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PARTICIPAÇÃO POPULAR RACIONAL PARA ASSEGURAR EFETIVIDADE ÀS
POLÍTICAS AMBIENTAIS
Cléia Cristina Pereira Januário Fernandes*
RESUMO
Os direitos sociais brasileiros estão enumerados na Constituição Federal,
determinando a aplicabilidade através das políticas públicas. Formou-se o
arcabouço legislativo e institucional, mas as políticas ambientais e
educacionais até então implementadas não conseguiram conter o amplo
processo de degradação ambiental e o baixo nível de aprendizagem dos
alunos. Urge a instituição de uma boa governança, formulando-se políticas
públicas transversais, integradas pelo critério de sustentabilidade ambiental.
Para isso, é imprescindível a participação popular. A educação, inclusive
ambiental, é o único mecanismo capaz de formar uma consciência critica e
preparar o cidadão para exigir dos governantes a plena efetivação dos seus
direitos.
Palavras-chaves: Políticas ambientais; implementação; eficiência; educação
ambiental.
ABSTRACT
The Brazilian social rights are enumerated on the Federal Constitution,
determining the applicability through the public politics. It has been formed a
legislative and institutional framework, but the educational and environmental
politics so far implemented didn’t get to contain the vast process of
environmental degradation and the low level of the students´ apprenticeship. It
urges the institution of good governance, formulating transversal public
politics, integrated through the sustainability criterion. That’s why it is very
important the popular participation. The education, including the
environmental, is the only mechanism capable to create a critical conscience
and prepare the citizen to demand from the governors the full fulfillment of its
rights.
Keywords: Environmental politics, implementation, efficiency, environmental
education.
1 INTRODUÇÃO
Para satisfação das necessidades populares, o Estado utiliza-se das políticas
públicas e o Direito, tradicionalmente repressivo, passa por uma adaptação para materializar
essas políticas, cujo processo de definição deve contar com uma participação popular
racional. O Brasil conseguiu formar um arcabouço legislativo e institucional propício à
formulação das políticas públicas.
A cidadania é um processo construído paulatinamente e de forma diferenciada
entre as nações. No Brasil foi iniciado a partir dos direitos sociais, ainda na década de 1930.
A Constituição Federal de 1988 enumerou os direitos sociais, considerando-os direitos
*
Promotora de Justiça do Piauí, Mestranda UFOI/TROPEN/PRODEMA
São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005
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humanos fundamentais e, além de tratar das políticas públicas, assegurou mecanismos para
o efetivo exercício desses direitos.
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado figura entre os direitos
sociais. A reação brasileira contra a utilização indiscriminada dos recursos naturais emergiu
de forma pulverizada nos primeiros séculos após o início da “colonização”. O movimento foi
se fortalecendo e culminou com a instituição da Política Nacional do Meio Ambiente, em
1981. Contudo, as políticas ambientais não vêm sendo eficientes para conter a degradação
ambiental.
A Conferência de Estocolmo (1972) apontou a Educação Ambiental como um
mecanismo que permite a solução dos problemas ambientais mundiais. Somente um
cidadão educado é capaz de participar racionalmente do processo de definição das políticas
públicas. O Brasil instituiu uma Política Nacional de Educação Ambiental (1999), porém
ainda está em processo de implementação. O país, apesar dos avanços na política
educacional como um todo, ainda registra dificuldades na educação básica e superior.
Mantidos os atuais padrões, dificilmente se conseguirá formar a consciência crítica dos
cidadãos, elemento indispensável para a participação no processo de definição das políticas
públicas e, por conseguinte, para construção de uma sociedade sustentável.
2 ESTADO, DIREITO E POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL
2.1. Conceitos
O Estado é uma sociedade política formada pela conjunção de três elementos:
povo (humano), território (material) e soberania (formal). A soberania confere ao Estado o
monopólio de editar o Direito e exigir o cumprimento das normas através da coerção. Pinho
(2001, p.02) enfatiza que o Estado não é um fim em si mesmo, mas um meio para a
satisfação das necessidades do povo organizado politicamente sobre determinado território.
Habermas (1997, Volume II, p. 171) justifica a necessidade do Estado como
poder de organização, de sanção e de execução, conferindo obrigatoriedade à implantação
dos direitos, pois “a comunidade de direito necessita de uma jurisdição organizada e de uma
força para estabilizar a identidade, e porque a formação da vontade política cria programas
que têm que ser implementados”.
Ente a princípio inerte, o Estado encaminha a satisfação das necessidades
populares através das políticas públicas, definidas por Bucci (2002, p. 241) como
“programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e
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as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e
politicamente determinados”.
Nesse contexto, o Direito tradicionalmente repressivo passa por uma adaptação
para materializar essas políticas. A doutrina chega a anunciar o surgimento de um novo
ramo: o direito das políticas públicas (ARZABE, 2005).
Quando trata da produção de direito legítimo através de uma política
deliberativa, Habermas (1997, Volume II, p. 45) defende que uma ordem jurídica não pode
se limitar apenas a garantir que toda pessoa seja reconhecida em seus direitos por todas as
demais pessoas; o reconhecimento recíproco dos direitos de cada um por todos os outros
deve apoiar-se em leis legítimas que garantam a cada um liberdades iguais, de modo que a
liberdade do arbítrio de cada um possa manter-se junto com a liberdade de todos
(HABERMAS, 1997, Volume I, p. 52).
2.2 O processo de definição das políticas públicas e das políticas ambientais
A formação democrática da opinião e da vontade idealizada por Habermas
(1997, Volume II, p. 33) está vinculada às opiniões públicas informais que idealmente se
formam em estrutura de uma esfera pública não desvirtuada pelo poder, que precisa contar
com uma base social na qual os direitos iguais dos cidadãos produzem eficácia social.
Desse modo, a imposição pelo Estado das áreas prioritárias de atuação através
das políticas públicas fere a idéia de boa governança e a identificação dos principais
problemas populares deve ser feita de forma participativa, com a participação racional da
sociedade.
Os governos que se sucederam no Brasil ainda não foram capazes de acatar o
processo de mudanças na forma de governar e, por conseguinte, não acolheram a idéia de
boa governança, que “pressupõe o direcionamento das ações estatais para a efetividade
dos direitos sociais e para o encaminhamento de soluções a problemas sociais que
encontrem os objetivos fundamentais da sociedade” (ARZABE, 2005).
A Constituição Federal de 1988, no art. 1º, elegeu dentre os fundamentos do
Estado brasileiro a soberania popular, exercida através de representantes eleitos ou
diretamente, a cidadania e a dignidade da pessoa humana. A participação popular foi
institucionalizada pela formação de conselhos, mas a plena efetivação depende da
composição por pessoas com nível de escolaridade que lhes permita participar
racionalmente. Ademais, os dirigentes governamentais precisam reconhecer e implementar
representações emergentes da sociedade civil, evitando a indicação dos conselheiros dentre
os simpatizantes da agremiação política, apenas para preencher o critério legal.
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Dentre os direitos sociais, figura o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, considerado bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações (art. 225, CF). Ocorre, porém, que o processo de definição das
políticas ambientais é desintegrado dos critérios de sustentabilidade e transversalidade,
resultando em degradação ambiental. Assim, o Ministério ou as Secretarias do Meio
Ambiente definem isoladamente suas ações. As conseqüências, por exemplo, da
elaboração e execução de uma política econômica destituída dos critérios de
sustentabilidade ambiental são graves e os custos, além de já estarem sendo arcados pelas
atuais gerações, fatalmente serão repassados às futuras.
Leis (2002, p. 237/238) reconhece o avanço do ambientalismo como um
movimento multissetorial na metade da década de 1980, porém ressalta que as políticas e a
gestão pública nessa área se mantêm estancadas e significativamente atrasadas em
relação às necessidades reais e às possibilidades oferecidas. O autor insere a “negociação
ambiental” como alternativa à recuperação do tempo perdido, pressupondo a participação
de diferentes atores, com capacidade e recursos relativamente equivalentes para influir no
processo de decisão.
2.3 A evolução da questão social no Brasil
Carvalho (2004, p. 11/12), ao discorrer sobre a construção da cidadania no
Brasil, aponta pelo menos duas diferenças em relação ao caminho trilhado na Inglaterra
(direitos civis – século XVIII, direitos políticos – século XIX e direitos sociais – século XX). A
primeira, refere-se a uma maior ênfase no direito social e a segunda à alteração na
seqüência em que os direitos foram adquiridos, com o social precedendo os demais.
Aqui não se registrou efetivamente um processo de “conquistas populares”
desses direitos sociais, pois eles foram outorgados à sociedade em resposta a
circunstâncias políticas.
Cerqueira Filho (1982, p. 108) enfatiza que antes de 1930 a questão social no
Brasil era tratada como caso de polícia e, simultaneamente, como questão ilegal,
não/legitimada pelos que detinham o poder político. Posteriormente, pela atuação das forças
de repressão, continuou sendo tratada como caso de política, mas não voltou a ser uma
questão ilegal. Os grupos sociais dominantes adotaram um discurso sofisticado,
contraditório e racionalizante, combinando um tratamento concreto e prático repressivo com
um pensamento que já conferira não só legitimidade, mas também legalidade à questão
social.
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Na época, a questão social era um fenômeno observado em nível mundial.
Entretanto, os governantes se articularam para mascarar os conflitos que surgiam. A
legislação trabalhista aprovada foi moldada com a finalidade de fazer desaparecer o
sindicalismo autônomo e o movimento operário. Paralelamente, elaborou-se um discurso
político que circunscrevia a temática social num círculo de autoritarismo e intervenção do
Estado, obstaculizando um discurso político autônomo da classe trabalhadora e enfatizando
o caráter de outorga da legislação trabalhista (CERQUEIRA FILHO, 1982, p. 109/125).
As Constituições contemporâneas, principalmente aquelas que se sucederam à
Segunda Guerra Mundial, contemplaram os direitos sociais de seus cidadãos. Esse
fenômeno também foi observado nas Constituições elaboradas em países que passaram
por longo período autoritário, a exemplo do Brasil (FRISCHEISEN, 2000, p. 34).
A Constituição Federal de 1988 estabelece os direitos sociais nos arts. 6º, 7º e
1
225 e trata das políticas públicas pelas quais os administradores devem se pautar para
assegurar o efetivo exercício desses direitos (FRISCHEISEN, 2000, p.58/59). O salto
quântico foi a inclusão dos direitos sociais na categoria dos direitos fundamentais da pessoa
humana, ou seja, que “a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente
reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados” (AFONSO DA SILVA, 2001, p.
182).
A Carta Magna também criou mecanismos legais para a efetiva aplicabilidade
desses direitos, seja em caso de ausência de normas infraconstitucionais integradoras, com
o Mandado de Injunção (art. 5º, LXXXI) e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por
Omissão (art. 103, § 3º) ou, na hipótese de não cumprimento das normas pela
Administração, através do controle judicial ou extrajudicial2. Destarte, o administrador fica
vinculado às políticas públicas estabelecidas na Constituição Federal e a sua omissão é
passível de responsabilização. A margem de discricionariedade é mínima, não
contemplando o não fazer (FRISCHEISEN, 2000, p. 59). Urge a atuação do cidadão para
exigir os seus direitos.
1
O art. 6º estabelece o rol dos direitos sociais gerais: educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência
social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. O art. 7º enumera os direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais. No art. 225 está previsto o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
2
O controle judicial pode ser feito individual ou coletivamente. No primeiro caso através da ação popular (art. 5º,
LXXIII); no segundo, através do mandado de segurança coletivo (art. 5º, LXX) e da ação civil pública (art. 129, III
e Lei nº 7.347/85). Para o controle extrajudicial foram criados órgãos e instituições do controle, que podem ser
internos (Auditorias e Corregedorias) ou externos (Ministério Público e Tribunais de Contas). Também foi
assegurada a comunicação entre Administração e cidadãos, inclusive através de Ouvidorias, cuja finalidade é
encaminhar as reclamações dos cidadãos aos órgãos de fiscalização. V. FRISCHEISEN, 2000, p.110/111.
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2.4 Do surgimento da questão ambiental à definição de uma política pública para o
meio ambiente
A trajetória do movimento ambientalista possui características similares em todo
o mundo, pois emerge da sociedade civil (organizações ou ativistas) e enfrenta a resistência
dos governos, empresários e teóricos desenvolvimentistas. No Brasil a reação surgiu de
forma pulverizada nos primeiros séculos que se sucederem à “colonização”, quando os
efeitos deletérios começaram a aparecer. O primeiro registro de Urban (1998) são os artigos
publicados em 1859 pelo jornalista Thomaz Pompeu de Sousa Brasil.
A partir da década de 1960, o movimento foi marcado por dois grandes
obstáculos: o regime militar e a baixa escolaridade da população. A despeito disso,
conseguiu se arregimentar até culminar na implantação de uma política democrática – Lei nº
6.938, de 31.08.1981, cujos mecanismos propiciavam a elaboração de uma política
ambiental em todos os níveis de governo.
A instituição de uma política pública voltada para o meio ambiente foi
influenciada por um processo de conquistas populares, ainda em processo de consolidação.
O movimento ambientalista, tanto nacional como internacional, teve importante papel no
avanço formal da legislação. No entanto, na esfera pública governamental verifica-se uma
resistência à implementação dessas políticas.
Bredariol (1998, p.83) registra as contradições entre uma economia predadora e
poderosas pressões de movimentos e interesses nacionais e internacionais. Num primeiro
momento, houve a criação de uma política do meio ambiente dissociada ou acomodada
dentro do projeto Brasil Potência dos Militares. O segundo momento é marcado pelo
atendimento às pressões sobre queimadas na Amazônia, no governo Sarney, onde o Brasil
redefiniu sua política ambiental, reestruturando o setor público encarregado dessa política e
criando o IBAMA.
O país conseguiu formar um arcabouço legislativo e institucional que possibilita a
formulação de políticas ambientais. Entretanto, falta vontade política para uma eficiente
implementação. Hodiernamente, vive-se uma fase de transição.
2.5 As políticas educacionais e a instituição da Política Nacional de Educação
Ambiental
A partir da Conferência de Estocolmo (1972), a temática da Educação Ambiental
começou a ser apontada como uma das soluções para os problemas ambientais mundiais.
Todavia, durante alguns anos o Brasil ignorou o assunto no plano legislativo, até consideráSão Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005
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la um princípio na Política Nacional de Meio Ambiente (1981), erigido à categoria de norma
constitucional com a Carta Magna de 1988. A Lei nº 9.795, de 27.04.1999 instituiu a Política
Nacional de Educação Ambiental, regulamentada pelo Decreto nº 4.281, de 25.06.2002.
Todo o processo é marcado pela dicotomia entre o plano legal e o real, pois a
implementação avança a passos lentos.
Analisadas isoladamente, as políticas públicas educacionais do Brasil implicaram
em uma evolução significativa da escolaridade dos brasileiros nos últimos anos. No entanto,
há problemas na educação básica, com atraso no fluxo escolar dos estudantes, defasagem
idade-série e baixo rendimento dos alunos (SISTEMA de Estatísticas, 2004; SÍNTESE...,
2004). No ensino superior os resultados do Exame Nacional de Desempenho dos
Estudantes – ENADE mostram uma pequena diferença entre o desempenho dos estudantes
ingressantes e concluintes na parte da formação geral (BRASIL. Ministério da Educação,
2005). Destarte, as políticas educacionais de modo geral não vêm sendo efetivadas de
maneira eficiente, o que também atinge também a política direcionada à Educação
Ambiental.
Uma educação de qualidade e com resultados efetivos é indispensável ao
exercício de uma “nova cidadania”, que deseja a constituição de sujeitos sociais ativos para
definirem quais são os seus direitos (BREDARIOL, 1998, p. 29/30). Essa educação tem que
ser permeada pela vertente ambiental. Mantidos os atuais padrões, dificilmente se
conseguirá formar a consciência crítica dos cidadãos, elemento indispensável à construção
de uma sociedade sustentável.
4 CONCLUSÃO
A Constituição Federal brasileira assegura os direitos sociais, reputando-os
direitos humanos fundamentais. Ainda que as normas necessitem de eventuais ajustes,
possibilitam a implementação de políticas públicas eficientes. O problema não reside na
legislação. As políticas ambientais e educacionais até então implementadas não vêm
conseguindo conter o amplo processo de degradação ambiental e o baixo nível de
aprendizagem dos alunos.
O país precisa instituir uma boa governança e formular políticas públicas
transversais, integradas pelo critério de sustentabilidade ambiental. Para isso, é
imprescindível a participação popular, seja de forma individual ou coletiva, pessoalmente ou
através de representantes. A educação, inclusive ambiental, é o único mecanismo capaz de
formar uma consciência critica e preparar o cidadão para exigir dos governantes a plena
efetivação dos seus direitos.
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São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005
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