Tema: Crianças
GAROTO LINHA-DURA
Deu-se que Pedrinho estava jogando bola no jardim e, ao emendar a bola de bico por
cima do travessão, a dita foi de contra uma vidraça e despedaçou tudo. Pedrinho botou a
bola debaixo do braço e sumiu até a hora do jantar, com medo de ser espinafrado pelo
pai.
Quando o pai chegou, perguntou à mulher quem quebrara o vidro e a mulher disse que
foi Pedrinho, mas que o menino estava com medo de ser castigado, razão pela qual ela
temia que a criança não confessasse o seu crime.
O pai chamou Pedrinho e perguntou:
— Quem quebrou o vidro, meu filho?
Pedrinho balançou a cabeça e respondeu que não tinha a mínima idéia. O pai achou que
o menino estava ainda sob o impacto do nervosismo e resolveu deixar para depois.
Na hora em que o jantar ia para a mesa, o pai tentou de novo:
— Pedrinho, quem foi que quebrou a vidraça, meu filho? — E, ante a negativa reiterada
do filho, apelou: — Meu filhinho, pode dizer quem foi que eu prometo não castigar
você.
Diante disso, Pedrinho, com a maior cara-de-pau, pigarreou e lascou:
— Quem quebrou foi o garoto do vizinho.
— Você tem certeza?
— Juro.
Aí o pai se queimou e disse que, acabado o jantar, os dois iriam ao vizinho esclarecer
tudo. Pedrinho concordou que era a melhor solução e jantou sem dar a menor mostra de
remorso. Apenas — quando o pai fez ameaça — Pedrinho pensou um pouquinho e
depois concordou.
apelar: chamar em auxílio, recorrer a um expediente.
emendar: jogar, chutar.
espinafrar (gíria): repreender com dureza, descompor.
impacto: choque; impressão muito forte, muito profunda.
linha-dura: autoritário, que abusa do poder, que defende medidas
severas contra a subversão.
queimar-se: ficar bravo, zangar-se, irar-se.
reiterada: repetida, renovada.
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subversivo: revolucionário, que quer reformar ou modificar
algo; aquele que pretende destruir ou transformar a ordem
pública, social ou econômica estabelecida.
travessão: barra de madeira que delimita a parte superior do
gol.
Terminado o jantar o pai pegou o filho pela mão e — já chateadíssimo — rumou para a
casa do vizinho. Foi aí que Pedrinho provou que tinha idéias revolucionárias. Virou-se
para o pai e aconselhou:
— Papai, esse menino do vizinho é um subversivo desgraçado. Não pergunte nada a ele
não. Quando ele vier atender a porta, o senhor vai logo tacando a mão nele.
(Stanislaw Ponte Preta. A palavra é… humor. Contos selecionados por Ricardo Ramos.
São Paulo: Scipione, 1989. p. 84-6.)
■COMPREENSÃO E INTERPRETAÇÃO
1. Depois que quebrou a vidraça jogando bola, Pedrinho sumiu até a hora do jantar
“com medo de ser espinafrado pelo pai”. Na sua opinião, o menino realmente estava
com medo? Justifique sua resposta.
Talvez não, pois ele vai jogar bola em outro lugar e na hora do jantar já está em casa.
2. O texto mostra uma situação familiar em que os pais desejam repreender uma falta do
filho. A mãe sabia que Pedrinho tinha quebrado a vidraça, mas preferiu esperar o pai
chegar. Por que você acha que ela própria não repreendeu o filho?
3. A forma como os pais educam os filhos varia muito, mas é possível dizer que existem
dois modelos básicos de educação: um tradicional e outro moderno.
No modelo tradicional, os pais são mais duros com os filhos e dialogam pouco; o pai é a
figura principal.
Como você imagina que seja o modelo de educação moderno?
4. O pai de Pedrinho, ao saber da aprontação do menino, conversou com ele e disse:
“— Pedrinho, quem foi que quebrou a vidraça, meu filho? […] Meu filhinho, pode dizer
quem foi que eu prometo não castigar você.”
a) Por esse trecho, pode-se dizer que o pai estava procurando seguir um modelo
tradicional ou um modelo moderno de educação?
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b) Por essa fala do pai de Pedrinho, pode-se concluir que ele já sabia quem era o
culpado?
Por quê?
c) O pai de Pedrinho inicialmente chamou o filho de “meu filho” e depois de “meu
filhinho”. O que
o pai pretendia com isso?
5. Com a insistência de Pedrinho, “o pai se queimou e disse que, acabado o jantar, os
dois iriam ao vizinho esclarecer tudo”. Depois, “chateadíssimo”, pegou o filho pela mão
e “rumou para a casa do vizinho”.
a) Qual o sentido de se queimou nesse contexto? O pai ficou furioso, muito bravo,
nervoso.
b) Por que, na sua opinião, o pai, mesmo antes de ir, já estava chateadíssimo?
6. Pedrinho, prevendo que o filho do vizinho o desmentiria, deu um conselho ao pai.
Por que, na sua opinião, podemos dizer que, em vez do vizinho, Pedrinho é que era um
subversivo?
7. Quanto ao modelo de educação adotado pelos pais de Pedrinho, podemos tirar
algumas conclusões.
a) Ele é tradicional (linha-dura), moderno (baseado no diálogo) ou uma mistura dos
dois? Por quê?
b) Na sua opinião, que método o pai iria experimentar depois de sair da casa do
vizinho? Por quê?
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