Passages de Paris 7 (2012) 105–121
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HOMOFOBIA DOS DOIS LADOS DO ATLÂNTICO: ATITUDES NEGATIVAS
FACE A LÉSBICAS E A GAYS EM PORTUGAL E NO BRASIL1
Jorge GATO
Résumé: Dans cette étude on a comparé les préjugés contre les lesbiennes et les gays dans un échantillon
d’étudiants universitaires portugais et brésiliens (N = 844). On a évalué deux manifestations de préjugé:
une plus traditionnelle (Homopathologisation) et une autre plus contemporaine (Hétérosexisme moderne).
Puisque ce type de préjugé n'est pas indépendant du genre, on a également exploré la relation avec cette
variable. Aucune différence entre les deux pays n’a été observée, tant en ce qui concerne les niveaux
d’Homopathologisation comme en ce qui concerne l’Hétérosexisme moderne. Toutefois, les participants
portugais et brésiliens ont manifesté des niveaux significativement plus élevés d’Hétérosexisme moderne
que d’Homopathologisation. En ce qui concerne le genre, les hommes ont manifesté des niveaux plus
élevés de ces deux types de préjugés que les femmes. Ces résultats attirent l’attention sur la nécessité des
programmes de lutte contre l’homophobie. Les agents psychosociaux et éducatifs, particulièrement ceux
qui interviennent dans le milieu universitaire, devraient être sensibles à l'incidence plus
élevée d’homophobie dans la population masculine et aux expressions plus contemporaines de ce type de
préjugé.
Mots-clefs: homophobie; préjugé traditionnel; préjugé moderne; genre.
Resumo: Neste estudo efectuou-se uma comparação dos preconceitos contra lésbicas e gays em Portugal
e no Brasil, numa amostra de estudantes universitários (N = 844). Foram avaliadas duas manifestações do
preconceito: uma de carácter mais tradicional (Homopatologização) e outra de carácter mais
contemporâneo (Heterossexismo moderno). Uma vez que este tipo de preconceito não é independente do
gênero, foi também explorada a relação com essa variável. Não se verificaram diferenças entre os dois
países, quer no que diz respeito aos níveis de Homopatologização, quer de Heterossexismo moderno. No
entanto, os participantes portugueses e brasileiros evidenciaram níveis significativamente mais elevados
de Heterossexismo moderno do que de Homopatologização. No que diz respeito ao gênero, os homens
evidenciaram níveis mais elevados dos dois tipos de preconceito do que as mulheres. Os resultados deste
estudo chamam a atenção para a necessidade de programas de luta contra a homofobia. Os agentes
educativos e psicossociais, particularmente aqueles que operam no espaço universitário, devem ser
1
Os dados apresentados neste trabalho foram apresentados e publicados nas Actas do Congresso
FazendoGênero em 2010 (Gato, Leme, & Leme, 2010). O presente texto é complementado com
investigações posteriores do autor principal, realizados no âmbito da sua tese de doutorado em Psicologia
na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, com apoio financeiro da
Fundação para a Ciência e Tecnologia (SFRH/BD/41752/2007).

Jorge Gato a obtenu son Master en psychologie dans la Faculté de Psychologie et des Sciences de
l'Éducation de l'Université de Coimbra. Il est thérapeute systémique et familial, certifié par la Société
Portugaise de Thérapie Familiale. Il réalise actuellement un doctorat à la Faculté de Psychologie et des
Sciences de l'Education de l'Université de Porto, avec une thèse sur l’homoparentalité au Portugal. Ses
intérêts de recherche se distribuent dans la Psychologie da la famille, Psychologie LGBT et Genre,
matières sur lesquelles il a publié dans diverses revues et ouvrages scientifiques, nationaux et
internationaux.
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sensíveis, quer a expressões mais modernas do preconceito, quer à maior incidência deste na população
masculina.
Palavras-chave: homofobia; preconceito tradicional; preconceito moderno; gênero.
A crescente visibilidade e aceitação social de lésbicas e gays (Andersen & Fetner, 2008;
Carneiro & Menezes, 2007; Costa, Pereira, Oliveira, & Nogueira, 2010) poderá fazer
pensar que o preconceito e a discriminação em razão da orientação sexual já não
constituem um problema. No entanto, como salientaram Nogueira e Oliveira (2010), “se
(…) a adopção de uma identidade gay ou lésbica é considerada uma orientação viável e
saudável, por outro lado, existem ainda preconceitos e desinformação persistente sobre
a homossexualidade com diferentes resultados e consequências” (p. 10). Por exemplo,
nos EUA esta população permanece um dos principais grupos alvo de crimes de ódio e
perseguição (Herek, 2009). O preconceito e discriminação de que lésbicas e gays são
vítimas é também patente nas taxas relativamente altas de suicídio e tentativas de
suicídio encontradas em adolescentes e adultos não heterossexuais (Haas et al., 2011;
Marshal et al., 2011).
Dados provenientes do World Values Survey (1997, 1999)2 indicam uma situação
preocupante no que diz respeito ao preconceito anti-homossexual, em Portugal e no
Brasil. Assim, as médias da resposta à questão, “Em que medida considera a
homossexualidade justificável?” (em que 1 correspondia a nada jusficável e 10 a sempre
justificável) são, nos dois países, de 3,2, o que aponta para um predomínio de atitudes
negativas. Foi objectivo do presente trabalho efectuar uma comparação do preconceito
contra lésbicas e gays numa amostra de estudantes universitários portugueses e
brasileiros. Debruçamo-nos, em primeiro lugar, sobre a situação geral desses dois
países, no que diz respeito ao preconceito e discriminação contra pessoas GLBT e, mais
especificamente, contra lésbicas e gays. Em segundo lugar, abordamos algumas nuances
deste tipo de preconceito que é possível observar actualmente. Dada a sua importância,
apresentamos ainda uma pequena revisão sobre o impacto do gênero nas atitudes face a
lésbicas e a gays. Finalmente, apresentamos o estudo empírico realizado.
PRECONCEITO EM PORTUGUES
Portugal ainda se diferencia da maior parte dos seus congéneres europeus no que
concerne às atitudes face a lésbicas e a gays. Por exemplo, embora cerca de 60% da
população concorde que “Gays e lésbicas deveriam ser livres para viver a vida como
querem”, Portugal é, entre os países da Europa Ocidental, um dos que apresenta níveis
mais baixos de concordância com esta afirmação (European Social Survey, 2006).
Dados provenientes do Eurobarómetro também mostram que, comparativamente com a
média europeia, os portugueses sentem-se menos confortáveis com a ideia de ter um/a
2
Trata-se de um inquérito sobre valores realizado periodicamente em vários países do mundo. Os dados
foram coligidos em 1997 no Brasil e em 1999 em Portugal.
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vizinho/a homossexual3, com a presença de uma pessoa homossexual no cargo político
elegível mais elevado do país e têm uma probabilidade mais baixa de ter uma pessoa
amiga ou conhecida homossexual (Comissão Europeia, 2009). Os portugueses parecem
ter consciência desta situação: cerca de 60% considera que a orientação não
heterossexual é um factor de discriminação comum no seu país (valor médio para a
Europa de 47%) (Comissão Europeia, 2009). No que diz respeito à opinião sobre a
adopção por casais do mesmo sexo, Portugal apresenta novamente valores mais baixos
relativamente à média europeia (32%), com cerca de 19% da população a concordar
com esta questão (Comissão Europeia, 2007). Tendo em conta a percepção das próprias
pessoas GLBT, um inquérito recente a 972 pessoas com orientações e identidades de
gênero não normativas (Oliveira, Pereira, Costa, & Nogueira, 2010) revelou que estas
expressavam uma percepção elevada de discriminação, quer a nível geral, quer em
sectores específicos como a Justiça, a Educação, a Segurança Social e a Saúde.
Esta situação parece ser o reflexo de múltiplas circunstâncias históricas, políticas e
culturais. De acordo com Carneiro:
Portugal está caracterizado por uma história de condenação da “diferença” sexual, a que
o regime ditatorial do Estado Novo, uma forte influência judaico-cristã e a latinidade
não são factores alheios, constituindo fenómenos que auxiliaram a manutenção de
condições ideológicas para a condenação da homossexualidade. (2006, p. 74)
De facto, só em 1982 foi descriminalizada a homossexualidade, até à data mencionada
como “prática de vícios contra a natureza”. Com o advento da democracia, em 1974, e a
adesão à Comunidade Económica Europeia, em 1986, verificou-se uma abertura gradual
aos princípios e valores da modernidade (Machado & Costa, 1998). Contudo, só a partir
dos anos 90 as questões relacionadas com a homossexualidade começaram a assumir
visibilidade sistemática e a revestir-se de um carácter colectivo e organizado com
impactos políticos e socioculturais (Carneiro, 2006, 2009). Na sequência das
reivindicações das associações de defesa dos direitos GLBT, assistiu-se, durante a
última década, a importantes alterações legislativas no que concerne aos direitos civis
das minorias sexuais. A título de exemplo, em 2001, a Lei das Uniões de Facto veio
alargar direitos sociais de cidadania a casais do mesmo sexo; em 2004 a reivindicação
da ILGA – Portugal para que a orientação sexual fosse incluída no artigo 13 da
Constituição Portuguesa (Princípio da Igualdade) foi aprovada (Constituição
Portuguesa, 2005); em 2010 o acesso ao casamento civil foi garantido a casais do
mesmo sexo; em 2011 foi aprovada uma lei que permite o reconhecimento da
identidade de gênero das pessoas transexuais.
3
Por estarem associadas a estereótipos negativos e remeterem mais para uma prática do que para uma
orientação ou identidade, procuram-se evitar neste trabalho as designações “homossexual/homossexuais”
(American Psychological Association – APA, 2010). Assim, são utilizadas preferencialmente as
expressões “gay/s” e “lésbica/s”. Porém, como se verifica no presente caso, tal nem sempre é possível: a
designação “homossexual" é utilizada nas questões do Eurobarómetro.
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Não obstante estes avanços, como salientou Almeida (2010), “o processo legislativo
relativo a questões LGBT padece de um carácter errático e por vezes contraditório” (p.
53). Por exemplo, em legislações como a do casamento civil ou a da reprodução
medicamente assistida, verifica-se a introdução de excepções discriminatórias,
respectivamente em relação à adopção por casais do mesmo sexo, no primeiro caso, e ao
acesso ao apoio do Estado por mulheres solteiras ou em união homossexual, no segundo
caso.
Não pretendendo fazer um levantamento exaustivo da situação brasileira, apresentamse, em seguida, alguns dados sobre o preconceito e a discriminação em razão da
orientação sexual e da identidade de gênero, neste país. Em termos legislativos, embora
a Constituição Federal de 1988 não considere a orientação sexual como discriminação,
algumas constituições estaduais e legislações municipais já contemplam explicitamente
esse tipo de discriminação (CNDC, 2004). Algumas acções judiciais movidas por
grupos de activistas GLBT têm também redundado em mudanças legislativas (CNDC,
2004), como por exemplo a extensão de benefícios de pensão por morte e auxílioreclusão aos casais de pessoas do mesmo sexo e a abertura de precedentes
jurisprudenciais relacionados com direitos de parentalidade de pessoas homossexuais.
Saliente-se, no entanto, que os crimes de ódio contra pessoas GLBT – e mais
especialmente contra travestis e transgêneros – são um dos problemas com que o Brasil
continua a sedebater. Os dados divulgados por associações brasileiras de defesa dos
direitos das pessoas GLBT (cf. CNDC, 2004) são preocupantes, revelando que centenas
de gays, travestis e lésbicas foram assassinados no país. Para além da situação extrema
do assassinato, muitas outras formas de discriminação vêm sendo apontadas,
envolvendo familiares, vizinhos, colegas de trabalho ou de instituições públicas como a
escola, as forças armadas, a justiça ou a polícia. Por exemplo, os resultados de um
estudo realizado no Rio de Janeiro, envolvendo 416 pessoas GLT (Carrara, Ramos, &
Caetano, 2002, in CNCD, 2004) revelaram que 60% dos entrevistados já tinham sido
vítimas de algum tipo de agressão motivada pela orientação sexual. Quando
perguntados sobre os tipos de agressão vivenciada, 16,6% disseram ter sofrido agressão
física (cifra que sobe para 42,3% entre travestis e transexuais), 18% já haviam sofrido
algum tipo de chantagem e extorsão (cifra que, entre travestis e transexuais, sobe para
30,8%) e, 56,3% declararam já haver passado pela experiência de ouvir xingamentos,
ofensas verbais e ameaças relacionadas à homossexualidade. Além disso, devido a sua
orientação sexual ou identidade de gênero, 58,5% declararam já haver experimentado
discriminação ou humilhação tais como impedimento de ingresso em estabelecimentos
comerciais, expulsão de casa, mau tratamento por parte de servidores públicos, colegas,
amigos e familiares, chacotas, problemas na escola, no trabalho ou no bairro.
Os resultados da pesquisa “Juventudes e sexualidade” (Castro, Abramovay, & Silva,
2004), realizada em 14 capitais brasileiras, apontam, efectivamente, para níveis
preocupantes de preconceito contra as pessoas GLBT. Por exemplo, 25% dos estudantes
inquiridos não gostariam de ter um colega de classe homossexual (resposta
maioritariamente emitida por estudantes do sexo masculino). Mais recentemente, um
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inquérito sobre diversidade sexual e homofobia (Venturi, 2009),4revelou que 92% das
pessoas entrevistadas são da opinião que existe preconceito contra pessoas GLBT. No
entanto, quando perguntados se são preconceituosas, apenas 29% admitiram ter
preconceito contra travestis, 28% contra transexuais, 27% contra lésbicas e bissexuais e
26% contra gays. O preconceito contra pessoas GLBT é também patente nas
percentagens de concordância com as seguintes afirmações, “A homossexualidade é
uma doença que precisa de ser tratada” (40%), “Quase sempre os homossexuais são
promíscuos” (45%), “Casais de gays ou lésbicas não deveriam andar abraçados ou ficar
se beijando em lugares públicos” (50%), “Casais de gays ou lésbicas não deveriam criar
filhos” (47%), “A homossexualidade é safadeza e falta de carácter” (37%) e “Os gays
são os principais culpados pelo facto da AIDS estar se espalhando pelo mundo” (34%).
Nesta medida, no Brasil “ser ou não ser homossexual ainda é uma questão bem mais
aflitiva que ser ou não negro, deficiente físico, mulher” (Almeida & Crillanovick, 1999,
p. 167).
DIVERSIDADE DE ATITUDES
Como pudemos constatar, coexistem actualmente diversos tipos de atitudes face a
lésbicas e a gays, desde as de carácter mais tradicional até às mais subtis.
No que diz respeito às primeiras, são ainda visíveis diversas manifestações de
condenação moral e patologização da homossexualidade. Até recentemente, o Instituto
Português de Sangue excluía explicitamente os homossexuais masculinos da doação
voluntária de sangue, deliberação justificada com a alegação de que os gays são
sexualmente “mais promíscuos” do que os heterossexuais (Carneiro, 2006; Jornal
Público, 17.07.2009). Em 1999 a Classificação Nacional de Deficiências integrou a
“homossexualidade”, designando-a como “deficiência da função heterossexual”
(Carneiro, 2006). Apesar de desde 1973, a homossexualidade não constar da lista de
doenças mentais da Associação Americana de Psiquiatria, 36 anos mais tarde o
presidente do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos Portugueses ainda
distinguia entre homossexualidade primária (adquirida biologicamente) e secundária
(adquirida socialmente), declarando que a última pode ser objeto de tratamento
psiquiátrico (Jornal Público, 02.05.2009).
No Brasil, a homossexualidade foi tratada pela Medicina e pela Psicologia como
patologia até muito recentemente (Scardua & Filho, 2006).Apenas em 1985 o Conselho
Federal de Medicina passou a não considerar a homossexualidade como doença,
4
Esta pesquisa, realizada pela Fundação Perseu Abramo em parceria com a ONG alemã Rosa Luxemburg
Stiftung, coligiu os dados de entrevistas a 2014 adultos de cinco regiões do Brasil (150 cidades). Trata-se
de um levantamento quantitativo com amostragem probabilística nos primeiros estágios (sorteio de
municípios, setores censitários e domicílios) e controle de cotas de sexo e idade (IBGE) para a selecção
dos indivíduos(estágio final).
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enquanto o Conselho Federal de Psicologia (CEP) não se manifestou a este respeito até
mais recentemente (Lacerda, Pereira, & Camino, 2002; Scardua & Filho, 2006).
Efectivamente, só em 1999 foi promulgada uma resolução do CEP que estabelece aos
psicólogos normas de atuação em relação às orientações sexuais, em que a
homossexualidade não é considerada doença, nem distúrbio, não podendo estes
trabalhar em propostas de tratamento e cura da mesma (Lacerda, Pereira, & Camino,
2002). Numa pesquisa sobre a aceitação dessa Resolução, Camino (2000) verificou que
os professores de psicologia que actuam nas áreas social e organizacional concordam
que ela representa um avanço na Psicologia, enquanto mais de metade dos que actuam
na área clínica discordam da resolução. O autor constatou ainda que a atitude negativa
concentrava-se principalmente nos professores evangélicos e nas mulheres que atuam na
área clínica.
Sendo ainda possível encontrar visões patologizadoras da homossexualidade, também é
verdade que o preconceito contra as pessoas não heterossexuais tornou-se mais sutil,isto
é, assumiu formas menos evidentes. Efetivamente, as transformações nas atitudes face a
lésbicas e a gays encontram um paralelo, quer no domínio dos novos preconceitos
raciais e étnicos (e.g., racismo moderno – McConahay, 1986; racismo aversivo –
Gaertner & Dovidio, 2000; racismo subtil – Meertens & Pettigrew, 1999), quer no
domínio do preconceito de gênero contemporâneo (e.g., sexismo moderno – Swim,
Aikin, Hall, & Hunter, 1995; neo-sexismo – Tougas, Brown, Beaton, & Joly, 1995;
sexismo ambivalente – Glick & Fiske, 2001).
Globalmente, estas pesquisas têm salientado o caráter mais dissimulado do preconceito
e a sua manutenção em sociedades nas quais as práticas discriminatórias são proibidas e
onde as pessoas preconceituosas são mal vistas. Algumas destas conceitualizações
foram utilizadas para explicar as modificações que também se observam na expressão
do preconceito contra as pessoas não heterossexuais (para uma revisão destes estudos
ver Gato, Carneiro, & Fontaine, 2011).Contudo, as manifestações modernas de
preconceito contra as pessoas não heterossexuais têm especificidades que as distinguem
das formas contemporâneas de preconceito racial/étnico ou de sexismo (Massey, 2009).
Em primeiro lugar, a população GLBT não está tão “protegida” pela norma social que
impede a expressão de formas mais hostis de preconceito, como outros grupos aos quais
é atribuído um estatuto inferior (Herek, 2007; Pereira, Monteiro, & Camino, 2009). Por
outras palavras, o preconceito contra as pessoas não heterossexuais é socialmente mais
aceito do que o preconceito étnico ou o sexismo.
Em segundo lugar, a aplicação de teorias que explicam as manifestações
contemporâneas de racismo ao preconceito sexual é problemática, uma vez que as
ideologias que lhes estão subjacentes não são necessariamente as mesmas. De acordo
com Hegarty (2006), mais do que receio da discriminação positiva, de competição
económica ou de diferenças culturais inconciliáveis, patentes no racismo moderno, o
preconceito contra lésbicas e gays radica no desconforto com a sua crescente
visibilidade e no questionamento que algumas destas pessoas fazem de valores e
instituições tradicionalmente associados à heterossexualidade (por exemplo, o
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casamento e a parentalidade). A este propósito, Biernat, Vescio e Theno (1996)
demonstraram que os valores relativos à ética protestante e ao igualitarismo
aumentavam a probabilidade de usar a raça como uma base para avaliação do exogrupo,
mas não a orientação sexual. Pelo fato de lébicas, gays e heterossexuais partilharem
geralmente a mesma cultura, a utilização de modelos sobre o preconceito racial para a
avaliação do preconceito anti-homosexual pode revelar-se particularmente inadequada.
Assim, no caso da orientação sexual, o que está em jogo diz respeito, sobretudo, à
influência do heterossexismo, enquanto ideologia que valoriza a heterossexualidade
como mais natural que e/ou superior à homossexualidade (Morin, 1977).
Em terceiro lugar, como acentuou Herek (2007), ao contrário da etnia/raça ou do
gênero, a orientação sexual de uma pessoa não é necessariamente visível. A este
propósito, Hegarty (2006) chamou a atenção para o fato de alguns estudos
experimentais (e. g., Moreno & Bodenhausen, 2001) terem sugerido que, em contextos
sociais igualitários, não são as identidades lésbicas e gays que desencadeiam
automaticamente preconceito, mas sim a visibilidade destas identidades. Por exemplo,
Morrison e Morrison (2002) verificaram que sujeitos com pontuações mais elevadas na
sua escala de homonegatividade moderna, evitavam ver um filme num laboratório com
um homem que tivesse vestido uma t-shirt que o identificasse como gay, quando havia
uma outra razão plausível, para além da sua identidade sexual, para ver o filme noutra
sala. Segundo Hegarty (2006), esta experiência é bem elucidativa acerca dos custos
sociais associados à expressão e visibilidade de uma identidade gay/lésbica. Assim, não
serão as identidades, mas as manifestações explícitas destas identidades que motivam o
tratamento derrogatório, principalmente quando questionam a normatividade da
heterossexualidade no espaço público.
GENERO E PRECONCEITO CONTRA LESBICAS E GAYS
O gênero tem sido identificado como um dos indicadores mais fiáveis do preconceito
homossexual (para uma meta-análise ver Kite & Whitley, 1996), sendo as atitudes dos
homens mais homofóbicas do que as das mulheres. Este padrão foi também observado
em amostras de estudantes universitários (D’Augelli & Hershberger, 1995; Evans, 200;
Iraklis, 2010).
Na nossa perspectiva, este fenómeno pode ser melhor compreendido a partir de uma
articulação de diversos contributos teóricos, provenientes de várias áreas das ciências
sociais.
São particularmente úteis no campo sociológico, as perspectivas do “doing gender”
(West & Zimmerman, 1987, 2002) e da masculinidade hegemónica (Connell, 1987,
1995) e, no campo da psicologia social, os estudos acerca dos estereótipos de gênero
(Eagly, Wood, & Diekman, 2000; Fiske, Cuddy, Glick, & Xu, 2002; Pratto & Walker,
2004; Williams & Best, 1990)
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West e Zimmerman (1987, 2002) argumentaram que o gênero não é algo que somos,
mas sim algo que fazemos e que é construído em interacção. Para captar esta dimensão
performativa do gênero os autores propuseram o conceito de “doing gender”. Fazer
gênero é, nesta perspectiva, agir com a possibilidade de se ser julgado segundo a
categoria sexual a que se pertence ou aparenta pertencer, isto é, de “prestar contas” a
essa categoria sexual. O gênero é, assim, socialmente construído e estabelecido nas
interacções quotidianas, à luz de concepções normativas da masculinidade e da
feminilidade.
Em geral, estas concepções ou estereótipos descrevem as mulheres como mais comunais
e expressivas e os homens como mais instrumentais (Eagly, Wood, & Diekman, 2000).
Para além desta dimensão horizontal de diferença, existe uma dimensão hierárquica de
desigualdade, sendo aos homens atribuído um maior poder (Pratto & Walker, 2004).
Williams e Best (1990) mostraram que, atribuindo a cada sexo aptidões específicas, os
estereótipos de gênero associam simultaneamente um estatuto superior e maior
competência aos homens, particularmente no que diz respeito às áreas socialmente
valorizadas da racionalidade e da instrumentalidade. Da mesma forma, Fiske, Cuddy,
Glick e Xu (2002) demonstraram que as mulheres são, em geral, vistas como menos
competentes, mas mais ‘‘amistosas” e mais proficientes em tarefas comunais (por sua
vez menos valorizadas).
Connel (1987, 1995) também enfatiza que a masculinidade e a feminilidade são
conceitos relacionais. Por esta razão, ao longo das suas vidas, a generalidade dos
homens procurar afirmar a sua masculinidade provando que não são mulheres. Nas
palavras de Kimmel, a ‘‘noção de anti-feminilidade está no cerne das construções
históricas e contemporâneas da masculinidade, de tal forma que a masculinidade se
define mais pelo que não se é do que pelo que se é’’ (1994, p. 119). Postulando os
estereótipos acerca das lésbicas e dos gays que estes possuem os traços do sexo oposto
(Kite & Deaux, 1987), a homossexualidade é geralmente associada um comportamento
de gênero invertido. Adicionalmente, dado que a masculinidade hegemônica é definida
como exclusivamente heterossexual (Connel, 1987, 1995; Kimmel, 1994), a
homossexualidade masculina é vista como uma contradição e uma expressão de
feminilidade. De forma consistente, a homossexualidade masculina é mais repudiada do
que a homossexualidade feminina, particularmente pelos homens heterossexuais (Kite
& Whitley, 1996). A homofobia é, assim, essencial para a rejeição da feminilidade e
afirmação da masculinidade heterossexual (Badinter, 1997; Connell, 1987, 1995; Herek,
1993). Como referiu Connell (1987, p. 186), ‘‘o desprezo pela homossexualidade e
pelos homens homossexuais... faz parte do pacote ideológico da masculinidade
hegemónica.’’
No estudo empírico que apresentamos em seguida, serão avaliadas duas manifestações
do preconceito contra lésbicas e gays, numa amostra de estudantes brasileiros e
portugueses, uma de carácter mais tradicional e outra de carácter mais contemporâneo.
Uma vez que estas atitudes não são independentes do gênero, será também explorada a
relação com essa variável. Foram, assim, testadas as seguintes hipóteses:
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Hipótese 1: Não se antecipam diferenças entre Brasil e Portugal nas duas expressões do
preconceito.
Hipótese 2: Os participantes evidenciarão níveis mais elevados da expressão mais
contemporânea do preconceito do que da sua expressão tradicional.
Hipótese 3: Os participantes do sexo masculino apresentarão níveis mais elevados de
preconceito do que as suas congéneres do sexo feminino.
METODO
PARTICIPANTES
A amostra, não probabilística, é constituída por 844 estudantes provenientes de
universidades públicas de Portugal (Universidade do Porto, Universidade de Lisboa,
Universidade da Beira Interior e Universidade do Algarve) e do Brasil (Universidade
Federal de Uberlândia). A idade variou de 17 a 60 anos, com uma média de 22 anos
(DP = 5.03). Como se pode constatar através da Tabela 1, as amostras foram
equilibradas em termos do curso e do gênero dos participantes.
Tabela 1. Características da Amostra
País
Curso/Gênero
Medicina
Direito
Ciências Sociais (B)/
Sociologia (P)
Engenharia Mecânica
Pedagogia(B)/
Ciências da Educação (P)
Total
Brasil
Mulheres Homens
62
37
(63%)
(37%)
76
48
(61%)
(39%)
27
10
(73%)
(27%)
11
93
(11%)
(89%)
52
4
(93%)
(7%)
228
192
(54%)
(46%)
Portugal
Mulheres Homens
76
28
(73%)
(27%)
49
18
(73%)
(27%)
27
12
(70%)
(30%)
15
126
(11%)
(89%)
59
14
(81%)
(19%)
226
198
(53%)
(47%)
Total
203
(24%)
191
(23%)
76
(9%)
245
(29%)
129
(15%)
844
(100%)
114
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INSTRUMENTO
Gato, Fontaine e Carneiro (no prelo) construíram e validaram a Escala
Multidimensional de Atitudes Face a Lésbicas e a Gays (EMAFLG), composta por três
dimensões atitudinais negativas, duas de caráter mais tradicional (Homopatologização e
Rejeição da proximidade) e uma de caráter mais atual (Heterossexismo moderno), e por
uma atitude positiva (Suporte). Antes de ser utilizado no Brasil, o instrumento foi
sujeito a um processo de reflexão falada junto de seis pessoas de nacionalidade
brasileira, após o que foram realizados alguns ajustes semânticos para facilitar a
compreensão dos itens. Com o propósito de verificar em que medida a EMAFLG tinha
um significado equivalente no Brasil, Gato, Fontaine e Leme (2012) realizaram o teste
da invariância do instrumento, junto de uma amostra de estudantes universitários
brasileiros, recorrendo à análise fatorial confirmatória multigrupos. Os resultados
sugerem a aplicabilidade da EMAFLG em amostras de estudantes universitários nos
dois países. Neste estudo foram utilizadas como variáveis dependentes duas dimensões
negativas: a Homopatologização e o Heterossexismo moderno.
Os cinco itens que compõem a sub-escala Homopatologização dizem respeito a juízos
morais e patologizadores acerca da homossexualidade (e.g., “A homossexualidade é
uma perturbação psicológica”). O Heterossexismo moderno é composto por sete itens
relacionados com manifestações contemporâneas do preconceito contra lésbicas e gays.
Estas referem-se ao desempenho, por estas pessoas, de papéis tradicionalmente
associados à heterossexualidade, como a conjugalidade e a parentalidade. Incluem-se
ainda neste tipo de preconceito posicionamentos negativos relativamente à visibilidade
ou expressão da identidade lésbica e gay e à ênfase excessiva que lésbicas e gays
supostamente colocam na sua sexualidade (e.g., ”Ser criado num lar homossexual é
bastante diferente de ser criado num lar heterossexual” ou “Celebrações como o ‘dia do
orgulho gay’ são ridículas porque assumem que a orientação sexual deve constituir um
motivo de orgulho”).
Os participantes exprimiram a sua opinião acerca dos itens utilizando uma escala tipo
Likert de 1 (discordo completamente) a 6 (concordo completamente). Os índices de
consistência interna das duas dimensões apresentaram valores bastante razoáveis, quer
para a amostra total, quer para cada um dos países (ver Tabela 2). Além da EMAFLG,
os particpantes responderam ainda a um conjunto de questões socio-demográficas.
Tabela 2. Índices de consistência interna (Alfa de Cronbach) da Homopatologização e
do Heterossexismo moderno em função do país e da amostra total
Homopatologização
Heterossexismo moderno
Brasil
Portugal
Total
.84
.79
.86
.81
.85
.80
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PROCEDIMENTO
Após ter sido obtida autorização das respectivas instituições, os questionários foram
colectivamente administrados no período disponibilizado para sua reliazacao. Antes do
preenchimento, foi fornecida informação acerca da natureza voluntária da participação,
bem como da confidencialidade e anonimato das respostas. A administração ocorreu em
ambiente de sala de aula.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para averiguar diferenças nas variáveis em função do país e do gênero foram utilizados
testes t de Student. Para verificar se os níveis de Homopatologização diferiam dos níveis
de Heterossexismo moderno foram realizados testes t de Student para amostras
emparelhadas. Como se pode constatar na Tabela 3, não se verificaram diferenças em
função do país nas duas variáveis, confirmando-se a hipótese 1, resultado aliás de
acordo com os dados provenientes do World Values Survey (1997, 1999), em que a
média das respostas, nos dois países, ao indicador de atitudes perante a
homossexualidade foi exactamente a mesma.
Tabela 3. Diferenças em função do país
Variável
Homopatologização
Heterossexismo moderno
Brasil
M
DP
a
2.05 1.10
3.42b 0.81
Portugal
M
DP
a
1.92 1.03
3.52b 0.71
T
1.79
1.73
g.l.
P
815.06 .08
829
.07
Nota. Diferentes letras simbolizam diferenças entre os valores médios de
Homopatologizaçao e Heterossexismo, para o Brasil [t (412) = 37.45, p <.001] e
Portugal [t (405) = 39.96, p <.001].
Constatou-se também que os níveis médios de preconceito são relativamente baixos,
particularmente na Homopatologização. Provavelmente, tal deve-se ao facto de se tratar
de uma amostra de estudantes universitários, uma população que tende a evidenciar
atitudes sociais menos conservadoras. Nesta medida, um estudo numa amostra mais
heterogénea ou com recurso a outros métodos que não o inquérito por questionário,
poderia revelar níveis de homopatologização mais elevados.
No entanto, os participantes portugueses e brasileiros evidenciaram níveis
significativamente mais elevados de Heterossexismo moderno do que de
Homopatologização, comprovando-se a hipótese 2 (diferenças assinaladas através das
letras a e b na Tabela 3). De facto, dada a similitude do ambiente cultural dos dois
países, os participantes portugueses e brasileiros poderão ter interiorizado, de forma
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semelhante, a norma social que impede uma expressão aberta do preconceito, como é,
por exemplo, considerar a homossexualidade uma patologia (Pereira et al., 2009). No
entanto, os níveis significativamente mais elevados que se verificaram no
Heterossexismo moderno são indicativos da presença de expressões contemporâneas e
socialmente mais aceitáveis de preconceito relativamente a lésbicas e a gays (Biernat,
Vescio e Theno, 1996; Hegarty, 2006; Herek, 2007; Moreno & Bodenhausen, 2001;
Morin, 1977; Morrison & Morrison, 2002). Efectivamente, embora discordem de que a
homossexualidade seja uma perturbação psicológica, os participantes tendem a
concordar mais com a apreciação desta orientação sexual como substancialmente
diferente da heterossexualidade, com consequências nos papéis familiares,
nomeadamente no que diz respeito ao casamento e à parentalidade. Adicionalmente,
tendem a evidenciar mais desconforto com a visibilidade das orientações não
heterossexuais. A conjunção destas duas atitudes poder-se-ia resumir no seguinte
raciocínio “a homossexualidade não é uma doença, mas o que é diferente deve ser
tratado de forma diferente”.
No que diz respeito ao gênero, como se pode verificar na Tabela 4, observaram-se
diferenças entre homens e mulheres, quer na Homopatologização, quer no
Heterossexismo moderno, confirmando-se a hipótese 3.
Tabela 4. Diferenças em função do gênero
Variável
Homopatologização
Heterossexismo moderno
Mulheres
M
DP
1.78 0.96
3.31 .73
Homens
M
DP
2.24 1.12
3.65 0.76
T
6.53
6.39
g.l.
p
795.70 .000
829
.000
Estes resultados estão de acordo com os estudos que indicam que o gênero é um dos
indicadoresmais poderosos do preconceito contra lésbicas e gays (Kite & Whitley,
1996), inclusive em pesquisas conduzidas junto de amostras de estudantes universitários
(D’Augelli & Hershberger, 1995; Evans, 200; Iraklis, 2010). Efectivamente,
comprovou-se que os homens são mais inflexíveis do que as mulheres no que diz
respeito às normas de gênero, julgando de forma mais severa aqueles que consideram
desviar-se dessas mesmas normas (Connell, 1987, 1995; Eagly, Wood, & Diekman,
2000; Fiske, Cuddy, Glick, & Xu, 2002; Herek, 1993; Kimmel, 1994; Kite & Deaux,
1987; Kite & Whitley, 1996; Pratto & Walker, 2004; West & Zimmerman, 1987, 2002;
Williams & Best, 1990)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não obstante alguns avanços e mudanças nas atitudes (Almeida, 2010; Almeida &
Crillanovick, 1999; Andersen & Fetner, 2008; Carneiro, 2006, 2009; Carneiro &
Menezes, 2007; CNDC, 2004; Costa et al., 2010; Haas et al., 2011; Herek, 2009;
Machado & Costa, 1998; Marshal et al., 2011), o preconceito e a discriminação em
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117
razão da orientação sexual continuam a fazer-se sentir em Portugal e no Brasil (Castro
et al., 2004; CNDC, 2004; Comissão Europeia, 2007, 2009; European Social Survey,
2006; Oliveira et al., 2010; Venturi, 2009; World Values Survey, 1997, 1999).
São, por isso, urgentes programas de luta contra este tipo de preconceito. Com base nos
resultados obtidos, os agentes educativos e psicossociais, particularmente aqueles que
operam no espaço universitário, devem ser sensíveis, quer a expressões mais modernas
do preconceito, quer à maior incidência deste na população masculina. Algumas
limitações do estudo devem, contudo, ser mencionadas. Em primeiro lugar, a amostra é
constituída exclusivamente por estudantes universitários, não sendo por isso
representativa da população geral. Em segundo lugar, a orientação sexual dos
participantes não era conhecida. Contudo, uma vez que as pessoas não heterossexuais
detêm, com maior probabilidade, atitudes menos estereotipadas e hostis relativamente
aos seus congéneres, a presença de participantes lésbicas e gays pode ter reduzido a
amplitude das diferenças observadas nas atitudes mensuradas. Deve, no entanto, ser
notado que esta limitação aumenta a probabilidade de ocorrência do erro de tipo-II, não
invalidando os resultados. Independentemente destas limitações, este estudo parece ter
contribuído para um melhor conhecimento do preconceito contra lésbicas e gays, das
suas nuances e das diferenças em função do gênero, no Brasil e em Portugal5.
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5
Os dados apresentados neste trabalho foram apresentados e publicados nas Actas do Congresso Fazendo
Gênero em 2010 (Gato, Leme, & Leme, 2010). O presente texto é complementado com investigações
posteriores do autor principal, realizados no âmbito da sua tese de doutorado em Psicologia na Faculdade
de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, com apoio financeiro da Fundação
para a Ciência e Tecnologia (SFRH/BD/41752/2007).Trata-se de um inquérito sobre valores realizado
periodicamente em vários países do mundo. Os dados foram coligidos em 1997 no Brasil e em 1999 em
Portugal.Por estarem associadas a estereótipos negativos e remeterem mais para uma prática do que para
uma orientação ou identidade, procuram-se evitar neste trabalho as designações
“homossexual/homossexuais” (American Psychological Association – APA, 2010). Assim, são utilizadas
preferencialmente as expressões “gay/s” e “lésbica/s”. Porém, como se verifica no presente caso, tal nem
sempre é possível: a designação “homossexual" é utilizada nas questões do Eurobarómetro. Esta pesquisa,
realizada pela Fundação Perseu Abramo em parceria com a ONG alemã Rosa Luxemburg Stiftung, coligiu
os dados de entrevistas a 2014 adultos de cinco regiões do Brasil (150 cidades). Trata-se de um
levantamento quantitativo com amostragem probabilística nos primeiros estágios (sorteio de municípios,
setores censitários e domicílios) e controle de cotas de sexo e idade (IBGE) para a selecção dos
indivíduos (estágio final).
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HOMOFOBIA DOS DOIS LADOS DO ATLÂNTICO