LOEBLEIN, Danieli da Rosa; CHAVES JUNIOR, Airto. A materialidade do crime de embriaguez ao volante diante
das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 229-250, 3º Trimestre de 2013. Disponível em:
www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044
A MATERIALIDADE DO CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE DIANTE DAS
ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI N. 12.760/2012
Danieli da Rosa Loeblein1
Airto Chaves Junior2
SUMÁRIO:
Introdução; 1. A prova no processo penal; 1.1 A liberdade probatória em Processo
Penal; 1.2 Limitações à liberdade probatória; 2. O crime de embriaguez ao volante;
2.1 Digressão histórica; 2.2 A materialidade do crime de embriaguez ao volante
antes das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/12; 2.3 A materialidade do crime
de embriaguez ao volante após a vigência da Lei n. 12.760/12; Considerações finais;
Referências das fontes citadas.
RESUMO
A presente pesquisa tem por objeto a análise da recente alteração do crime de
embriaguez ao volante, previsto no art. 306, do Código de Trânsito Brasileiro,
modificado pela Lei n. 12.760, de 20 de dezembro de 2012, sobretudo no que tange
à forma de constatação do delito, tendo em vista a possibilidade apresentada pela
nova legislação da utilização de todos os meios de prova em direito admitidos para
a comprovação da infração. A justificativa deriva das incertezas que surgiram
acerca da aplicabilidade da nova redação do referido crime, razão pela qual se faz
necessária uma análise da sua aplicação e dos pontos controvertidos em relação a
esse novo dispositivo legal. Para tanto, inicia-se o trabalho com a análise da
liberdade probatória como regra de tratamento no Processo Penal. Após, trata-se
dos limites legais e constitucionais dessa liberdade, que comportam algumas
exceções, especialmente no que tange à prova proibida. Continuamente, investigase os métodos legítimos de aferição da materialidade do crime do art. 306 do Código
de Trânsito Brasileiro, com enfoque em sua digressão história até as alterações
promovidas pela Lei n. 12.760/12. Quanto à metodologia empregada, destacam-se
duas fases distintas. A fase de investigação denota a utilização do método
comparativo; nas considerações finais, ressalta-se o emprego da base lógica
indutiva.
Palavras-chave: Embriaguez ao volante. Materialidade. Prova.
INTRODUÇÃO
O propósito do presente trabalho será a análise das recentes alterações do
tipo penal de embriaguez ao volante, previsto no art. 306, do Código de Trânsito
Brasileiro, promovidas pela Lei n. 12.760, de 20 de dezembro de 2012, sobretudo no
1
Acadêmica do 9º período do Curso de Direito da UNIVALI. E-mail: [email protected]
2
Doutorando e Mestre em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí; Professor do Curso de Graduação
em Direito da Univali nas disciplinas de Direito Penal e Direito Processual Penal; Professor de Direito Penal da
Escola do Ministério Público do Estado de Santa Catarina (EMPSC); Advogado. E-mail: [email protected]
229
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das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
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que tange à forma de constatação do delito, tendo em vista a possibilidade
apresentada pela nova legislação da utilização de todos os meios de prova em
direito admitidos para a comprovação da infração.
À época da edição da Lei n. 11.705, de junho de 2008, conhecida como “Lei
Seca”, ocorreram significativas alterações no Código de Trânsito Brasileiro,
notadamente em relação ao crime de embriaguez ao volante, tanto no aspecto
administrativo e criminal.
Agora, entra em cena a denominada “Nova Lei Seca”, que se ateve a
reformulação do famigerado art. 306 do CTB, tendo como finalidade preencher as
lacunas e reparar os equívocos existentes no diploma anterior.
A fim de alcançar um panorama mais claro acerca da transição entre as leis
n. 9.503/97, n. 11.705/08 e n. 12.760/12, resta necessário estabelecer uma
comparação entre o que dispunha anteriormente a redação do crime de embriaguez
ao volante e o novo texto legal.
Seu objetivo geral será analisar a prova do crime previsto no art. 306, do
Código de Trânsito Brasileiro, diante das alterações promovidas pela Lei n.
12.760/12.
Para atingir seu objetivo será realizada uma análise da liberdade probatória
como regra de tratamento no Processo Penal. Após, será tratado acerca dos limites
legais e constitucionais dessa liberdade, que comportam algumas exceções,
especialmente no que tange à prova proibida. Continuamente, serão investigados os
métodos legítimos de aferição da materialidade do crime do art. 306 do Código de
Trânsito Brasileiro, com enfoque em sua digressão história até as alterações
promovidas pela Lei n. 12.760/12.
Finalmente, quanto à metodologia empregada no artigo científico, destacamse duas fases distintas. A fase de investigação denota a utilização do método
comparativo; nas considerações finais, ressalta-se o emprego da base lógica
indutiva.
1 A PROVA NO PROCESSO PENAL
O Código de Processo Penal, a partir do Título VII, apreciou um conjunto de
regras que regulamentam a produção de provas no âmbito do processo penal. Para
230
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isso, estabeleceu normas gerais relacionadas aos critérios a serem utilizados pelo
magistrado na valoração dos elementos de convicção trazidos ao processo, bem
como disciplinou determinados meios específicos de prova, ou seja, elementos
juntados ao processo capazes de orientar o julgador na busca da verdade dos
fatos3.
Por meio, principalmente, das provas, o processo penal pretende criar
condições para que o juiz exerça sua atividade recognitiva, a partir da qual se
produzirá o convencimento exteriorizado na sentença. O processo penal e a prova
nele admitida integram o que se poderia chamar de modos de construção do
convencimento do julgador, que formará a sua convicção e legitimará o poder
contido na sentença4.
A prova tem como principal objetivo o convencimento do juiz, ou seja, tornar
os fatos alegados pelas partes conhecidos do juiz, a fim de convencê-lo de sua
veracidade. Contudo, apesar de ser o magistrado o principal destinatário da prova,
as partes são também interessadas e, por conseguinte, destinatárias indiretas das
provas, a fim de que possam aceitar ou não a decisão judicial final assentada como
justa5.
Para Edilson Mougenot Bonfim “a prova é o instrumento usado pelos sujeitos
processuais para comprovar os fatos da causa, isto é, aquelas alegações que são
deduzidas pelas partes como fundamento para o exercício da tutela jurisdicional” 6.
Assim, a prova é todo elemento que pode levar o conhecimento de um fato a
alguém e o direito processual regula os meios de prova, que são os instrumentos
que trazem os elementos de prova aos autos7.
1.1 A liberdade probatória em Processo Penal
Por conta dos interesses dos envolvidos no processo penal, ou seja, de um
lado, o interesse do indivíduo na manutenção de seu direito a liberdade e do outro o
interesse estatal no exercício do jus puniendi, objetivando-se a tutela dos bens
3
AVENA, Norberto. Processo penal esquematizado. 4. ed. São Paulo: MÉTODO, 2012, p. 438.
4
LOPES Jr., Aury. Direito processual penal. 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 536.
5
RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 13. ed. rev., atual e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p.
405.
6
BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 347.
7
GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 8. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010, p.
185.
231
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jurídicos resguardados pelas normas penais, vigora no processo penal a mais ampla
liberdade probatória, seja quanto ao momento ou tema da prova, seja quanto aos
meios de prova que podem ser utilizados8.
O princípio da liberdade da prova é uma consequência lógica do princípio da
verdade processual, dessa forma, se o magistrado deve buscar sempre a verdade
dos fatos que lhe são apresentados, deverá ter toda liberdade de agir, a fim de
reconstituir o fato praticado e aplicar a ele a norma jurídica que for cabível9.
O direito à prova, assim como todo e qualquer direito fundamental, não tem
natureza absoluta, visto que está sujeito a limitações porque coexiste com outros
direitos igualmente protegidos pelo ordenamento jurídico10.
Por essa razão, não sendo ilimitada a possibilidade de produção de provas,
seguem adiante as exceções à liberdade probatória.
1.2 Limitações à liberdade probatória
A liberdade da prova não é absoluta, pois muitas vezes o juiz estará
restringido em sua pesquisa sobre a verdade dos fatos. O embasamento desta
limitação está em que a lei considera certos interesses de maior valor do que a
simples prova de um fato, mesmo que este seja ilícito. Pois os princípios
constitucionais de proteção e garantia da pessoa humana impedem que para a
busca da verdade sejam utilizados meios condenáveis dentro de um Estado
Democrático de Direito11.
Dessa forma, resta evidente que os meios de prova devem ter sido obtidos
de maneira lícita e com respeito à ética e à moral, haja vista o preceito constitucional
que veda a admissibilidade no processo de provas obtidas por meios ilícitos,
conforme dispõe o art. 5º, LVI, da Constituição Federal. Portanto, o Estado-Juiz não
pode exercer o jus puniendi sem antes certificar-se de que o fato imputado ao
acusado é verdadeiro, da mesma forma a averiguação da verdade deve ser feita por
8
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, vol I. 2. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2012, p. 909.
9
RANGEL, Paulo. Direito processual penal, p. 411.
10
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 867.
11
RANGEL, Paulo. Direito processual penal, p. 411.
232
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meios lícitos, que se ajustem à moralidade dos atos públicos e que respeitem as
liberdades públicas garantidas pela Constituição Federal12.
Como visto anteriormente, uma das limitações quanto ao princípio da
liberdade probatória esta assegurada pela Constituição Federal, a qual em seu art.
5º, LVI, prevê que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios
ilícitos”.
No mesmo sentido, a Lei n. 11.690/2008 alterou a redação do art. 157, a
qual atualmente dispõe que: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do
processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas
constitucionais ou legais”.
Em relação às provas proibidas, o Ministro Celso de Mello destaca com
propriedade que:
A ação persecutória do Estado, qualquer que seja a instância de
poder perante a qual se instaure, para revestir-se de legitimidade,
não pode apoiar-se em elementos probatórios ilicitamente obtidos,
sob pena de ofensa à garantia constitucional do due proces of law,
que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma se
suas mais expressivas projeções concretizadas no plano do nosso
sistema de direito positivo. – A Constituição da República, em norma
revestida de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, inc. LVI), desautoriza,
por incompatível com os postulados que regem uma sociedade
fundada em bases democráticas (CF, art. 1º), qualquer prova cuja
obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão a cláusula de
ordem constitucional, repelindo, por isso mesmo, quaisquer
elementos probatórios que resultem de violação do direito material
(ou, até mesmo, do direito processual), não prevalecendo, em
consequência, no ordenamento normativo brasileiro, em matéria de
atividade probatória, a fórmula autoritária do male captum, bene
retentum13.
De tal modo, a prova será considerada ilegal ou proibida sempre que sua
aquisição se der por meio de violação de normas legais ou de princípios gerais do
ordenamento jurídico, seja de natureza material ou processual. A prova obtida por
meios ilegais deve funcionar como o gênero, do qual são espécies as provas obtidas
por meios ilícitos e as provas obtidas por meios ilegítimos14.
12
13
14
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 911.
STF, 2ª Turma, HC nº 90.376/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, Dje 17/05/2007. A expressão male captum, bene
retentum significa “mal colhida, mas bem conservada”.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 868.
233
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Assim, a prova será considerada ilícita quando for obtida através da violação
de regra de direito material, seja penal ou constitucional. Desse modo, quando
houver a obtenção de prova em prejuízo de direitos que o ordenamento reconhece
aos indivíduos, independente do processo, a prova será considerada ilícita. Outra
característica é que, em regra, há uma violação no momento da colheita da prova,
geralmente em período anterior ou concomitante ao processo, mas sempre
externamente a este15.
Da mesma forma devem ser tratadas as provas invasivas, ou seja, aquelas
intervenções corporais feitas no indivíduo contra sua vontade, como instrumento de
prova, tais como exame de DNA, exame de alcoolemia. Trata-se de produção de
prova ilícita, visto que não se pode constranger o investigado ao fornecimento desse
tipo de prova, menos ainda considerar a sua recusa uma confissão tácita dos fatos.
O direito de não produzir prova contra si é garantia fundamental de um Estado
Democrático de Direito16.
Ademais, a prova considerada ilícita, consequentemente, inadmissível no
processo, não é passível de repetição, pois o vício vincula-se ao momento em que
foi obtida, ou seja, fora do processo. De tal modo, não há possibilidade de repetição,
devendo a prova ilícita ser desentranhada dos autos e destruída17.
No que tange a prova ilegítima, esta ocorrerá quando for obtida mediante
violação à norma de direito processual, portanto, são provas obtidas por meios
ilegítimos aos referentes ao momento de sua produção, em regra, no curso do
processo18.
Quando há a violação de uma regra de direito processual penal no momento
da sua produção em juízo a prova será considerada ilegítima. A proibição tem
natureza exclusivamente processual, como, por exemplo, a juntada fora do prazo,
prova unilateralmente produzida, ou seja, quando for imposta em função de
interesses relativos ao processo19.
A prova será ilegítima quando sua obtenção infringir norma processual
dizendo respeito à própria produção da prova, sendo assim, a prova obtida por meio
15
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 868/869.
16
RANGEL, Paulo. Direito processual penal, p. 415/416.
17
LOPES Jr., Aury. Direito processual penal, p. 594.
18
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 869.
19
LOPES Jr., Aury. Direito processual penal, p. 593.
234
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ilegítimo esta sujeita ao reconhecimento de sua nulidade e decretação de sua
ineficácia no processo20.
Além da vedação às provas obtidas por meios ilícitos, imorais e antiéticos,
há outra exceção ao princípio da liberdade probatória em relação aos meios de
prova, essa se refere à prova tarifada, Renato Brasileiro de Lima traz um exemplo
acerca dessa limitação, observa-se:
Um exemplo de prova tarifada consta no art.155, parágrafo único, do
CPP, o qual dispõe que “somente quanto ao estado das pessoas
serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil”. Assim, se
acaso pretenda o advogado provar que seu cliente está morto, não
poderá querer fazê-lo através de prova testemunhal, sendo cogente
a juntada de certidão de óbito, tal qual disposto no art. 62 do CPP21.
Para que incida a agravante prevista no art. 61, II, “e”, do Código Penal,
deve haver a prova nos termos da lei civil de que o crime foi praticado contra
ascendente, descendente, irmão ou cônjuge, esse é outro exemplo de prova
tarifada. Tais circunstâncias de parentesco ou matrimônio devem ser comprovadas
através da respectiva certidão de nascimento ou casamento, conforme o caso em
questão. De modo que não se comprova por prova testemunhal a falta de
documento civil respectivo, assim não se poderá tal circunstância ser provada de
outra forma, não incidindo nesse caso a referida agravante22.
Diante do exposto, observa-se que para a prova ser considerada tarifada ela
deverá ter o seu valor prefixado em lei, pois estes fatos somente podem ser
provados desta ou daquela forma, ou seja, o juiz não tem poder para adotar outro
meio de prova que não seja aquele imposto pela lei.
2. O CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE
As mortes decorrentes de acidentes de trânsito são frequentes e o consumo
de álcool é um dos maiores fomentadores. Em razão do crescente número de
vítimas em acidentes, especialmente aqueles advindos da combinação “álcool e
20
21
22
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 873/874.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 864.
LOPES Jr., Aury. Direito processual penal, p. 581.
235
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direção”, bem como pelos anseios da sociedade que rogava por um maior rigor
punitivo, a Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997, instituiu o Código de Trânsito
Brasileiro.
A referida legislação trouxe um conjunto de dispositivos, os quais os
condutores devem cumprir ao conduzirem os seus veículos e, inovadoramente,
estabeleceu um capítulo destinado a crimes de trânsito.
Atualmente, o Código de Trânsito Brasileiro passa por mais uma alteração,
esta imposta pela Lei n. 12.760/12, contudo, já foram três desde a sua concepção,
as Leis n. 11.256/06 e n. 11.705/08, também modificaram alguns de seus artigos,
em especial o crime de embriaguez ao volante.
Na época da edição da Lei n. 11.705, de junho de 2008, conhecida como
“Lei Seca” e do Decreto 6488, da referida data, ocorreram significativas alterações
no crime previsto no art. 306, do Código de Trânsito Brasileiro, tanto no aspecto
administrativo como no criminal.
Agora, a denominada “Nova Lei Seca” (Lei n. 12.760/12) entra em cena com
a finalidade de preencher as lacunas e reparar os equívocos existentes no diploma
anterior.
A fim de alcançar um panorama mais claro acerca da transição entre as leis
n. 9.503/97, n. 11.705/08 e n. 12.760/12, resta necessário estabelecer uma
comparação entre o que dispunham anteriormente as redações do crime de
embriaguez ao volante e o novo texto legal.
2.1 Digressão histórica
A Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997, instituiu o Código de Trânsito
Brasileiro, bem como dedicou um capítulo aos crimes de trânsito, sendo uma das
inovações a tipificação penal da conduta do ébrio que, conduz, na via pública,
veículo automotor, expondo a dano potencial a incolumidade pública de outrem23,
assim previa o art. 306 do CTB:
Art.306. Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência
de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano
potencial a incolumidade de outrem:
23
RANGEL, Paulo. Direito processual penal, p. 28.
236
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Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou
proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo
automotor.
Para a caracterização do ilícito penal previsto no art. 306 em sua redação
originária, não bastava que o agente tivesse ingerido bebida alcoólica ou substância
de efeitos análogos, mas sim a comprovação de que a substância teria afetado a
forma de dirigir do condutor, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem24.
Assim, quanto à natureza jurídica do crime de embriaguez ao volante
previsto na Lei n. 9503/97, em que pesem às divergências doutrinárias, o delito foi
considerado, predominantemente, de perigo concreto, pois exigia a caracterização
de um perigo real, aferível em cada caso submetido à analise25.
O tipo penal exigia somente que o sujeito conduzisse o veículo de forma
anormal, “sob a influência de álcool”, não existindo limite de tolerância para a esfera
criminal, caracterizando o crime o fato de um cidadão conduzir veículo automotor,
em via pública, tendo ingerido bebida alcóolica ou substância de efeito análogo, em
qualquer quantidade, por menor que seja, desde que se encontrasse “sob a
influência de álcool” 26.
Dessa forma, o delito se aperfeiçoaria independente da quantidade de álcool
no sangue, ou de outra substância tóxica constatável na urina, porquanto uma
quantidade menor pode, dependendo da pessoa que a ingere, provocar mais alto
grau de embriaguez, se evidenciado que o motorista, em razão do consumo dessas
substâncias, não mais tem controle para dirigir com segurança no trânsito, em razão
da debilidade de coordenação psíquica e motora27.
Nesse sentido, em face do silêncio do tipo penal quanto à especificação de
qualquer grau de concentração, a análise deveria ser em relação ao caso concreto,
devendo-se verificar se a quantidade de álcool, ingerida pelo infrator, teria
24
JESUS, Damásio Evangelista de. Crimes de trânsito: anotações à parte criminal do Código de Trânsito (Lei nº
9.503, de 23/09/1997). 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 147.
25
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2013, p. 44.
26
HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. Campinas: Millennium, 2000, p. 438.
27
FUKASSAWA, Fernando Y. Crimes de trânsito: de acordo com a lei n. 9.503. de 23-09-1997: Código de
Trânsito Brasileiro. São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 1998, p. 157.
237
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provocado alteração em seu sistema nervoso, de modo a reduzir suas funções
motoras e perceptivas, ocasionando perigo na condução de veículos automotores28.
Diante do exposto, é possível perceber que o exercício do direito a não
autoincriminação não era empecilho à comprovação do crime de embriaguez ao
volante em sua redação original. Isso porque, mesmo que o agente se recusasse a
soprar o bafômetro, era possível que a elementar do tipo “sob a influência de álcool”
fosse comprovada através de exame clínico com a participação passiva do agente.
Dessa forma, ainda que o motorista se recusasse a fazer exame de sangue ou
soprar o bafômetro, um médico perito poderia facilmente constatar que tal pessoa
estava “sob a influência de álcool”, sem que exigisse qualquer comportamento ativo
do agente, bastando analisar, por exemplo, a aparência do agente, sua atitude,
orientação, elocução, andar, coordenação motora, hálito, etc29.
Logo, a hipótese da negativa de exame pericial era facilmente solucionada,
através do exame clínico, era a situação em que o suspeito estava em estado de
torpor tão intenso, que era incapaz de manifestar-se, inclusive sobre o seu
assentimento para exames e teses. Com o exame clínico, tranquilamente, o
legislador constatava a ebriedade, a anterior “influência de álcool” em estado que
gerava perigo potencial na direção de veículo automotor30.
Por fim, conclui-se que para a caracterização do crime em sua formulação
originária bastava à obtenção de qualquer prova em direito admitida, acerca dos
notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.
2.2 A materialidade do crime de embriaguez ao volante antes das alterações
promovidas pela Lei n. 12.760/12
Uma primeira alteração expressiva se processa pela Lei n. 11.705, de 19 de
junho de 2008, pois antes de sua edição bastava que o agente, sob a influência de
álcool, expusesse a dano potencial a incolumidade de outrem para a configuração
do delito de embriaguez ao volante31.
28
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 27.
29
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 71.
30
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 30.
31
RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 8. ed. rev., atual. ampl. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 606.
238
LOEBLEIN, Danieli da Rosa; CHAVES JUNIOR, Airto. A materialidade do crime de embriaguez ao volante diante
das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 229-250, 3º Trimestre de 2013. Disponível em:
www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044
Com a entrada em vigor da Lei n. 11.705/08, a chamada Lei Seca, o tipo
penal passou a ter a seguinte redação: “Conduzir veículo automotor, na via pública,
estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis)
decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que
determine dependência.”
Dessa forma, inseriu-se a quantidade mínima exigível e excluiu-se a
necessidade de exposição de dano potencial, de modo que se delimitou o meio de
prova admissível, ou seja, a figura típica só se perfazia com a quantificação objetiva
da concentração de álcool no sangue, o que não se pode presumir. A dosagem
etílica, portanto, passou a integrar o tipo penal, que exigia a comprovação superior a
6 (seis) decigramas para a configuração do crime32.
Quanto à alteração do caput do referido artigo, Renato Brasileiro de Lima
esclarece que o problema é exatamente em relação à forma que deveria ser feita
para a comprovação dessa concentração de álcool por litro de sangue. Pois nos
termos do art. 277, do CTB, o condutor de veículo automotor que for alvo de
fiscalização de trânsito, e sob o qual recaiam suspeitas de dirigir sob a influência de
álcool, será submetido a teste de alcoolemia, exame que será capaz de apontar a
quantidade de álcool etílico no sangue do condutor33.
Em razão de ser a extração de sangue um método muito invasivo, foi criado
o bafômetro, aparelho de ar alveolar destinado a estabelecer o teor alcóolico no
organismo do condutor do veículo automotor, através do sopro do motorista no
referido equipamento. Dessa maneira, a produção de prova quanta à prática do
delito tornou-se bem mais complicada. Isso porque o novo tipo traz como elementar
a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas34.
O decreto 6.488, de 19.06.2008, regulamentando o art. 306 do CTB, definiu
as duas maneiras de comprovação da dosagem etílica, uma sendo o exame de
sangue e a outra o teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômentro), ou
popularmente conhecido como ‘bafômetro’, conforme art. 2º:
32
RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro, p. 606.
33
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 71.
34
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal, p. 71.
239
LOEBLEIN, Danieli da Rosa; CHAVES JUNIOR, Airto. A materialidade do crime de embriaguez ao volante diante
das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 229-250, 3º Trimestre de 2013. Disponível em:
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Art. 2º. Para os fins criminais de que trata o art. 306 da Lei n. 9.503,
de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, a equivalência entre os
distintos testes de alcoolemia é a seguinte:
I - exame de sangue: concentração igual ou superior a seis
decigramas de álcool por litro de sangue; ou
II - teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro):
concentração de álcool igual ou superior a três décimos de miligrama
por litro de ar expelido dos pulmões.
Em face da Lei n. 11.705/2008 e do Decreto 6.488/2008, o Superior Tribunal
de Justiça confirmou a obrigatoriedade de provas técnicas, por oportuno colacionase o seguinte julgado:
1. Antes da edição da Lei n. 11.705/08 bastava, para a configuração
do delito de embriaguez ao volante, que o agente, sob a influência de
álcool, expusesse a dano potencial a incolumidade de outrem. 2.
Entretanto, com o advento da referida Lei, inseriu-se a quantidade
mínima exigível e excluiu-se a necessidade de exposição de dano
potencial, delimitando-se o meio de prova admissível, ou seja, a
figura típica só se perfaz com a quantificação objetiva da
concentração de álcool no sangue o que não se pode presumir. A
dosagem etílica, portanto, passou a integrar o tipo penal que exige
seja comprovadamente superior a 6 (seis) decigramas. 3. Essa
comprovação, conforme o Decreto nº 6.488 de 19.6.08 pode ser feita
por duas maneiras: exame de sangue ou teste em aparelho de ar
alveolar pulmonar (etilômetro), este último também conhecido como
bafômetro. 4. Cometeu-se um equívoco na edição da Lei. Isso não
pode, por certo, ensejar do magistrado a correção das falhas
estruturais com o objetivo de conferir-lhe efetividade. O Direito Penal
rege-se, antes de tudo, pela estrita legalidade e tipicidade. 5. Assim,
para comprovar a embriaguez, objetivamente delimitada pelo art. 306
do Código de Trânsito Brasileiro, é indispensável a prova técnica
consubstanciada no teste do bafômetro ou no exame de sangue35.
Observa-se que, em conformidade com texto imprimido pela Lei n. 11.705/08
ao artigo 306, CTB, não bastaria à mera constatação da “influência de álcool”, nem
mesmo da embriaguez do condutor por outros meios de prova ou até mesmo pelo
exame pericial médico. Isso porque, em nenhum desses procedimentos, é possível
aferir o grau de concentração de álcool no sangue, imprescindível para a
caracterização da infração em destaque naquela conformação legal36.
35
STJ, 6ª Turma, HC nº 166.377/SP, Rel. Min. Og. Fernandes, Dje 01/07/2010.
36
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 27.
240
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das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
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Dessa forma, tendo a recusa do condutor, seria impossível aferir a dosagem
etílica e, se o exame fosse levado a efeito nessas condições, a prova seria
considerada ilícita, já que não haveria o consentimento do investigado37.
Nessa linha, há precedentes do Supremo Tribunal Federal no sentido de que
não se pode presumir a embriaguez de quem não se submete a exame de dosagem
alcoólica: “a Constituição da República impede que se extraia de qualquer conclusão
desfavorável daquele que, suspeito ou acusado de praticar alguma infração penal,
exerce o direito de não produzir prova contra si mesmo”
38
.
Corroborando com o já exposto, quanto à inexigência da colaboração do réu
para a realização dos exames fornecendo material, é seu direito a nãoautoincriminação, da mesma maneira que não tem obrigação de colaborar para a
realização da prova pericial, a qual tem a finalidade de prejudica-lo. Por esse motivo,
não necessita fornecer sangue para o exame de constatação de dosagem alcoólica,
como também não está obrigado a soprar o aparelho denominado bafômetro39.
Prosseguindo a análise do dispositivo em apreço, percebe-se que Lei n.
11.705/08 não previu somente a ebriedade etílica na direção de veículos
automotores. Como já ocorria na redação original, outras substâncias alteradoras do
psiquismo, da coordenação ou da percepção podem ocasionar a responsabilização
criminal daquele que dirigi sob a sua influência40.
Contudo, enquanto a formulação original do art. 306, CTB, falava em
substância de efeitos análogos ao álcool, a referida legislação usou a designação de
qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. De forma que, a
expressão abrange todas as substâncias lícitas ou ilícitas capazes de afetar o
psiquismo
(reflexão,
percepção,
reação,
atenção
etc.)
e
que
determine
dependência41.
Outra mudança relevante que se deu com a chegada da Lei n. 11.705/2008
refere-se ao fato de que o crime de embriaguez ao volante deixou de exigir a
ocorrência de perigo concreto, pois o legislador passou a entender que conduzir
37
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 27.
38
STF, 1ª Turma, HC nº 93.916/PA, Rel.ª Min.ª Cármen Lucia, Dje 27/06/2008.
39
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 6. ed. rev., atual. e ampl. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 407.
40
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 39.
41
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 39.
241
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veículo automotor nas condições estabelecidas pelo art. 306, é conduta que,
independente de qualquer outro acontecimento, gera perigo suficiente ao bem
tutelado, de modo que possibilita a imposição da sanção penal. Não se exige mais
um conduzir anormal, manobras perigosas que possam expor a perigo efetivo a
incolumidade de outrem42.
Portanto,
o
crime
passou
a
ser
de
perigo
abstrato,
ou,
mais
apropriadamente, de crime de mera conduta, pois para a sua configuração basta o
fato de dirigir sob a influência de álcool, na quantidade de álcool estipulada por lei,
ou sob influência de substância psicoativa, tanto que o sujeito passivo é a
coletividade. De modo que, encontrando-se o motorista com álcool no sangue, nos
índices previstos, e locomovendo o veiculo em via publica, consuma-se o delito43.
2.3 A materialidade do crime de embriaguez ao volante após a vigência da Lei
n. 12.760/12
Com o propósito de conter o número alarmante da violência no trânsito e em
resposta a pressão imposta pela mídia e pela sociedade, o poder legislativo mais
uma vez alterou a redação do art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro para tentar
diminuir a prática infracional de dirigir sob influência de álcool.
A lei mais recente, Lei n. 12.760, de 20 de dezembro de 2012, conhecida
como “Nova Lei Seca”, retirou do caput do artigo 306 do CTB a exigência da
concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, a
fim de dar uma resposta mais severa aos condutores ébrios, haja vista que,
conforme acima demonstrado, apenas com a prova técnica, neste caso, o exame de
sangue e o etilômetro, poderia ser aferida a quantidade de álcool por litro de sangue
e então ser configurado o delito44.
Nessa linha de argumentação, verificou-se que sendo assegurado o direito
constitucional de que ninguém pode ser compelido a produzir prova contra si, restou
engessado o crime de embriaguez ao volante. Assim, somente quando o suspeito
42
MARCÃO, Renato. Crimes de trânsito. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 159.
43
RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro, p. 607.
44
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 26.
242
LOEBLEIN, Danieli da Rosa; CHAVES JUNIOR, Airto. A materialidade do crime de embriaguez ao volante diante
das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
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decidisse livremente colaborar seria realizado o teste do etilômetro ou o exame
toxicológico, podendo dessa forma ser comprovada a materialidade do crime.
Em decorrência das mudanças introduzidas pela Lei n. 12.760/12, o art. 306
apresenta seguinte redação:
Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora
alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância
psicoativa que determine dependência:
§ 1o As condutas previstas no caput serão constatadas por:
I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro
de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de
ar alveolar; ou
II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran,
alteração da capacidade psicomotora.
§ 2o A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida
mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova
testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos,
observado o direito à contraprova.
§ 3o O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes
de alcoolemia para efeito de caracterização do crime tipificado neste
artigo.
Como se vê, foram modificadas as elementares do tipo fundamental,
caput do art. 306, foi acrescido o parágrafo 1º que dispõe sobre a forma de
constatação do delito e o parágrafo 2º, o qual indica a possibilidade de todos os
meios de prova admitidos em direito para a demonstração da infração, e, por fim, o
parágrafo 3º, a indicar a atribuição do Contran para dispor sobre a equivalência dos
testes de alcoolemia45.
Importante ressaltar que os incisos I e II do são ligados pela conjunção
alternativa “ou”, de modo que devem ser interpretados separadamente, sem
qualquer necessidade de integração a não ser diretamente com o caput. Esses
dispositivos legais estabelecem como se constatará a alteração da capacidade
psicomotora devido à influência de álcool ou demais substâncias mencionadas no
caput 46.
45
46
MARCÃO, Renato. Nova Lei Seca não pode ser aplicada retroativamente. Consultor Jurídico. 23 de janeiro
de 2013. Disponível em http://www.conjur.com.br/2013-jan-23/renato-marcao-lei-seca-nao-aplica-casosanteriores-edicao. Acesso em 02.06.2013.
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 52.
243
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das alterações promovidas pela Lei n. 12.760/2012. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro
de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 229-250, 3º Trimestre de 2013. Disponível em:
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Nesse sentido, verifica-se que não há necessidade, para a comprovação da
alteração da capacidade psicomotora, que o agente incida nos incisos I e II, mas sim
que incida no inciso I “ou” no inciso II. Observado o fato de que se houver no caso
concreto, incidência dupla, tanto melhor, mas isso não é exigível e muito menos
imprescindível para a caracterização do crime 47.
Isto posto, resta evidente a intenção do legislativo no sentido de retornar ao
método anterior em que não se fica atrelado a uma concentração de álcool no
sangue ou ar alveolar, pois a comprovação do estado perigoso na direção de
automotores pode ser produzida por outros meios legais.
Dessa forma, por meio da Resolução 432/13, o Conselho Nacional de
Trânsito (Contran) regulamentou, em 23/01/13, a chamada Nova Lei Seca, e em seu
art. 3º estão descritos os procedimentos que poderão ser realizados para a
confirmação da alteração da capacidade psicomotora, observa-se:
Art. 3º. A confirmação da alteração da capacidade psicomotora em
razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que
determine dependência dar-se-á por meio de, pelo menos, um dos
seguintes procedimentos a serem realizados no condutor de veículo
automotor:
I – exame de sangue;
II – exames realizados por laboratórios especializados, indicados
pelo órgão ou entidade de trânsito competente ou pela Polícia
Judiciária, em caso de consumo de outras substâncias psicoativas
que determinem dependência;
III – teste em aparelho destinado à medição do teor alcoólico no ar
alveolar
(etilômetro);
IV – verificação dos sinais que indiquem a alteração da capacidade
psicomotora do condutor.
§ 1º Além do disposto nos incisos deste artigo, também poderão ser
utilizados prova testemunhal, imagem, vídeo ou qualquer outro meio
de prova em direito admitido.
47
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 52.
244
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de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 229-250, 3º Trimestre de 2013. Disponível em:
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Como se vê, com o advento da Lei 12.760/12, o exame toxicológico e o teste
do etilômetro não deixaram de ser meios de prova de ebriedade, apenas, agora, eles
não são mais os únicos meios de comprovação válidos legalmente48.
Nesse norte, considerando-se que ninguém é obrigado a fazer o exame de
sangue ou mesmo o teste do etilômetro, por força do princípio da nãoautoincriminação, a nova lei possibilitou provar a embriaguez por sinais indicativos
de alteração da capacidade psicomotora49.
Por oportuno, colaciona-se o art. 5º da Resolução n. 432 do Contran, a qual
define as formas de constatação dessa alteração:
Artigo 5º. Os sinais de alteração da capacidade psicomotora
poderão ser verificados por:
I - exame clínico com laudo conclusivo e firmado por médico perito;
ou
II - constatação, pelo agente da Autoridade de Trânsito, dos sinais de
alteração da capacidade psicomotora nos termos do Anexo II.
§ 1º Para confirmação da alteração da capacidade psicomotora pelo
agente da Autoridade de Trânsito, deverá ser considerado não
somente um sinal, mas um conjunto de sinais que comprovem a
situação do condutor.
§ 2º Os sinais de alteração da capacidade psicomotora de que trata o
inciso II deverão ser descritos no auto de infração ou em termo
específico que contenha as informações mínimas indicadas no
Anexo II, o qual deverá acompanhar o auto de infração.
Sobre os “sinais indicadores da alteração psicomotora”, observa-se que o
subjetivismo é quase que absoluto, cabendo considerar cada pessoa, cada fato, pois
o automatismo que se pretendia contra o motorista que fez exame de sangue ou o
teste do etilômetro desaparece, de modo que a matemática sai e entra o
singularismo de cada caso concreto50.
Nesse caso, caberá à acusação indicar quais são os sinais indicativos que
demonstram a alteração da capacidade psicomotora do condutor. Portanto, é
48
49
50
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 36.
GOMES, Luiz Flávio. A nova Lei Seca deve ser interpretada literalmente. Consulto Jurídico. 1º de Fevereiro
de
2013.
Disponível
em
http://www.conjur.com.br/2013-fev-01/luiz-flavio-gomes-lei-seca-nao-sendointerpretada-literalmente. Acesso em 02.06.2013.
GOMES, Luiz Flávio. A nova Lei Seca deve ser interpretada literalmente.
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preciso perquirir esses sinais que podem ser: o andar cambaleante, a fala pastosa, a
agitação, a depressão, o sono ao volante, a falta de concentração, a consciência
alterada, a direção em descontrole, a falta de coordenação motora ou sua
deficiência etc51.
No que tange às demais substâncias psicoativas, a Lei n. 12760 manteve a
redação anterior, apenas foi retirada a palavra “qualquer”, que não alterou
significativamente o sentido do texto. Da mesma forma, o critério da mera influência
foi mantido, não estabelecendo níveis de concentração sanguínea como parâmetro.
De tal maneira, no caso de outras substâncias psicoativas bastará o exame
clínico, que poderá ser complementado por exames toxicológicos, mas não
necessariamente. E isso não é novidade trazida pela Lei n. 12760, já imperava esse
tratamento, desde a primeira Lei Seca. Assim, a produção da prova e a formação de
indícios mínimos, para a convicção de flagrância, eram muito mais simples e
praticáveis nos casos de outras substâncias psicoativas do que no caso do álcool,
no tempo da vigência da Lei n. 11.705/0852.
Como visto anteriormente, a Lei 11.705/08, deu nova redação ao caput do
artigo 306 do CTB e deixou de exigir a ocorrência de perigo concreto, nesse sentido,
nota-se que as alterações introduzidas com a Lei 12.760/12, não modificaram esta
realidade jurídica. Uma vez que, conduzir veículo nas condições do artigo
306, caput,
do
Código
de
Trânsito
Brasileiro,
é
conduta
que,
por
si,
independentemente de qualquer outro acontecimento, gera perigo suficiente ao bem
jurídico tutelado, de modo a justificar a imposição de pena criminal53.
Portanto, não se exige um conduzir anormal, manobras perigosas que
exponham a dano efetivo a incolumidade de outrem. O crime é de perigo abstrato54,
presumido 55.
Agora, se o condutor se nega, usando de um direito constitucional seu, a
submeter-se a exames de sangue ou de etilômetro, nada impede seu processo e
51
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 59.
52
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 40/41.
53
MARCÃO, Renato. Nova Lei Seca não pode ser aplicada retroativamente.
54
55
Existem doutrinadores, como Luiz Flávio Gomes, que não cogitam a admissão de crime de perigo abstrato no
atual ordenamento jurídico, sob o argumento de que viola o principio da lesividade ou ofensividade, tendo em
vista que o crime do art. 306, do CTB não é gerado contra uma pessoa determinada, mas sim contra um
número indeterminado de pessoas que estão no trânsito, além do que, é um “perigo” que se presume a partir
da condição do motorista.
MARCÃO, Renato. Nova Lei Seca não pode ser aplicada retroativamente.
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condenação com base em outras provas, dentre as quais o exame clínico de
embriaguez levado a efeito pelo Médico – Legista56.
Por fim, frisa-se que não será mais o próprio suspeito que irá decidir se
haverá produção de provas contra si, haja vista que a comprovação do delito poderá
ser procedida através de exames, testes ou outros meios legais que independem da
colaboração do investigado57.
A Resolução 432/13, do CONTRAN, em seu art. 3º, § 1º, registra “qualquer
outro meio de prova em direito admitido”. Conforme Bonfim58, considera-se meio de
prova todo o fato, documento ou alegação que possa servir, direta ou indiretamente,
à busca da verdade real dentro do processo. Em outras palavras, é o instrumento
utilizado pelo juiz para formar a sua convicção acerca dos fatos alegados pelas
partes.
O Código de Processo Penal não esclarece taxativamente os meios de
prova admissíveis, por conseguinte, o rol de provas é aberto, haja vista que na
busca pela verdade real, podem as partes optar por meios de provas não
especificados em lei. Isso porque, vigora relativa liberdade probatória quanto aos
sujeitos do processo, respeitando-se as proibições legais59.
Com a Lei n. 12.760/12, acrescentou-se o § 2º no art. 306, do CTB, o qual
prevê que:
Art. 306 [...]. § 2o A verificação do disposto neste artigo poderá ser
obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo,
prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos,
observado o direito à contraprova.
O Código de Processo Penal não limita os meios de prova, logo, não há
nenhum impedimento à produção de outras provas além das indicadas nos art. 158
a 250 do referido diploma legal. O veto às provas que atentam contra a moralidade
dignidade da pessoa humana, de modo geral, decorre de princípios constitucionais,
por isso não pode ser olvidado60.
56
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 59.
57
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Nova lei seca, p. 59.
58
BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal, p. 352.
59
BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal, p. 357.
60
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 3. vol. 28. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2006, p. 220.
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Esses são os chamados meios legais, outros, porém, são admissíveis,
desde que consentâneos com a cultura do processo moderno, ou seja, respeitem os
valores da pessoa humana e racionalidade61.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscou-se, com o presente trabalho, analisar as recentes alterações do
crime de embriaguez ao volante previsto no art. 306, do Código de Trânsito
Brasileiro, promovidas pela Lei n. 12.760/2012, especialmente quanto à forma de
constatação do delito, tendo em vista a possibilidade apresentada pela nova
legislação da utilização de todos os meios de prova em direito admitidos para a sua
comprovação.
Para atingir este objetivo, realizou-se um estudo quanto à evolução da
criminalização da embriaguez ao volante na Lei 9.503/97, a começar por sua
redação original. Após, retratou-se as modificações promovidas pela chamada “Lei
Seca”, até chegar à recente redação proferida pela Lei n. 12.760/2012.
Verificou-se, a partir da pesquisa, que a denominada “Nova Lei Seca” entrou
em vigor com a intenção de acertar os equívocos provocados pela Lei n.
11.705/2008, visto que a exigência da comprovação de uma taxa específica de
alcoolemia resultou em sérias dificuldades para aplicação do referido dispositivo.
Isso porque, a realização dos procedimentos necessários dependia da colaboração
espontânea do investigado, o qual não pode ser constrangido a fornecer nenhum
tipo de material em virtude da garantia constitucional de não-autoincriminação.
Entendeu-se que a nova legislação, ao retirar do tipo penal a mencionada
taxa e, consequentemente, não exigir mais a prova tarifada para a sua
comprovação, pretendeu ampliar as formas de constatação do crime a fim de retirar
do investigado o poder de produção de prova, pois evidente que o Estado não pode
deixar a mercê do suspeito a faculdade de comprovação da materialidade do
referido crime, sob pena de manifesto sentimento de impunidade e insegurança
jurídica.
61
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A MATERIALIDADE DO CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE