Os Custos Indiretos da Propriedade
Alfredo Fonceca Peris
A busca pela segurança em termos de preservação do patrimônio amealhado ao
longo da vida, a expectativa de valorização, somadas a resquícios de uma memória
inflacionária, nos leva, muitas vezes, a conservar a maior parte do nosso
patrimônio sobre a forma de propriedades, principalmente imóveis.
Durante o período de inflação crônica vivido pelo Brasil, entre as décadas de 1970 e
1990, a moeda perdeu uma de suas principais funções, qual seja, a de reserva de
valor. Os brasileiros nascidos até a metade da década de 1980 foram educados a se
livrar rapidamente do dinheiro, trocando-o por mercadorias ou bens, sob risco de
perda de parte do patrimônio corroído pela inflação.
Essa conjuntura inflacionária levava as pessoas e as empresas a investir o máximo
de suas reservas em mercadorias e bens e a abrir mão de uma maior liquidez. No
caso das pessoas físicas, imóveis principalmente. Ainda hoje, após 17 anos de
estabilização da economia, ainda se conserva um relativo temor em guardar parte
do patrimônio em dinheiro, aplicado numa instituição financeira, por exemplo.
Conservamos, ainda, uma desconfiança que, com o passar do tempo, possamos
perder parte de nossa riqueza pois o valor investido, acrescido dos juros e da
correção monetária, não compram mais os bens que poderíamos ter comprado na
data em que tomamos a decisão de fazer a aplicação.
Somem-se a esses fatores, a condição financeira de significativa parte das famílias
brasileiras, principalmente aquelas que, historicamente, estiveram excluídas do
acesso à propriedade. Tanto na condição de habitantes do campo quanto do meio
urbano.
Com o crescimento econômico experimentado pelo Brasil, nas últimas duas
décadas, acrescido das facilidades de crédito, as famílias estão optando pela
aquisição de propriedades, principalmente de habitações para uso próprio.
Nesse caso, é sempre recomendada a opção pela propriedade do imóvel. Esta é
mais do que uma pré-condição para uma melhor qualidade de vida. É, também,
uma condição de cidadania.
Essa questão ganha uma conotação diferenciada quando passa a ser opção de
investimento e de reserva de valor. Nesses casos, tem-se que considerar um fator
por muitos negligenciado, qual seja, o custo indireto da manutenção de uma
propriedade. Não quero dizer aqui que as pessoas não devam investir em imóveis,
mas, sim, discutir a relevância desses custos na manutenção do imóvel, ao longo
do tempo e apontar possíveis alternativas para o investimento das reservas
pessoais.
Quando começamos nossa vida profissional, particularmente no caso das pessoas
que ambicionam um crescimento patrimonial, o desejo da propriedade é
extremamente aguçado. Olhamos os bens materiais e só enxergamos o lado bom.
Somos quase que incapazes de enxergar as dificuldades, tanto na obtenção quanto
na manutenção do bem.
É interessante que, em certo período da vida, paramos para refletir e constatamos
duas questões relevantes: primeiro, temos o sentimento de que passamos à
condição de escravos dos bens que amealhamos ao longo da vida; segundo, além
de dispensar uma parte significativa de nosso tempo para cuidar de sua
manutenção, conservação e preservação, temos ainda que trabalhar, e muito, para
fazer face aos desembolsos financeiros necessários para manter sua propriedade.
Isso porque, na maioria das vezes, os bens que adquirimos nos dão mais despesas
do que receitas. Principalmente se considerarmos que hoje, no Brasil, os aluguéis
de imóveis, na maioria das cidades, estão extremamente baixos. E tão mais baixo,
quanto maior o valor do imóvel, com exceção de alguns imóveis urbanos muito
bem localizados, o que não é o caso da maioria.
As despesas são representadas pela reposição do que é corroído pela ação do
tempo, como pinturas, telhados, calhas, portas e janelas, vidros, instalações
elétricas e hidráulicas, entre outros; pela ação de vândalos que destroem vidros,
pinturas de muros e fachadas; pela ação de ladrões que, além de roubar o que
podem, ainda destroem o que lhe cause algum transtorno durante a ação; pelo
pagamento de taxas, contribuições de melhoria e impostos; pela contratação de
seguros contra incêndios, vendavais e outras ações da natureza; ou, na falta
desses, pela reposição do que a natureza destrói, no caso de uma catástrofe que,
ultimamente, tem se tornado mais comum. Sem contar o desgaste na relação com
inquilinos e com todos os profissionais envolvidos nesses processos.
Como contrapartida financeira imediata, somente o recebimento do aluguel que,
muitas vezes, não chega a atingir 0,50% do valor do imóvel, considerando que, em
primeiro lugar, somente a inflação atual atinge índice próximo desse percentual e
que, em segundo lugar, em muitas cidades a valorização do imóvel é bem pequena.
Somado a esses fatores, devemos lembrar que, quando da venda do imóvel, são
devidos comissão ao intermediador do negócio, algo em torno de 5% do valor total
do imóvel, imposto de renda à razão de 15% sobre o que o Fisco entende por
ganho de capital e, acrescido a isso tudo, a demora na comercialização que, no final
do processo, nos dá a sensação de que só o que vamos comprar tem valor. Quando
estamos vendendo, temos a sensação de que o que possuímos não tem quase
valor.
Outra variável que precisa ser colocada na equação é o fato de que, à medida que
vamos envelhecendo, temos mais dificuldades para manter o padrão da renda
auferida com o trabalho. É exatamente para esse momento que guardamos uma
parte da renda que auferimos ao longo de nossa vida produtiva. Em contraposição
a essa realidade que são peculiares aos investimentos em bens tangíveis,
particularmente representados por imóveis e, nesse caso, os imóveis urbanos são
mais próximos do que aqui descrevemos, pode-se considerar as alternativas que
temos hoje para a guarda de nosso patrimônio pessoal, amealhado ao longo da
vida ou que se está obtendo atualmente.
Em primeiro lugar, a economia brasileira cresceu e se desenvolveu muito, nessas
últimas duas décadas. Concomitante a esse crescimento, o mercado de capitais
cresceu e se desenvolveu no Brasil. O investimento em ações, com visão de longo
prazo, passou a ser uma interessante opção para a guarda de patrimônio. Sem
contar que possui uma liquidez praticamente imediata. Lembrando sempre que o
ideal é sempre efetuar a venda em momento de alta e não de baixa, como vivemos
nesses dias atuais.
Por outro lado, o sistema bancário brasileiro é, hoje, um dos mais sólidos do
mundo. Pode-se investir em aplicações financeiras, sempre com orientação de um
profissional especializado, no caso dessa opção ser a escolhida, sem a desconfiança
de que o banco poderá quebrar.
Em terceiro lugar, o Governo Federal se tornou um importante captador de
recursos, por meio das operações de Tesouro Direto, que são interessantes opções
de investimento, principalmente para o médio e longo prazos.
Esse artigo tem como objetivo elencar as principais dificuldades que encontramos
na gestão de nosso patrimônio, quando esse está representado por imóveis e
chamar a atenção para a importância das opções que temos hoje de investimentos
cuja remuneração não é nada desprezível, além de requerer o mínimo possível de
tempo e recurso financeiro na sua gestão, bem como oferecer um grau de liquidez
praticamente diário, coisa que os imóveis estão distantes de oferecer.
É interessante também acrescentar que não se deve investir em um único tipo de
bem. O dito popular "não coloque todos os ovos num único cesto" é bastante
oportuno para o caso. Dados todos os custos indiretos que recaem sobre os imóveis
e considerando as opções de investimento que temos hoje, em ações, títulos do
governo e produtos bancários, é possível montar um portfólio de investimentos que
nos dê rentabilidade e segurança, sem nos dar muito trabalho e exigência de
desembolsos financeiros e dispêndio de tempo.
Alfredo Fonceca Peris, economista, sócio-diretor da Peris Consultoria Empresarial Ltda.
www.perisconsultoria.blogspot.com
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