CONSELHOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL NO BRASIL Gean Oliveira Gonçalves Maria Carolina Nocetti Mayra Castro Vizentin Michelle Branco de Araujo – [email protected] Professora responsável: Denise Paiero – [email protected] Resumo Este texto trata a respeito dos conselhos de comunicação social no Brasil com intenção de apresentar os projetos de Conselhos de Comunicação Social no Brasil, além de analisar os discursos sociais como forma de fiscalização social ou censura institucionalizada. Palavras-Chave Comunicação Social, Políticas Públicas, Regulamentação Introdução O artigo seguinte visa à apresentação dos projetos de Conselhos de Comunicação Social no Brasil, em âmbito nacional e estadual, de caráter consultivo ou deliberativo, além de analisar os discursos sociais a respeito dos mesmos como forma de fiscalização social ou censura institucionalizada, já que refletem um debate pela democratização da comunicação e o temor em torno dos órgãos de participação da sociedade civil nas discussões das políticas públicas de comunicação. Para isso, serão visitadas as questões do direito humano a comunicação social; a necessidade de regulamentação das entidades do setor como demanda a Constituição Federal; o Conselho Nacional de Comunicação Social; a 1ª Conferência Nacional de Comunicação e seus dilemas; e por fim, os recentes projetos de Conselhos de Comunicação Social dos estados da União, exemplificados por Bahia e Ceará. Democratização da Comunicação: a perspectiva do direito social A regulamentação da mídia brasileira, sob as propostas de governos do Partido dos Trabalhadores (PT), criou uma grande discussão na imprensa e setores sociais ligados a comunicação sobre ser uma suposta nova tentativa de censura dos meios de comunicação e controle governamental. O PT em setembro de 2011, em sua convenção de partido, preparou um documento em que defendia um controle da mídia para a sua democratização, com o fim da propriedade cruzada nos meios da comunicação e o fim dos monopólios de mídia. O assunto vem ganhando espaço, recentemente no 1º encontro mundial de blogueiros sediado no estado do Paraná, debateu-se sobre esse problema e se cobrou o marco regulatório da mídia e o direito a banda larga. Sabe-se que há grandes desafios a se enfrentar, principalmente ao lidar com grandes corporações que fazem uso de estratégias discursivas em seus meios de comunicação para impedir a perspectiva da regulamentação como um direito social. A democratização da comunicação não é uma questão em pauta atualmente, há anos tenta-se solucionar os impasses com a denúncia do cenário feita pelo relatório McBride, um documento desenvolvido pelo irlandês Sean McBride, divulgado em 1980 pela UNESCO com o título de Many Voices, One World, ele analisava a problemática da comunicação no mundo contemporâneo e se focava na comunicação de massa e na imprensa internacional, e propunha como solução uma nova ordem comunicacional. O documento tinha como finalidade buscar meios para reduzir as desigualdades tecnológicas e os desequilíbrios informativos com propostas como a integração da comunicação ao desenvolvimento, democratização da comunicação como sendo este um elemento essencial ao direito do ser humano. O que foi considerado utópico, e classificado depois como uma “missão impossível”. No período, os líderes Ronald Reagan (EUA) e Margareth Tatcher (Reino Unido) abandonaram a reunião após verificarem a crítica do estudo ao panorama da concentração de meios de comunicação no mundo, alegaram que esta reunião estava demasiadamente politizada. A proposta fracassou e o documento foi engavetado após a polêmica sendo assim descartado devido à pressão de grandes conglomerados da comunicação, ou seja, jamais foram colocadas em prática. E mesmo trinta e um anos após sua publicação os mesmos problemas permanecem atuais: a informação ainda pertence aos grandes conglomerados como antigamente e os debates em prol da transformação do cenário são reduzidos ou esvaziados a confrontos ideológicos que não geram frutos. Nota-se então que a regulamentação da mídia é necessária, trata-se de uma demanda, e que resistir a uma nova ordem da informação e comunicação é evitar uma nova ordem econômica internacional e assim abandonar uma perspectiva democratizante que contemple os discursos de identidade cultural, dignidade humana, luta de classes, gêneros, sexualidade, etnias e demais direitos humanos. Regulamentação da Comunicação: uma demanda da sociedade e uma exigência da Constituição Cidadã (1988) A imprensa, a serviço da cidadania, tem sido questionada a respeito de direitos e visibilidade de grupos quando não o faz. As prerrogativas de assegurar os direitos cidadãos estão fragilizadas pelas ações corporativas dos grupos empresariais de comunicação quando estes interferem em sua produção jornalística ou de caráter comunicacional pelos interesses privados. O problema é que o controle da atividade jornalística, segundo especialistas, vai de encontro ao artigo 5º da Constituição Federal: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” e o artigo 220 da Constituição Federal que garante o exercício de informar, assegurando a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação. Esse artigo estabelece ainda que “sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição”, e que “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social”; ele veda ainda qualquer censura de natureza política, ideológica e/ou artística. Quando se fala em democratização da informação e fiscalização da comunicação, logo já se fala em censura. Mas o fato é que em países democráticos, como Estado Unidos e Portugal, já existe regulação e órgãos fiscalizadores que respeitam a independência da mídia e a liberdade de expressão da imprensa, garantindo o pluralismo, o controle do monopólio da informação e dos veículos de comunicação e defendendo minorias, direitos humanos, a cultura nacional e a indústria cultural. No Brasil é necessária a criação de entidades que incentivem à concorrência no mercado e a democratização da informação, hoje controlada politicamente por grupos específicos. A Constituição Cidadã entende a mídia e a comunicação social como manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação de todos os setores da sociedade brasileira tendo em vista a preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; a promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; a regionalização da produção cultural, artística e jornalística, e o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família; tudo conforme regulamentação e fiscalização do poder público e participação da sociedade, um exemplo é o Conselho Nacional de Comunicação Social. Conselho Nacional de Comunicação Social O artigo 224 da Constituição Federal de 1988, dentro do capítulo sobre Comunicação Social, determina a criação do Conselho Nacional de Comunicação Social, como órgão auxiliar do Congresso Nacional (Legislativo) como espaço para consulta, debate, estudos, pareceres, recomendações e outras solicitações que lhe forem encaminhadas a respeito da mídia e dentre os seguintes tópicos: a) liberdade de manifestação do pensamento, da criação, da expressão e da informação; b) propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias nos meios de comunicação social; c) diversões e espetáculos públicos; d) produção e programação das emissoras de rádio e televisão; e) monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social; f) finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas da programação das emissoras de rádio e televisão; g) promoção da cultura nacional e regional, e estímulo à produção independente e à regionalização da produção cultural, artística e jornalística; h) complementariedade dos sistemas privado, público e estatal de radiodifusão; i) defesa da pessoa e da família de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto na Constituição Federal; j) propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens; l) outorga e renovação de concessão, permissão e autorização de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens; m) legislação complementar quanto aos dispositivos constitucionais que se referem à comunicação social. (CASA CIVIL, 1991) Por meio da Lei nº 8.389, de 30 de dezembro de 1991, promulgada pelo então Presidente Fernando Collor, a criação do Conselho foi regulamentada. No entanto, mesmo com um caráter apenas consultivo, o CCS demorou 14 anos para ter seus membros nomeados e ter início a suas atividades. O primeiro mandato teve início em 2002. O Conselho teve seus 13 titulares e 13 suplentes nomeados, com representantes da mídia, entidades sindicais e sociedade civil, e puderam tratar de temas como a concentração da mídia, rádios comunitárias e TV digital. Mesmo desprovido de poder, as atividades incomodavam. Foi esvaziado paulatinamente e a ponto de ter realizado sua última reunião em 2007, a mesma também foi a única do ano. Em 2008, os novos integrantes não chegaram nem a ser nomeados. O Conselho de Comunicação Social do Congresso depende da nomeação do Senado para retomar sua atuação. A reativação do conselho é uma demanda de setores da sociedade que o entendem como espaço de participação e consulta à opinião pública. A promessa de ser revigorado foi feita pelo presidente do Senado, José Sarney, em 2010. Conferência Nacional de Comunicação: discursos de censura x discursos de fiscalização Realizada entre os dias 14 e 17 de dezembro de 2009, a 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) foi o resultado final de um processo de debates em torno das políticas públicas de comunicação, que teve início em conjunto com a sociedade civil organizada em âmbito local, estadual e regional. Empresariado e sociedade foram convocados pelo Governo Federal para discutir a modernização da comunicação social, de questões técnicas e de infraestrutura até as demandas de pluralidade no acesso à produção e distribuição de conteúdos midiáticos, com o objetivo de traçar propostas para uma Política Nacional de Comunicação: “[...] garantir o acesso mais amplo às novas mídias não passa apenas por uma questão técnica. Depende, antes de tudo, do estabelecimento de um diálogo democrático entre a Sociedade Civil, o Poder Público e a Sociedade Civil Empresarial, operando uma pactuação que possibilite a construção de uma comunicação efetiva e cidadã, produtiva e com responsabilidade social, representativa da diversidade cultural que caracteriza o Brasil. Essa foi a linha mestra da 1ª Confecom, que contou com várias conferências preparatórias, municipais, estaduais, distrital e virtual, além da etapa nacional. Com representantes do Poder Público, da Sociedade Civil e da Sociedade Civil Empresarial” (MINISTÉRIO, p.11, 2010) No entanto, os principais veículos de comunicação não participaram e se retiraram: Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Brasileira de Internet (Abranet), a Associação Brasileira de TV por Assinatura, a Associação de Jornais e Revistas do Interior do Brasil, a Associação Nacional dos Editores de Revistas e a Associação Nacional de Jornais. O grupo considera que as propostas de estabelecer um controle social da mídia são uma forma de censurar os órgãos de imprensa, cerceando a liberdade de expressão, o direito à informação e a livre iniciativa. Dentre as 672 propostas definidas estava a reinstituição do Conselho Nacional de Comunicação Social, a criação do Conselho Federal de Jornalismo e dos Conselhos Estaduais de Comunicação Social em formato deliberativo, como forma da população se manifestar diante dos abusos cometidos pelos veículos, principalmente àqueles que ferem a dignidade da pessoa humana ou como forma de garantir a informação plural e libertária em prol da democracia. Para as entidades de empresas de comunicação, a Confecom reuniu setores interessados em promover a censura institucionalizada sob o argumento do controle social da mídia. Os conselhos seriam instâncias de repressão da liberdade de imprensa e pensamento. Esferas como a do jornalismo, portanto, não devem ser vigiadas, tuteladas ou controladas. O cenário durante e pós-conferência que se desenhou foi o de interesses empresarias em oposição aos interesses sociais. Um lado promovia o discurso de fiscalização da mídia por meio dos CCS, já o outro enxergava a proposta como censura. Porém, o noticiário da grande mídia só trazia a versão do controle totalitário da imprensa por meio dos CCS. O que só se tornou mais forte com as definições de Conselhos Estaduais deliberativos nos moldes da Confecom, para os estados do Ceará e Bahia, ao mesmo tempo em que Rio Grande do Sul, Alagoas e Distrito Federal passam a cogitar a institucionalização de seus conselhos. Exemplos são o Estado de S. Paulo de 15 de dezembro de 2009 e a Folha de São Paulo de 25 de outubro de 2010. Conselhos Estaduais de Comunicação – a experiência de Ceará e Bahia. O projeto de Lei que cria o Conselho Estadual de Comunicação da Bahia foi aprovado em 27 de abril deste ano. A elaboração de tal projeto é uma somatória de esforços de movimentos sociais organizados e órgãos democráticos que lutam por uma ampliação da participação nos processo de decisões que envolvem o setor da comunicação. Em 2009, o Grupo de Trabalho (GT) da Bahia que representaria o estado na Conferência Nacional de Comunicação Social (Confecom) cria o Decreto nº 11.846, de 16 de novembro de 2009, que dá origem à lei. Esse GT era formado por três membros da Agecom, um da Casa Civil, quatro representantes da sociedade civil, dois representantes de ONG´S e dois representantes do setor empresarial. Já o conselho é formado por 27 representantes, divididos de forma proporcional entre esses quatro setores. O CECS-BA tem caráter consultivo e deliberativo, e tem como algumas de suas funções a criação e acompanhamento de Políticas Públicas para a Comunicação, o recebimento de denúncias contra órgãos de comunicação e o fortalecimento de ações que ampliem a comunicação comunitária. O Conselho Estadual de Comunicação Social do Ceará foi aprovado em outubro de 2010. O projeto de lei que cria o conselho foi proposto pela deputada Rachel Marques (PT). O órgão formado por 25 representantes dos setores público e civil está ligado à Casa Civil e terá como uma de suas funções, produzir relatórios semestrais sobre as atividades da mídia no estado. Em ambos os casos, a Associação Brasileira de Rádio e Televisão e a Associação Nacional de Jornais se colocaram contra a criação dos conselhos por afirmarem que tais iniciativas teriam por objetivo censurar o trabalho da mídia. Assim como a maioria dos grandes órgãos de comunicação, comandados por famílias que historicamente são detentoras dos meios, também se opuseram e fizeram certa “campanha” contra a criação desses conselhos. Os movimentos sociais e partidos políticos que criaram e defendem os Conselhos afirmam que esses podem contribuir para que haja uma ampliação da participação social na comunicação. Possibilitando que a sociedade civil tenha mais voz sobre o conteúdo da mídia não no sentido de censura, mas no sentido de ampliação da participação do processo de produção desse conteúdo. Considerações Finais Como apresentado até aqui o debate em torno dos CCS se encerra na questão da ‘censura’ e ‘controle’, quando a noção de fiscalização da mídia pela sociedade está além de conselhos e legislações. A comunicação social se presta a informar e entreter a sociedade, em um pacto de midiatização para a sociabilidade, portanto, está sempre sujeita ao aval de grupos, sujeitos e instituições da esfera pública. Conselhos de Comunicação Social, tanto em âmbito nacional quanto estadual, com atribuições consultivas ou deliberativas, devem ser debatidos e entendidos como espaços para a promoção de políticas públicas de comunicação. Cabe a essas esferas ou outras ainda a serem criadas uma ação em prol do direito humano à comunicação e informação. A compreensão e a justiça quanto à visibilidade de “Um Brasil, muitas vozes” depende da articulação dos discursos da necessidade de democratização da comunicação no cenário de oligopólio midiático. Bibliografia ARANTES, R. Conselho de Comunicação Social da Bahia - Um Novo Espaço em Construção. In: XXXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Recife, 2011. Disponível em: <http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2011/resumos/R6-1696-1.pdf>. Acesso em 28 de out. 2011 CASA CIVIL. Lei nº 8.389, de 30 de dezembro de 1991. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8389.htm>. Acesso em 29 de out. 2011. CONSTITUIÇÃO da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 29 de out. 2011. DINES, A. Seqüestraram o Conselho de Comunicação Social. Observatório do direito à comunicação, 2008. Disponível em: <http://www.direitoacomunicacao.org.br/content.php?option=com_content&task=view&id=289 5>. Acesso em 31 de out. 2011. FOLHA de São Paulo. São Paulo, p. Capa, A4 e A6. 25 de out. 2010. 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