“UMA CÂMARA, UMA CIDADE, VÁRIOS PODERES – A HISTÓRIA DO PODER NA CIDADE DE MARIANA” Material didático destinado a promover a Educação Patrimonial na cidade de Mariana. Autores: Camila Alves Diana Poepcke Henrique Maria Fernanda Natália Severino Renato Saad Orientação: Virgínia Buarque UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO Mariana, 2010 O ensino de História a partir do espaço museológico KIT DO PROFESSOR O ensino de história hoje não se caracteriza apenas no saber da sala de aula, pode ser ensinado de maneira que o aluno apreenda o assunto de forma interativa, interdisciplinar, através de espaços diversos. No nosso caso, a proposta está nos espaços museológicos, que representa “lugares de memória” do nosso passado, como já disse o historiador Pierre Nora, que tradicionalmente são apontados como lugares de preservação da memória. Retomando ao texto de Pierre Nora, “Entre Memória e História: a problemática dos lugares” notamos a concepção do autor de que os lugares de memória se caracterizam por impedir o esquecimento de um determinado patrimônio material ou imaterial, que a partir dos vínculos entre o passado e o presente, ganham o estatuto de objetos sagrados. Os edifícios antigos, os arquivos, os museus, os monumentos públicos, entre outros, são espaços onde pode se restaurar a memória. No nosso projeto “Museus e Ensino de História”, o museu do prédio da Câmara Municipal de Mariana, construído no século XVIII, no centro histórico da cidade, representa no passado e na atualidade também, o poder administrativo e legislativo da cidade, e foi construído para abrigar os chamados “homens bons” daquela sociedade colonial. Assim, os museus se configuram como um lugar de preservação da memória, onde podem estar contidos os valores da época, além de uma vinculação temática e biográfica dos objetos referentes ao museu. Nesse aspecto, o desafio para os professores e freqüentadores é perceber se naquele espaço é possível uma reflexão sobre nossa memória, sobre a nossa historicidade, sobre quem fomos, quem somos, para pensarmos criticamente sobre o nosso passado, pensando nossas diversidades tanto social como cultural. Dessa maneira, o professor pode inserir os espaços museológicos como um recurso didático, na medida em que esses espaços possibilitam conhecer o passado através de uma construção ou até mesmos desconstrução de determinada memória. Ou seja, o trabalho do professor vai além de uma apresentação puramente factual dos acontecimentos. Ao optar por um ensino descentralizado, o professor deve possuir um embasamento teórico para que possa criar com seus alunos projetos que articulem os discentes e os locais de ensino de história fora da sala de aula. Assim, a pesquisa deve ser construída a partir da realidade exposta no museu, relacionando-a com a história local, com a história do Brasil e uma história geral, por exemplo, é possível fazer com o acervo da Câmara de Mariana. Vale ressaltar que a construção dos lugares de memória assume um caráter político, constituindo uma relação de poder, pois os museus são capazes de selecionar a memória que será guardada ou esquecida e, dessa forma, os seus significados podem possuir uma intencionalidade da manutenção de uma certa memória, que deseja ser lembrada ou esquecida. Em um importante trabalho acerca do ensino de história em museus, Marcos Silva e Selma Guimarães Fonseca discutem sobre a cultura material e a relação dessa com a metodologia do ensino de história. A cultura material para eles está presente na metodologia da história desde o século XIX, onde alguns autores da época abordavam o cotidiano, as relações de poder, o trabalho e, desse modo, buscavam compreender a história a partir da sua base material, ou seja, o materialismo histórico proposto por Marx. Posteriormente, no século XX, surgem novos trabalhos acerca da cultura material, sobretudo com a Escola dos Annales na França, mais especificamente com Pierre Nora, como podemos perceber no texto de Marcos Silva, quando ele diz que: “Os debates da Nova História francesa retomaram tradições clássicas de pesquisa, representadas no caso da Cultura Material, principalmente por Arqueologia e História da Arte, sem esquecer de História Local e História dos Costumes” (FONSECA & SILVA, 2007 :84). No ensino de História, os museus devem ser estudados com um olhar crítico e contextualizado, considerando todas as práticas culturais do fazer humano, questionando, por exemplo, os grupos sociais que tinham acesso a determinado objeto exposto, quem os produziu, materiais usados, a temporalidade e outros questionamentos possíveis. Assim, o campo do conhecimento histórico através dos museus é pensado como espaço onde coexistam “dimensões imaginárias da materialidade e as dimensões materiais do imaginário” (FONSECA & SILVA, 2007: 88). Umas das saídas para o entendimento do ensino de história através dos museus, que se concebe como uma aplicação das idéias já propostas por Paulo Freire e complementada pelo pesquisador Francisco Régis Lopes Ramos, é a metodologia conhecida como “objeto gerador”, proposta pelo autor e que se remete ao conceito de “palavra geradora” de que tratava Freire. Esse conceito consiste na experiência cotidiana do visitante, na perspectiva de provocar nele um debate dos problemas e das situações vivenciadas. Para o autor, as comparações dos objetos expostos do passado com os objetos que encontramos no presente nos dão uma maior noção de historicidade, e desse ponto a noção do que é histórico é trabalhada de forma mais direta, como propomos neste trabalho de ensino de história a partir de museus. Percebemos que a disposição com que cada museu é criado, elaborado, e a maneira com que sua narrativa é construída nos permitem diversas interpretações acerca de um evento ou acontecimento. Podemos notar até mesmo que a história do prédio onde o acervo está exposto nos oferece indícios para criar algumas interpretações acerca da descrição dos fatos, havendo assim um diálogo entre a história do museu, a história do seu acervo que está sendo narrado e a narrativa construída a partir dessa relação. Orientações ao Professor: Essa atividade visa explorar o patrimônio histórico da cidade de Mariana, através do prédio da Câmara municipal de Mariana, que representa o poder legislativo, fiscal e administrativo da cidade desde o século XVIII, quando o Brasil ainda era uma colônia de Portugal. Em síntese, essa atividade pretende analisar a seleção dos objetos que compõem o museu, para entender a relação desses objetos com o passado histórico e o que eles podem significar no presente, para que o aluno possa conhecer e construir um saber histórico sobre os objetos e o museu em questão. Dessa maneira, poderemos construir uma pesquisa histórica referente à realidade exposta que o museu da Câmara Municipal de Mariana nos oferece, fazendo um diálogo com a história local, através do conhecimento que já portamos e o conhecimento que poderá ser construído a partir do contato com o museu. É proposta a apresentação do museu Casa de Câmara e Cadeia de Mariana, primeiramente historicizando a formação do Arraial de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo, onde havia a necessidade da fundação de uma estrutura administrativa e judiciária, e em seguida caracterizando a composição dessa instituição. Depois de uma aula introdutória sobre a cidade de Mariana e sobre a primeira Casa de Câmara de Minas Gerais, o professor deverá distribuir aos alunos pranchas com gravuras de objetos que se encontram em exposição no museu. Estes objetos serão alvos de uma historicização, para que os alunos possam se situar no recorte temporal da história. Onde estavam estes objetos? Como eram utilizados? Por quem eram utilizados? Qual era sua função? Hoje, onde estão estes objetos? Ainda são utilizados? Por quem? Qual sua atual função? Qual memória ele ativa aos visitantes do museu? Depois que este tema for apresentado e explorado, os alunos farão uma visita ao museu, sob a supervisão do professor. No museu, eles serão orientados e conhecerão a exposição como um todo, onde deverão procurar um dos objetos estudados em sala de aula e explorar sua história. O professor deverá acompanhar um pouco cada grupo e sugerir questões, que poderão ser respondidas em uma folha. Sugestão de questões: •Qual o nome deste objeto? •Ele tem o mesmo nome hoje ou tinha outra denominação quando foi criado? •Qual material foi utilizado na sua fabricação? •Quem utilizava este objeto? •Você acha relevante a exposição do objeto no museu? •Você acha que ele está exposto corretamente, ou seria melhor se estivesse em outro lugar? Em uma próxima aula, depois da visita, é proposto que o professor discuta com os alunos a impressão que tiveram do museu, o que acharam da visita, o que acharam dos objetos e o que os alunos mudariam na exposição. Referências bibliográficas: FONSECA, S.G; SILVA, Marcos. Materialidade da experiência e materiais de ensino e aprendizagem. In: Ensinar História no século XXI: em busca do tempo entendido. Campinas SP: Papirus, 2007. p.65-88. NORA, Pierre. Entre lugar e memória: a problemática dos lugares. In: Projeto História. São Paulo, nº 10, p.7-28, dez. 1993. RAMOS, Francisco R. L. A história nos objetos e O objeto gerador. In: A danação do objeto: o museu no ensino de História. Chapecó: Argos, 2004. p.19-36. SILVA, Marcos. Além das coisas e do imediato: cultura material, História imediata e ensino de História. Tempo. Revista do Departamento de História da UFF. Dossiê: Ensino de História, Niterói, V, 10, N.20, jan.2006. KIT DO ALUNO CÂMARA MUNICIPAL DE MARIANA Construído durante o período de 1762 até 1798, por José Pereira dos Santos, o prédio localiza-se na Praça Minas Gerais, centro Histórico de Mariana. Segundo o historiador Salomão de Vasconcelos, em 1748, o então governador Gomes Freire de Andrade, juntamente com oficiais da câmara e o Ouvidor geral, entraram em um consenso do melhor lugar para se construir o prédio legislativo, que seria aquele ocupado pelos antigos quartéis dos Dragões. A obra data de 1762, realizada pelo mestre José Pereira dos Santos, porém somente em 1798 a câmara foi instalada no edifício. Os poderes atribuídos às Câmeras Municipais se resumem à criar leis, fiscalizar e controlar os ator do poder executivo. O controle do poder político local era representado pela Câmara e essa instituição organizava e geria as atividades econômicas nas relações políticas e econômicas coloniais. Os municípios, através de sua Câmara, buscaram adquirir certa autonomia e independência administrativa da metrópole, pois tendiam mais a defender os interesses dos colonos, podendo representar um foco de resistência ao centralismo da Coroa Portuguesa. Quando se criava uma nova vila, inaugurava-se o PELOURINHO, que representava a jurisdição e a existência de uma vila, onde era realizada a convocação dos “homens bons” a fim de eleger os vereadores daquela municipalidade. ALVES, Daniela Pinheiro Lessa. Poder Local e atividades econômicas: breves considerações sobre as atas da câmara da cidade de salvador no século XVIII. PELOURINHO O pelourinho original foi construído em 1750, por José Moreira Matos e demolido mais tarde, em 1871. O atual pelourinho foi construído na década de 1970. Está localizado na praça Minas Gerais, em frente ao prédio da Câmara Municipal de Mariana. O nome pelourinho tem sua origem no latim “pirorium”. Era constituída por um pedestal com escadarias feitas de pedras. Sempre erguidos na praça principal da vila, o pelourinho era um símbolo ou um marco da administração, servindo também como local de castigos dos criminosos e escravos fugidos. JANELA DA CADEIA O objeto que analisaremos agora é a janela do calabouço (prisão) da antiga casa de Câmara e Cadeia. Atualmente ela faz parte de um salão onde são realizadas exposições culturais, mas o espaço que ela representa hoje nem sempre teve o mesmo significado. No século XIX, a Casa de Câmara e Cadeia possuía diversas funções, como já vimos. Uma delas era a de manter presos os acusados ou suspeitos de violar a lei. A responsabilidade da Cadeia estava nas mãos do carcereiro, que evitava que os presos fossem soltos sem julgamento. Janela da Casa de Câmara e Cadeia, construída entre 1762 e 1798 O aparelho judiciário da Câmara não tinha apenas a função de promover a segurança da população, mas também garantia que se cumprisse todas as ordens do rei. Essa justiça seguia as leis do reino português, que eram chamadas de Ordenações Filipinas. As sentenças para os presos variavam de acordo com o tipo de crime que cometiam, porém essas penas não eram aplicadas igualmente a todos os faltosos; as leis do reino eram aplicadas de forma diferente para os fidalgos, desembargadores e homens letrados. Mas hoje o espaço em que funcionava a Cadeia não tem mais essa função de prisão. Atualmente, devido a sua importância histórica e social, ele faz parte do Museu da Câmara. PLENÁRIO DA CÂMARA Esta sala se encontra no segundo andar do prédio, representando o Plenário da Câmara, ou seja, o lugar onde os vereadores se reúnem semanalmente para a realização das assembléias. BRASÃO O que é um brasão? O brasão de armas ou simplesmente brasão, na tradição européia medieval, é um desenho especificamente criado com a finalidade de identificar e/ou distinguir os indivíduos, famílias, clãs, corporações, cidades, regiões e nações. O desenho de um brasão é normalmente colocado num suporte em forma de escudo que representa a arma de defesa homônima usada pelos guerreiros medievais. No entanto, o desenho pode ser representado sobre outros suportes, como bandeiras, vestuário, elementos arquitetônico, mobiliário e objetos pessoais. Assim, em cima do portal da Câmara há um floral que abriga o brasão do Império. Nos desenhos abaixo podemos ver mais exemplos de brasões Brasão do Império do Brasil (1º Reinado) Brasão de Armas do Brasil