assumidos pelo FGP. O quadro abaixo aponta as modalidades de garantia passíveis de serem emitidas pelo FGP, condicionadas aos ativos do fundo que forem usados como lastro. III - Regras claras para acionamento (Cláusula Pétrea) - O Regulamento do FGP obriga o Banco do Brasil a receber todos os pedidos de execução de garantia, consoante o comando expresso na Lei n° 11.079/2004: 45 dias após o vencimento da fatura aceita e 90 dias após vencimento de fatura não contestada [11]. Estabelece ainda o prazo máximo de 15 dias úteis para o pagamento da garantia, caso o pleito do parceiro privado seja procedente e a administração pública não tenha providenciado o pagamento ou a contestação da fatura nesse período. Admite-se ainda a utilização de arbitragem, desde que previsto no contrato de PPP. IV - Restrições a decisões discricionárias dos Cotistas - Vedou-se a possibilidade do parceiro público interferir nas decisões do FGP que possam representar risco ao cumprimento de suas obrigações, como, por exemplo, outorgar garantias em desacordo com o limite financeiro 146 SALERA, Taciana de Oliveira .O novo regulamento do fundo garantidor das Parcerias Público-Privadas do Governo Federal Disponível em : <http://www.azevedosette.com.br/ppp/artigos/novo_regulamento.html>, acesso em 13 abr. 2010. disponível, manifestar-se sobre a execução e pagamento de garantias (Cláusula Pétrea) e liquidar o FGP sem saldar os compromissos assumidos. V - Comprometimento jurídico - As garantias outorgadas pelo FGP serão expressas em edital e contrato de PPP, de maneira detalhada, visando dar forma jurídica clara aos direitos e obrigações das partes. 147 Para garantir uma melhor transparência dos seus atos, o FGP divulga periodicamente a sua evolução patrimonial e também os fatos relevantes à confiabilidade e valorização deste patrimônio. Objetivando ilustrar o caso apresentado, o modelo criado no Estado de São Paulo, através da edição da Lei Paulista nº 11.688/04 que optou pela constituição de uma pessoa jurídica de Direito Privado Integrante da Administração Indireta, chamada de Companhia Paulista de Parcerias, a qual tem como objetivo e competência dar garantias ao cumprimento das obrigações do Estado nas PPPs. Com a criação dessa Lei, a espera pelo pagamento está fora da ordem dos precatórios. O aspecto central da discussão se dá pelo fato de não ser facultado ao Estado criar entes da sua administração indireta, ainda mais prestadores de serviços públicos, para fugir de seu regime próprio, qual seja, o regime de direito público que se sujeita ao processo constitucional de execução previsto no Artigo 100 da Constituição Federal. 3.3 PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA E SUA EFETIVIDADE Como principais adeptos dessa modalidade de parceria, pode-se citar o Governo do Estado de Minas Gerais e de Pernambuco. O Estado de Minas Gerais é um dos mais avançados e diversificados na adesão e modelo de realização de PPPs e traz em seu portal da internet sobre PPP a seguinte informação: Informações sobre o Programa PPP-MG e os Projetos de PPP em Minas Gerais. A viabilização do programa das PPPs não deve ser vista como uma finalidade em si, mas como um meio para que o Estado possa alcançar as verdadeiras prioridades-fim entre as dez anunciadas: melhorar substancialmente a segurança dos mineiros; prover a infraestrutura requerida por Minas Gerais com ênfase na ampliação e recuperação da malha rodoviária e saneamento básico; melhorar e ampliar o atendimento ao cidadão, por meio da oferta dos serviços públicos de qualidade, 147 BITTENCOURT, Arnaldo de Mesquita Neto. A eficácia das garantias oferecidas ao parceiro privado frente aos riscos oriundos do contrato de PPP. Elaborado em 11.2005 Disponível em : <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7755>, acesso em 13 abr. 2010. especialmente na educação, saúde e habitação; fomentar o desenvolvimento econômico estadual e reduzir as desigualdades regionais”. São demandas como essas que o programa de PPP vai começar a atender. E sua contribuição não será pequena. Na medida em que os investimentos e a conseqüente oferta dos serviços passarem a ser gradativamente realizados pelo setor privado, os impactos de desembolsos de recursos públicos poderão ser diluídos por períodos de tempo bem mais longos.148 O Estado de Minas Gerais está em fase de implantação e contratação de parcerias público-privadas para o sistema prisional, sistema viário, aeroportuário, sistema de saúde, metrô entre outros. Já o Governo do Estado de Pernambuco relata em seu portal oficial governamental da internet149 que o Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas foi iniciado a partir da publicação da Lei Estadual nº 12.765 em janeiro de 2005 e em consonância com a Lei nº 11.079 de 30 de dezembro de 2004, que instituiu normas gerais para licitação e contratação de parcerias público-privadas no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Na sequência foram sancionadas a Lei Estadual nº 12.976, de 28 de dezembro de 2005, que instituiu o Fundo Estadual Garantidor das Parcerias Público-Privadas e deu outras providências, tais como nova redação aos artigos 4º, 12, e 19 da Lei Nº 12.765 e a criação, na estrutura da Secretaria de Planejamento, a Unidade Operacional de Coordenação de Parcerias Público-Privadas – Unidade PPP. Finalmente, em janeiro de 2006, foi publicado o Decreto Nº 28.844 que instalou o Comitê Gestor do Programa Estadual, o CGPE. Em sua primeira reunião ordinária, realizada em 06 de fevereiro de 2006, o CGPE definiu os seguintes projetos prioritários: a) Ponte e Sistema Viário do Projeto Praia do Paiva; b) Sistema de Saneamento Básico do Projeto Praia do Paiva; c) Sistema de Saneamento Básico da Região Metropolitana; d) Duplicação da PE-60; e) Sistema de Saneamento Básico de Suape. Este primeiro pleito foi autorizado na 3º Reunião Ordinária do CGPE, realizada em 26/04/2006, após a avaliação da Subunidade de Infraestrutura, instituída então na Secretaria de Infraestrutura, que julgou os custos apresentados pelos empreendedores privados para a execução do projeto em conformidade com os parâmetros de mercado e apresentou o relatório de avaliação – RAV nº 001/2006, recomendando a aprovação. 148 PPP em Minas Gerais <http://www.ppp.mg.gov.br/pppemminas>, acesso em 15 abr. 2010. 149 Secretaria de Planejamento do Estado de Pernambuco <http://www.ppp.seplan.pe.gov.br/sobre.php>. Acesso em 15 abr. 2010. Seplan O projeto, tão logo encerrado o período de consulta pública (3/10 a 03/11/2006) e o atendimento de todas as exigências legais, foi incluído no Programa Estadual de PPP, na 5º reunião do CGPE, realizada em 8/11/2006. Na ocasião, foi autorizada a abertura do processo de licitação a partir de 13/11, sendo o seu respectivo aviso, por conta dos prazos legais, publicado no dia 10 do mesmo mês. O processo licitatório começou no dia 13/12/2006, com a abertura dos envelopes contendo a “Documentação de Habilitação” e a “Proposta Econômica” das empresas concorrentes. No dia 15/12, foi apresentada a relação dos “Licitantes Habilitados”. O vencedor, anunciado no dia 18 após as devidas análises feitas pela Comissão Permanente de Licitação – CPL/PPP, foi o Consórcio Odebrecht Investimentos em Infraestrutura Ltda, e a Construtora Norberto Odebrecht S/A. Em 28/12/2006, foi assinado o Contrato de Concessão Patrocinada para a Exploração da Ponte de Acesso e Sistema Viário do Destino de Turismo e Lazer Praia do Paiva – CONTRATO CGPE-001/2006, de um lado pelo Estado de Pernambuco (CONCEDENTE), por intermédio do Comitê Gestor do Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas CGPE e, do outro lado, pela Via Parque S.A. (CONCESSIONÁRIA), que é uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), constituída pelos adjudicatórios da licitação, encarregada de todas as obras civis de implantação de infraestrutura e implementação operacional dos serviços previstos no contrato. Com a assinatura do contrato, a Via Parque S.A. deu seqüência a todas as etapas previstas no cronograma de ações para a viabilização do início das obras, previsto para setembro de 2007. Foi nesse momento que a Concessionária Via Parque S.A. se empenhou na liberação da licença de implantação, que deverá ser concedida pela Agência Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – CPRH. O Governo do Estado, por sua vez, através do CGPE, tomou as providências necessárias para a abertura da conta garantia, conforme previsto na cláusula 36 do contrato CGPE – 001/2006. O segundo pleito, referente à solicitação para a execução de estudos e projetos do sistema de saneamento básico do Projeto Praia do Paiva, também na modalidade de concessão patrocinada, foi apresentado ao CGPE na sua 3º reunião ordinária, realizada em 26/04/2006. Durante a 5º reunião ordinária, realizada em 08/11/2006, foi apresentado o relatório de análise da solicitação de estudos e projeto básico feitos pela Sub-unidade PPP Infraestrutura. Na ocasião, concluiu-se que os dados e custos apresentados pela Construtora Norberto Odebrecht e Terrenos e Construções S.A. estavam em consonância com os valores de mercado, e então foi emitida uma carta de autorização para a solicitação. Em 22/03/2007, as empresas citadas solicitaram uma prorrogação do prazo de entrega, a fim de realizar estudos especiais. O CGPE acatou a solicitação e ficou estabelecido que a data limite para a entrega dos estudos e do projeto será 30/06/2007. Neste momento, o Governo de Pernambuco, através da Secretaria de Recursos Hídricos e da Companhia Pernambucana de Saneamento – COMPESA estudou a possibilidade de uma nova modelagem técnica, econômica, administrativa e operacional, onde a própria COMPESA executaria as obras e operacionalizaria os serviços delas decorrentes. O Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas - PEPPP encontra-se, atualmente, em fase de análise dos projetos prioritários existentes e definição de novos projetos a serem incluídos nesta relação de prioridade. Qualquer solicitação de inclusão deverá ser feita ao CGPE, através da Gerência Geral de Parcerias Público-Privadas – Unidade PPP, da Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado de Pernambuco – SEPLAG. A partir desta solicitação, a Unidade PPP procederá à fase de análise de enquadramento do projeto, nos parâmetros técnicos, administrativos e legais exigidos pela legislação estadual e federal. A análise resultará num parecer técnico de enquadramento que será encaminhado ao CGPE e posteriormente analisado quanto à sua conveniência, oportunidade e interesse, durante a 1º reunião ordinária do CGPE em 2007, a ser convocada. O Governo do Estado de Pernambuco, através da Unidade PPP, só concederá autorização para a realização de estudos e projetos básicos dos empreendimentos que fizerem parte da lista de projetos prioritários do PEPPP. No tocante as parcerias público-privadas no trato dos resíduos sólidos, estudo realizado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe)150, divulgado durante o Fórum Brasileiro de Resíduos Sólidos, revelam que o Brasil produziu quase 61 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU) em 2010, uma média de 378 kg de lixo por ano para cada brasileiro. Este volume é 6,8% superior ao registrado em 2009 e seis vezes superior ao índice de crescimento populacional urbano no mesmo período. A publicação apontou que, do total de 61 milhões de toneladas de RSU gerados no Brasil, 51 milhões de toneladas foram coletadas pelos serviços públicos de limpeza urbana. Segundo o estudo, em termos percentuais, houve uma ligeira melhora na destinação final dos resíduos sólidos urbanos: 57,6% do total coletado tiveram destinação adequada, sendo encaminhado a aterros sanitários, ante um índice de 56,8% no ano de 2009. 150 http://blogs.diariodonordeste.com.br/gestaoambiental/residuos-solidos/geracao-de-residuos-solidos-cresceseis-vezes-mais-do-que-a-populacao-brasileira/ acesso em 14 ago. 2011. Ainda assim, a quantidade de lixo com destinação inadequada permanece muito alta. Quase 23 milhões de toneladas de resíduos seguiram para lixões e aterros controlados no ano passado, em comparação a 21,7 milhões em 2009. Esse cenário é extremamente preocupante, uma vez que lixões e aterros controlados não têm mecanismos adequados de disposição e armazenamento do lixo e apresentam riscos de contaminação do solo e da água. No que se refere à reciclagem, permanece a tendência de crescimento das iniciativas de coleta seletiva, ainda que de forma muito lenta. O estudo mostrou que 57,6% dos municípios brasileiros afirmam ter iniciativas de coleta seletiva, em comparação a 56,6% no ano anterior. Embora a quantidade seja expressiva, vale destacar, em muitos casos essas iniciativas resumem-se à disponibilização de pontos de entrega voluntária à população ou na simples formalização de convênios com cooperativas de catadores para a execução dos serviços. A síntese do Panorama 2010 mais uma vez remete à necessária a adoção imediata de um sistema integrado e sustentável de gestão de resíduos sólidos para fazer frente ao crescimento desenfreado na geração e para garantir um destino adequado à totalidade dos resíduos. Já existem municípios no Brasil que aderiram a parceria público-privada na questão do tratamento dos resíduos sólidos, com destaque para os municípios de São Carlos e Embu das Artes. A Prefeitura de São Carlos - SP151, implantou uma PPP – Parceria Público-Privada para cuidar da coleta de lixo no município. O contrato com a empresa São Carlos Ambiental Serviços de Limpeza Urbana e Tratamento de Resíduos foi assinado no dia 23 de agosto de 2010 e entrou em operação 15 dias depois. O acordo foi considerado modelo e recebeu elogios do TCE – Tribunal de Contas do Estado. Um dos principais diferenciais dessa parceria é o pagamento fixo pelo volume de lixo coletado. A nova modalidade incentiva a empresa a implantar programas de coleta seletiva e reciclagem de lixo, reduzindo o volume encaminhado ao aterro sanitário do município. No modelo até então vigente, a companhia recebia por tonelada de lixo coletado e encaminhado ao aterro. 151 Site oficial da Prefeitura Municipal de São Carlos http://www.saocarlos.sp.gov.br/index.php/noticias/2009/155199-parceria-publico-privada-para-coleta-dolixo.html acesso em 12 ago. 2011. SP A São Carlos Ambiental será responsável pela implantação de um novo aterro sanitário e deverá investir aproximadamente R$ 18 milhões no local, com início de operação previsto para o final de 2011. A empresa também deve oferecer estrutura física para as cooperativas do programa de coleta seletiva do município. O contrato estabelece, ainda, a implantação de um sistema de queima controlada do gás metano gerado pelo lixo orgânico. A vencedora da licitação deverá implantar procedimentos para obter créditos de carbono com a queima dessa substância. A PPP será realizada na modalidade de concessão administrativa e o contrato de 20 anos poderá ser prorrogado por mais dez. A prefeitura vai investir R$ 9,5 milhões por ano no sistema de coleta de lixo da cidade. O TCE, por sua vez, destacou o desatrelamento entre o volume de resíduos depositados no aterro e os valores recebidos pela iniciativa privada. A modelagem proposta pela Prefeitura do município privilegia a conservação do meio ambiente, já que a empresa terá de buscar alternativas para diminuir o lixo depositado. Também pode-se citar o Município de Embu das Artes – SP como exemplo na parceria público-privada para o tratamento dos resíduos sólidos segundo matéria veiculada na imprensa digital152 o lixo é atualmente um dos maiores problemas enfrentados pelas prefeituras da região do Conisud, que abrange as cidades de Taboão, Embu das Artes, Itapecerica, São Lourenço, Juquitiba e Embu-Guaçu. Embu das Artes saiu na frente na busca pela resolução do problema por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) para a Prestação de Serviços de Limpeza Urbana e Manejo de Resíduos Sólidos. Durante o lançamento os moradores da cidade e autoridades da região conheceram de perto o modelo que a cidade vai implantar baseado em experiências internacionais de países como a França, Alemanha, Holanda e Suíça. O processo de coleta será auto sustentável gerando 400 novos empregos o que possibilitará uma maior integração social, buscando-se dessa forma o desenvolvimento sustentável. Além disso, a coleta seletiva será ampliada, haverá a produção de adubos e fertilizantes orgânicos e até a possibilidade de geração de energia por meio do processo de combustão dos resíduos sólidos. uso da tecnologia é maior diferencial do novo modelo de coleta e tratamento dos resíduos que Embu vai implantar. As novidades foram apresentadas pela empresa Embu Ambiental ganhadora da licitação para a implantação do novo sistema no município. O contrato entre a prefeitura e a cidade prevê a coleta e o transporte de resíduos domiciliares, e materiais recicláveis, execução 152 http://www.jornalnanet.com.br/noticias/2015/embu-busca-resolucao-no-tratamento-do-lixo acesso em 13 ago. 2011. das obras de recuperação e encerramento do atual aterro e a ampliação de área para os próximos 30 anos. Assim como a implantação, operação e manutenção do Centro de Tratamento de Resíduo, entre outros serviços. Independente da boa vontade e interesse da sociedade, o sucesso também está vinculado a uma política mais clara de incentivos e estímulos, tanto do governo federal como dos governos estaduais, para os municípios, que deverão buscar soluções conjuntas e regionalizadas, por meio dos consórcios públicos. Nunca é demais lembrar, essas soluções devem ser estruturadas com uma perspectiva de longo prazo e plena adequação ambiental, o que demanda investimentos, que podem ser supridos com a adoção do modelo de Parcerias Público-Privadas. 3.4 AS PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS E SUAS VANTAGENS As Parcerias Público-Privadas trazem inúmeros benefícios e vantagens para todos os seus envolvidos, quer sejam os particulares, o ente Estatal e para toda a população. As suas vantagens recaem principalmente na possibilidade de se prestar um serviço adequado e com qualidade ao qual o Estado se vê obrigado, porém sem condições de fazer. Essa modalidade de negócio traz a dinâmica da iniciativa privada na gestão dos recursos e cumprimento de metas para a prestação do serviço público, fornecendo dessa maneira um serviço com mais qualidade e eficiência para os cidadãos. Os principais aspectos econômicos da parceria público-privada estão ligados a celeridade nos investimentos e implementação dos projetos, pois conforme previsto na legislação específica, existem mecanismos que após garantida a execução do projeto, o parceiro no caso o ente privado, tem autonomia na gestão. Outro grande aspecto e vantagem econômica que se vislumbra por meio da parceria público-privada é a possibilidade de levar o desenvolvimento em locais em que o Estado não teria condições de imediato, uma vez que ao transferir para a iniciativa privada a responsabilidade pela implementação do projeto e a prestação do serviço, a única preocupação do Estado é a de instituir o Fundo Garantidor das Parcerias. Quem sai ganhando é a própria população, que passa a ter um serviço na sua maioria das vezes de qualidade que até então não o tinha, e de forma imediata que em muitas situações sequer teriam acesso se dependessem única e exclusivamente do Estado. Como se trata especificamente de Parcerias Público-Privadas que terão por objeto a prestação de serviços ou construções e investimentos de toda sorte, acabarão ainda gerando inúmeros empregos diretos e indiretos nos seus locais de implementação. Gerando empregos, automaticamente poderá se verificar o crescimento econômico e seus benefícios para a região na qual se encontra a parceria público-privada firmada. Os aspectos sociais da parceria público-privada estão intimamente ligados com a inserção e garantia ao acesso da população a serviços públicos aos quais tem direito, porém por ineficiência do Estado não lhes são oferecidos. A Constituição Federal consigna, como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, o desenvolvimento nacional (Art. 3º, II). José Afonso da Silva aponta que é a primeira vez que uma Constituição assinala, especificadamente, objetivos do Estado brasileiro. Com o dispositivo Constitucional acima mencionado, fica claro que o Estado, no cumprimento do seu papel, deve precipuamente buscar o desenvolvimento nacional, compreendendo o desenvolvimento econômico e social, por meio de duas atividades que são inerentes à sua existência: a administrativa e a financeira. Há muito tempo o erário público, em todas as esferas, não consegue estabelecer uma relação de equilíbrio entre despesas e receitas apresentando, quase sempre, “déficit” do caixa governamental. Para se obter o desenvolvimento necessário, é preciso definir o processo de sustentabilidade da parceria público-privada como instrumento de eficácia nesse processo. Para Eros Roberto Grau153, a idéia de desenvolvimento supõe dinâmicas mutações e importa em que se esteja a realizar um processo de mobilidade social contínuo e intermitente. O processo de desenvolvimento deve importar mudanças de ordem não apenas quantitativa, mas também qualitativa, ou seja, deve haver uma elevação do nível econômico e do nível cultural intelectual comunitário. Insta destacar que os projetos de desenvolvimento implicam uma consideração acerca do sistema econômico do país e, necessário se fará, saber qual modelo econômico terá maiores possibilidades para promover o crescimento qualitativo. Para que o Estado cumpra sua tarefa constitucional de “garantir o desenvolvimento nacional” não deve se ocupar tão somente com o crescimento econômico, mas, 153 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). 13 ed. ver. atual. São Paulo: 2008. principalmente, com a promoção do desenvolvimento, em todas as dimensões, tais como a social, a moral, a política e outras. Nesse sentido, André Ramos Tavares: O desenvolvimento do Estado passa prioritariamente pelo desenvolvimento do homem, de seu cidadão, de seus direitos fundamentais. Sem ele, o mero avanço econômico pouco significará, ou fará sentido para poucos. Assim independentemente do conceito que determinada atitude possa ocupar nas teorias econômicas, ela será adotada se puder ser utilizada como instrumento para alcançar mencionado desenvolvimento. Portanto, a intervenção do Estado, sempre que servir para esse desiderato, será necessária, bem como as prestações de cunho social (e especialmente tais prestações), sem que isso signifique a assunção de um modelo socialista. Da mesma forma, a consagração da liberdade, incluindo a livre iniciativa e a livre concorrência, serão essenciais para que se implemente aquele grau de desenvolvimento desejado.154 Na atual Constituição Federal o desenvolvimento que se objetiva é o desenvolvimento amplo. Não apenas econômico, no sentido de aumentar a produção nacional, mas, necessariamente, tendo finalidades sociais e humanas, com compromisso moral e ético. Gustavo Henrique Justino de Oliveira considera que: Mesmo diante da escassez de recursos públicos – fato que eventualmente pode ser tido como obstáculo para a efetivação de direitos sociais pela via direta da prestação de serviços públicos – o Estado não pode isentar-se de suas responsabilidades nesse campo. A ele cumpre promover uma série de outras ações (v.g., fomento, regulação, parcerias), as quais igualmente visam promover os valores fundamentais.155 Acredita-se que por meio das parcerias público-privadas, será possível garantir o desenvolvimento sem deixar de lado os aspectos sociais constitucionalmente protegidos. No tocante aos aspectos ambientais no presente trabalho, as parcerias público-privadas possuem aspectos relevantes e peculiares. Haja vista que o tratamento dos resíduos sólidos urbanos, também conhecido lixo, é obrigação do Estado. Como já mencionado no decorrer do trabalho, nos dias atuais o Estado não possuí condições de oferecer e cumprir com todas as suas obrigações para com a população, o que o obriga a aderir ao modelo e firmar parcerias público-privadas. 154 TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: Método, 2003, p. 68. 155 OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino de. Parceria público-privada e Direito ao Desenvolvimento: Uma Abordagem Necessária. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, v. 241, mar. 2006, p. 311. Na parceria público-privada para a gestão de resíduos sólidos urbanos, o Estado vai conferir ao parceiro particular a possibilidade de explorar uma atividade até então pertencente e de obrigação exclusiva do Estado. A avaliação da experiência internacional tem demonstrado que as PPPs são uma solução ganha-ganha para o setor público, setor privado e sociedade, possuindo diversas vantagens a seguir resumidamente mostradas. Para o Estado, a PPP permite a obtenção de um melhor uso do recurso público, quando da oferta de serviços públicos, ao lhes conferir eficiência, eficácia e efetividade, particularmente através das seguintes fontes: • Inovação. A PPP permite a transferência da capacidade inovadora do setor privado para a área pública. Uma das maiores fontes de ganho a esse respeito advém do fato do Governo não necessitar de fornecer pormenores de como um ativo deva ser projetado e construído, mas sim de estabelecer os condicionantes básicos de como o serviço público deverá ser ofertado pelo parceiro privado (modelo DBFOT); • Otimização do custo e da vida útil. Num modelo DBFOT, o empreendedor estará numa ótima posição para aprimorar técnicas de projeto e construção, que minimizem os custos de implantação e operação e aumentem a vida útil dos ativos, algo que dificilmente seria possível no esquema tradicional de gestão pública, em que as diversas fases do modelo antes citado são de responsabilidade de diferentes atores; • Compartilhamento de infra-estruturas. Existem vários casos em que facilidades governamentais implementadas através de PPPs são compartilhadas com terceiros, minimizando gastos operacionais do parceiro público, num movimento impulsionado pela experiência do parceiro privado em gestão de ativos; • Divisão ótima de responsabilidades. No caso mais freqüente, o parceiro público define as condições de oferta de determinado serviço público, e o parceiro privado projeta, constrói e opera os ativos para tal. Nessas circunstâncias, costuma ocorrer uma divisão de responsabilidades mais clara e coerente, já que cada um dos parceiros estará exercendo suas atividades finalísticas. Para o setor privado, a PPP representa um novo e amplo leque de oportunidades de negócios, muitas delas restritas anteriormente à governança pública. Para a sociedade, as PPPs representam uma oportunidade de se desfrutar de serviços públicos mais bem estruturados e coordenados, sobretudo pelo fato que indicadores de desempenho estarão monitorando todo o processo concessional. 3.5 SUGESTÃO DE PPP Após a abordagem do tema no trabalho, se faz necessário a apresentação de um modelo de negócio que seja capaz de viabilizar por meio da parceria público-privada a gestão de resíduos sólidos urbanos. Os municípios brasileiros despendem de grandes somas em dinheiro para a coleta, transporte e a destinação dos resíduos sólidos urbanos para os aterros e lixões. Essa política de trabalho e destinação compromete os investimentos para que seja aplicado e implementado um projeto eficaz para solução da problemática apresentada. Um dos fatores que onera o transporte e a coleta dos resíduos é a distância que vem aumentando entre os centros urbanos e os locais de descarte, muitas vezes sendo necessário até o transporte para outros municípios, haja vista não possuir aterros ou locais devidamente licenciados e apropriados para receber esses resíduos. Além de onerar o processo de descarte, muitas vezes os municípios não possuem condições financeiras de arcar com esses custos e dessa forma acabam por dispensar o lixo em locais impróprios como já mencionado, nesse caso geram condições para proliferação de doenças, haja vista o lixo se encontrar depositado a céu aberto. Também gera um problema social, com a atividade de catadores sem qualquer condição de proteção nesses lixões. Com isso a proposta apresentada é resultado de um estudo desenvolvido pelo Instituto Brasil Ambiente que sugere a implantação de uma usina de reciclagem com a geração de energia elétrica. A reciclagem dos resíduos sólidos pode viabilizar a economia de custos para os Municípios uma vez que não precisam gastar com o transporte e até a destinação final, não obstante também é possível obter renda com a venda do material reciclado, gerar empregos diretos e indiretos e ainda evitar a poluição ambiental. Um dos aspectos necessários para a implantação desse modelo de negócio é a implantação da coleta seletiva, pois com essa prática é possível elevar os ganhos econômicos com a reciclagem. Isso ocorre em razão de obter um maior preço na venda dos recicláveis limpos e consequentemente se evita custos com a higienização desses produtos. Nessa etapa já se inicia a educação ambiental, o que possibilitará uma maior integração da sociedade com o problema dos resíduos sólidos e a preocupação em participar de alguma alternativa capaz de solucionar o problema. Outra etapa para implementação do projeto é a instalação da central de reciclagem, a qual pode abranger os principais resíduos municipais, como exemplo a reciclagem de tronco e galhos resultantes das podas das árvores e também aproveitar os entulhos da construção civil. Além disso o lixo de cozinha e o lixo seco também podem ser aproveitados. Na central de reciclagem serão gerados empregos e renda para as famílias, isso possibilita a integração dessas pessoas que antes trabalhavam como catadores nas ruas ou nos próprios lixões, sem qualquer perspectiva de melhoria de renda ou integração social. Essa atividade tem por objetivo buscar o desenvolvimento sustentável social, trazendo dignidade para todas as pessoas envolvidas nessa fase do projeto. A etapa da central de reciclagem pode ser implantada no projeto como um todo da usina de reciclagem e geração de energia ou de forma isolada, o que já garante parte de solução do problema. Também é possível a geração de crédito de carbono a partir da reciclagem dos resíduos sólidos de cozinha. Essa geração de receita é significativa, uma vez que dos resíduos domiciliares 60% (sessenta) por cento é composto pelos resíduos da cozinha. 156 Após a separação na estação de triagem dos materiais (papéis, plásticos, vidro e latas) retornam para as indústrias. A economia gerada para o município é muito significativa, haja vista não precisar transportar cerca de 20% (vinte) por cento do total dos resíduos domiciliares, além do que a remuneração dos trabalhadores que fazem essa coleta é significativa. Ainda, como objetivo da reciclagem, poderá ser instalada a reciclagem de resíduos da construção civil, segundo dados do Instituto Brasil Ambiente no Brasil são gerados cerca de 500 (quinhentos) quilos de resíduos da construção civil por habitante todos os anos, mais do que o total gerado de resíduos domiciliares. Em geral, esse entulho é destinado para locais impróprios, prejudicando o meio ambiente. Uma solução apresentada é reaproveitar esses materiais, transformando-os em areia, brita, base para pavimentação, tijolos e lajotas, gerando assim renda e empregos. Tem-se ainda o chamado lixo remanescente que é aquele que não foi contemplado em nenhuma etapa da reciclagem das anteriores, esses resíduos que são compostos por fraldas descartáveis, papel higiênico e absorventes representam cerca de 15% (quinze) por cento do total dos resíduos domiciliares e são aproveitados para a geração de energia elétrica por meio do processo de gaseificação. 156 Instituto Brasil Ambiente – WWW.brasilambiente.com.br acesso em 20 jul. 2011. Por fim na cadeia do processo de reciclagem tem-se os móveis e eletroeletrônicos que para evitar uma disposição inadequada e gerar economia, móveis e eletroeletrônicos devem ser levados para oficinas comunitárias de reciclagem e reutilização. Com todo esse processo e a implementação de todas as etapas podem ser gerados em um município com cerca de 200.000 (duzentos mil) habitantes, cerca de 140 (cento e quarenta) empregos diretos, com remuneração mensal de aproximadamente 01 (um) salário mínimo mais benefícios a serem concedidos. Os custos evitados por um município com as dimensões acima mencionadas bem como a geração de receita que terá, poderá ser de cerca de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais) de receita e evitar os custos na ordem de R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais) com o transporte e a disposição dos resíduos sólidos urbanos em aterros.157 Para contemplar esse projeto se faz necessário a implantação da parceria públicoprivada, pois essa constitui um excelente mecanismo para que os municípios possam evitar os investimentos necessários, transferindo-os para o setor privado que passaria a reciclar os materiais e a compartilhar os ganhos com a própria Prefeitura. Isso em razão da modalidade de implantação da parceria público-privada que por meio do seu Fundo Garantidor confere aos empresários da iniciativa privada a segurança para o retorno dos investimentos realizados, como já dito investimentos de grande monta, oferecendo a toda a população um serviço de qualidade e principalmente garantindo a proteção do meio ambiente buscando o desenvolvimento sustentável ambiental. 157 Instituto Brasil Ambiente – WWW.brasilambiente.com.br acesso em 20 jul. 2011. CONCLUSÃO Para o desenvolvimento sustentável é necessário conjugar esforços de toda a sociedade, sem a exclusão de qualquer de seus segmentos, discutindo-se temas importantes como: explosão demográfica, desenvolvimento industrial, degradação do meio ambiente, novas políticas públicas na área educacional e ambiental. É verdade que se tem visto desenvolver programas, projetos e trabalhos no sentido de se atingir o desenvolvimento sustentável, mas a grande maioria trata-se de empreendimentos da iniciativa privada que acabam sendo isoladas, ante a inércia do grande potencial que temos para executar ações neste sentido. Dessa forma o desenvolvimento sustentável deve-se constituir em um objetivo planetário, um objetivo de toda a humanidade para que possa ser alcançado. Os povos devem se unir por esta causa e em parceria combater os problemas ambientais com soluções imaginativas e eficientes. O Estado brasileiro deve tomar as rédeas e gerenciar programas e projetos oficiais condizentes com as determinações mundiais ambientais, levando as diretrizes à sociedade, a qual, terá, assim, a oportunidade de participar do desenvolvimento sustentável. A sociedade brasileira esperou vinte anos para que seus legisladores aprovassem uma política nacional para os resíduos sólidos. Ao longo de todo esse período, grupos de interesse defenderam suas posições em negociações com deputados e senadores. Essas pressões tiveram evidentes influências no resultado final da Lei da PNRS. Ao mesmo tempo parece abrangente, a PNRS é genérica. Ao listar todos os possíveis e imagináveis instrumentos para facilitar sua implantação, a Lei não identifica entre eles aqueles que serão priorizados. As pressões de diferentes segmentos sociais não deixaram o legislador confortável para priorizar responsabilidades na gestão dos resíduos sólidos no Brasil: todos (governos, empresas, consumidores, comerciantes) são responsáveis, de maneira que nenhum será responsável por conduzir individualmente o processo de mudança. Uma vez genérica em muitos de seus aspectos, a Lei transfere para a sua regulamentação pelo Executivo a definição do que será priorizado e de que maneira isso será priorizado. Espera-se que os regulamentadores tenham claro que a PNRS brasileira alterará oferta, demanda e mercados de resíduos sólidos no país. Ao alterar tudo isso, influenciará preços praticados nas diferentes atividades relacionadas com resíduos sólidos. O problema apresentado quanto aos resíduos sólidos urbanos era tratado por meio do regime jurídico de contratos administrativos e das concessões previsto no Art. 175 da CF/88 e da Lei 8.987/95, o que nem sempre ocorria de forma eficiente. Em razão dessa dificuldade do Estado em gerir o problema, busca-se alternativas capazes de tratar a questão de forma eficiente, dentre essas alternativas apresenta-se a Parceria Público-Privada instituída pela Lei 11.079/2004, a qual confere ao parceiro privado algumas vantagens e garantias. A primeira vantagem é a criação da Sociedade de Propósito Específico, que tem por finalidade, implantar e gerir o objeto do contrato de parceria público-privada. A Sociedade deve ser constituída antes da celebração do contrato, apresentar transparência na gestão, o seu controle é feito pelo parceiro privado vencedor da licitação, o qual será responsável pela execução do contrato. A maioria do capital do SPE sempre será do parceiro privado. O equilíbrio econômico financeiro do contrato, garantido pela aplicação dos princípios contratuais, compartilhamento dos riscos e resultados fato esse inovador se comparado às concessões tradicionais. A instituição do Fundo Garantidor o qual irá garantir a execução do contrato e em caso de inadimplemento o parceiro privado tem a garantia sobre os investimentos realizados, não se sujeitando as regras tradicionais de execução contra o Estado, saindo inclusive das filas dos precatórios. Outra vantagem é o longo prazo de duração desses contratos de cinco a trinta e cinco anos, o que possibilitará o retorno do investimento realizado, porém caso no término do contrato o retorno do investimento do parceiro privado ainda não tenha sido amortizado, o prazo poderá ser prorrogado, isso atrai mais parceiros. Com a criação da parceria público-privada o que se busca é trazer para a prestação do serviço público a eficiência do setor privado. Dessa forma, verifica-se que a Parceria Público-Privada é uma alternativa apresentada para tratar da questão dos resíduos sólidos urbanos, por todas as suas vantagens e atrativos apresentados, bem como em razão do Estado não ter condições de tratar os resíduos sólidos da maneira antiga, por meio das concessões tradicionais. Analisando-se os casos concretos apresentados de PPPs já firmadas, sugere-se o modelo apresentado pelo Instituto Brasil Ambiente que prevê a instalação de uma usina de reciclagem e geração de energia a partir dos resíduos sólidos urbanos para um município de duzentos mil habitantes, por meio do qual será efetuada a reciclagem do resíduo doméstico, da construção civil, industrial e até mesmo das atividades de poda das árvores pelo município. Essa Parceria Público-Privada atingiria os fins da busca pelo desenvolvimento sustentável ambiental, econômico e social, garantindo o fornecimento de um serviço público eficiente e consequentemente resolvendo um problema contemporâneo até então sem solução. REFERÊNCIAS ANDRADE, Rui Otávio Bernardes de; TACHIZAWA, Takeshy; DE CARVALHO, Ana Barreiros. Gestão Ambiental – Enfoque Estratégico Aplicado ao Desenvolvimento Sustentável. 2 ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2002. ALVARENGA, José Eduardo de. 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TEIXEIRA, Murilo e MARQUES, Telma Maria. Perspectivas De Reciclagem Para A Preservação Ambiental Sustentavel. Trabalho realizado durante o curso de Mestrado em Sistema de Gestão, Laboratório de Tecnologia, Gestão de Negócios e Meio Ambiente – LATEC – da Universidade Federal Fluminense, localizado no dia 05.08.2011, no endereço eletrônico http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:N2Nvdf1oY3gJ:www.aedb.br/seget/ artigos04/140_RECICLAGEM%2520DE%2520PET%2520NO%2520BRASIL.doc+QUANT IDADE+DE+LIXO+DEPOSITADO TROSTER, Roberto Luis; MOCHÓN, Francisco. Introdução à economia. Ed. Ver. At. São Paulo: Makron Books, 2002. ANEXO I Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos LEI No 11.079, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2004. Mensagem de veto Institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Capítulo I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES Art. 1o Esta Lei institui normas gerais para licitação e contratação de parceria públicoprivada no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Esta Lei se aplica aos órgãos da Administração Pública direta, aos fundos especiais, às autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Art. 2 o Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa. § 1 o Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. § 2 o Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. § 3 o Não constitui parceria público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. § 4o É vedada a celebração de contrato de parceria público-privada: I – cujo valor do contrato seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais); II – cujo período de prestação do serviço seja inferior a 5 (cinco) anos; ou III – que tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública. Art. 3o As concessões administrativas regem-se por esta Lei, aplicando-se-lhes adicionalmente o disposto nos arts. 21, 23, 25 e 27 a 39 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e no art. 31 da Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995. (Regulamento) § 1 o As concessões patrocinadas regem-se por esta Lei, aplicando-se-lhes subsidiariamente o disposto na Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e nas leis que lhe são correlatas.(Regulamento) § 2o As concessões comuns continuam regidas pela Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e pelas leis que lhe são correlatas, não se lhes aplicando o disposto nesta Lei. § 3o Continuam regidos exclusivamente pela Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e pelas leis que lhe são correlatas os contratos administrativos que não caracterizem concessão comum, patrocinada ou administrativa. Art. 4 o Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes: I – eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade; II – respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; IV – responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias; V – transparência dos procedimentos e das decisões; VI – repartição objetiva de riscos entre as partes; VII – sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria. Capítulo II DOS CONTRATOS DE PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA Art. 5 o As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: I – o prazo de vigência do contrato, compatível com a amortização dos investimentos realizados, não inferior a 5 (cinco), nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação; II – as penalidades aplicáveis à Administração Pública e ao parceiro privado em caso de inadimplemento contratual, fixadas sempre de forma proporcional à gravidade da falta cometida, e às obrigações assumidas; III – a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária; IV – as formas de remuneração e de atualização dos valores contratuais; V – os mecanismos para a preservação da atualidade da prestação dos serviços; VI – os fatos que caracterizem a inadimplência pecuniária do parceiro público, os modos e o prazo de regularização e, quando houver, a forma de acionamento da garantia; VII – os critérios objetivos de avaliação do desempenho do parceiro privado; VIII – a prestação, pelo parceiro privado, de garantias de execução suficientes e compatíveis com os ônus e riscos envolvidos, observados os limites dos §§ 3o e 5o do art. 56 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e, no que se refere às concessões patrocinadas, o disposto no inciso XV do art. 18 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; IX – o compartilhamento com a Administração Pública de ganhos econômicos efetivos do parceiro privado decorrentes da redução do risco de crédito dos financiamentos utilizados pelo parceiro privado; X – a realização de vistoria dos bens reversíveis, podendo o parceiro público reter os pagamentos ao parceiro privado, no valor necessário para reparar as irregularidades eventualmente detectadas. § 1 o As cláusulas contratuais de atualização automática de valores baseadas em índices e fórmulas matemáticas, quando houver, serão aplicadas sem necessidade de homologação pela Administração Pública, exceto se esta publicar, na imprensa oficial, onde houver, até o prazo de 15 (quinze) dias após apresentação da fatura, razões fundamentadas nesta Lei ou no contrato para a rejeição da atualização. § 2o Os contratos poderão prever adicionalmente: I – os requisitos e condições em que o parceiro público autorizará a transferência do controle da sociedade de propósito específico para os seus financiadores, com o objetivo de promover a sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços, não se aplicando para este efeito o previsto no inciso I do parágrafo único do art. 27 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; II – a possibilidade de emissão de empenho em nome dos financiadores do projeto em relação às obrigações pecuniárias da Administração Pública; III – a legitimidade dos financiadores do projeto para receber indenizações por extinção antecipada do contrato, bem como pagamentos efetuados pelos fundos e empresas estatais garantidores de parcerias público-privadas. Art. 6o A contraprestação da Administração Pública nos contratos de parceria públicoprivada poderá ser feita por: I – ordem bancária; II – cessão de créditos não tributários; III – outorga de direitos em face da Administração Pública; IV – outorga de direitos sobre bens públicos dominicais; V – outros meios admitidos em lei. Parágrafo único. O contrato poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato. Art. 7o A contraprestação da Administração Pública será obrigatoriamente precedida da disponibilização do serviço objeto do contrato de parceria público-privada. Parágrafo único. É facultado à Administração Pública, nos termos do contrato, efetuar o pagamento da contraprestação relativa a parcela fruível de serviço objeto do contrato de parceria público-privada. Capítulo III DAS GARANTIAS Art. 8o As obrigações pecuniárias contraídas pela Administração Pública em contrato de parceria público-privada poderão ser garantidas mediante: I – vinculação de receitas, observado o disposto no inciso IV do art. 167 da Constituição Federal; II – instituição ou utilização de fundos especiais previstos em lei; III – contratação de seguro-garantia com as companhias seguradoras que não sejam controladas pelo Poder Público; IV – garantia prestada por organismos internacionais ou instituições financeiras que não sejam controladas pelo Poder Público; V – garantias prestadas por fundo garantidor ou empresa estatal criada para essa finalidade; VI – outros mecanismos admitidos em lei. Capítulo IV DA SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO Art. 9o Antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. § 1o A transferência do controle da sociedade de propósito específico estará condicionada à autorização expressa da Administração Pública, nos termos do edital e do contrato, observado o disposto noparágrafo único do art. 27 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. § 2o A sociedade de propósito específico poderá assumir a forma de companhia aberta, com valores mobiliários admitidos a negociação no mercado. § 3 o A sociedade de propósito específico deverá obedecer a padrões de governança corporativa e adotar contabilidade e demonstrações financeiras padronizadas, conforme regulamento. § 4o Fica vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata este Capítulo. § 5o A vedação prevista no § 4 o deste artigo não se aplica à eventual aquisição da maioria do capital votante da sociedade de propósito específico por instituição financeira controlada pelo Poder Público em caso de inadimplemento de contratos de financiamento. Capítulo V DA LICITAÇÃO Art. 10. A contratação de parceria público-privada será precedida de licitação na modalidade de concorrência, estando a abertura do processo licitatório condicionada a: I – autorização da autoridade competente, fundamentada em estudo técnico que demonstre: a) a conveniência e a oportunidade da contratação, mediante identificação das razões que justifiquem a opção pela forma de parceria público-privada; b) que as despesas criadas ou aumentadas não afetarão as metas de resultados fiscais previstas no Anexo referido no § 1o do art. 4o da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa; e c) quando for o caso, conforme as normas editadas na forma do art. 25 desta Lei, a observância dos limites e condições decorrentes da aplicação dos arts. 29, 30 e 32 da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, pelas obrigações contraídas pela Administração Pública relativas ao objeto do contrato; II – elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada; III – declaração do ordenador da despesa de que as obrigações contraídas pela Administração Pública no decorrer do contrato são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias e estão previstas na lei orçamentária anual; IV – estimativa do fluxo de recursos públicos suficientes para o cumprimento, durante a vigência do contrato e por exercício financeiro, das obrigações contraídas pela Administração Pública; V – seu objeto estar previsto no plano plurianual em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado; VI – submissão da minuta de edital e de contrato à consulta pública, mediante publicação na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que deverá informar a justificativa para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato, seu valor estimado, fixando-se prazo mínimo de 30 (trinta) dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos 7 (sete) dias antes da data prevista para a publicação do edital; e VII – licença ambiental prévia ou expedição das diretrizes para o licenciamento ambiental do empreendimento, na forma do regulamento, sempre que o objeto do contrato exigir. § 1 o A comprovação referida nas alíneas b e c do inciso I do caput deste artigo conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, observadas as normas gerais para consolidação das contas públicas, sem prejuízo do exame de compatibilidade das despesas com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias. § 2o Sempre que a assinatura do contrato ocorrer em exercício diverso daquele em que for publicado o edital, deverá ser precedida da atualização dos estudos e demonstrações a que se referem os incisos I a IV do caput deste artigo. § 3o As concessões patrocinadas em que mais de 70% (setenta por cento) da remuneração do parceiro privado for paga pela Administração Pública dependerão de autorização legislativa específica. Art. 11. O instrumento convocatório conterá minuta do contrato, indicará expressamente a submissão da licitação às normas desta Lei e observará, no que couber, os §§ 3o e 4 o do art. 15, os arts. 18, 19 e 21 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, podendo ainda prever: I – exigência de garantia de proposta do licitante, observado o limite do inciso III do art. 31 da Lei no 8.666 , de 21 de junho de 1993; II – (VETADO) III – o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996, para dirimir conflitos decorrentes ou relacionados ao contrato. Parágrafo único. O edital deverá especificar, quando houver, as garantias da contraprestação do parceiro público a serem concedidas ao parceiro privado. Art. 12. O certame para a contratação de parcerias público-privadas obedecerá ao procedimento previsto na legislação vigente sobre licitações e contratos administrativos e também ao seguinte: I – o julgamento poderá ser precedido de etapa de qualificação de propostas técnicas, desclassificando-se os licitantes que não alcançarem a pontuação mínima, os quais não participarão das etapas seguintes; II – o julgamento poderá adotar como critérios, além dos previstos nos incisos I e V do art. 15 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, os seguintes: a) menor valor da contraprestação a ser paga pela Administração Pública; b) melhor proposta em razão da combinação do critério da alínea a com o de melhor técnica, de acordo com os pesos estabelecidos no edital; III – o edital definirá a forma de apresentação das propostas econômicas, admitindo-se: a) propostas escritas em envelopes lacrados; ou b) propostas escritas, seguidas de lances em viva voz; IV – o edital poderá prever a possibilidade de saneamento de falhas, de complementação de insuficiências ou ainda de correções de caráter formal no curso do procedimento, desde que o licitante possa satisfazer as exigências dentro do prazo fixado no instrumento convocatório. § 1o Na hipótese da alínea b do inciso III do caput deste artigo: I - os lances em viva voz serão sempre oferecidos na ordem inversa da classificação das propostas escritas, sendo vedado ao edital limitar a quantidade de lances; II – o edital poderá restringir a apresentação de lances em viva voz aos licitantes cuja proposta escrita for no máximo 20% (vinte por cento) maior que o valor da melhor proposta. § 2o O exame de propostas técnicas, para fins de qualificação ou julgamento, será feito por ato motivado, com base em exigências, parâmetros e indicadores de resultado pertinentes ao objeto, definidos com clareza e objetividade no edital. Art. 13. O edital poderá prever a inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento, hipótese em que: I – encerrada a fase de classificação das propostas ou o oferecimento de lances, será aberto o invólucro com os documentos de habilitação do licitante mais bem classificado, para verificação do atendimento das condições fixadas no edital; II – verificado o atendimento das exigências do edital, o licitante será declarado vencedor; III – inabilitado o licitante melhor classificado, serão analisados os documentos habilitatórios do licitante com a proposta classificada em 2o (segundo) lugar, e assim, sucessivamente, até que um licitante classificado atenda às condições fixadas no edital; IV – proclamado o resultado final do certame, o objeto será adjudicado ao vencedor nas condições técnicas e econômicas por ele ofertadas. Capítulo VI DISPOSIÇÕES APLICÁVEIS À UNIÃO Art. 14. Será instituído, por decreto, órgão gestor de parcerias público-privadas federais, com competência para: (Vide Decreto nº 5.385, de 2005) I – definir os serviços prioritários para execução no regime de parceria público-privada; II – disciplinar os procedimentos para celebração desses contratos; III – autorizar a abertura da licitação e aprovar seu edital; IV – apreciar os relatórios de execução dos contratos. § 1 o O órgão mencionado no caput deste artigo será composto por indicação nominal de um representante titular e respectivo suplente de cada um dos seguintes órgãos: I – Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ao qual cumprirá a tarefa de coordenação das respectivas atividades; II – Ministério da Fazenda; III – Casa Civil da Presidência da República. § 2 o Das reuniões do órgão a que se refere o caput deste artigo para examinar projetos de parceria público-privada participará um representante do órgão da Administração Pública direta cuja área de competência seja pertinente ao objeto do contrato em análise. § 3 o Para deliberação do órgão gestor sobre a contratação de parceria público-privada, o expediente deverá estar instruído com pronunciamento prévio e fundamentado: I – do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, sobre o mérito do projeto; II – do Ministério da Fazenda, quanto à viabilidade da concessão da garantia e à sua forma, relativamente aos riscos para o Tesouro Nacional e ao cumprimento do limite de que trata o art. 22 desta Lei. § 4o Para o desempenho de suas funções, o órgão citado no caput deste artigo poderá criar estrutura de apoio técnico com a presença de representantes de instituições públicas. § 5o O órgão de que trata o caput deste artigo remeterá ao Congresso Nacional e ao Tribunal de Contas da União, com periodicidade anual, relatórios de desempenho dos contratos de parceria público-privada. § 6 o Para fins do atendimento do disposto no inciso V do art. 4 o desta Lei, ressalvadas as informações classificadas como sigilosas, os relatórios de que trata o § 5 o deste artigo serão disponibilizados ao público, por meio de rede pública de transmissão de dados. Art. 15. Compete aos Ministérios e às Agências Reguladoras, nas suas respectivas áreas de competência, submeter o edital de licitação ao órgão gestor, proceder à licitação, acompanhar e fiscalizar os contratos de parceria público-privada. Parágrafo único. Os Ministérios e Agências Reguladoras encaminharão ao órgão a que se refere o caput do art. 14 desta Lei, com periodicidade semestral, relatórios circunstanciados acerca da execução dos contratos de parceria público-privada, na forma definida em regulamento. Art. 16. Ficam a União, suas autarquias e fundações públicas autorizadas a participar, no limite global de R$ 6.000.000.000,00 (seis bilhões de reais), em Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas – FGP, que terá por finalidade prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias assumidas pelos parceiros públicos federais em virtude das parcerias de que trata esta Lei. (Vide Decreto nº 7.070, de 2010) Art. 16. Ficam a União, seus fundos especiais, suas autarquias, suas fundações públicas e suas empresas estatais dependentes autorizadas a participar, no limite global de R$ 6.000.000.000,00 (seis bilhões de reais), em Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas FGP, que terá por finalidade prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias assumidas pelos parceiros públicos federais em virtude das parcerias de que trata esta Lei. (Redação dada pela Medida provisória nº 513, de 2.010) Art. 16. Ficam a União, seus fundos especiais, suas autarquias, suas fundações públicas e suas empresas estatais dependentes autorizadas a participar, no limite global de R$ 6.000.000.000,00 (seis bilhões de reais), em Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas FGP, que terá por finalidade prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias assumidas pelos parceiros públicos federais em virtude das parcerias de que trata esta Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.409, de 2011) § 1 o O FGP terá natureza privada e patrimônio próprio separado do patrimônio dos cotistas, e será sujeito a direitos e obrigações próprios. § 2 o O patrimônio do Fundo será formado pelo aporte de bens e direitos realizado pelos cotistas, por meio da integralização de cotas e pelos rendimentos obtidos com sua administração. § 3 o Os bens e direitos transferidos ao Fundo serão avaliados por empresa especializada, que deverá apresentar laudo fundamentado, com indicação dos critérios de avaliação adotados e instruído com os documentos relativos aos bens avaliados. § 4o A integralização das cotas poderá ser realizada em dinheiro, títulos da dívida pública, bens imóveis dominicais, bens móveis, inclusive ações de sociedade de economia mista federal excedentes ao necessário para manutenção de seu controle pela União, ou outros direitos com valor patrimonial. § 5o O FGP responderá por suas obrigações com os bens e direitos integrantes de seu patrimônio, não respondendo os cotistas por qualquer obrigação do Fundo, salvo pela integralização das cotas que subscreverem. § 6 o A integralização com bens a que se refere o § 4o deste artigo será feita independentemente de licitação, mediante prévia avaliação e autorização específica do Presidente da República, por proposta do Ministro da Fazenda. § 7 o O aporte de bens de uso especial ou de uso comum no FGP será condicionado a sua desafetação de forma individualizada. § 8o A capitalização do FGP, quando realizada por meio de recursos orçamentários, darse-á por ação orçamentária específica para esta finalidade, no âmbito de Encargos Financeiros da União. (Incluído pela Medida provisória nº 513, de 2.010) § 8o A capitalização do FGP, quando realizada por meio de recursos orçamentários, darse-á por ação orçamentária específica para esta finalidade, no âmbito de Encargos Financeiros da União. (Redação dada pela Lei nº 12.409, de 2011) Art. 17. O FGP será criado, administrado, gerido e representado judicial e extrajudicialmente por instituição financeira controlada, direta ou indiretamente, pela União, com observância das normas a que se refere o inciso XXII do art. 4o da Lei no 4.595, de 31 de dezembro de 1964. § 1o O estatuto e o regulamento do FGP serão aprovados em assembléia dos cotistas. § 2 o A representação da União na assembléia dos cotistas dar-se-á na forma do inciso V do art. 10 do Decreto-Lei no 147, de 3 de fevereiro de 1967. § 3 o Caberá à instituição financeira deliberar sobre a gestão e alienação dos bens e direitos do FGP, zelando pela manutenção de sua rentabilidade e liquidez. Art. 18. As garantias do FGP serão prestadas proporcionalmente ao valor da participação de cada cotista, sendo vedada a concessão de garantia cujo valor presente líquido, somado ao das garantias anteriormente prestadas e demais obrigações, supere o ativo total do FGP. Art. 18. O estatuto e o regulamento do FGP devem deliberar sobre a política de concessão de garantias, inclusive no que se refere à relação entre ativos e passivos do Fundo. (Redação dada pela Medida provisória nº 513, de 2.010) Art. 18. O estatuto e o regulamento do FGP devem deliberar sobre a política de concessão de garantias, inclusive no que se refere à relação entre ativos e passivos do Fundo. (Redação dada pela Lei nº 12.409, de 2011) § 1o A garantia será prestada na forma aprovada pela assembléia dos cotistas, nas seguintes modalidades: I – fiança, sem benefício de ordem para o fiador; II – penhor de bens móveis ou de direitos integrantes do patrimônio do FGP, sem transferência da posse da coisa empenhada antes da execução da garantia; III – hipoteca de bens imóveis do patrimônio do FGP; IV – alienação fiduciária, permanecendo a posse direta dos bens com o FGP ou com agente fiduciário por ele contratado antes da execução da garantia; V – outros contratos que produzam efeito de garantia, desde que não transfiram a titularidade ou posse direta dos bens ao parceiro privado antes da execução da garantia; VI – garantia, real ou pessoal, vinculada a um patrimônio de afetação constituído em decorrência da separação de bens e direitos pertencentes ao FGP. § 2 o O FGP poderá prestar contra-garantias a seguradoras, instituições financeiras e organismos internacionais que garantirem o cumprimento das obrigações pecuniárias dos cotistas em contratos de parceria público-privadas. § 3o A quitação pelo parceiro público de cada parcela de débito garantido pelo FGP importará exoneração proporcional da garantia. § 4o No caso de crédito líquido e certo, constante de título exigível aceito e não pago pelo parceiro público, a garantia poderá ser acionada pelo parceiro privado a partir do 45 o (quadragésimo quinto) dia do seu vencimento. § 5 o O parceiro privado poderá acionar a garantia relativa a débitos constantes de faturas emitidas e ainda não aceitas pelo parceiro público, desde que, transcorridos mais de 90 (noventa) dias de seu vencimento, não tenha havido sua rejeição expressa por ato motivado. § 6o A quitação de débito pelo FGP importará sua subrogação nos direitos do parceiro privado. § 7o Em caso de inadimplemento, os bens e direitos do Fundo poderão ser objeto de constrição judicial e alienação para satisfazer as obrigações garantidas. § 8º O FGP poderá usar parcela da cota da União para prestar garantia aos seus fundos especiais, às suas autarquias, às suas fundações públicas e às suas empresas estatais dependentes. (Incluído pela Medida provisória nº 513, de 2.010) § 8 o O FGP poderá usar parcela da cota da União para prestar garantia aos seus fundos especiais, às suas autarquias, às suas fundações públicas e às suas empresas estatais dependentes. (Incluído pela Lei nº 12.409, de 2011) Art. 19 O FGP não pagará rendimentos a seus cotistas, assegurando-se a qualquer deles o direito de requerer o resgate total ou parcial de suas cotas, correspondente ao patrimônio ainda não utilizado para a concessão de garantias, fazendo-se a liquidação com base na situação patrimonial do Fundo. Art. 20. A dissolução do FGP, deliberada pela assembléia dos cotistas, ficará condicionada à prévia quitação da totalidade dos débitos garantidos ou liberação das garantias pelos credores. Parágrafo único. Dissolvido o FGP, o seu patrimônio será rateado entre os cotistas, com base na situação patrimonial à data da dissolução. Art. 21. É facultada a constituição de patrimônio de afetação que não se comunicará com o restante do patrimônio do FGP, ficando vinculado exclusivamente à garantia em virtude da qual tiver sido constituído, não podendo ser objeto de penhora, arresto, seqüestro, busca e apreensão ou qualquer ato de constrição judicial decorrente de outras obrigações do FGP. Parágrafo único. A constituição do patrimônio de afetação será feita por registro em Cartório de Registro de Títulos e Documentos ou, no caso de bem imóvel, no Cartório de Registro Imobiliário correspondente. Art. 22. A União somente poderá contratar parceria público-privada quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 (dez) anos subseqüentes, não excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios. Capítulo VII DISPOSIÇÕES FINAIS Art. 23. Fica a União autorizada a conceder incentivo, nos termos do Programa de Incentivo à Implementação de Projetos de Interesse Social – PIPS, instituído pela Lei no 10.735, de 11 de setembro de 2003, às aplicações em fundos de investimento, criados por instituições financeiras, em direitos creditórios provenientes dos contratos de parcerias público-privadas. Art. 24. O Conselho Monetário Nacional estabelecerá, na forma da legislação pertinente, as diretrizes para a concessão de crédito destinado ao financiamento de contratos de parcerias público-privadas, bem como para participação de entidades fechadas de previdência complementar. Art. 25. A Secretaria do Tesouro Nacional editará, na forma da legislação pertinente, normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de parceria público-privada. Art. 26. O inciso I do § 1 o do art. 56 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 56 .................................................................................... § 1o ......................................................................................... I - caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, devendo estes ter sido emitidos sob a forma escritural, mediante registro em sistema centralizado de liquidação e de custódia autorizado pelo Banco Central do Brasil e avaliados pelos seus valores econômicos, conforme definido pelo Ministério da Fazenda; ........................................................................................." (NR) Art. 27. As operações de crédito efetuadas por empresas públicas ou sociedades de economia mista controladas pela União não poderão exceder a 70% (setenta por cento) do total das fontes de recursos financeiros da sociedade de propósito específico, sendo que para as áreas das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH seja inferior à média nacional, essa participação não poderá exceder a 80% (oitenta por cento). § 1 o Não poderão exceder a 80% (oitenta por cento) do total das fontes de recursos financeiros da sociedade de propósito específico ou 90% (noventa por cento) nas áreas das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, onde o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH seja inferior à média nacional, as operações de crédito ou contribuições de capital realizadas cumulativamente por: I – entidades fechadas de previdência complementar; II – empresas públicas ou sociedades de economia mista controladas pela União. § 2o Para fins do disposto neste artigo, entende-se por fonte de recursos financeiros as operações de crédito e contribuições de capital à sociedade de propósito específico. Art. 28. A União não poderá conceder garantia e realizar transferência voluntária aos Estados, Distrito Federal e Municípios se a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por esses entes tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente líquida do exercício ou se as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 (dez) anos subseqüentes excederem a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios. Art. 28. A União não poderá conceder garantia e realizar transferência voluntária aos Estados, Distrito Federal e Municípios se a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por esses entes tiver excedido, no ano anterior, a 3% (três por cento) da receita corrente líquida do exercício ou se as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 (dez) anos subsequentes excederem a 3% (três por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios. (Redação dada pela Lei nº 12.024, de 2009) § 1o Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que contratarem empreendimentos por intermédio de parcerias público-privadas deverão encaminhar ao Senado Federal e à Secretaria do Tesouro Nacional, previamente à contratação, as informações necessárias para cumprimento do previsto no caput deste artigo. § 2 o Na aplicação do limite previsto no caput deste artigo, serão computadas as despesas derivadas de contratos de parceria celebrados pela Administração Pública direta, autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo respectivo ente. § 2o Na aplicação do limite previsto no caput deste artigo, serão computadas as despesas derivadas de contratos de parceria celebrados pela administração pública direta, autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo respectivo ente, excluídas as empresas estatais não dependentes. (Redação dada pela Lei nº 12.024, de 2009) § 3o (VETADO) Art. 29. Serão aplicáveis, no que couber, as penalidades previstas no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, na Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992 – Lei de Improbidade Administrativa, na Lei no 10.028, de 19 de outubro de 2000 - Lei dos Crimes Fiscais, no Decreto-Lei no 201, de 27 de fevereiro de 1967, e na Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950, sem prejuízo das penalidades financeiras previstas contratualmente. Art. 30. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 30 de dezembro de 2004; 183o da Independência e 116o da República. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Bernard Appy Nelson Machado ANEXO II Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos LEI Nº 12.305, DE 2 DE AGOSTO DE 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: TÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS CAPÍTULO I DO OBJETO E DO CAMPO DE APLICAÇÃO Art. 1o Esta Lei institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, dispondo sobre seus princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos aplicáveis. § 1o Estão sujeitas à observância desta Lei as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos. § 2o Esta Lei não se aplica aos rejeitos radioativos, que são regulados por legislação específica. Art. 2 o Aplicam-se aos resíduos sólidos, além do disposto nesta Lei, nas Leis nos 11.445, de 5 de janeiro de 2007, 9.974, de 6 de junho de 2000, e 9.966, de 28 de abril de 2000, as normas estabelecidas pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa) e do Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Sinmetro). CAPÍTULO II DEFINIÇÕES Art. 3o Para os efeitos desta Lei, entende-se por: I - acordo setorial: ato de natureza contratual firmado entre o poder público e fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto; II - área contaminada: local onde há contaminação causada pela disposição, regular ou irregular, de quaisquer substâncias ou resíduos; III - área órfã contaminada: área contaminada cujos responsáveis pela disposição não sejam identificáveis ou individualizáveis; IV - ciclo de vida do produto: série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produto, a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final; V - coleta seletiva: coleta de resíduos sólidos previamente segregados conforme sua constituição ou composição; VI - controle social: conjunto de mecanismos e procedimentos que garantam à sociedade informações e participação nos processos de formulação, implementação e avaliação das políticas públicas relacionadas aos resíduos sólidos; VII - destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos; VIII - disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos; IX - geradores de resíduos sólidos: pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas incluído o consumo; X - gerenciamento de resíduos sólidos: conjunto de ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta Lei; XI - gestão integrada de resíduos sólidos: conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável; XII - logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada; XIII - padrões sustentáveis de produção e consumo: produção e consumo de bens e serviços de forma a atender as necessidades das atuais gerações e permitir melhores condições de vida, sem comprometer a qualidade ambiental e o atendimento das necessidades das gerações futuras; XIV - reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa; XV - rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada; XVI - resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível; XVII - responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: conjunto de atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei; XVIII - reutilização: processo de aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua transformação biológica, física ou físico-química, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa; XIX - serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos: conjunto de atividades previstas no art. 7º da Lei nº 11.445, de 2007. TÍTULO II DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 4o A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos. Art. 5 o A Política Nacional de Resíduos Sólidos integra a Política Nacional do Meio Ambiente e articula-se com a Política Nacional de Educação Ambiental, regulada pela Lei no 9.795, de 27 de abril de 1999, com a Política Federal de Saneamento Básico, regulada pela Lei nº 11.445, de 2007, e com a Lei no 11.107, de 6 de abril de 2005. CAPÍTULO II DOS PRINCÍPIOS E OBJETIVOS Art. 6o São princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos: I - a prevenção e a precaução; II - o poluidor-pagador e o protetor-recebedor; III - a visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública; IV - o desenvolvimento sustentável; V - a ecoeficiência, mediante a compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta; VI - a cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade; VII - a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; VIII - o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania; IX - o respeito às diversidades locais e regionais; X - o direito da sociedade à informação e ao controle social; XI - a razoabilidade e a proporcionalidade. Art. 7o São objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos: I - proteção da saúde pública e da qualidade ambiental; II - não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos; III - estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços; IV - adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais; V - redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos; VI - incentivo à indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de matériasprimas e insumos derivados de materiais recicláveis e reciclados; VII - gestão integrada de resíduos sólidos; VIII - articulação entre as diferentes esferas do poder público, e destas com o setor empresarial, com vistas à cooperação técnica e financeira para a gestão integrada de resíduos sólidos; IX - capacitação técnica continuada na área de resíduos sólidos; X - regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção de mecanismos gerenciais e econômicos que assegurem a recuperação dos custos dos serviços prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade operacional e financeira, observada a Lei nº 11.445, de 2007; XI - prioridade, nas aquisições e contratações governamentais, para: a) produtos reciclados e recicláveis; b) bens, serviços e obras que considerem critérios compatíveis com padrões de consumo social e ambientalmente sustentáveis; XII - integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; XIII - estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto; XIV - incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o aproveitamento energético; XV - estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável. CAPÍTULO III DOS INSTRUMENTOS Art. 8o São instrumentos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre outros: I - os planos de resíduos sólidos; II - os inventários e o sistema declaratório anual de resíduos sólidos; III - a coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; IV - o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; V - o monitoramento e a fiscalização ambiental, sanitária e agropecuária; VI - a cooperação técnica e financeira entre os setores público e privado para o desenvolvimento de pesquisas de novos produtos, métodos, processos e tecnologias de gestão, reciclagem, reutilização, tratamento de resíduos e disposição final ambientalmente adequada de rejeitos; VII - a pesquisa científica e tecnológica; VIII - a educação ambiental; IX - os incentivos fiscais, financeiros e creditícios; X - o Fundo Nacional do Meio Ambiente e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; XI - o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir); XII - o Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa); XIII - os conselhos de meio ambiente e, no que couber, os de saúde; XIV - os órgãos colegiados municipais destinados ao controle social dos serviços de resíduos sólidos urbanos; XV - o Cadastro Nacional de Operadores de Resíduos Perigosos; XVI - os acordos setoriais; XVII - no que couber, os instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente, entre eles: a) os padrões de qualidade ambiental; b) o Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais; c) o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental; d) a avaliação de impactos ambientais; e) o Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente (Sinima); f) o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; XVIII - os termos de compromisso e os termos de ajustamento de conduta; XIX - o incentivo à adoção de consórcios ou de outras formas de cooperação entre os entes federados, com vistas à elevação das escalas de aproveitamento e à redução dos custos envolvidos. TÍTULO III DAS DIRETRIZES APLICÁVEIS AOS RESÍDUOS SÓLIDOS CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES Art. 9o Na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. § 1o Poderão ser utilizadas tecnologias visando à recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos, desde que tenha sido comprovada sua viabilidade técnica e ambiental e com a implantação de programa de monitoramento de emissão de gases tóxicos aprovado pelo órgão ambiental. § 2o A Política Nacional de Resíduos Sólidos e as Políticas de Resíduos Sólidos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios serão compatíveis com o disposto no caput e no § 1o deste artigo e com as demais diretrizes estabelecidas nesta Lei. Art. 10. Incumbe ao Distrito Federal e aos Municípios a gestão integrada dos resíduos sólidos gerados nos respectivos territórios, sem prejuízo das competências de controle e fiscalização dos órgãos federais e estaduais do Sisnama, do SNVS e do Suasa, bem como da responsabilidade do gerador pelo gerenciamento de resíduos, consoante o estabelecido nesta Lei. Art. 11. Observadas as diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei e em seu regulamento, incumbe aos Estados: I - promover a integração da organização, do planejamento e da execução das funções públicas de interesse comum relacionadas à gestão dos resíduos sólidos nas regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, nos termos da lei complementar estadual prevista no § 3º do art. 25 da Constituição Federal; II - controlar e fiscalizar as atividades dos geradores sujeitas a licenciamento ambiental pelo órgão estadual do Sisnama. Parágrafo único. A atuação do Estado na forma do caput deve apoiar e priorizar as iniciativas do Município de soluções consorciadas ou compartilhadas entre 2 (dois) ou mais Municípios. Art. 12. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão e manterão, de forma conjunta, o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir), articulado com o Sinisa e o Sinima. Parágrafo único. Incumbe aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios fornecer ao órgão federal responsável pela coordenação do Sinir todas as informações necessárias sobre os resíduos sob sua esfera de competência, na forma e na periodicidade estabelecidas em regulamento. Art. 13. Para os efeitos desta Lei, os resíduos sólidos têm a seguinte classificação: I - quanto à origem: a) resíduos domiciliares: os originários de atividades domésticas em residências urbanas; b) resíduos de limpeza urbana: os originários da varrição, limpeza de logradouros e vias públicas e outros serviços de limpeza urbana; c) resíduos sólidos urbanos: os englobados nas alíneas “a” e “b”; d) resíduos de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços: os gerados nessas atividades, excetuados os referidos nas alíneas “b”, “e”, “g”, “h” e “j”; e) resíduos dos serviços públicos de saneamento básico: os gerados nessas atividades, excetuados os referidos na alínea “c”; f) resíduos industriais: os gerados nos processos produtivos e instalações industriais; g) resíduos de serviços de saúde: os gerados nos serviços de saúde, conforme definido em regulamento ou em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS; h) resíduos da construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis; i) resíduos agrossilvopastoris: os gerados nas atividades agropecuárias e silviculturais, incluídos os relacionados a insumos utilizados nessas atividades; j) resíduos de serviços de transportes: os originários de portos, aeroportos, terminais alfandegários, rodoviários e ferroviários e passagens de fronteira; k) resíduos de mineração: os gerados na atividade de pesquisa, extração ou beneficiamento de minérios; II - quanto à periculosidade: a) resíduos perigosos: aqueles que, em razão de suas características de inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, teratogenicidade e mutagenicidade, apresentam significativo risco à saúde pública ou à qualidade ambiental, de acordo com lei, regulamento ou norma técnica; b) resíduos não perigosos: aqueles não enquadrados na alínea “a”. Parágrafo único. Respeitado o disposto no art. 20, os resíduos referidos na alínea “d” do inciso I do caput, se caracterizados como não perigosos, podem, em razão de sua natureza, composição ou volume, ser equiparados aos resíduos domiciliares pelo poder público municipal. CAPÍTULO II DOS PLANOS DE RESÍDUOS SÓLIDOS Seção I Disposições Gerais Art. 14. São planos de resíduos sólidos: I - o Plano Nacional de Resíduos Sólidos; II - os planos estaduais de resíduos sólidos; III - os planos microrregionais de resíduos sólidos e os planos de resíduos sólidos de regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas; IV - os planos intermunicipais de resíduos sólidos; V - os planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos; VI - os planos de gerenciamento de resíduos sólidos. Parágrafo único. É assegurada ampla publicidade ao conteúdo dos planos de resíduos sólidos, bem como controle social em sua formulação, implementação e operacionalização, observado o disposto na Lei no 10.650, de 16 de abril de 2003, e no art. 47 da Lei nº 11.445, de 2007. Seção II Do Plano Nacional de Resíduos Sólidos Art. 15. A União elaborará, sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, com vigência por prazo indeterminado e horizonte de 20 (vinte) anos, a ser atualizado a cada 4 (quatro) anos, tendo como conteúdo mínimo: I - diagnóstico da situação atual dos resíduos sólidos; II - proposição de cenários, incluindo tendências internacionais e macroeconômicas; III - metas de redução, reutilização, reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente adequada; IV - metas para o aproveitamento energético dos gases gerados nas unidades de disposição final de resíduos sólidos; V - metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; VI - programas, projetos e ações para o atendimento das metas previstas; VII - normas e condicionantes técnicas para o acesso a recursos da União, para a obtenção de seu aval ou para o acesso a recursos administrados, direta ou indiretamente, por entidade federal, quando destinados a ações e programas de interesse dos resíduos sólidos; VIII - medidas para incentivar e viabilizar a gestão regionalizada dos resíduos sólidos; IX - diretrizes para o planejamento e demais atividades de gestão de resíduos sólidos das regiões integradas de desenvolvimento instituídas por lei complementar, bem como para as áreas de especial interesse turístico; X - normas e diretrizes para a disposição final de rejeitos e, quando couber, de resíduos; XI - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito nacional, de sua implementação e operacionalização, assegurado o controle social. Parágrafo único. O Plano Nacional de Resíduos Sólidos será elaborado mediante processo de mobilização e participação social, incluindo a realização de audiências e consultas públicas. Seção III Dos Planos Estaduais de Resíduos Sólidos Art. 16. A elaboração de plano estadual de resíduos sólidos, nos termos previstos por esta Lei, é condição para os Estados terem acesso a recursos da União, ou por ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade. (Vigência) § 1o Serão priorizados no acesso aos recursos da União referidos no caput os Estados que instituírem microrregiões, consoante o § 3o do art. 25 da Constituição Federal, para integrar a organização, o planejamento e a execução das ações a cargo de Municípios limítrofes na gestão dos resíduos sólidos. § 2o Serão estabelecidas em regulamento normas complementares sobre o acesso aos recursos da União na forma deste artigo. § 3o Respeitada a responsabilidade dos geradores nos termos desta Lei, as microrregiões instituídas conforme previsto no § 1 o abrangem atividades de coleta seletiva, recuperação e reciclagem, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos urbanos, a gestão de resíduos de construção civil, de serviços de transporte, de serviços de saúde, agrossilvopastoris ou outros resíduos, de acordo com as peculiaridades microrregionais. Art. 17. O plano estadual de resíduos sólidos será elaborado para vigência por prazo indeterminado, abrangendo todo o território do Estado, com horizonte de atuação de 20 (vinte) anos e revisões a cada 4 (quatro) anos, e tendo como conteúdo mínimo: I - diagnóstico, incluída a identificação dos principais fluxos de resíduos no Estado e seus impactos socioeconômicos e ambientais; II - proposição de cenários; III - metas de redução, reutilização, reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a quantidade de resíduos e rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente adequada; IV - metas para o aproveitamento energético dos gases gerados nas unidades de disposição final de resíduos sólidos; V - metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; VI - programas, projetos e ações para o atendimento das metas previstas; VII - normas e condicionantes técnicas para o acesso a recursos do Estado, para a obtenção de seu aval ou para o acesso de recursos administrados, direta ou indiretamente, por entidade estadual, quando destinados às ações e programas de interesse dos resíduos sólidos; VIII - medidas para incentivar e viabilizar a gestão consorciada ou compartilhada dos resíduos sólidos; IX - diretrizes para o planejamento e demais atividades de gestão de resíduos sólidos de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões; X - normas e diretrizes para a disposição final de rejeitos e, quando couber, de resíduos, respeitadas as disposições estabelecidas em âmbito nacional; XI - previsão, em conformidade com os demais instrumentos de planejamento territorial, especialmente o zoneamento ecológico-econômico e o zoneamento costeiro, de: a) zonas favoráveis para a localização de unidades de tratamento de resíduos sólidos ou de disposição final de rejeitos; b) áreas degradadas em razão de disposição inadequada de resíduos sólidos ou rejeitos a serem objeto de recuperação ambiental; XII - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito estadual, de sua implementação e operacionalização, assegurado o controle social. § 1o Além do plano estadual de resíduos sólidos, os Estados poderão elaborar planos microrregionais de resíduos sólidos, bem como planos específicos direcionados às regiões metropolitanas ou às aglomerações urbanas. § 2 o A elaboração e a implementação pelos Estados de planos microrregionais de resíduos sólidos, ou de planos de regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas, em consonância com o previsto no § 1 o, dar-se-ão obrigatoriamente com a participação dos Municípios envolvidos e não excluem nem substituem qualquer das prerrogativas a cargo dos Municípios previstas por esta Lei. § 3 o Respeitada a responsabilidade dos geradores nos termos desta Lei, o plano microrregional de resíduos sólidos deve atender ao previsto para o plano estadual e estabelecer soluções integradas para a coleta seletiva, a recuperação e a reciclagem, o tratamento e a destinação final dos resíduos sólidos urbanos e, consideradas as peculiaridades microrregionais, outros tipos de resíduos. Seção IV Dos Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Art. 18. A elaboração de plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, nos termos previstos por esta Lei, é condição para o Distrito Federal e os Municípios terem acesso a recursos da União, ou por ela controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à limpeza urbana e ao manejo de resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade. (Vigência) § 1o Serão priorizados no acesso aos recursos da União referidos no caput os Municípios que: I - optarem por soluções consorciadas intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, incluída a elaboração e implementação de plano intermunicipal, ou que se inserirem de forma voluntária nos planos microrregionais de resíduos sólidos referidos no § 1o do art. 16; II - implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda. § 2o Serão estabelecidas em regulamento normas complementares sobre o acesso aos recursos da União na forma deste artigo. Art. 19. O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos tem o seguinte conteúdo mínimo: I - diagnóstico da situação dos resíduos sólidos gerados no respectivo território, contendo a origem, o volume, a caracterização dos resíduos e as formas de destinação e disposição final adotadas; II - identificação de áreas favoráveis para disposição final ambientalmente adequada de rejeitos, observado o plano diretor de que trata o § 1 o do art. 182 da Constituição Federal e o zoneamento ambiental, se houver; III - identificação das possibilidades de implantação de soluções consorciadas ou compartilhadas com outros Municípios, considerando, nos critérios de economia de escala, a proximidade dos locais estabelecidos e as formas de prevenção dos riscos ambientais; IV - identificação dos resíduos sólidos e dos geradores sujeitos a plano de gerenciamento específico nos termos do art. 20 ou a sistema de logística reversa na forma do art. 33, observadas as disposições desta Lei e de seu regulamento, bem como as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS; V - procedimentos operacionais e especificações mínimas a serem adotados nos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, incluída a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e observada a Lei nº 11.445, de 2007; VI - indicadores de desempenho operacional e ambiental dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos; VII - regras para o transporte e outras etapas do gerenciamento de resíduos sólidos de que trata o art. 20, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS e demais disposições pertinentes da legislação federal e estadual; VIII - definição das responsabilidades quanto à sua implementação e operacionalização, incluídas as etapas do plano de gerenciamento de resíduos sólidos a que se refere o art. 20 a cargo do poder público; IX - programas e ações de capacitação técnica voltados para sua implementação e operacionalização; X - programas e ações de educação ambiental que promovam a não geração, a redução, a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos; XI - programas e ações para a participação dos grupos interessados, em especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver; XII - mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda, mediante a valorização dos resíduos sólidos; XIII - sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, bem como a forma de cobrança desses serviços, observada a Lei nº 11.445, de 2007; XIV - metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, entre outras, com vistas a reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para disposição final ambientalmente adequada; XV - descrição das formas e dos limites da participação do poder público local na coleta seletiva e na logística reversa, respeitado o disposto no art. 33, e de outras ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; XVI - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito local, da implementação e operacionalização dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos de que trata o art. 20 e dos sistemas de logística reversa previstos no art. 33; XVII - ações preventivas e corretivas a serem praticadas, incluindo programa de monitoramento; XVIII - identificação dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos, incluindo áreas contaminadas, e respectivas medidas saneadoras; XIX - periodicidade de sua revisão, observado prioritariamente o período de vigência do plano plurianual municipal. § 1o O plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos pode estar inserido no plano de saneamento básico previsto no art. 19 da Lei nº 11.445, de 2007, respeitado o conteúdo mínimo previsto nos incisos do caput e observado o disposto no § 2 o, todos deste artigo. § 2o Para Municípios com menos de 20.000 (vinte mil) habitantes, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos terá conteúdo simplificado, na forma do regulamento. § 3 o O disposto no § 2 o não se aplica a Municípios: I - integrantes de áreas de especial interesse turístico; II - inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional; III - cujo território abranja, total ou parcialmente, Unidades de Conservação. § 4o A existência de plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos não exime o Município ou o Distrito Federal do licenciamento ambiental de aterros sanitários e de outras infraestruturas e instalações operacionais integrantes do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos pelo órgão competente do Sisnama. § 5o Na definição de responsabilidades na forma do inciso VIII do caput deste artigo, é vedado atribuir ao serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos a realização de etapas do gerenciamento dos resíduos a que se refere o art. 20 em desacordo com a respectiva licença ambiental ou com normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e, se couber, do SNVS. § 6o Além do disposto nos incisos I a XIX do caput deste artigo, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos contemplará ações específicas a serem desenvolvidas no âmbito dos órgãos da administração pública, com vistas à utilização racional dos recursos ambientais, ao combate a todas as formas de desperdício e à minimização da geração de resíduos sólidos. § 7 o O conteúdo do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos será disponibilizado para o Sinir, na forma do regulamento. § 8o A inexistência do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos não pode ser utilizada para impedir a instalação ou a operação de empreendimentos ou atividades devidamente licenciados pelos órgãos competentes. § 9o Nos termos do regulamento, o Município que optar por soluções consorciadas intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, assegurado que o plano intermunicipal preencha os requisitos estabelecidos nos incisos I a XIX do caput deste artigo, pode ser dispensado da elaboração de plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos. Seção V Do Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos Art. 20. Estão sujeitos à elaboração de plano de gerenciamento de resíduos sólidos: I - os geradores de resíduos sólidos previstos nas alíneas “e”, “f”, “g” e “k” do inciso I do art. 13; II - os estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços que: a) gerem resíduos perigosos; b) gerem resíduos que, mesmo caracterizados como não perigosos, por sua natureza, composição ou volume, não sejam equiparados aos resíduos domiciliares pelo poder público municipal; III - as empresas de construção civil, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama; IV - os responsáveis pelos terminais e outras instalações referidas na alínea “j” do inciso I do art. 13 e, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e, se couber, do SNVS, as empresas de transporte; V - os responsáveis por atividades agrossilvopastoris, se exigido pelo órgão competente do Sisnama, do SNVS ou do Suasa. Parágrafo único. Observado o disposto no Capítulo IV deste Título, serão estabelecidas por regulamento exigências específicas relativas ao plano de gerenciamento de resíduos perigosos. Art. 21. O plano de gerenciamento de resíduos sólidos tem o seguinte conteúdo mínimo: I - descrição do empreendimento ou atividade; II - diagnóstico dos resíduos sólidos gerados ou administrados, contendo a origem, o volume e a caracterização dos resíduos, incluindo os passivos ambientais a eles relacionados; III - observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa e, se houver, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos: a) explicitação dos responsáveis por cada etapa do gerenciamento de resíduos sólidos; b) definição dos procedimentos operacionais relativos às etapas do gerenciamento de resíduos sólidos sob responsabilidade do gerador; IV - identificação das soluções consorciadas ou compartilhadas com outros geradores; V - ações preventivas e corretivas a serem executadas em situações de gerenciamento incorreto ou acidentes; VI - metas e procedimentos relacionados à minimização da geração de resíduos sólidos e, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, à reutilização e reciclagem; VII - se couber, ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, na forma do art. 31; VIII - medidas saneadoras dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos; IX - periodicidade de sua revisão, observado, se couber, o prazo de vigência da respectiva licença de operação a cargo dos órgãos do Sisnama. § 1 o O plano de gerenciamento de resíduos sólidos atenderá ao disposto no plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos do respectivo Município, sem prejuízo das normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa. § 2o A inexistência do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos não obsta a elaboração, a implementação ou a operacionalização do plano de gerenciamento de resíduos sólidos. § 3 o Serão estabelecidos em regulamento: I - normas sobre a exigibilidade e o conteúdo do plano de gerenciamento de resíduos sólidos relativo à atuação de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis; II - critérios e procedimentos simplificados para apresentação dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos para microempresas e empresas de pequeno porte, assim consideradas as definidas nos incisos I e II do art. 3o da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006, desde que as atividades por elas desenvolvidas não gerem resíduos perigosos. Art. 22. Para a elaboração, implementação, operacionalização e monitoramento de todas as etapas do plano de gerenciamento de resíduos sólidos, nelas incluído o controle da disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, será designado responsável técnico devidamente habilitado. Art. 23. Os responsáveis por plano de gerenciamento de resíduos sólidos manterão atualizadas e disponíveis ao órgão municipal competente, ao órgão licenciador do Sisnama e a outras autoridades, informações completas sobre a implementação e a operacionalização do plano sob sua responsabilidade. § 1 o Para a consecução do disposto no caput, sem prejuízo de outras exigências cabíveis por parte das autoridades, será implementado sistema declaratório com periodicidade, no mínimo, anual, na forma do regulamento. § 2 o As informações referidas no caput serão repassadas pelos órgãos públicos ao Sinir, na forma do regulamento. Art. 24. O plano de gerenciamento de resíduos sólidos é parte integrante do processo de licenciamento ambiental do empreendimento ou atividade pelo órgão competente do Sisnama. § 1 o Nos empreendimentos e atividades não sujeitos a licenciamento ambiental, a aprovação do plano de gerenciamento de resíduos sólidos cabe à autoridade municipal competente. § 2o No processo de licenciamento ambiental referido no § 1 o a cargo de órgão federal ou estadual do Sisnama, será assegurada oitiva do órgão municipal competente, em especial quanto à disposição final ambientalmente adequada de rejeitos. CAPÍTULO III DAS RESPONSABILIDADES DOS GERADORES E DO PODER PÚBLICO Seção I Disposições Gerais Art. 25. O poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações voltadas para assegurar a observância da Política Nacional de Resíduos Sólidos e das diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei e em seu regulamento. Art. 26. O titular dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos é responsável pela organização e prestação direta ou indireta desses serviços, observados o respectivo plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, a Lei nº 11.445, de 2007, e as disposições desta Lei e seu regulamento. Art. 27. As pessoas físicas ou jurídicas referidas no art. 20 são responsáveis pela implementação e operacionalização integral do plano de gerenciamento de resíduos sólidos aprovado pelo órgão competente na forma do art. 24. § 1 o A contratação de serviços de coleta, armazenamento, transporte, transbordo, tratamento ou destinação final de resíduos sólidos, ou de disposição final de rejeitos, não isenta as pessoas físicas ou jurídicas referidas no art. 20 da responsabilidade por danos que vierem a ser provocados pelo gerenciamento inadequado dos respectivos resíduos ou rejeitos. § 2o Nos casos abrangidos pelo art. 20, as etapas sob responsabilidade do gerador que forem realizadas pelo poder público serão devidamente remuneradas pelas pessoas físicas ou jurídicas responsáveis, observado o disposto no § 5o do art. 19. Art. 28. O gerador de resíduos sólidos domiciliares tem cessada sua responsabilidade pelos resíduos com a disponibilização adequada para a coleta ou, nos casos abrangidos pelo art. 33, com a devolução. Art. 29. Cabe ao poder público atuar, subsidiariamente, com vistas a minimizar ou cessar o dano, logo que tome conhecimento de evento lesivo ao meio ambiente ou à saúde pública relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos. Parágrafo único. Os responsáveis pelo dano ressarcirão integralmente o poder público pelos gastos decorrentes das ações empreendidas na forma do caput. Seção II Da Responsabilidade Compartilhada Art. 30. É instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, a ser implementada de forma individualizada e encadeada, abrangendo os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, consoante as atribuições e procedimentos previstos nesta Seção. Parágrafo único. A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos tem por objetivo: I - compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais e os processos de gestão empresarial e mercadológica com os de gestão ambiental, desenvolvendo estratégias sustentáveis; II - promover o aproveitamento de resíduos sólidos, direcionando-os para a sua cadeia produtiva ou para outras cadeias produtivas; III - reduzir a geração de resíduos sólidos, o desperdício de materiais, a poluição e os danos ambientais; IV - incentivar a utilização de insumos de menor agressividade ao meio ambiente e de maior sustentabilidade; V - estimular o desenvolvimento de mercado, a produção e o consumo de produtos derivados de materiais reciclados e recicláveis; VI - propiciar que as atividades produtivas alcancem eficiência e sustentabilidade; VII - incentivar as boas práticas de responsabilidade socioambiental. Art. 31. Sem prejuízo das obrigações estabelecidas no plano de gerenciamento de resíduos sólidos e com vistas a fortalecer a responsabilidade compartilhada e seus objetivos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes têm responsabilidade que abrange: I - investimento no desenvolvimento, na fabricação e na colocação no mercado de produtos: a) que sejam aptos, após o uso pelo consumidor, à reutilização, à reciclagem ou a outra forma de destinação ambientalmente adequada; b) cuja fabricação e uso gerem a menor quantidade de resíduos sólidos possível; II - divulgação de informações relativas às formas de evitar, reciclar e eliminar os resíduos sólidos associados a seus respectivos produtos; III - recolhimento dos produtos e dos resíduos remanescentes após o uso, assim como sua subsequente destinação final ambientalmente adequada, no caso de produtos objeto de sistema de logística reversa na forma do art. 33; IV - compromisso de, quando firmados acordos ou termos de compromisso com o Município, participar das ações previstas no plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos, no caso de produtos ainda não inclusos no sistema de logística reversa. Art. 32. As embalagens devem ser fabricadas com materiais que propiciem a reutilização ou a reciclagem. § 1 o Cabe aos respectivos responsáveis assegurar que as embalagens sejam: I - restritas em volume e peso às dimensões requeridas à proteção do conteúdo e à comercialização do produto; II - projetadas de forma a serem reutilizadas de maneira tecnicamente viável e compatível com as exigências aplicáveis ao produto que contêm; III - recicladas, se a reutilização não for possível. § 2o O regulamento disporá sobre os casos em que, por razões de ordem técnica ou econômica, não seja viável a aplicação do disposto no caput. § 3 o É responsável pelo atendimento do disposto neste artigo todo aquele que: I - manufatura embalagens ou fornece materiais para a fabricação de embalagens; II - coloca em circulação embalagens, materiais para a fabricação de embalagens ou produtos embalados, em qualquer fase da cadeia de comércio. Art. 33. São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: I - agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas; II - pilhas e baterias; III - pneus; IV - óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; V - lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; VI - produtos eletroeletrônicos e seus componentes. § 1 o Na forma do disposto em regulamento ou em acordos setoriais e termos de compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial, os sistemas previstos no caput serão estendidos a produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens, considerando, prioritariamente, o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados. § 2 o A definição dos produtos e embalagens a que se refere o § 1o considerará a viabilidade técnica e econômica da logística reversa, bem como o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados. § 3o Sem prejuízo de exigências específicas fixadas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS, ou em acordos setoriais e termos de compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial, cabe aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos produtos a que se referem os incisos II, III, V e VI ou dos produtos e embalagens a que se referem os incisos I e IV do caput e o § 1o tomar todas as medidas necessárias para assegurar a implementação e operacionalização do sistema de logística reversa sob seu encargo, consoante o estabelecido neste artigo, podendo, entre outras medidas: I - implantar procedimentos de compra de produtos ou embalagens usados; II - disponibilizar postos de entrega de resíduos reutilizáveis e recicláveis; III - atuar em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, nos casos de que trata o § 1o. § 4o Os consumidores deverão efetuar a devolução após o uso, aos comerciantes ou distribuidores, dos produtos e das embalagens a que se referem os incisos I a VI do caput, e de outros produtos ou embalagens objeto de logística reversa, na forma do § 1o. § 5o Os comerciantes e distribuidores deverão efetuar a devolução aos fabricantes ou aos importadores dos produtos e embalagens reunidos ou devolvidos na forma dos §§ 3 o e 4 o. § 6o Os fabricantes e os importadores darão destinação ambientalmente adequada aos produtos e às embalagens reunidos ou devolvidos, sendo o rejeito encaminhado para a disposição final ambientalmente adequada, na forma estabelecida pelo órgão competente do Sisnama e, se houver, pelo plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos. § 7o Se o titular do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, por acordo setorial ou termo de compromisso firmado com o setor empresarial, encarregar-se de atividades de responsabilidade dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes nos sistemas de logística reversa dos produtos e embalagens a que se refere este artigo, as ações do poder público serão devidamente remuneradas, na forma previamente acordada entre as partes. § 8o Com exceção dos consumidores, todos os participantes dos sistemas de logística reversa manterão atualizadas e disponíveis ao órgão municipal competente e a outras autoridades informações completas sobre a realização das ações sob sua responsabilidade. Art. 34. Os acordos setoriais ou termos de compromisso referidos no inciso IV do caput do art. 31 e no § 1o do art. 33 podem ter abrangência nacional, regional, estadual ou municipal. § 1o Os acordos setoriais e termos de compromisso firmados em âmbito nacional têm prevalência sobre os firmados em âmbito regional ou estadual, e estes sobre os firmados em âmbito municipal. § 2o Na aplicação de regras concorrentes consoante o § 1o, os acordos firmados com menor abrangência geográfica podem ampliar, mas não abrandar, as medidas de proteção ambiental constantes nos acordos setoriais e termos de compromisso firmados com maior abrangência geográfica. Art. 35. Sempre que estabelecido sistema de coleta seletiva pelo plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos e na aplicação do art. 33, os consumidores são obrigados a: I - acondicionar adequadamente e de forma diferenciada os resíduos sólidos gerados; II - disponibilizar adequadamente os resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis para coleta ou devolução. Parágrafo único. O poder público municipal pode instituir incentivos econômicos aos consumidores que participam do sistema de coleta seletiva referido no caput, na forma de lei municipal. Art. 36. No âmbito da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, cabe ao titular dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, observado, se houver, o plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos: I - adotar procedimentos para reaproveitar os resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis oriundos dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos; II - estabelecer sistema de coleta seletiva; III - articular com os agentes econômicos e sociais medidas para viabilizar o retorno ao ciclo produtivo dos resíduos sólidos reutilizáveis e recicláveis oriundos dos serviços de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos; IV - realizar as atividades definidas por acordo setorial ou termo de compromisso na forma do § 7o do art. 33, mediante a devida remuneração pelo setor empresarial; V - implantar sistema de compostagem para resíduos sólidos orgânicos e articular com os agentes econômicos e sociais formas de utilização do composto produzido; VI - dar disposição final ambientalmente adequada aos resíduos e rejeitos oriundos dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos. § 1o Para o cumprimento do disposto nos incisos I a IV do caput, o titular dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos priorizará a organização e o funcionamento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, bem como sua contratação. § 2o A contratação prevista no § 1o é dispensável de licitação, nos termos do inciso XXVII do art. 24 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. CAPÍTULO IV DOS RESÍDUOS PERIGOSOS Art. 37. A instalação e o funcionamento de empreendimento ou atividade que gere ou opere com resíduos perigosos somente podem ser autorizados ou licenciados pelas autoridades competentes se o responsável comprovar, no mínimo, capacidade técnica e econômica, além de condições para prover os cuidados necessários ao gerenciamento desses resíduos. Art. 38. As pessoas jurídicas que operam com resíduos perigosos, em qualquer fase do seu gerenciamento, são obrigadas a se cadastrar no Cadastro Nacional de Operadores de Resíduos Perigosos. § 1o O cadastro previsto no caput será coordenado pelo órgão federal competente do Sisnama e implantado de forma conjunta pelas autoridades federais, estaduais e municipais. § 2o Para o cadastramento, as pessoas jurídicas referidas no caput necessitam contar com responsável técnico pelo gerenciamento dos resíduos perigosos, de seu próprio quadro de funcionários ou contratado, devidamente habilitado, cujos dados serão mantidos atualizados no cadastro. § 3o O cadastro a que se refere o caput é parte integrante do Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais e do Sistema de Informações previsto no art. 12. Art. 39. As pessoas jurídicas referidas no art. 38 são obrigadas a elaborar plano de gerenciamento de resíduos perigosos e submetê-lo ao órgão competente do Sisnama e, se couber, do SNVS, observado o conteúdo mínimo estabelecido no art. 21 e demais exigências previstas em regulamento ou em normas técnicas. § 1o O plano de gerenciamento de resíduos perigosos a que se refere o caput poderá estar inserido no plano de gerenciamento de resíduos a que se refere o art. 20. § 2 o Cabe às pessoas jurídicas referidas no art. 38: I - manter registro atualizado e facilmente acessível de todos os procedimentos relacionados à implementação e à operacionalização do plano previsto no caput; II - informar anualmente ao órgão competente do Sisnama e, se couber, do SNVS, sobre a quantidade, a natureza e a destinação temporária ou final dos resíduos sob sua responsabilidade; III - adotar medidas destinadas a reduzir o volume e a periculosidade dos resíduos sob sua responsabilidade, bem como a aperfeiçoar seu gerenciamento; IV - informar imediatamente aos órgãos competentes sobre a ocorrência de acidentes ou outros sinistros relacionados aos resíduos perigosos. § 3o Sempre que solicitado pelos órgãos competentes do Sisnama e do SNVS, será assegurado acesso para inspeção das instalações e dos procedimentos relacionados à implementação e à operacionalização do plano de gerenciamento de resíduos perigosos. § 4o No caso de controle a cargo de órgão federal ou estadual do Sisnama e do SNVS, as informações sobre o conteúdo, a implementação e a operacionalização do plano previsto no caput serão repassadas ao poder público municipal, na forma do regulamento. Art. 40. No licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades que operem com resíduos perigosos, o órgão licenciador do Sisnama pode exigir a contratação de seguro de responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente ou à saúde pública, observadas as regras sobre cobertura e os limites máximos de contratação fixados em regulamento. Parágrafo único. O disposto no caput considerará o porte da empresa, conforme regulamento. Art. 41. Sem prejuízo das iniciativas de outras esferas governamentais, o Governo Federal deve estruturar e manter instrumentos e atividades voltados para promover a descontaminação de áreas órfãs. Parágrafo único. Se, após descontaminação de sítio órfão realizada com recursos do Governo Federal ou de outro ente da Federação, forem identificados os responsáveis pela contaminação, estes ressarcirão integralmente o valor empregado ao poder público. CAPÍTULO V DOS INSTRUMENTOS ECONÔMICOS Art. 42. O poder público poderá instituir medidas indutoras e linhas de financiamento para atender, prioritariamente, às iniciativas de: I - prevenção e redução da geração de resíduos sólidos no processo produtivo; II - desenvolvimento de produtos com menores impactos à saúde humana e à qualidade ambiental em seu ciclo de vida; III - implantação de infraestrutura física e aquisição de equipamentos para cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda; IV - desenvolvimento de projetos de gestão dos resíduos sólidos de caráter intermunicipal ou, nos termos do inciso I do caput do art. 11, regional; V - estruturação de sistemas de coleta seletiva e de logística reversa; VI - descontaminação de áreas contaminadas, incluindo as áreas órfãs; VII - desenvolvimento de pesquisas voltadas para tecnologias limpas aplicáveis aos resíduos sólidos; VIII - desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos. Art. 43. No fomento ou na concessão de incentivos creditícios destinados a atender diretrizes desta Lei, as instituições oficiais de crédito podem estabelecer critérios diferenciados de acesso dos beneficiários aos créditos do Sistema Financeiro Nacional para investimentos produtivos. Art. 44. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito de suas competências, poderão instituir normas com o objetivo de conceder incentivos fiscais, financeiros ou creditícios, respeitadas as limitações da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), a: I - indústrias e entidades dedicadas à reutilização, ao tratamento e à reciclagem de resíduos sólidos produzidos no território nacional; II - projetos relacionados à responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos, prioritariamente em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda; III - empresas dedicadas à limpeza urbana e a atividades a ela relacionadas. Art. 45. Os consórcios públicos constituídos, nos termos da Lei no 11.107, de 2005, com o objetivo de viabilizar a descentralização e a prestação de serviços públicos que envolvam resíduos sólidos, têm prioridade na obtenção dos incentivos instituídos pelo Governo Federal. Art. 46. O atendimento ao disposto neste Capítulo será efetivado em consonância com a Lei Complementar nº 101, de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), bem como com as diretrizes e objetivos do respectivo plano plurianual, as metas e as prioridades fixadas pelas leis de diretrizes orçamentárias e no limite das disponibilidades propiciadas pelas leis orçamentárias anuais. CAPÍTULO VI DAS PROIBIÇÕES Art. 47. São proibidas as seguintes formas de destinação ou disposição final de resíduos sólidos ou rejeitos: I - lançamento em praias, no mar ou em quaisquer corpos hídricos; II - lançamento in natura a céu aberto, excetuados os resíduos de mineração; III - queima a céu aberto ou em recipientes, instalações e equipamentos não licenciados para essa finalidade; IV - outras formas vedadas pelo poder público. § 1o Quando decretada emergência sanitária, a queima de resíduos a céu aberto pode ser realizada, desde que autorizada e acompanhada pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e, quando couber, do Suasa. § 2o Assegurada a devida impermeabilização, as bacias de decantação de resíduos ou rejeitos industriais ou de mineração, devidamente licenciadas pelo órgão competente do Sisnama, não são consideradas corpos hídricos para efeitos do disposto no inciso I do caput. Art. 48. São proibidas, nas áreas de disposição final de resíduos ou rejeitos, as seguintes atividades: I - utilização dos rejeitos dispostos como alimentação; II - catação, observado o disposto no inciso V do art. 17; III - criação de animais domésticos; IV - fixação de habitações temporárias ou permanentes; V - outras atividades vedadas pelo poder público. Art. 49. É proibida a importação de resíduos sólidos perigosos e rejeitos, bem como de resíduos sólidos cujas características causem dano ao meio ambiente, à saúde pública e animal e à sanidade vegetal, ainda que para tratamento, reforma, reúso, reutilização ou recuperação. TÍTULO IV DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS E FINAIS Art. 50. A inexistência do regulamento previsto no § 3o do art. 21 não obsta a atuação, nos termos desta Lei, das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis. Art. 51. Sem prejuízo da obrigação de, independentemente da existência de culpa, reparar os danos causados, a ação ou omissão das pessoas físicas ou jurídicas que importe inobservância aos preceitos desta Lei ou de seu regulamento sujeita os infratores às sanções previstas em lei, em especial às fixadas na Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que “dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”, e em seu regulamento. Art. 52. A observância do disposto no caput do art. 23 e no § 2o do art. 39 desta Lei é considerada obrigação de relevante interesse ambiental para efeitos do art. 68 da Lei nº 9.605, de 1998, sem prejuízo da aplicação de outras sanções cabíveis nas esferas penal e administrativa. Art. 53. O § 1o do art. 56 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 56. ................................................. ................................ § 1 o Nas mesmas penas incorre quem: I - abandona os produtos ou substâncias referidos no caput ou os utiliza em desacordo com as normas ambientais ou de segurança; II - manipula, acondiciona, armazena, coleta, transporta, reutiliza, recicla ou dá destinação final a resíduos perigosos de forma diversa da estabelecida em lei ou regulamento. .............................................................................................” (NR) Art. 54. A disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, observado o disposto no § 1 o do art. 9 o, deverá ser implantada em até 4 (quatro) anos após a data de publicação desta Lei. Art. 55. O disposto nos arts. 16 e 18 entra em vigor 2 (dois) anos após a data de publicação desta Lei. Art. 56. A logística reversa relativa aos produtos de que tratam os incisos V e VI do caput do art. 33 será implementada progressivamente segundo cronograma estabelecido em regulamento. Art. 57. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 2 de agosto de 2010; 189o da Independência e 122o da República. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Rafael Thomaz Favetti Guido Mantega José Gomes Temporão Miguel Jorge Izabella Mônica Vieira Teixeira João Reis Santana Filho Marcio Fortes de Almeida Alexandre Rocha Santos Padilha