No Último Degrau da Vida: Um Estudo no Asilo Barão do Amparo em Vassouras R e s e n h a s R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 117-150, 2003 151 Um Contraponto Baiano, Açúcar, Fumo, Mandioca e Escravidão no Recôncavo 1780-1860. Um Contraponto Baiano, Açucar, Fumo, Mandioca e Escravidão1no Recôncavo 1780-1860 Maria Yedda Leite Linhares BARICKMAN, B. J. Um Contraponto Baiano, Açúcar, Fumo, Mandioca e Escravidão no Recôncavo, 1780-1860. Apresentação de João Reis. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. tradução brasileira , 445 pp Originariamente concebido como uma tese de doutorado (PHD) americano na Universidade de Illinois, sob a orientação de Joseph Love e concretizada por seu autor com inegáveis méritos, levou mais de uma década para ser editada no Brasil após o longo percurso entre a defesa em 1990 e sua edição brasileira atual. Os obstáculos enfrentados pelo autor, entre os quais o da tradução para o português levada avante com notável competência, puderam finalmente ser galgados e o resultado aí está: um bonito texto, em formato adequado, tarefas essas levadas a cabo com esmero acadêmico, apanágios de nosso autor e colega americano, de longa data vinculado à vida brasileira, notadamente à Bahia e ao Rio de Janeiro. Os resultados são evidentes nesta edição brasileira feita com competência e sensibilidade. Nosso historiador é um brasilianista despojado de qualquer resquício messiânico, um scholar como raramente se encontra. O resultado é claro: uma tese sólida, séria, brilhante sob vários aspectos e que contribui para esclarecer aspectos importantes da economia e da sociedade que se construíam no Brasil entre as últimas décadas do século XVIII e a primeira metade do século XIX. Bert Barickman, hoje professor da Universidade do Arizona (Tucson) contribui para enterrar definitivamente a surrada tese do dualismo estrutural como pedra de toque da formação histórica do país João Reis, com a autoridade que sua obra lhe confere, ao analisar este livro, assinala a relevância da pesquisa que se fundamenta na refutação dessa tese, em boa hora sepultada Em outras palavras, trata-se do atestado de óbito do chamado dualismo estrutural da sociedade colonial que se construía no Brasil e segundo a qual a colônia teria se constituído para produzir açúcar nada mais do que açúcar, a monocultura que sustentaria a mão-de-obra africana importada. No caso baiano, à agricultura exportadora da canaProfessora emérita da UFRJv.e 5, Professora do Programa 153 R. Mestr. Hist., Vassouras, p. 153-156, 2003 de Mestrado em História da Universidade Severino Sombra - Vassouras/RJ 1 Maria Yedda Leite Linhares de-açúcar e seu produto-rei, o açúcar, acrescentava-se o tabaco importante monaie d´échange do comércio de escravos da África. Na pequena lavoura de mercado interno, à mandioca cabia o lugar de honra. A tese da monocultura da cana-de-açúcar se desmorona aí, face à realidade da mandioca – o pão da terra – indispensável alimento de todos. Conclui João Reis: “ O estudo combinado e detalhado desses três produtos – a cana, o fumo e a mandioca – e sua relação com a escravidão, é o que constitui a originalidade deste livro”. A tese é construída em seis capítulos e comporta análises eruditas sobre a economia baiana e sua extraordinária capacidade para exportar desde o açúcar e o fumo até algodão, café, aguardente, cacau, couros, ouro, madeira e diamantes, produtos esses que viviam suas crises conjunturais, manifestavam tendências e apresentavam flutuações dignas de análise como em qualquer economia de antigo regime, pelo menos no período que se encerra por volta de 1860, sobretudo no tocante ao Recôncavo, a mola mestra da Bahia dos engenhos, do açúcar e dos escravos. A pesquisa de Barickman vai além do Recôncavo e seus engenhos, das dificuldades estruturais do abastecimento de Salvador. Por outro lado, a incorporação da imensa erudição nascida através de sucessivas gerações de historiadores e pesquisadores merece um destaque especial na obra de nosso autor que realizou a proeza de esgotar a capacidade de apreensão do saber acumulado pelo conjunto da bibliografia pertinente. As Notas de erudição abrangem setenta páginas de conhecimento existente, sem mencionar as referências às fontes pesquisadas e incorporadas ao texto central. Estamos de fato diante de uma obra magistral que se manterá por algum tempo como referência obrigatória para os estudos relativos à Bahia e, por extensão, ao Brasil e sua história do período escravista. O nosso Autor merece parabéns pelo desempenho acadêmico mas também pela qualidade da edição brasileira que cuidadosamente supervisionou. Suas tabelas, seus gráficos e demais aparato de erudição traduzem a qualidade da pesquisa realizada. De fato, a Bahia vem sendo 154 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 153-156, 2003 Um Contraponto Baiano, Açucar, Fumo, Mandioca e Escravidão no Recôncavo 1780-1860 aquinhoada de pesquisadores de primeiro escalão. O presente livro ostenta ainda, na parte final, um índice de assuntos e nomes próprios, inestimável recurso para o leitor e pesquisador. Merecidos parabéns ao autor e à editora brasileira. R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 153-156, 2003 155