Economia Como Ciência Preditiva no Setor de Tecnologia
Marcos Vinícius Brzowski - Economista
Mestrando em Filosofia / UFPR. [email protected]
RESUMO: A capacidade da economia como ciência preditiva tem sido debatida de forma
intensa desde o começo do século XX. Sendo a tecnologia um fator preponderante no sistema
econômico, responsável pelo seu desenvolvimento, e a inovação tecnológica considerada
como um salto no desconhecido, a questão referente à capacidade de previsão da economia
renasce como uma questão relevante para a pesquisa econômica e para a filosofia da
econômia. Para esclarecer esta questão, utilizou-se neste artigo a concepção de Thomas Kuhn
da ciência normal, a aplicação da vertente teórica econômica influênciada por Michael
Polanyi (teoria econômica evolucionária) e um estudo de caso da indústria fonográfica
focando a APPLE como empresa principal. Neste trabalho, o objetivo foi mostrar que a
previsão na econômia ocorreria apenas na previsão das condições iniciais onde ocorrem as
inovações tecnológicas, ao contrário da previsão de algum produto, tecnologia ou modelo de
negócios específico.
PALAVRAS-CHAVE: Paradigmas Tecnoeconômicos, Inovação Tecnológica, Filosofia da
Economia, Predição na Economia, Thomas Kuhn
ABSTRACT: Economics capacity to predict has been intensely debated since the early XX.
With technology as a major factor in the economic system, responsible for its development,
and technological innovation being considered as a jump to the unknown, the question about
economics capacity to predict rebirths as an important question for economic research and
philosophy of economics. Shedding light to the question, this work utilized Thomas Kuhn
concept of normal science, the application of a particular economic theory influenced by
Michael Polanyi (evolutionary economics) and a case study about the phonographic industry,
having Apple at it's center. In this work, the objective was to show that prediction in
economics would happen only as predictions about the initial conditions where technological
innovations would exist, contrary to the prediction of a particular product, technology or
business model.
KEYWORDS: Technoeconomic Paradigms, Technological Innovation, Philosophy of
Economics, Prediction in Economics, Thomas Kuhn
1. Paradigma e pesquisa normal em Thomas Kuhn.
Podemos defender a posição de que economistas podem fazer predições
específicas e precisas, especialmente na área de tecnologia, dentro da concepção de Thomas
Kuhn da ciência?
Irei analisar as posições de Kuhn sobre quais fatores podem diferenciar a
economia das ciências naturais e se estes fatores podem ser impedimentos para a
cientificidade, e subsequênte dificuldade em prever, no mercado tecnológico.
Se há alguma linha que separa o empreendimento científico dos outros
empreendimentos, ela deve estar na característica de ser a resolução de quebra-cabeças, ou
seja, a capacidade das ciências naturais de encontrar uma forma deliberada de limitar as
possíveis abordagens e criar questões relevantes. Posteriormente, o progresso passa a ser
evidente pelo próprio mecanismo interno da ciência normal, quando cientistas buscam elevar
a precisão do paradigmai no conflito com fatos e dados, podendo levar ao período de ciência
revolucionária. Portanto, o critério de cientificidade que nos interessa é a capacidade de um
paradigma de viabilizar eficientemente a atividade de pesquisa normal, possibilitando
predições conforme a pesquisa normal aumenta a precisão do paradigma.
Nas ciências naturais, embora ocorram períodos de ciência revolucionária
implicando a reinterpretação e rearticulação do paradigma, majoritariamente a atividade não é
a constante revisão dos fundamentos básicos que definem a disciplina. No entanto, esse
parece ser o comportamento da pesquisa nas ciências humanas, onde novas teorias e
abordagens constantemente modificam as entidades e relações básicas que definem um
campo, criando inevitavelmente a necessidade do cientista de reconstruir seu campo desde os
fundamentos.
Há aqui uma importante bifurcação nas possíveis explicações para essa
diferença entre as ciências humanas e naturais. Primeiro, há a possibilidade de que as ciências
humanas ainda não encontraram um paradigma que viabilize a pesquisa normal. Nessa
hipótese, podemos argumentar que seria uma questão de tempo para que as ciências humanas
i
Kuhn foi criticado por Margaret Masterman por ter usado o conceito de paradigma em “vinte e uma
maneiras sutilmente diferentes” na Estrutura (Masterman, 1970, p. 61). Ele revisou o conceito e
posteriormente substituiu por “matriz disciplinar”. O uso do termo paradigma muitas vezes era
interpretado, por exemplo, como sinônimo de teoria, mas este era apenas um dos intuitos do filósofo.
Ele apresenta a expressão matriz disciplinar. Ela corresponde ao corpo de suposições teóricas e
ferramentas que guiam os cientístas no seu trabalho, membros de uma comunidade científica.
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adquiram o evidente progresso que observamos nas ciências naturais. Adquirindo, pela
pesquisa normal, a característica que diferencia a ciência dos outros empreendimentos
humanos.
Mas há uma segunda possibilidade que pode criar um importante impedimento
para a ocorrência da ciência normal. Tomemos como exemplo a interpretação dos céus, desde
a Grécia até os tempos modernos. Os objetos celestes para os gregos dividiam-se em
categorias como estrelas, planetas e meteoros.
Apesar de termos as mesmas categorias (e muitas outras), os gregos incluíam o
Sol e a Lua na mesma categoria de Júpiter. Tais corpos eram semelhantes, mas diferentes das
categorias estrelas e meteoros (Kuhn, 2006, p. 268). Podemos observar que a divisão grega e
moderna para as categorias dos céus são diferentes e vem se modificando sistematicamente
desde os tempos antigos.
A pesquisa que proporcionou a transição para a versão moderna foi feita nas
versões prévias, como a grega. Durante o período de pesquisa normal que alteraria essas
categorias celestiais, os céus permaneceram exatamente iguais (Kuhn, 2006, p. 273). Esta
estabilidade é essencial para que a ciência normal ocorra eficientemente, resultando nas
mudanças da taxonomiaii celestial apresentadas. Uma analogia semelhante pode ser apontada
na Física, onde as relações físicas que governam o planeta são as mesmas desde Aristóteles,
nós cientificamente conscientes dessas relações ou não.
Aqui pode estar o impedimento para a ocorrência da ciência normal e a
inviabilização da capacidade de prever nas ciências humanas, pois não haveria a mesma
estabilidade nas disciplinas que incluem, direta ou indiretamente, aspectos sociais. Nesse
sentido, mesmo paradigmas que viabilizassem a pesquisa normal poderiam perder sua
relevância ou correspondência com o objeto de estudo, devido às mudanças inerentes dos
sistemas que incluem pessoas.
Nada impede a prática ou tentativa da ciência normal, mas sua eficácia e
resultados seriam inversamente proporcionais ao quão exposto está o campo estudado às
comunidades, indivíduos e aos resultados dos mesmos. Mais especificamente, não seria a
mera presença física de indivíduos, mas a inevitável presença ativa, criadora, transformadora
ii
As partes de uma teoria estão interligadas em um todo coerente. Kuhn nomeia esse holismo
semântico de taxonomia lexical.
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e adaptativa. A tecnologia e o desenvolvimento tecnológico se inserem nesse contexto, sendo
uma das fontes principais dessa instabilidade.
2. A Firma e os Paradigmas Tecnoeconômicos
Devemos compreender como a tecnologia esta inserida no paradigma
tecnoeconômico para que a questão seja esclarecida. Conceitos como aprendizado
tecnológico, difusão tecnológica e inovações precisam ser compreendidos para observarmos
como esses fatores podem ser fonte de imprevisibilidade e como eles definem o paradigma
tecnoeconômico.
Pelas teorias econômicas evolucionárias referentes à mudança econômica, que
representam um campo muito recente da teoria econômica e são consideradas heterodoxas
por conflitar com a linha principal da teoria econômica, a empresa é um conjunto de
competências incorporadas em suas rotinas. As rotinas orientam a firma, incluindo todas as
rotinas técnicas de produção e desenvolvimento (Pesquisa & Desenvolvimento) da firma.
Esses procedimentos incorporam conhecimentos, de natureza tácita e
codificada, servindo como a base de conhecimentos e habilidades da empresa. Estas tarefas
diminuem a diversidade e a quantidade infinita de informações a um conjunto acessível para
assimilação e processamento.
A firma busca também manter o conhecimento adquirido por seus
trabalhadores, através das rotinas, este muitas vezes não codificado e passível de ser perdido
caso um trabalhador saia da empresa. Para lucrar e sobreviver, a firma precisa preocupar-se
em adquirir e preservar conhecimentos necessários à produção e comercialização de seus
produtos num ambiente de competição e incerteza. Através da criação e reprodução de
rotinas, ela tenta estabilizar e tornar esse conhecimento coletivo. Este se torna resistente a
problemas de raízes individuais. No entanto como salienta Pessali & Fernandes (2006, p. 317318), a manutenção, aquisição e ampliação das desse conhecimento tácito e codificado da
firma está inserido dentro de um processo de inovação tecnológica.
As características essenciais desse processo são: 1. As inovações são um salto
no desconhecido, cujos resultados são incertos; 2. As tecnologias evoluem por trajetórias
dependentes canalizadas em paradigmas tecnológicos, estes consistem em padrões de
resolução de certos problemas técnicos; 3. As mudanças são cumulativas (se dentro do mesmo
paradigma tecnológico); 4. Há um grau de irreversibilidade em função da acumulação de
3
conhecimentos e da tecnologia, das decisões de investimento tomadas pelos agentes e das
trajetórias tecnológicas; 5. Há uma inter-relação com outras tecnologias ou ativos
complementares (gestão de recursos físicos e humanos, regulação, distribuição); 6.
Conhecimentos das inovações podem ser de difícil transmissão, tácitos e pouco codificáveis
em manuais; 7. As informações técnicas são passíveis de vazamento por diversos meios,
tornando praticamente impossível assegurar direitos autorais;
À procura de lucros e diante da incerteza, a firma busca inovar e assentar a
inovação em ações coletivas estáveis. Nessas tarefas ela terá que lidar com indivíduos
racionalmente limitados, diversamente qualificados, sensíveis em diferentes graus ao contexto
e com objetivos próprios (PESSALI & FERNANDEZ, 2006, p 317-318). Outro ponto
importante está no aprendizado tecnológico. O caminho que vai da acumulação de
competências técnicas, por meio de processos desse processo, até a mudança tecnológica
bem-sucedida é bastante sinuoso. O aprendizado pode dar-se pelo fazer, pela adaptação, pela
pesquisa, pela interação, entre outros. Adicionalmente, a mudança tecnológica não é produto
da ação isolada de um determinado agente, mas sim o resultado de uma complexa rede
envolvendo firmas, universidades, agências de governo e instituições financeiras.
O uso do termo paradigma por economistas parte de uma analogia feita do
paradigma na filosofia da ciência de Kuhn. O paradigma científico representa uma estrutura
institucionalizada de conhecimentos que coloca os problemas a serem resolvidos e o método
para enfrentá-los. Analogamente, o paradigma tecnológico inclui uma série de escolhas
(trade-offs) técnicas e econômicas, que serão feitas pelas empresas de acordo com as
características do setor e do ambiente institucional onde elas se situam.
Já a trajetória tecnológica é a direção tomada pelo desenvolvimento
tecnológico uma vez que as firmas escolheram determinadas tecnologias visando a obtenção
de lucros. Assim, o conceito de paradigma tecnológico foi desenvolvido para entender a
geração e a adoção de inovações, diferente do conceito de trajetória tecnológica que se refere
muito mais à difusão de inovações.
Para que uma nova tecnologia se difunda, esta deve promover benefícios
econômicos, seja na redução de custos, melhoria nas características técnicas de muitos bens e
serviços, aplicáveis em diversos setores.
O processo de difusão depende de uma corrente de melhoramentos nas
características de rendimento de uma inovação, sua modificação e adaptação progressiva para
acomodar-se às necessidades especializadas de distantes submercados e da disponibilidade e
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introdução de outras inovações complementares que afetam de forma decisiva a atratividade
econômica da inovação original. Adicionalmente, o usuário da tecnologia tem grande
importância na sua evolução. As faculdades de aprender usando (learning-by-using) em
complemento ao aprender fazendo (learning-by-doing) influenciam nas diversas inovações
incrementais do produto.
Quanto mais “pública” e fácil a aprendizagem, maior a taxa de difusão. No
mesmo sentido, o aprendizado dos consumidores tem papel primordial para a difusão da
tecnologia, concluindo-se que uma tecnologia que facilite a interação do usuário, learning-byusing, terá maiores chances de sobrevivência. Podemos concluir que a tecnologia, para tornarse padrão, precisa ser amigável para o usuário final e para seu fornecedor, precisa ter uma
complementaridade com tecnologias e serviços já existentes e uma baixa curva de
aprendizado. Notadamente, a difusão tecnológica ao gerir mudanças diretamente na
distribuição e produção, pode criar problemas para firmas com modelos de negócios já
estabilizados e "antigos", caso a trajetória tecnológica facilite a obtenção de bens e serviços
antes comercializados por outras vias tecnológicas anteriores (como na indústria fonográfica
com o advento de avanços na troca de arquivos, banda larga e a criação do formato mp3).
A empresa quando decide pelo seu programa de P&D leva em consideração,
entre outros fatores, as tendências futuras quanto ao sucesso das alternativas tecnológicas, a
maior parte delas definidas pelo paradigma tecnológico, que apresenta um conjunto de
oportunidades para inovação. O progresso técnico é um processo cumulativo. As decisões
passadas em relação ao seu desenvolvimento tecnológico definem um conjunto específico de
conhecimentos que a empresa detém no presente e do seu paradigma tecnoeconômico.
3. Estudo de caso: Ipod, Iphone e mudança cultural dos consumidores como exemplo de
imprevisibilidade no mercado de tecnologia.
A empresa americana Apple promove um ambiente organizacional favorável
para a leitura do ambiente econômico, da organização e dos mercados. Suas opções
tecnológicas têm peculiar diferença para com os seus concorrentes. As diferenças internas,
tecnológicas e gerenciais com seus concorrentes criam possibilidades de destaque na criação
de produtos, com diferenciais que atraem o típico consumidor de produtos de alta tecnologia.
Toda a publicidade da Apple está voltada a destacar e destoar a empresa dos seus
concorrentes, focando nessa política de produtos e criação.
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Como salientado anteriormente, as decisões para solução de problemas
tecnológicos e tecnoeconômicos seguem a analogia da ciência normal de Kuhn. Este último,
como dito anteriormente, se caracteriza por uma estrutura institucionalizada de conhecimentos
que coloca os problemas a serem resolvidos e o método para enfrentá-los. Ou seja, o mercado
de tecnologia tende a repetir soluções para problemas encontrados recorrentemente. Essa
repetição cria o paradigma tecnológico e conseqüentemente o paradigma tecnoeconômico.
Esta tendência do pensamento para a “trilha habitual” na solução de problemas
no setor tecnológico cria grandes possibilidades de ganhos para agentes que busquem
maneiras diferentes para solucionar os mesmos problemas. Este novo caminho, caso torne-se
padrão e difunda-se por trazer benefícios econômicos, trará lucros ao agente inovador. As
decisões da Apple tentam aprimorar conceitos e produtos já existentes no mercado, seja com a
adição de softwares mais avançados e amigáveis ao usuário ou hardwares mais potentes, mas
notadamente esta é a maneira em que todos os concorrentes solucionam problemas no seu
mercado.
No entanto, além das decisões dentro da trajetória tecnológica de
computadores e gadgets, a firma em questão busca criar soluções fora do paradigma
tecnológico. Essa estratégia cria saltos tecnológicos facilmente perceptíveis, após seu
lançamento, nos produtos ofertados, se comparados com os produtos de seus concorrentes.
Adicionalmente, para efetivamente criar tais produtos, ela possui uma política interna
diferente das demais, utilizando a capacidade dos seus funcionários de forma mais eficiente
ao criar um ambiente que promove e premia o desenvolvimento de inovações. O modelo de
criação que ela utiliza, a engenharia concomitante, define-se pelo conhecimento dos
funcionários do setor de P&D das diversas etapas de produção do produto, desde seus
materiais, hardware e software.
Seguindo a estratégia da empresa de entrar no mercado de aparelhos portáteis,
em abril de 2007 a Apple anunciou o Iphone. O aparelho busca juntar várias funções e tornar
mais fácil e simplificado a navegação nos celulares. A principal inovação é a nova interface
do usuário que possibilita uma expansão nas funcionalidades de um celular. A retirada dos
botões é uma quebra nos paradigmas de design de celulares, destacando o produto da
trajetória tecnológica anterior. A mudança não é apenas “cosmética”, pois amplia
drasticamente as possibilidades de atualização do software do aparelho, aumentando
consideravelmente o apelo ao consumidor. Da mesma forma, a inovação possibilita maior
mobilidade para modificar ou apresentar novas idéias para todos os proprietários, mantendo
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contato permanente com o consumidor do produto. O não uso de botões amplia as
capacidades de programação e utilidades potenciais do produto.
Um fator importante para o sucesso dos seus produtos está na sinergia do
produto com um recente fenômeno que tem atingido a indústria audiovisual, advindo de uma
mudança de comportamento dos consumidores, a propensão a piratear. A pirataria disseminou
grandes bibliotecas musicais, e mais recentemente filmes, nas mais diversas camadas de
consumidores. No entanto, até o lançamento do Ipod, não havia nenhuma maneira prática de
ouvir as musicas e ver filmes que eram adquiridos ilegalmente. Dessa forma, consumidores
insatisfeitos com os preços de CDs, ou até mesmo com a tecnologia desse modelo,
começaram a ter opções claramente mais vantajosas com o lançamento do Ipod e Iphone.
Segundo o relatório sobre pirataria da MPAA (Motion Picture Association of
America), a indústria mundial audiovisual, incluindo produtores americanos e estrangeiros,
distribuidores, cinemas, locadoras e pay-per-view, perdeu US$ 18,2 bilhões para a pirataria
em 2005. Este valor inclui a pirataria digital via internet, bem como a cópia física de CDs e a
sua distribuição e comercialização ilegal.
A análise econômica e da trajetória tecnológica dessa conjuntura indica que o
modelo de negócios das gravadoras está ultrapassado. A possibilidade de distribuição digital,
mesmo por canais legais, cria um ganho econômico expressivo ao tirar o aspecto físico
atrelado à venda e distribuição de CDs. Para o consumidor, há apenas facilitadores nesse novo
modelo, especialmente com o lançamento de produtos como o Iphone e similares. Apesar de a
plataforma de CDs ainda apresentar relevância, devido à toda cadeia econômica criada por
essa tecnologia durante décadas, tendo empresas dependentes e condicionadas pelas escolhas
tecnológicas passadas que fizeram, sua demanda deve decair com o aumento do consumo de
mp3 players, disseminação da pirataria e avanços tecnológicos. Devido à natureza da pirataria
virtual, as leis de países desenvolvidos e subdesenvolvidos não chegam a versar sobre o
assunto. A troca de arquivos acontece de computador pessoal para computador pessoal (peerto-peer), não sendo possível o registro eficiente de quais arquivos e de quem esta baixando.
Estes sites não possuem os arquivos ilegais, pois estes estão nos computadores pessoais de
milhares de pessoas. Desse modo, eles possuem imunidade legal, porque apesar de
direcionarem para conteúdos ilegais, eles não os possuem.
Analogamente, caso fosse vencida alguma ação contra estes sites, o mesmo
poderia ser aplicado à ferramenta difundida de procura chamada Google, por direcionar aos
próprios sites de pirataria, pornografia infantil, entre outros. A Apple foi uma das primeiras
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empresas a disponibilizar música online legalmente, tornando-se um veículo para gravadoras
disponibilizarem seu material. A firma encontrou um valor individual para cada música em
que o consumidor prefere comprar ao invés de adquirir ilegalmente.
Os problemas encontrados pelas gravadoras atualmente são sinais da
obsolescência do mercado de CDs. O rápido crescimento da venda de álbuns digitais e a
venda de mp3 players indicam que há uma mudança de paradigma no mercado musical,
principalmente na forma de distribuição das músicas. No período entre 1997 e 2007, verificase queda na venda física de CDs em 7 anos (RIAA, 2007).. De modo inverso, a venda de
álbuns e singles digitais cresceram desde 2004, quando começou a se registrar os valores.
4. Predição das condições inicias ao invés de uma instância particular
Podemos agora compreender como seria a previsão de economistas que
estudem o mercado fono e cinematográfico. Eles conseguiriam antecipar os movimentos
descritos anteriormente e todas as particularidades da mudança de paradigma tecnoeconomico
do setor, especificando quais aparelhos, tecnologias e modelos de negócios que se
apresentariam nesse mercado, antes do fato? A resposta parece evidente: a predição específica
não parece ser uma possibilidade em um setor complexo e dinâmico, no qual a parte de sua
própria natureza é a imprevisibilidade. As características do mercado de tecnologia garantem
incerteza devido às inovações serem um salto no desconhecido.
O reconhecimento dessa característica inerentemente impede previsões
específicas, mas compreender os estados dos agentes econômicos que proporcionaram tal
salto é a proposta da dessa vertente da teoria econômica, influenciada por economistas
heterodoxos como Schumpeter e Friedrich Hayek.
Dessa forma, economistas poderiam ser capazes de especificar as condições
iniciais em que certos comportamentos econômicos ocorreriam, como descrita na concepção
evolucionária da mudança tecnológica e dos paradigmas, ao invés de prever uma instância
particular do fenômeno, como no mercado de tecnologia. A teoria apresentada sobre a gestão
interna da firma, trajetória tecnológica e paradigmas tecnoeconômicos busca mostrar em qual
condição inicial fomenta-se a inovação tecnológica e qual deve ser o posicionamento de uma
firma para se beneficiar desse processo. O estudo de caso da indústria de aparelhos portáteis,
tendo a Apple como exemplo de agente inovador, demonstra como as condições iniciais para
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o fenômeno podem ser especificadas e ao mesmo tempo como seria uma tarefa equivocada
tentar antecipar qual desenvolvimento tecnológico irá ocorrer.
Nesse contexto, a teoria econômica que almejasse previsões específicas e
pontuais no mercado de tecnologia seria pseudociêntífica na concepção de Kuhn da diência,
porque a previsão e antecipação de eventos seria inevitavelmente equivocada e não produtiva,
ignorando a instabilidade do objeto de estudo. Mas a função explicativa ainda seria possível e
sua utilidade, na previsão das condições iniciais para certo comportamento, não seria inválida.
A diferença essencial entre economia e ciências naturais majoritariamente estaria no tipo de
predição e no tipo de respostas que a pesquisa econômica seria capaz de oferecer.
O papel da tecnologia e seu poder de alterar previsões específicas de
economistas não deveria ser ignorado. As previsões do economista do século XVIII, Thomas
Malthus, para recuperarmos um equívoco interessante, serve como exemplo. Considerado o
pai de demografia, ele postulou que o crescimento populacional teria uma progressão
geométrica, enquanto o crescimento da produção de alimentos teria uma progressão
aritmética. No entanto, ele não conseguiu antever a revolução na agricultura com as novas
técnicas de plantio e a adição constante de tecnologia. Hoje temos o problema inverso em
ambas as afirmações: o crescimento populacional tende à uma estabilidade na maioria dos
países desenvolvidos e nossa produção agrícola excede nossa demanda devido às inovações
tecnológicas.
5. BIBLIOGRAFIA
KUHN, Thomas S. 2006. O caminho desde a estrutura. São Paulo; Editora UNESP.
MASTERMAN, Margaret, 1970. “The Nature of a Paradigm.” lakatos and Musgrave, 1970,
pp.59-89.
PESSALI, H. F. ; FERNÁNDEZ, Ramón García . Inovação e teorias da firma. In: Victor
Pelaez; Tamas Szmerecsányi. (Org.). Economia da Inovação Tecnológica. São Paulo:
Hucitec, 2006, v. , p. 302-332.
RIAA, disponível em: <http://www.riaa.com/> acessado em: janeiro de 2011.
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