UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SHEILA CRISTINA RIBEIRO REGO IMAGENS FIXAS NO ENSINO DE FÍSICA: suas relações com o texto verbal em materiais didáticos e padrões de leitura de licenciandos RIO DE JANEIRO 2011 Sheila Cristina Ribeiro Rego IMAGENS FIXAS NO ENSINO DE FÍSICA: suas relações com o texto verbal em materiais didáticos e padrões de leitura de licenciandos Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia Educacional para Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de Doutora em Educação em Ciências e Saúde. Orientadora: Profa. Dra. Guaracira Gouvêa de Sousa Rio de Janeiro 2011 R343 Rego, Sheila Cristina Ribeiro Imagens fixas no ensino de Física: suas relações com o texto verbal em materiais didáticos e padrões de leitura de licenciandos / Sheila Cristina Ribeiro Rego. – 2011. 143 f. : il. (algumas color.) Tese (doutorado em Educação em Ciências e Saúde) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Núcleo de Tecnologia Educacional para Saúde, 2011. “Orientadora: Profª. Drª. Guaracira Gouvêa de Sousa”. 1. Livros didáticos – Ilustrações – Análise. 2. Material didático – Análise. 3. Imagens, ilustrações, etc – Pesquisa. 4. Interpretação de imagens. 5. Professores de física – Livros e leitura. I. Sousa, Guaracira Gouvêa de (orient.). II.Título. CDD 371.022 Sheila Cristina Ribeiro Rego IMAGENS FIXAS NO ENSINO DE FÍSICA: suas relações com o texto verbal em materiais didáticos e padrões de leitura de licenciandos Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do Título de Doutor em Educação em Ciências e Saúde. Aprovado em 28 de junho de 2011. ______________________________________________________ Profa. Dra. Guaracira Gouvêa de Sousa - UFRJ ______________________________________________________ Prof. Dr. Henrique César da Silva - UFSC ______________________________________________________ Profa. Dra. Carmen Irene Correia de Oliveira - UNIRIO ______________________________________________________ Profa. Dra. Deise Miranda Vianna - UFRJ ______________________________________________________ Profa. Dra. Isabel Gomes Rodrigues Martins – UFRJ Ao meu Pai AGRADECIMENTOS A vida é assim: a gente escolhe um caminho na esperança de que ele vá nos conduzir a um lugar de alegria. Tolos, pensamos que a alegria está ao final do caminho. E caminhamos distraídos, sem prestar atenção. Afinal de contas, caminho é só caminho, passagem não é o ponto de chegada. Com frequência, a gente não chega lá, porque morre antes. Mas há uns poucos que chegam ao lugar sonhado – só para descobrir que a alegria não mora lá. Caminharam sem compreender que a alegria não se encontra ao final, mas às margens do caminho. Não foi isso que disse Riobaldo? “O real não está na saída nem na chegada; ele se dispõe para a gente é no meio da travessia”. (Rubem Alves, Variações sobre o prazer, 2011) Oi, meu nome é Sheila. Para eu chegar neste momento, se passaram vários anos. Mas, de doutorado mesmo, foram, até agora, 4 anos e 3 meses. E durante esse período, muita coisa aconteceu, muita coisa mudou, principalmente, dentro de mim. Para olhar o que passou, fecho os olhos, como se procurasse dentro de mim as lembranças dos momentos, das pessoas, das coisas que vi, ouvi, senti, compartilhei... O mais importante não é este momento, em que estou prestes a entregar a versão final da minha tese para a defesa, mas tudo que vivi durante o caminho para chegar até aqui. Pessoas saíram da minha vida, outras entraram; algumas percorreram comigo a trajetória até certo ponto, outras continuam andando do meu lado. A maioria não tem a menor ideia da importância que tiveram na formação de quem sou hoje. Mas elas fazem parte dessa história. A palavra que simboliza melhor o que sinto agora é: gratidão. Sou grata, primeiramente, a Deus por me conduzir durante todo esse caminho; por abrir meus olhos, meus ouvidos; pelas mensagens que Ele foi enviando durante a passagem através das pessoas, do mar, das gaivotas, da lua cheia, das esculturas de pedra, das cataratas de Foz do Iguaçu, das músicas, dos textos, das danças, do amanhecer, do anoitecer... Agradeço a Ele por ter me conduzido a uma orientadora que me ajudou muito nessa caminhada, que me compreendeu quando eu sentia que não daria conta do trabalho, que me incentivou a continuar, que me introduziu nesse mundo da imagem. Guaracira, obrigada pelo apoio! Agradeço pelos colegas do NUTES: professores, estudantes e funcionários, que compartilharam comigo das etapas de amadurecimento dessa pesquisa. Agradeço pela minha companheira de orientação, Lucia Pralon, que me acompanhou em meus primeiros contatos com a imagem, e pela professora Isabel Martins, que me ouviu e me aconselhou a continuar a caminhar. Agradeço pelos professores da banca, Henrique, Carmen, Deise, Isabel, Luiz e Leila que se disponibilizaram a contribuir com esse trabalho. Agradeço pelos meus amigos do CEFET/RJ de Nova Iguaçu, principalmente, ao Marcelo e ao Laercio, por terem me escutado nos momentos de desânimo e, também, das conquistas. Agradeço pelos meus alunos que conviveram comigo nesse período; pelos que se transformaram em amigos e que, torcendo por mim, me cobravam o término desse doutorado (não é, Lina?) Agradeço pela professora Marta Máximo do CEFET/RJ de Nova iguaçu por ter me possibilitado acesso a sua turma de 3º ano de Telecomunicações do Ensino Médio de 2010 para fazer o pré-teste da oficina com seus alunos. Agradeço à disponibilidade dos estudantes dessa turma em participar com tanta atenção às perguntas e imagens. Agradeço aos professores Susana de Souza Barros e João José Fernandes de Souza, do Instituto de Física da UFRJ, e à diretora Ana Maria Ferraz Bastos, do Polo de Campo Grande do CEDERJ, por me autorizarem a aplicar a oficina com seus estudantes, por facilitarem meu acesso a eles e me concederem todo o apoio material que eu necessitava para realizar a oficina. Agradeço pela professora Maria Antonieta Teixeira de Almeida por me conceder o material de análise do curso semipresencial. Como agradeço, também, pelos estudantes que aceitaram participar da pesquisa. Agradeço pela minha família (minha mãe, meus irmãos, cunhadas e sobrinhos), que tem um papel fundamental em quem sou hoje e no caminho que tenho percorrido e que, nesse período, também passou por mudanças profundas comigo. Agradeço pela minha família de fé, em especial ao FC (grupo Faculdade e Carreira) por compartilharem das minhas dificuldades e vitórias, por orarem comigo e por mim, por seu carinho que me ajudou a continuar a caminhar. Andrew, obrigada pelos livros de linguística. Agradeço pelo Pr. Abrahão, meu “paistor” que é uma pessoa importante na construção de quem sou hoje, que me apresentou ao Acampamento Caminhos da Vida, cuja equipe me ajudou a me conhecer melhor e a não ter medo de mostrar quem eu sou. Agradeço pela Teresa, minha terapeuta, minha amiga, que me ajudou e continua me ajudando a “ver melhor”. Agradeço pela vida da Luciana, Gleice, Chezza e Maria que têm a capacidade de me escutar em momentos que nem eu sei me explicar. Agradeço pelos amigos que conheci no II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia (II SINECT – Ponta Grossa/PR): valeu, galera do Hotel Pax! Agradeço pelos autores que entraram na minha vida para me ensinar mais do que conceitos acadêmicos: como Bakhtin, Roland Barthes, C. S. Lewis, Rubem Alves, Brennan Manning, Max Lucado, Clarice Lispector, Thomas Kuhn, Alberto Manguel, Bachelard, Leandro Konder, Karl Erik Schøllhammer, João da Cruz, entre outros. Obrigada, Pai, por tudo que você tem feito por mim e em mim! E como esse trabalho fala de palavras e imagens, represento, a seguir, de forma imagética, algumas dessas pessoas tão importantes nesse caminho. Equipe Acampamento Caminhos da Vida Turma de Doutorado (alunos e professores) Grupo Faculdade e Carreira Hotel Pax Futebol Club Mãe, irmãos e sobrinha Eu e Luciana (amiga-irmã) RESUMO REGO, Sheila Cristina Ribeiro. Imagens fixas no ensino de Física: suas relações com o texto verbal em materiais didáticos e padrões de leitura de licenciandos. Rio de Janeiro, 2011. Tese (Doutorado em Educação em Ciências e Saúde) – Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011. Recentemente, pesquisas têm se preocupado com o uso e a leitura da linguagem imagética, seja abordando a imagem como objeto de estudo ou utilizando-a na tentativa de compreender outras questões. O presente trabalho parte do princípio de que existe a necessidade de uma alfabetização para a leitura da imagem, principalmente da imagem utilizada no ensino de Ciências. Como nos restringimos às representações visuais, focalizamos nosso trabalho no campo de estudos da semiótica. Pretendeu-se, através deste estudo: (a) compreender algumas características semióticas de imagens contidas em materiais didáticos e suas relações com o texto escrito; e (b) investigar padrões de leitura de imagens realizadas por estudantes de licenciatura em Física. Limitamos nossa abordagem às imagens fixas por serem, historicamente, as primeiras a surgirem e por continuarem fortemente presentes nas atividades de ensino. Buscando atingir o primeiro objetivo, estudamos materiais impressos utilizados no 1° período do curso de Licenciatura em Física oferecido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) nas modalidades presencial e semipresencial. Realizamos oficinas com estudantes do 1º, 2° e 3º períodos procurando entender alguns aspectos das leituras de imagens provenientes de diversas áreas do conhecimento (artes, propaganda, jornalismo e Física). Os aspectos das imagens examinados no material didático foram: as formas de produção das imagens, sua composição, seus níveis de iconicidade e as relações estabelecidas entre o texto verbal e a imagem (denotação/conotação), considerandose o texto dentro da imagem, o texto que faz referência a ela e sua legenda. Em relação às leituras realizadas pelos estudantes, investigamos a relação do texto escrito produzido por eles com a imagem (identificação, interpretação e relais), a utilização de termos da Física na leitura, a relação construída por eles entre as realidades concreta e pensada e de que modo eles transitam entre imagens de diferentes níveis de iconicidade. A análise do material didático indicou a presença marcante dos desenhos, dos esquemas de Física e da função de interpretação da imagem por meio da mensagem verbal em ambos os materiais, o que sugere uma relação forte com os modelos da ciência. No que se refere ao nível de iconicidade, no material do curso semipresencial houve a preponderância das imagens abstratas, enquanto no material do curso presencial, verificamos uma frequência equilibrada entre as imagens concretas e abstratas, fazendo-nos pensar que no último houve uma preocupação maior em aproximar a realidade pensada da concreta. Nas discussões dos artigos analisados sobre a imagem no ensino da Física, nos manuais didáticos examinados e nas leituras dos estudantes, percebemos dificuldades em tratar os conhecimentos da Física como originados de um processo de modelização da realidade concreta, de modo a admitir que a Física não explica essa realidade como ela é, mas que simplifica essa realidade para compreendê-la. Tentar utilizar argumentos pautados em situações concretas do cotidiano para validar os modelos da Física (a realidade pensada), não parece ser epistemologicamente consistente, mesmo porque, até os experimentos realizados em laboratório partem de uma modelização: algumas variáveis são controladas para simplificar elementos da realidade concreta. Palavras-chave: imagem, Física, material didático, leitura, licenciandos ABSTRACT REGO, Sheila Cristina Ribeiro. Still images in Physics teaching: its relations with the verbal text in textbooks and reading patterns of undergraduates. Rio de Janeiro, 2011.Thesis (Ph.D. in Science Education and Health) - Educational Technology Center for Health, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011. More recently, research has been concerned with the use of imagery language and reading, whether it be addressing the image as object of study or using it in an attempt to understand other issues. This paper assumes that there is a need for literacy to read the image, especially the image used in Science teaching. As we restrict ourselves to visual representations, we focus our work in the field of semiotic studies. It was intended, through this study: (a) to understand some features of semiotic images contained in teaching materials and their relationship with the written text, and (b ) investigate patterns of image reading performed by undergraduate students in Physics. We limit our approach to images because they are historically the first to arise and remain strongly present in teaching. Seeking to achieve the first objective, we studied printed materials used in the 1st period of the Degree in Physics offered by the Federal University of Rio de Janeiro (UFRJ), of the face and blended modalities. We conducted workshops with students of 1st, 2nd and 3rd periods, trying to understand some aspects of the readings of images from different areas of knowledge (arts, advertising, journalism and physics). The features of the images in the teaching materials were examined: how to produce the images, their composition, their levels of iconicity and the relationships between verbal text and image (denotation / connotation), considering the text within the image, the text that makes reference to it and its caption. In relation to the readings performed by students, we investigated the relationship between the written text produced by them and the image (identification, interpretation and relay), the use of physics in terms of reading, the relationship built by them between the concrete realities and thought and how they move between images of different levels of iconicity. The analysis of the teaching material indicated the strong presence of drawings, diagrams of Physics and function of image interpretation through verbal message in both materials, suggesting a strong relationship with the models of science. With regard to the level of iconicity, in the blended course material there was preponderance of abstract images , while in the actual course material, we found a balance between the often abstract and concrete images, making us think that the last was a major concern to bring the reality of concrete thought. In discussions of the articles analyzed on the image in Physics teaching, in the textbooks examined in the students’ readings, we realized the difficulties in dealing with the knowledge of Physics as something originated from a modeling of reality process, assuming that Physics can not explain this reality as it is, but it simplifies the reality to understand it. Trying to use arguments based on concrete situations of everyday life to validate the models of physics (reality thought), does not seems to be epistemologically consistent, because, even laboratory experiments are based on a modeling: some variables are controlled to simplify aspects of concrete reality. Keywords: image, Physics, textbooks, reading, undergraduates. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: Funcionamento de um refrigerador Figura 2: Partitura da Sinfonia em Mi Bemol Maior composta por Mozart Figura 3: Signo com expressão derivativa Figura 4: Níveis de iconicidade decrescente Figura 5: Níveis de abstração decrescente Figura 6: Denotação e Conotação Figura 7: Função da mensagem linguística Figura 8: Contradição entre texto e imagem Figura 9: Mensagem linguística (fixação e relais) Figura 10: Reconhecimento e compreensão Figura 11: Ultrassonografia – vácuo semiótico Figura 12: O desenho em perspectiva Figura 13: A técnica da "visão transparente" Figura 14: Representações na anatomia humana Figura 15: Desenhos da Engenharia e Cirurgia Figura 16: Imagens que podem representar diferentes realidades Figura 17: Real concreto e real pensado Figura 18: Imagens recorrentes no ensino de Física Figura 19: Imagem não analisada Figura 20: Exemplo de imagem com erro Figura 21: Imagem incompreensível Figura 22: Formas de produção das imagens Figura 23: Imagens com diferentes formas de produção Figura 24: Composição das imagens Figura 25: Imagens com diferentes elementos em sua constituição Figura 26: Iconicidade das imagens Figura 27: Imagens com diferentes níveis de iconicidade Figura 28: Relação texto-imagem Figura 29: Relação texto-imagem na imagem Figura 30: Relação texto-imagem na legenda Figura 31: Relação texto-imagem no texto de referência Figura 32: Questões apresentadas aos estudantes (questões 1 a 7) Figura 33: Questões apresentadas aos estudantes (questões 8 e 9) Figura 34: Questões apresentadas aos estudantes (Questão 10) Figura 35: Questões apresentadas aos estudantes (Questão 11) Figura 36: Relação texto-imagem Figura 37: Resposta de L8 à Questão 1 Figura 38: Análise da Questão 10 20 30 30 33 35 37 39 39 40 42 45 49 50 51 52 53 55 62 96 97 97 98 99 100 100 101 102 103 104 105 105 111 112 113 114 115 116 124 LISTA DE QUADROS Quadro 1: “Tecnologias” de produção e recepção de imagens Quadro 2: Classificação dos signos segundo Shaff (1968) Quadro 3: Iconicidade x abstração das imagens Quadro 4: Natureza da imagem, suporte e mídia Quadro 5: Instrumentos de coleta de dados Quadro 6: Grade curricular do curso presencial Quadro 7: Grade curricular do curso semipresencial Quadro 8: Sumários dos módulos de Introdução às Ciências Físicas 1 Quadro 9: Sumário das Unidades 1 e 3 do Projeto Física Quadro 10: Sumário do Módulo 3 – As medidas experimentais e as observações terrestres Quadro 11: Quantidade de imagens encontradas no Material A Quadro 12: Sumário da Unidade 1 – Conceitos de Movimento Quadro 13: Quantidade de imagens encontradas no Material B Quadro 14: Composição da imagem Quadro 15: Respostas dos estudantes 17 29 33-34 66 67 78 81 82 88 89-90 91 92 93 94-95 115 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 1.1 QUESTÕES DE PESQUISA 1.2 INSTRUMENTOS DE COLETAS DE DADOS 1.3 METODOLOGIA 1.3.1 Análise do material didático 1.3.2 Oficina de leitura 1.4 CATEGORIAS DE ANÁLISE 1.4.1 Material didático 1.4.2 Leituras dos estudantes 1.5 OBJETIVOS DOS PRÓXIMOS CAPÍTULOS 1.5.1 Capítulo 2: Aspectos semióticos da imagem 1.5.2 Capítulo 3: Imagem e ciências naturais 1.5.3 Capítulo 4: Os cursos, os materiais e as leituras dos estudantes 1.5.4 Capítulo 5: Considerações 16 23 23 23 24 24 25 25 25 26 26 26 26 27 2 ASPECTOS SEMIÓTICOS DA IMAGEM 2.1 A IMAGEM COMO SIGNO 2.1.1 Arbitrariedade 2.1.2 Linearidade 2.1.3 Denotação e conotação 2.2 RELAÇÃO TEXTO-IMAGEM 2.3 LEITURA DE IMAGEM 28 29 31 36 36 38 41 3 IMAGEM E CIÊNCIAS NATURAIS 3.1 A CIÊNCIA NO RENASCIMENTO 3.1.1 A invenção da imprensa 3.1.2 O método do desenho em perspectiva 3.1.3 A concepção do real 3.2 A REPRESENTAÇÃO DA REALIDE 3.3 IMAGEM DA CIÊNCIA NA FORMAÇÃO SUPERIOR 3.4 PESQUISAS SOBRE IMAGEM NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS 3.5 IMAGENS EM PESQUISAS NO ENSINO DE FÍSICA 3.5.1 Imagens em livros didáticos 3.5.2 Considerações 48 48 48 49 52 52 58 63 69 71 73 4 OS CURSOS, OS MATERIAIS E AS LEITURAS DOS ESTUDANTES 4.1 DESCRIÇÃO DOS CURSOS DE LICENCIATURA EM FÍSICA DA UFRJ 4.1.1 O curso presencial 4.1.2 O curso semipresencial 4.1.3 As disciplinas introdutórias à Física 4.1.3.1 Introdução às Ciências Físicas 1 (ICF1) 4.1.3.2 Introdução à Física 4.2 O MATERIAL DIDÁTICO 4.2.1 O material de Introdução às Ciências Físicas 1 (Material A) 4.2.2 O material de Introdução à Física (Material B) 4.2.3 Categorias de análise 4.2.3.1 Forma de produção 4.2.3.2 Composição das imagens 76 76 77 79 81 82 86 89 89 91 93 93 93 4.2.3.3 Nível de iconicidade 4.2.3.4 Denotação e conotação 4.2.4 Resultados da análise 4.2.4.1 Formas de produção das imagens 4.2.4.2 Composição das imagens 4.2.4.3 Nível de iconicidade das imagens 4.2.4.4 Denotação e conotação 4.2.4.4.1 Relação texto-imagem na mensagem verbal inserida na imagem 4.2.4.4.2 Relação texto-imagem na legenda 4.2.4.4.3 Relação texto-imagem no texto de referência 4.2.5 Algumas considerações sobre a análise do material didático 4.3 PADRÕES DE LEITURA DOS ESTUDANTES 4.3.1 Discussão dos resultados 4.3.1.1 Questão 1 4.3.1.2 Questão 2 4.3.1.3 Questão 3 4.3.1.4 Questão 4 4.3.1.5 Questão 5 4.3.1.6 Questão 6 4.3.1.7 Questão 7 4.3.1.8 Questão 10 4.3.1.9 Questão 11 95 95 96 98 99 101 102 104 104 105 106 109 115 116 117 118 119 120 121 122 124 126 5 CONSIDERAÇÕES 129 REFERÊNCIAS 134 ANEXO 139 16 Qualquer que seja o caso, as imagens, assim como as palavras, são a matéria de que somos feitos. Alberto Manguel 1 INTRODUÇÃO A linguagem vem sendo amplamente estudada em diversas áreas, tais como: Filosofia, Psicologia, Linguística, Comunicação, Cultura, Educação etc. Mais recentemente, pesquisas têm se preocupado com a produção e a leitura da linguagem imagética, seja abordando a imagem como objeto de estudo ou utilizando-a na tentativa de compreender outras questões, dentre elas a cultura (MACEDO, 2004), a produção de textos narrativos (TEIXEIRA; COMPIANI; NEWERLA, 2006) e o desenvolvimento de estratégias pedagógicas (COSTA et al, 2006, 2007). Em levantamento realizado em 77 periódicos classificados como da área da Educação pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), encontramos 155 artigos que faziam referência em seus títulos à imagem visual fixa, publicados no período de 1998 a 2007, dos quais, aproximadamente, 70% foram publicados a partir de 2003. O processo de produção das imagens visuais passou por profundas modificações, desde as imagens registradas em rochas e pedras, às pinturas em telas, desenhos em papel, fotografias, cinema, televisão, vídeo até as desenvolvidas por meio de linguagem computacional. Hoje, convivemos com imagens fixas e em movimento criadas, armazenadas, reproduzidas e transmitidas por meio de diversos suportes. Toda forma de produção da imagem carrega uma maneira de recepção da mesma, ambas marcadas pela tecnologia utilizada que distinguem o agir do homem no mundo. Dubois (1999) discute algumas características das formas de representação da realidade na pintura, fotografia, cinema, televisão-vídeo e imagens informáticas, tendo em vista três questões: o maquinismo/humanismo, a semelhança/dessemelhança e a materialidade/imaterialidade. Essas características são resumidas no Quadro 1. A primeira diz respeito ao papel da máquina na relação entre o real representado na imagem e o sujeito. Na pintura, a máquina (por exemplo, a câmera escura) é utilizada para captar o real de modo a auxiliar a visão do sujeito que produzirá a imagem em um suporte que será marcado por aspectos de sua personalidade, de seu traço, de sua ação, não podendo ser reproduzidos de forma idêntica, pois fazem parte de um tempo e de um espaço já 17 delimitados. O papel da máquina será modificado com a fotografia: ela não se limita a captar, mas também registra a imagem em materiais fotossensíveis. A função do fotógrafo passa a ser o da escolha do que e como será registrado, mostrando o que era importante para ele naquele momento, qual sua visão de mundo. Maquinismo/ humanismo Semelhança/ Dessemelhança Captação do real Realismo subjetivo Imagem sensível Fotografia Inscrição do real Realismo objetivo Imagem afinada Cinema Visualização do real Realismo do tempo Televisão (vídeo) Transmissão do real Realismo da simultaneidade Imagem eletrônica Imagem informática Concepção do real Simulação da semelhança Imagem virtual “Tecnologia” Pintura escultura) (desenho, Materialidade/ imaterialidade Imagem impalpável Quadro 1: “Tecnologias” de produção e recepção de imagens Não há necessidade de um intermediário para a visualização de telas de pintura, desenhos no papel, esculturas e fotografias: em todas essas “tecnologias” podemos “possuir a imagem”. A recepção da imagem sofre uma transformação com o cinema, uma vez que são inseridas máquinas de projeção, sem as quais a visualização da imagem em movimento se tornaria impossível. O cinema não nos permite “tocar a imagem”. A televisão vem modificar a relação entre máquina e sujeito no que concerne à transmissão da imagem. Pessoas geograficamente afastadas podem observar, simultaneamente, os mesmos acontecimentos, em tempo real. Na imagem informática, a máquina transforma a concepção do real; ela dá origem ao real por meio de programas computacionais. O real não precisa mais ser reproduzido, ele pode ser produzido, no sentido de que a presença do objeto ou de um acontecimento a ser registrado não é indispensável para a confecção da imagem. Os níveis de iconicidade da imagem, isto é, sua analogia com a realidade representada, são abordados por Dubois (1999) na questão da semelhança/dessemelhança. A marca do artista na pintura carrega sua subjetividade, sua interpretação da realidade (realismo subjetivo). O peso dessa interpretação parece diminuir com a fotografia, uma vez que não é mais a mão do fotógrafo que inscreve a imagem. Embora possa se pensar que a fotografia ganhe em objetividade (realismo objetivo), o fotógrafo se faz valer de técnicas que orientam 18 o observador à leitura esperada por ele (BARTHES, 1990). O cinema vai além do realismo espacial, trazendo o realismo do tempo por meio da reprodução do movimento. Como a imagem é gravada, esse movimento pode ser repetido, revisto, invertido; é um tempo passado, que existiu e que podemos ver transcorrer. A imagem em tempo real transmitida pela televisão aproxima ainda mais o observador da realidade: é observada, senão no espaço em que ela é originada, no instante e no desenvolvimento de sua criação. Mesmo com a possibilidade de dar origem a figuras nunca vistas, conduzindo a uma nova concepção do que é real, a imagem informática, geralmente, tenta imitar a realidade, criando figuras mais próximas do que já é conhecido, simulando o que se pode visualizar. Na pintura, a materialidade da imagem é mais sensível: pode-se sentir o cheiro, o brilho, o relevo, a textura, o “corpo da imagem”. Em relação à pintura, a fotografia apresenta uma imagem mais afinada (DUBOIS, 1999); há uma perda da maioria das características “corporais” que diferenciam uma tela de outra; a ação das substâncias que possibilitam a inscrição da imagem no negativo é da mesma natureza, produzindo, ainda assim, imagens distintas. Apesar da presença material da imagem fixa no fotograma que dá existência à imagem em movimento do cinema, sua projeção torna a imagem final imaterial. Projetada numa tela, ela não pode ser tocada. Se a tela for deslocada ou manchada, a imagem continuará a mesma. A representação do movimento é produzida na mente do observador através da exposição de seus olhos a 24 imagens fixas por segundo. O movimento não está registrado em uma representação material, ele é formado mentalmente. O sinal que transmite as informações que se transformam em imagens televisivas é uma impulsão elétrica, sem realidade material. Diferente do cinema, que ainda tem o fotograma (ou filme-película) em que as imagens fixas podem ser tocadas, o sinal que gera a imagem na televisão é formado “por três entidades: os sinais cromáticos, luminosos e de sincronização. Em todo caso, esse sinal nunca é visível como imagem” (DUBOIS, 1999, p. 81). Na informática, mais uma vez, a imaterialidade da imagem, expressa por sua criação por meio de algoritmos, traz a busca pela aproximação da materialidade através, por exemplo, de “telas táteis”, “capacetes de visão” e “luvas de dados” que buscam dar a sensação de imagem “palpável”. Ao ser incorporada nas fotografias e filmes, a imagem digital modifica a 19 materialidade da imagem do cinema e da fotografia: não há mais a necessidade de registro da imagem num material fotossensível uma vez que a mesma é armazenada num dispositivo que a lê e a transmite em linguagem computacional. Conforme o homem desenvolve novas tecnologias, há uma tendência em tentar fazer uso delas em atividades de ensino. Não é novidade a utilização da imagem no ambiente escolar, e mais precisamente em materiais didáticos. Data de 1685 o primeiro livro didático em que as imagens possuem um papel fundamental na transmissão do conhecimento, o Orbis sensualium pictus (Mundo sensível ilustrado) de Comenius (COMENIUS, 1685 apud CHALMEL, 2004). Nele, a imagem era utilizada para substituir objetos que deveriam ser manipulados para um melhor aprendizado, mas que, por motivos diversos, não se encontravam disponíveis ao professor e aos alunos. A imagem era utilizada para ilustrar o texto verbal. Com o passar do tempo, houve uma inversão no papel do texto verbal e da imagem (BARTHES, 1990): o texto passou a direcionar a interpretação da imagem, conduzindo o leitor a sentidos preferenciais de leitura. Hoje, admite-se que, ambos, texto e imagem, exercem seu papel na leitura da mensagem que se quer transmitir, seja no entendimento de seu significado literal ou na compreensão de sentidos segundos para os quais o autor pretende dirigir o leitor. A tradicional complementaridade entre palavra e imagem é hoje percebida com base na distinção das respectivas qualidades e deficiências de um e de outro meio de expressão. Às vezes a imagem é designada para “ilustrar” a palavra, isto é, iluminar algo que se presume “obscuro” no sentido imanente da palavra. Em outros casos a palavra determina o sentido da imagem contra o poder sedutor da representação imediata. (SCHØLLHAMMER, 2007, p. 8) Nas últimas décadas, com a evolução das técnicas de impressão e reprodução, as representações visuais se tornaram efetivamente presentes nos livros didáticos. Atualmente, aproximadamente, 50% da superfície dos livros didáticos da educação básica são dedicados às ilustrações (JIMÉNEZ VALLADARES; PERALES PALACIOS, 2001), mostrando a necessidade e/ou importância atribuída à imagem no processo educacional. Nossa formação acadêmica e atuação profissional como professora de Física, levou nosso interesse pelas imagens à área de Educação em Ciências. As imagens fazem parte de atividades de ensino em Física, seja nos livros didáticos ou na utilização de ferramentas de ensino desde o quadro-negro ao computador. As imagens presentes em materiais didáticos para o ensino de Ciências apresentam 20 particularidades relacionadas à finalidade de estabelecer conceitos científicos que, geralmente, diferem dos que os estudantes adquirem de sua experiência cotidiana com os fenômenos e objetos ao redor (BACHELARD, 2005). Para isso, faz-se necessário trabalhar com imagens que possuem alto grau de abstração e, consequentemente, pouca semelhança com a realidade concreta conhecida por eles, mas que ajudem na construção de modelos que expliquem alguns aspectos da natureza, que possam ser generalizados a partir de simplificações de situações cotidianas. (A) (B) (C) Figura 1: Funcionamento de um refrigerador Fonte: YOUNG, Hugh D.; FREEDMAN, Roger A. Física II: Termodinâmica e ondas. 12ª edição. São Paulo: Pearson Addison Wesley, 2008. A Figura 1 indica alguns princípios envolvidos no funcionamento de um refrigerador. Na imagem (B), encontramos a disposição dos elementos principais para a compreensão do 21 processo de refrigeração (evaporador, válvula de expansão, condensador e compressor). O diagrama da imagem (A) representa o funcionamento do ciclo de refrigeração, ainda com a presença dos elementos da imagem (B) mostrando alguns de seus componentes internos. Em (C), os elementos são substituídos por um esquema que representa o fluxo de energia em um refrigerador. O fato de se tratar de um refrigerador está mais claro em (B), pois a imagem possui mais semelhança com a realidade concreta (ela é mais icônica). A imagem em (A) ganha em abstração em relação à imagem em (B). Ao mesmo tempo que ela perde em iconicidade, são incluídos conceitos utilizados para o entendimento de seu funcionamento, como frio, quente, baixa pressão, alta pressão e o sentido do ciclo, indicado pelas setas. O esquema em (C) se refere à generalização do fluxo de energia de um refrigerador que serve para explicar o funcionamento de qualquer aparelho que receba calor de uma fonte mais fria e ceda calor para uma fonte mais quente, por meio da realização de trabalho mecânico sobre um fluido. Algumas pesquisas desenvolvidas no âmbito da Educação em Ciências demonstram dificuldades relacionadas à produção e à leitura das imagens presentes em materiais didáticos de Física. Ao analisar livros didáticos, Otero, Moreira e Greca (2002) verificaram que sua produção parecia assumi-las como evidentes e transparentes, isto é, elas não necessitariam de interpretação para sua compreensão. Entretanto, Silva (2006) defende as imagens visuais como objetos simbólicos e, como tais, “produzidos histórico-socialmente como parte da cultura humana” (SILVA, 2006, p.72). Por não serem apresentadas as formas como os modelos são construídos nas imagens com alto grau de abstração, estas parecem transparentes, como se fossem a própria realidade e não sua representação relacionada a conceitos e ideias. Isso “dificulta e distorce a compreensão sobre a própria natureza do conhecimento científico” (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001 apud SILVA, 2006). Jiménez Valladares e Perales Palacios (2002a) examinaram exemplos de imagens presentes em livros didáticos de Física e Química, cuja utilização como argumento visual para convencer os leitores dos conceitos expostos, se apresentava de forma abusiva, ambígua ou errônea, tendo um efeito prejudicial ou nulo no aprendizado. Do estudo realizado por Souza, Rego e Gouvêa (2010), em consulta feita em 74 periódicos publicados entre 1998 e 2007, foram encontrados 13 artigos que abordavam a imagem no ensino de Física, e, destes, 9 pesquisavam a imagem no livro didático e 5 estavam relacionados ao uso da imagem no Ensino Superior. 22 Os que examinavam a imagem em livros didáticos destinados ao Ensino Superior somaram 4 artigos, dos quais 2 também se referiam ao seu uso no Ensino Médio. Três se situavam no campo de estudos da cognição e 1 no da didática. Um dos artigos (AGUILAR; MATURANO; NÚNEZ, 2007) utilizou imagens retiradas de livros didáticos para investigar concepções alternativas de estudantes dos cursos de Licenciatura em Astronomia e Geofísica acerca do movimento de projéteis próximos à superfície da Terra. Otero, Moreira e Greca (2002) analisaram como as imagens são usadas em 41 livros de Física (10 universitários) de acordo com categorias originadas da investigação dos livros examinados. Peduzzi (1999) expôs um conjunto de imagens, a maioria retiradas da Internet, e empregadas na complementação de um texto de Mecânica, tendo em vista seu potencial para o aprendizado. O único artigo (dos 13 mencionados anteriormente) que apresentou os professores como sujeitos da pesquisa, investigou quais eram suas ideias acerca das imagens utilizadas em materiais educativos (livros didáticos, vídeos, softwares, Internet). Seus resultados apontaram que “a problemática das imagens na educação em ciências, teria que ser incorporada tanto na formação dos futuros professores como na capacitação daqueles que se encontram em serviço” (FANARO; OTERO; GRECA, 2005, p. 19, tradução nossa)1. Tendo em vista a revisão bibliográfica realizada sobre o tema imagem, admitimos a necessidade de uma alfabetização para sua leitura, principalmente da imagem utilizada no ensino de Ciências. Nossa experiência profissional nos faz pensar nas dificuldades encontradas pelos estudantes na leitura dessas imagens, na importância das mesmas no ensino de Física e no papel do professor nesse processo de alfabetização. A verificação da escassez das pesquisas destinadas a esse assunto no ensino de Física no nível superior estimulou a realização do presente estudo que, ao reconhecer a importância do papel do professor no desenvolvimento da prática de leitura de imagens realizada pelos estudantes, buscou: (a) compreender algumas características semióticas de imagens presentes em materiais didáticos utilizados na formação de professores e suas relações com o texto escrito; e, (b) investigar padrões de leitura de imagens realizadas por estudantes de licenciatura em Física. Limitamo-nos a examinar as imagens fixas por serem, historicamente, as primeiras a surgirem e por continuarem fortemente presentes em atividades de ensino, sendo visualizadas por meio do quadro-negro, folhas de caderno, livros, revistas, jornais etc. 1 “la problemática de las imágenes en la educación en ciencias, tendría que incorporarse tanto en la formación de los futuros profesores como en la capacitación de aquellos que se encuentran en servicio.” (FANARO; OTERO; GRECA, 2005, p. 19) 23 Buscando atingir o primeiro objetivo, estudamos materiais impressos utilizados no 1° período do curso de Licenciatura em Física oferecido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), das disciplinas Introdução às Ciências Físicas I (ICF I) e Introdução à Física (IF), respectivamente, das modalidades semipresencial e presencial. Realizamos oficinas com estudantes do 1º, 2° e 3º períodos que estavam cursando ou já haviam cursado as disciplinas mencionadas acima, procurando entender alguns aspectos das leituras de imagens. Além disso, foram realizadas entrevistas não estruturadas com duas professoras das referidas disciplinas para compreendermos o contexto em que os materiais eram empregados (por que e de que forma eles eram utilizados pelos estudantes e professores das disciplinas). 1.1 QUESTÕES DE PESQUISA 1) Quais são as características composicionais das imagens presentes nos materiais didáticos analisados relacionadas a sua produção (“tecnologias” utilizadas, elementos constituintes das imagens)? 2) Quais são os aspectos da imagem como signo (nível de iconicidade, denotação e conotação)? 3) Qual é o papel do texto escrito em sua relação com as imagens (identificação, interpretação e relais)? 4) Quais são os padrões de leitura realizados pelos estudantes? 1.2 INSTRUMENTOS DE COLETAS DE DADOS Análise de material didático e oficinas com os estudantes. 1.3 METODOLOGIA Tanto as questões de pesquisa quanto as categorias utilizadas na análise do material didático e das respostas dos estudantes surgiram a partir de leituras realizadas durante o desenvolvimento deste estudo e da própria leitura do material analisado. As oficinas com os estudantes aconteceram após a análise do material didático. Para termos acesso aos estudantes, conversamos com professores do curso presencial e com a direção e tutores do Polo de Campo Grande do curso semipresencial. 24 Após a realização das oficinas, a partir de leituras feitas sobre a imagem nas ciências naturais (Capítulo 3), apareceram alguns pontos que não havíamos pensado em investigar, e que, por isso, não fizeram parte da análise do material didático nem da elaboração das oficinas, como: qual a imagem de ciência sugerida pelo material didático através de suas imagens e da relação entre o texto verbal e a imagem e se há e de que forma é feita a aproximação entre as realidades concreta e pensada pela ciência. Os detalhes sobre os procedimentos empregados no exame dos materiais didáticos e das leituras dos estudantes foram distribuídos no Capítulo 4. 1.3.1 Análise do material didático Para uma análise mais minuciosa das imagens presentes nos materiais didáticos e as relações texto/imagem estabelecidas neles, foram escolhidos do curso presencial, os capítulos 1 (A Linguagem do Movimento), 2 (Queda Livre – Galileu Descreve o Movimento), 3 (O Nascimento da Dinâmica – Newton Explica o Movimento) e 4 (A Compreensão do Movimento) e, do semipresencial, o Módulo 3 (As medidas experimentais e as observações terrestres) por tratarem do mesmo tema (Cinemática e Leis de Newton). Foram investigados: (a) as formas de produção das imagens; (b) sua composição; (c) seus níveis de iconicidade; e, (d) as relações estabelecidas entre o texto e a imagem (denotação/conotação), considerando-se o texto dentro da imagem, o texto que faz referência a ela e sua legenda. Denominamos o material do curso semipresencial de Material A, e de Material B, o do curso presencial. Os resultados foram apresentados para cada um dos materiais por dizerem respeito a objetos concretos diferentes. Como se referem à mesma área conceitual da Física, foi possível, após o exame do material, realizar algumas considerações sobre os dois. Entretanto, não tivemos como objetivo fazer qualquer comparação entre os cursos semipresencial e presencial, nem entre os materiais, de modo a qualificá-los como mais adequados ou não. 1.3.2 Oficina de leitura A finalidade das oficinas foi examinar alguns padrões de leitura de imagens efetuada pelos estudantes. Antes de sua realização, fizemos uma atividade semelhante com estudantes 25 do Ensino Médio da instituição onde a autora leciona, a partir da qual pudemos perceber alguns aspectos da oficina que deveriam ser modificados para melhor compreendermos características das leituras dos estudantes a que nos propomos nesse estudo. Tendo em vista entender as formas de leitura que os estudantes realizavam e sua utilização de termos próprios da Física para essa leitura, apresentamos algumas imagens que eles precisavam explicar. Buscando, ainda, investigar como eles escolhiam imagens para representar conceitos físicos, eles foram solicitados a selecionar uma imagem para a representação da Primeira Lei de Newton. A construção de uma sequência de imagens, imaginando-se a preparação de uma aula sobre um tema de Física, foi solicitada para observarmos como os estudantes trabalhavam com imagens de diferentes níveis de iconicidade e, portanto, com diferentes representações da realidade. Mais uma vez, não nos preocupamos em comparar as respostas dos estudantes das cursos semipresencial e presencial. E como as oficinas realizadas com os dois grupos apresentaram perguntas e imagens idênticas, para a análise de suas respostas, não diferenciamos os estudantes das duas modalidades. 1.4 CATEGORIAS DE ANÁLISE 1.4.1 Material didático Para a análise das imagens do material didático: a) forma de produção (pinturas, fotografias, cinema, televisão/vídeo, imagem informática); b) composição das imagens; c) nível de iconicidade; e, d) relação do texto escrito com a imagem (identificação, interpretação e relais). 1.4.2 Leituras dos estudantes Para examinar as leituras realizadas pelos estudantes: a) relação do texto escrito produzido por eles com a imagem (identificação, interpretação e relais); b) utilização de termos da Física; c) relação entre as realidades concreta e pensada; e, 26 d) nível de iconicidade. 1.5 OBJETIVOS DOS PRÓXIMOS CAPÍTULOS 1.5.1 Capítulo 2: Aspectos semióticos da imagem Como admitimos a imagem como signo e investigamos algumas de suas características como tal, trazemos no próximo capítulo aspectos dos signos (arbitrariedade, linearidade, denotação e conotação), as relações entre os signos verbais e imagéticos e níveis de leitura de imagens. 1.5.2 Capítulo 3: Imagem e ciências naturais No Capítulo 3, nos detemos ao uso da imagem nas ciências naturais, uma vez que nosso interesse são as imagens presentes em livros didáticos de Física e a leitura de licenciandos dessa área do conhecimento. Restringimos nosso estudo às particularidades das imagens científicas advindas com o Renascimento. Como forma de representação da realidade, discutimos relações das imagens utilizada no ensino da Física com as realidades concreta e pensada. Por examinarmos a imagem utilizada no nível superior e leitura de imagens de licenciandos de Física, refletimos sobre o trabalho científico, a formação de profissionais dessa área e o papel dos livros didático nessa formação. Apresentamos, ainda, alguns aspectos de estudos apresentados em artigos acerca do tema imagem na Educação em Ciências e, mais especificamente, no ensino de Física, tendo em vista nossos interesses de investigação. 1.5.3 Capítulo 4: Os cursos, os materiais e as leituras dos estudantes O material analisado nesse estudo surgiu a partir do curso de Licenciatura em Física da UFRJ, nas modalidades presencial e semipresencial. Por isso, com a finalidade de conhecermos o contexto de onde surgiu esse material, iniciamos o Capítulo 4 fazendo uma breve descrição desse curso, nas duas modalidades, com alguns aspectos de sua origem, de suas grades curriculares atuais, das disciplinas introdutórias à Física e do material didático utilizado nas mesmas. Em seguida, apresentamos as categorias empregadas na análise do material didático, 27 os resultados que encontramos a partir dessas categorias e algumas considerações sobre esses resultados. Por fim, expomos os padrões de leitura de imagens dos estudantes, mostrando as imagens e perguntas que foram exibidas a eles nas oficinas e discutindo suas respostas por questão. 1.5.4 Capítulo 5: Considerações Terminamos esse estudo retomando as questões iniciais a partir das discussões acerca da imagem e das análises realizadas nos capítulos anteriores. 28 As imagens nos contam histórias, atualizam memórias, inventam vivências, imaginam a história. Ana Maria Mauad 2 ASPECTOS SEMIÓTICOS DA IMAGEM A maioria das pessoas conhece a palavra “imagem” a partir de seus significados utilizados no cotidiano, que também se encontram em dicionários (FERREIRA, 2000, p.373): 1.Representação gráfica, plástica ou fotográfica de Representação plástica da Divindade, dum santo, etc. 3. assunto ou motivo religioso. 4. Reprodução invertida da superfície refletora. 5. Representação mental de um lembrança, recordação. 6. Metáfora. pessoa ou objeto. 2. Estampa que representa pessoa ou objeto, numa objeto, impressão, etc; Todas as definições anteriores apresentam em comum a relação da imagem, seja mental ou visual, com algo ou alguém exterior a ela, como representação, reprodução e relação de semelhança com a realidade do modo como a compreendemos. Aparici, García Matilla e Valdivia Santiago (1992) indicam dois tipos de representação: a analógica e a digital. Enquanto a primeira apresenta semelhança com o objeto representado, a segunda utiliza signos (visuais e auditivos) que não lembram, em sua aparência, o objeto que comunicam (por exemplo, a linguagem verbal). Assim, um retrato é uma representação analógica por ser semelhante à pessoa apresentada nele. A palavra “coração”, por não se parecer com o objeto que representa, é um signo digital. Saussure a classificaria como um signo arbitrário (FIORIN, 2005a, p.60), porque não existe uma motivação, uma justificativa, baseada na semelhança entre palavra e objeto, para que o objeto coração seja chamado de “coração”. Essa palavra poderia ser substituída por outra que representasse o mesmo objeto, contanto que as pessoas pertencentes ao grupo que a utilizassem a reconhecessem e concordassem no seu uso. As representações mentais e visuais estão sempre relacionadas em sua formação. “Não há imagens como representações visuais que não tenham surgido de imagens na mente daqueles que as produziram, do mesmo modo que não há imagens mentais que não tenham alguma origem no mundo concreto dos objetos visuais” (SANTAELLA; NÖTH, 2008, p.15). As imagens mentais não possuem um suporte material, elas são frutos da imaginação. Já as representações visuais estão no âmbito da percepção e, para serem notadas, necessitam de uma relação física imediata (visão, audição, tato) com o observador através de objetos materiais (pinturas, desenhos, fotografias, cinema, vídeo etc.). Enquanto as representações 29 visuais são estudadas pela semiótica, a ciência cognitiva se ocupa das representações mentais. O presente estudo se limita a pesquisar alguns aspectos semióticos da imagem, restringindose, assim, às representações visuais. 2.1 A IMAGEM COMO SIGNO A semiótica é a ciência geral dos signos (SANTAELLA, 1983) que tem por objetivos “estudar os diferentes tipos de signos interpretados por nós, estabelecer sua tipologia, encontrar as leis de funcionamento das suas diversas categorias...” (JOLY, 2007, p.30). Os signos, embora não sejam a realidade concreta, são o modo como conhecemos e nos apropriamos do mundo. Um dos fundadores da semiótica foi Ferdinand de Saussure. Adam Schaff (1968), citado por Fiorin (2005a), classifica os signos, primeiramente, em “naturais” e “artificiais”, tendo em vista seu propósito na comunicação. Os signos “naturais” são fenômenos da natureza que indicam a presença de outro fenômeno natural. Um arco-íris pode revelar que choveu; o som do trovão propõe que vai chover; cheiro de fumaça sugere fogo; febre aponta para algum problema no organismo. Natural Verbal Signo Artificial Sinal Com expressão derivativa Substitutivo Substitutivo stricto sensu Símbolo Quadro 2: Classificação dos signos segundo Shaff (1968) Os signos produzidos e compartilhados pela sociedade tendo por objetivo a comunicação (como as palavras e os sinais de trânsito) são “artificiais”. Estes, levando-se em conta seu papel ao interpretar diferentes linguagens, podem ser “verbais” ou “com expressão derivativa”. Segundo Schaff, os primeiros têm a capacidade de interpretar todas as linguagens. Isto é, os signos verbais podem ser usados para descrever o que é mostrado numa fotografia ou num filme (signos com expressão derivativa). Entretanto, é difícil, por exemplo, imaginar a explicação da melodia de uma composição de Mozart. Apesar de sua presença numa partitura (Figura 2), como traduzi-la em palavras? As notas podem ser descritas, os sons podem ser imitados, mas o modo como percebemos a imagem sonora, os efeitos que ela causa em nós não podem ser transmitidos, 30 apenas sentidos. Figura 2: Partitura da Sinfonia em Mi Bemol Maior composta por Mozart Fonte: http://g1.globo.com/Noticias/Musica/0,,MUL204456-7085,00MANUSCRITO+DE+MOZART+E+LEILOADO+POR+MIL+EUROS.html. Acesso em: 01 nov. 2009 Alguns signos “com expressão derivativa” não precisam vir acompanhados de signos verbais para serem compreendidos, mas nessa compreensão fazemos sua tradução em palavras e se quisermos explicá-los precisaremos utilizá-las. Por exemplo, as cenas do filme Tempos Modernos (TEMPOS, 1936) podem ser entendidas apesar da ausência da mensagem verbal, assim como a imagem na Figura 3: percebo e explico sua mensagem, traduzindo-a como um “pedido de silêncio”. Figura 3: Signo com expressão derivativa Fonte: http://www.otimos.blogspot.com/2007_12_18_archive.html. Acesso em: 01 nov. 2009 Por outro lado, existem expressões verbais que parecem não poder ser compreendidas de outra maneira que não seja utilizando-se a linguagem verbal. Será que o que Clarice Lispector (1999) quis manifestar com a frase “Quero escrever movimento puro” pode ser enunciado através de outros signos que não sejam os verbais? Se a sua finalidade na comunicação for levar alguém a agir de uma determinada forma, os signos “com expressão derivativa” são chamados de “sinais”. As cores do semáforo, o som da sirene de uma ambulância, o apito e os gestos de um juiz num jogo de futebol são “sinais”. Os signos “com expressão derivativa” cujo objetivo é a representação de algo são denominados de signos “substitutivos”, que, por sua vez, considerando-se a natureza daquilo que representam, podem ser divididos em signos “substitutivos stricto sensu” e “símbolos”. 31 Os últimos representam algo abstrato (o hino e a bandeira nacionais representam pátria), enquanto os primeiros expressam um elemento concreto (a maquete de um edifício). Uma fotografia de família, por exemplo, pode ser tanto um signo “substitutivo stricto sensu” quanto um “símbolo”, na medida em que representa as pessoas que fazem parte da família numa determinada época e pode manifestar união, poder ou miséria, dependendo do contexto. Para Saussure, o signo linguístico possui dois elementos constitutivos: o significado e o significante. O significado é o conceito que o signo carrega, é “o que quem emprega o signo entende por ele” (FIORIN, 2005a, p.58). Aquilo que se percebe ao usar o signo, o veículo do signo, é o significante. Assim, ao escutar a palavra “father”, uma pessoa que não conhece a língua inglesa consegue perceber o significante, mas não será capaz de entender seu significado. Significante e significado são componentes inseparáveis para a compreensão do signo. Neste estudo, adotamos a diferenciação dada pela Pragmática para significação e sentido (FIORIN, 2005b). A significação do signo se refere à mensagem literal, ou seja, a palavra seria aquilo que o dicionário afirma que ela representa. O sentido é relacionado à interpretação da mensagem que depende do contexto cultural e histórico de produção e leitura da mesma. Por exemplo, a frase “Você vai de carro?” pode não indicar apenas uma curiosidade sobre o meio de locomoção utilizado para se chegar a determinado lugar (significação), mas um pedido de carona (sentido). Três características do signo linguístico são apresentadas por Fiorin (2005a) e discutidas a seguir: (a) arbitrariedade; (b) linearidade; e, (c) denotação e conotação. As duas primeiras são propostas por Saussure como suas propriedades principais. 2.1.1 Arbitrariedade Dizer que o signo é arbitrário significa admitir seu caráter inteiramente convencional, isto é, cultural, e desprezar qualquer relação de iconicidade entre ele e o que ele representa. Para Saussure, o significado de um signo não pode ser apreendido por uma relação de semelhança com o significante. Parece não existir nenhuma justificativa natural para que o significante de “cem” tenha o significado que possui. Entretanto, a palavra “porcentagem” apresenta uma motivação proveniente da palavra “cem”. Assim, “porcentagem” é, segundo Saussure, relativamente arbitrário e “cem” é absolutamente arbitrário (FIORIN, 2005a). Nem sempre é uma tarefa fácil identificar um signo linguístico como relativamente arbitrário: a 32 maioria das palavras acaba parecendo totalmente convencional, uma vez que o conhecimento de suas origens pode se perder com o tempo. Em relação à convencionalidade da imagem, existem três correntes de pensadores (SANTAELLA; NÖTH, 2008): (a) os que defendem a natureza icônica da imagem; (b) aqueles que acreditam numa total arbitrariedade da imagem; e, (c) os que abordam uma posição intermediária entre as duas primeiras. Na linguagem imagética, o significado e o significante, geralmente, possuem uma relação de semelhança. Aparici, García Matilla e Valdivia Santiago (1992) apresentam, como uma das características básicas da imagem, o seu nível de iconicidade (propriedades comuns à imagem e ao objeto representado) em contraponto com seu nível de abstração (a imagem deixa de parecer com o objeto, mas não perde seu sentido). À medida que a imagem diminui seu nível de iconicidade, ela ganha em abstração, ou seja, ela se torna convencional. Moles (1976), citado pelos referidos autores, criou uma escala de 13 níveis de iconicidade decrescente (Quadro 3), em que a imagem de iconicidade máxima (e, consequentemente, de abstração mínima) é o próprio objeto, passando pelas construções bi e tridimensionais, de tamanho reduzido ou aumentado (por exemplo, o globo terrestre), fotografia, desenho, até, por último, a linguagem verbal (textos) e fórmulas algébricas que apresentam abstração máxima (iconicidade mínima). A Figura 4 contém cinco imagens apresentadas em ordem decrescente de níveis de iconicidade. A imagem A, uma fotografia, é mais icônica (ou naturalista) uma vez que foi captada de uma situação real: sua produção marca um evento que aconteceu em determinado lugar e em algum momento. Apesar da segunda imagem (B) possuir a propriedade da perspectiva, que apresenta a noção de profundidade (a terceira dimensão), ela, em relação à imagem A, perde em iconicidade por ser uma imagem computacional, construída, então, a partir de um modelo matemático e de onde foi perdido o contexto em que a gangorra e as crianças se encontram. As imagens C e D são desenhos, sendo que de C para D ocorre um processo de aumento de abstração: as pessoas em C, caracterizadas como um menino e uma menina, apresentam cabelos, olhos, bocas, roupas, isto é, particularidades humanas, enquanto em D, elas são substituídas por bonecos. Utilizando-se a escala de Moles (1976), a última imagem (E) pode ser denominada como um “esquema em espaços complexos” (num mesmo espaço de representação, ela apresenta elementos pertencentes a sistemas diferentes como, flecha, reta, objeto) acompanhado de uma fórmula algébrica. Para compreender esta imagem e suas 33 relações com as imagens anteriores é necessário um conhecimento cultural mais elaborado do que o requisitado para o entendimento da imagem A. Pode-se dizer que a imagem E possui maior densidade semiótica que as demais. A B D C E Figura 4: Níveis de iconicidade decrescente Fonte: A) arquivo pessoal; B) http://www.josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2007. Acesso em: 30 ago. 2009 C) http://www.mudapalmeiras.com.br/site/Imgs/gangorra.gif. Acesso em: 30 ago. 2009 D) http://www.grandeideiaestudio.com.br/multimidia/proj. Acesso em: 30 ago. 2009 E) http://www.commons.wikimedia.org/wiki/File:Alavanca.GIF. Acesso em: 30 ago. 2009 Iconicidade Abstração 12 0 11 1 10 2 9 3 8 4 Definição Critério Objeto e imagem coincidem mas existe uma Objeto em si relação de representação, quer dizer, o objeto mesmo está colocado em um estado ‘comunicativo’. O modelo possui todas ou grande parte das Modelo bi ou propriedades sensíveis do objeto, como cor e tridimensional forma, mas que podem ser sido modificadas em escala arbitrariamente. Esquema bi ou Cores e materiais escolhidos segundo critérios tridimensional lógicos. reduzido ou aumentado. Fotografias ou Com relação analógica ponto a ponto, entre a projeções realidade e sua projeção. A imagem apresenta realistas sobre um grau de definição equiparado ao poder um plano. resolutivo do olho. Desenhos ou A imagem mantém uma relação correta com a fotos de realidade através de critérios de similaridade, contorno. contorno de formas, silhueta. 34 Perfis. Esquema anatômico ou de construção. 7 5 6 6 Imagem fragmentada. 5 7 Esquema de princípios (eletricidade e eletrônica) 4 8 Organograma ou esquema. 3 9 Esquema de formulação. 10 Esquemas em espaços complexos. 2 1 0 11 12 Esquema de um espaço puramente abstrato e esquema vetorial. Descrição em palavras normalizadas ou em fórmulas algébricas A imagem se simplifica e pode mostrar coisas que não se vê a primeira vista. Se representa o que se vê e o que se sabe. A imagem se apresenta em uma disposição artificial e suas partes se organizam em uma disposição perspectiva de peças segundo suas relações espaciais. Todas as características sensíveis foram abstraídas, exceto a forma, a qual pode ter sido estilizada ou geometrizada. A imagem é um símbolo reconhecido (pictograma). Interessa mais conhecer e comunicar do que assemelhar à realidade. Desaparecem todas as características sensíveis e os elementos são quadros reunidos por conexões lógicas, hierárquicas. Relações lógicas e topológicas, em um espaço não geométrico, entre elementos abstratos. As relações são simbólicas, todos os elementos são visíveis. Combinação em um mesmo espaço de representação de elementos esquemáticos abstratos (flechas, retas, plano, objeto), pertencentes a sistemas diferentes. Todas as propriedades foram abstraídas à dimensões vetoriais com magnitudes (quantidade, direção, sentido) susceptíveis de serem representadas em um ponto. A imagem consiste em signos puramente abstratos sem conexão imaginável com o significado ou com a realidade. Quadro 3: Iconicidade x abstração das imagens (Fonte: Souza, Lucia Helena Pralon de. Imagens científicas e ensino de ciências: uma experiência docente de construção de representações simbólicas a partir do referente real. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, 15. Anais do XV ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino. Belo Horizonte: UFMG, 2010. 1 CD-ROM) A Figura 5 apresenta o processo oposto: o da perda da abstração e de ganho em iconicidade, ou seja, da diminuição da densidade semiótica. Presente em livros didáticos de Física, a primeira imagem (F) representa um pêndulo simples, isto é, um objeto, considerado uma partícula, preso em um fio que se movimenta devido ao seu afastamento em relação a sua 35 posição de equilíbrio. Esta imagem ainda contém vetores indicando as forças peso e tensão, o ângulo que o fio faz com a vertical que passa pela posição de equilíbrio e a velocidade nula na extremidade do movimento. Na imagem G, que é tridimensional, não se tem tanta informação simbólica quanto na primeira, mas é acrescentado o suporte em que o fio se encontra fixo. Apesar de ser uma fotografia, a imagem H manifesta um alto grau de abstração por expor um aparato experimental utilizado para demonstrar o movimento pendular. Para quem não teve contato com esse sistema em sua formação acadêmica não seria trivial identificar além de um objeto suspenso por um fio que, por sua vez, encontra-se preso a um suporte vertical. Talvez nas três próximas imagens (I, J e K) seja mais fácil perceber a representação de um balanço. Em I, ele foi retirado de seu contexto uma vez que não se sabe onde ele se encontra. A figura de um boneco é colocada em J. Por último, a imagem K situa o balanço pendurado em uma árvore, com uma criança sentada sendo empurrada por uma mulher. Com suas devidas adaptações, a figura F é um modelo do movimento do balanço em K. F I G J H K Figura 5: Níveis de abstração decrescente Fonte: F) http://www.fisica.ufs.br. Acesso em: 01 dez. 2009 G) http://www.br.geocities.com. Acesso em: 01 dez. 2009 H) http://www.mfisica.nonio.uminho.pt. Acesso em: 01 dez. 2009 I) http://www.fantasyplay.com.br. Acesso em: 01 dez. 2009 J) http://www.oladoocultodalua-eu.blogspot.com. Acesso em: 01 dez. 2009 K) http://www.elementocortante.wordpress.com. Acesso em: 01 dez. 2009 36 2.1.2 Linearidade A linearidade é uma propriedade do signo linguístico que não se aplica à linguagem imagética. Tanto na fala quanto na escrita, cada significante é apreendido consecutivamente. Na imagem vários significantes podem ser percebidos simultaneamente. Ao dizer: “Você pode fazer silêncio?”, uma palavra é comunicada e percebida de cada vez. Enquanto que, ao observar a Figura 3, não somos capazes de distinguir o que notamos primeiro. Dedos, unha, boca, nariz, queixo, face, sombras parecem ser sentidos ao mesmo tempo na transmissão da mensagem. 2.1.3 Denotação e Conotação Um signo denotado apresenta simplesmente o significado daquilo que representa enquanto um signo conotado traz consigo um sentido diferente adicionado ao seu significado. Uma das formas mais utilizadas de conotação é a metáfora. Na metáfora verbal, palavras são substituídas por outras devido a uma relação de analogia compreendida por quem participa de determinado grupo. Ao se identificar uma pessoa como “um ponto fora da curva”, quer se dizer que ela foge de certo padrão de pensamento ou atitude. Somente entenderá desta forma quem compartilha de habilidades de construção e leitura de gráficos. Assim, a metáfora trabalha com uma imagem (o ponto fora da curva) que não é a própria pessoa, mas que concede a ela características que a distinguem de um conjunto de pessoas. A conotação pressupõe alguma relação entre o significado do signo e o sentido adicionado à denotação. Essa relação é construída socialmente, mas também admite uma propriedade de semelhança em que o novo sentido lembre, de alguma maneira, o significado denotado. A expressão “estamos no mesmo barco” comunica o fato de que duas (ou mais) pessoas estarem vivendo situações semelhantes. Se analisada literalmente, barco é um objeto destinado à locomoção sobre a água. O sentido conotado do signo “barco” lembra seu significado, por remeter a uma viagem em que seus tripulantes estão sujeitos ao movimento das ondas, do vento, dos perigos de uma tempestade. Eles saem juntos e chegam juntos ao seu destino. Mas se a expressão fosse utilizada numa comunidade que não conhecesse os imprevistos de uma viagem de barco, não seria suficiente saber o que é um barco para o entendimento da expressão. Para Barthes (1990) as imagens também possuem duas mensagens: a denotada e a conotada. Se ela vier acompanhada por um texto verbal, ainda terá a mensagem linguística. A 37 imagem pode adquirir sentidos diferentes para leitores diferentes, ou para um mesmo leitor em momentos distintos, devido às suas experiências anteriores no contato, na percepção do mundo. Por isso, a imagem é polissêmica: ao ser produzida e lida, pode-se eleger alguns sentidos em detrimento de outros. Como um signo, para compreendê-la é necessário aproximá-la de outros signos já conhecidos (BAKHTIN, 2006). A mensagem conotada requer, para seu entendimento, um conhecimento cultural. Ela é um sentido suplementar ao(s) objeto(s) representado(s), escolhido por seu criador e lido pelo público. Nem sempre a mensagem que o autor deseja transmitir coincide com a mensagem interpretada pelo leitor. Para se conseguir comunicar a mensagem preferencial, o autor pode usar algumas técnicas de tratamento da imagem, como trucagem, pose, objetos, fotogenia, esteticismo e sintaxe (BARTHES, 1990). A primeira forma de conotação ao se captar uma imagem, seria a conotação perceptiva (ou denotação). Por utilizarmos a linguagem verbal (socialmente construída) para descrever uma imagem, aspectos culturais já estão presentes em sua denotação, tornando-a um modo de conotação. Em seguida, a conotação pode passar para o nível cognitivo, em que a leitura se relaciona de forma mais evidente à cultura do observador. A conotação ideológica ou ética é a que incorpora na interpretação da imagem julgamentos e valores (BARTHES, 1990). Se a leitura da imagem se limitar à identificação dos objetos representados, a mensagem é literal (denotada); é a que restaria se conseguíssemos excluir da leitura seus códigos de conotação, sua historicidade, seus aspectos culturais mais amplos. A mensagem denotada se refere às características “naturais” da imagem, isto é, ao seu significado, ao que se poderia extrair dela objetivamente. Figura 6: Denotação e Conotação Fonte: http://www.casuunopar.blogspot.com/2007/07/comunicao.html. Acesso em: 01 nov. 2009 A Figura 6 apresenta os seguintes signos denotados: um homem com camisa, gravata, boca aberta, olhos arregalados, um celular, um controle remoto, um teclado, dois monitores, 38 uma caneca e uma mangueira derramando líquidos no interior da cabeça do homem, uma clave de sol, notas musicais e curvas que parecem unir os objetos. A descrição desses elementos é uma forma de conotação, uma vez que, para reconhecê-los, é necessário compartilhar dos signos apresentados. Provavelmente, pessoas que não aprenderam a ler partituras musicais, não reconheceriam a clave de sol. Se vivêssemos numa sociedade que não utilizasse energia elétrica, não conseguiríamos nomear vários objetos presentes na figura. Ao observar a imagem, além de identificar os objetos que a compõem, podemos realizar uma segunda leitura (conotação) que indica que o homem se comunica e recebe informações visuais e sonoras por meio de vários instrumentos (celular, televisão, computador) e ao mesmo tempo. Sua expressão facial sugere uma atitude de atenção, espanto e cansaço. Como percebe-se no exemplo anterior, a partir do momento que a imagem é descrita, ela é conotada: o que é descrito por um leitor está sempre relacionado ao contexto cultural em que ele se encontra inserido, às experiências anteriores que ele teve com objetos e fenômenos ao seu redor. 2.2 RELAÇÃO TEXTO-IMAGEM O texto também funciona como método de conotação da imagem. Barthes (1990) afirma, utilizando a fotografia jornalística, que houve uma mudança na relação entre texto e imagem. Inicialmente, a imagem era utilizada para ilustrar o texto, para esclarecer as informações que continha. Em seguida, o texto passou a sugerir ou encaminhar sentidos “segundos” à imagem; o texto “torna a imagem mais pesada, impõe-lhe uma cultura, uma moral, uma imaginação” (BARTHES, 1990, p.20). Para isso, o texto pode enfatizar sentidos de conotação, supostamente, já presentes na imagem, isto é, ampliar conotações presentes na imagem, ou produzir (inventar) novos sentidos. Se o texto verbal irá enfatizar sentidos de conotação entendidos como já expressos na imagem ou orientar a leitura para a compreensão de novos sentidos de conotação, dependerá da relação estabelecida entre o leitor e a informação transmitida na imagem. Na Figura 7, a mensagem linguística tem por finalidade descrever os objetos expostos na imagem. Entretanto, para quem não tem familiaridade com a realização de experimentos didáticos de Física, objetos como o calorímetro e o aquecedor podem estar sendo nomeados pela primeira vez, originando uma nova conotação: o primeiro é utilizado para medir calor e o segundo para aumentar a temperatura. 39 Figura 7: Função da mensagem linguística Fonte: ALMEIDA, Maria Antonieta T.; BARROS, Susana L. de S. Introdução às Ciências Físicas. Vol.5. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2002. Figura 8: Contradição entre texto e imagem Fonte: ALVARENGA, B.; MÁXIMO, A. Curso de Física. Vol.1. São Paulo: Editora Scipione, 2000. Presente em material didático impresso para o ensino de Física, a Figura 8 se refere ao movimento de queda de duas esferas. O texto que acompanha a imagem sugere que, conforme previsto pelo modelo de queda livre, as duas esferas, abandonadas no mesmo instante e da mesma altura, num local onde a resistência do ar é desprezível, independente de suas massas, chegarão juntas ao chão. Entretanto, observamos através da fotografia que a esfera maior chega primeiro ao chão. Nesta situação a mensagem linguística produz um sentido de conotação não expresso pela imagem, contradizendo a mensagem imagética. A mensagem linguística admite duas funções ao acompanhar uma imagem: de 40 “fixação” ou de “relais” (BARTHES, 1990). A primeira está ligada diretamente ao aspecto polissêmico da imagem e pode ser de “identificação” ou de “interpretação”: o texto serve para guiar o leitor ao sentido preferencial da mensagem imagética. Na identificação, o texto é utilizado para descrever os elementos da imagem (enfatizar), ele tem uma finalidade denotativa. Quando ele orienta a leitura da imagem em direção ao sentido que o produtor ou editor da imagem quer comunicar, ajudando a descartar outras possíveis leituras, atua no nível da conotação (interpretação). No relais, texto e imagem se complementam. A mensagem linguística é utilizada na compreensão da leitura de uma sequência de imagens (histórias em quadrinhos, por exemplo), no desenvolvimento de uma ação (como no cinema), apresentando os sentidos que a imagem sozinha pode não manifestar claramente. Figura 9: Mensagem linguística (fixação e relais) Fonte: YOUNG, Hugh D. e FREEDMAN, Roger A. Física I: Mecânica. 12ª edição. São Paulo: Pearson Addison Wesley, 2008. Para um leitor que observa pela primeira vez a imagem anterior (Figura 9), ela pode parecer apresentar várias bolinhas, um aparato (difícil de ser identificado) no canto superior esquerdo e linhas horizontais num fundo preto. Essa descrição se limita à mensagem literal da imagem (denotada). A mensagem linguística (legenda) ajuda a compreender que na realidade são apenas duas bolinhas, cujos movimentos de queda são registrados por meio de fotografia estroboscópica. Ao mencionar “bola”, o texto enfatiza o que podemos perceber com a imagem 41 (identificação). Como a legenda indica que são duas bolas (a da esquerda e a da direita), descartamos o fato de serem várias bolinhas (interpretação). O texto também esclarece que a imagem fixa tenta mostrar o que acontece quando as bolinhas estão em movimento (a da esquerda em queda livre e a da direita em lançamento horizontal), registrando “imagens sucessivas” em “intervalos de tempo iguais”. Assim, na explicação do que ocorre com a passagem do tempo, o texto atua como relais. Uma das mensagens conotadas que podem ser retiradas da imagem, além da contida na mensagem linguística, é que as linhas horizontais indicam que, na vertical, para intervalos de tempo iguais, as bolas percorrem distâncias iguais, mesmo que suas trajetórias sejam diferentes (mesmo valor de y para valores diferentes de x). Mas, para ser orientado a este último sentido de conotação, é preciso estar familiarizado com alguns conceitos da linguagem da ciência (como posição, velocidade, aceleração, plano cartesiano e componentes vetoriais). 2.3 LEITURA DE IMAGEM Ler é uma prática social já que sempre implica em relações estabelecidas pelo leitor e o mundo. Essa prática é codificada, isto é, exige uma técnica de descodificação. Os signos, construídos socialmente para possibilitar a comunicação, precisam ser decifrados na leitura: o leitor necessita conhecer o significante e atribuir a eles um sentido. Por isso, “só podemos ver aquilo que, em algum feitio ou forma, nós já vimos antes. Só podemos ver as coisas para as quais já possuímos imagens identificáveis, assim como só podemos ler em uma língua cuja sintaxe, gramática e vocabulário já conhecemos” (MANGUEL, 2001, p.27, grifo do autor) Barthes e Compagnon (1987) dividem a leitura em dois grandes níveis, conforme seu objeto. No primeiro nível se encontra a identificação dos signos materiais (denotação); é a primeira leitura, mais superficial, mecânica, mas já influenciada pelas experiências do leitor. O segundo nível, somente possível a partir do primeiro, está relacionado ao sentido transmitido pelos signos (conotação). Ser capaz de reconhecer os signos materiais não significa, necessariamente, compreender seu sentido. Na Figura 10, apresentamos quatro imagens de diferentes graus de complexidade de códigos. A primeira (A) é uma pintura abstrata do cearense Antonio Bandeira (1922-1967). O nome da obra é “Amazonas Guerreando” (1958) e possui 1,46 m x 0,89 m (MAUC, 2010). Ao observar a imagem, percebemos as cores azul, vermelha, verde, amarela, branca e preta, além de traçados retos e curvilíneos. Talvez por conta do título da obra, onde vemos círculos, temos 42 a tendência a reconhecer cabeças humanas, o vermelho nos lembre sangue, o azul, água, e o verde a vegetação do Amazonas. Nossa leitura para por aqui. Não podemos explicar o que o autor queria que víssemos: podemos apenas dizer o que o quadro nos faz sentir. A obra não possui objetos ou pessoas que consigamos reconhecer. Faltam-nos conhecimentos sobre o expressionismo abstrato, a história do autor, as influências artísticas que recebeu, o momento que estava vivendo ao criar o quadro. E, talvez, se possuíssemos essas informações, ainda assim, não conseguiríamos compreender o sentido que o autor tentou transmitir. (A) (B) Fonte: http://www.mauc.ufc.br/expo/1961/02/index1.htm Acesso em: 30 out. 2010 Fonte:http://www.mariannagartner.com/2004/fourmen-standing.html. Acesso em: 30 out. 2010 (C) (D) Fonte: arquivo pessoal Fonte:http://www.commons.wikimedia.org/wiki/File:A lavanca.GIF Acesso em: 30 ago. 2009. Figura 10: Reconhecimento e compreensão A canadense Marianna Gartner é autora da segunda imagem apresentada (B): pintura de 1999, com 2,12m x 1,50m, denominada “Quatro homens em pé”. Ao contrário da primeira imagem, além das cores e traços, somos capazes de reconhecer seus elementos: quatro homens brancos em pé e vestidos de forma semelhante, um fundo verde, um troféu de cabeça de veado pendurado na parede. A partir dessa identificação, podemos questionar: o que a 43 autora queria que enxergássemos nesse quadro? Qual sentido intencionava nos transmitir? O título da obra não nos ajuda no nível da compreensão da mensagem. Manguel (2001) expôs sua leitura desse quadro, admitindo: Não tenho conhecimento do que o inspirou; eu o leio a partir de minha posição ignorante de espectador comum, inventando para o quadro um vocabulário que pode servir para revelá-lo ou não; eu o traduzo em imagens cujo significado crio a partir de fontes distantes... (MANGUEL, 2001, p.169). Sua leitura se inicia a partir da iconografia cristã, onde “quatro” pessoas sugerem a “intromissão” de uma num trio para trazer uma qualidade negada ou esquecida, como a divindade feminina representada por Maria ao aproximá-la da Trindade. O quarto personagem também pode representar um aspecto subversivo não expresso na história original, como no quadro “Adoração dos Magos”, de Hieronymus Bosch, em que na cena de adoração dos três reis magos diante de Jesus recém nascido, é incluído um quarto rei que se apresenta com uma atitude de louco. Para Manguel (2001), o homem da extremidade esquerda (o único com bigode e máscara) é o que foi incluído no trio. Além dele, a presença do troféu e de apenas três mãos o perturbam. Mas, ele não consegue dizer qual o objetivo desses elementos no quadro. A imagem (C) é uma fotografia que a maioria de nós é capaz de reconhecer: duas mulheres, uma gangorra, num local arborizado que parece um parque. Ao fundo, algumas casas e uma criança num balanço. Como a autora deste artigo é uma das pessoas da imagem, podemos afirmar que estávamos simplesmente a passeio, de manhã, numa cidade do Rio de Janeiro. O contexto de cotidiano não era difícil de se compreender tendo em vista as roupas e as expressões do corpo. Provavelmente, só quem teve contato com conteúdos de Física em sua formação acadêmica conseguirá reconhecer e compreender a última imagem (D). Utilizada no ensino da Mecânica, essa figura apresenta duas setas, uma reta grossa horizontal, uma reta mais fina, um triângulo, além da mensagem linguística (dA, dB, FA, FB) e uma expressão matemática. Todos os elementos simbolizam conceitos produzidos pela ciência para explicar o equilíbrio de um corpo rígido. As setas são vetores que representam as forças (FA e FB) exercidas nas extremidades do corpo estudado (a reta mais grossa), o triângulo é o ponto de apoio colocado numa determinada posição para possibilitar o equilíbrio, a reta mais fina delimita as distâncias ao ponto de apoio (dA e dB) e a expressão matemática mostra a relação entre as forças e as distâncias para que ocorra o equilíbrio. 44 Para um professor de Física, esse segundo nível de leitura (compreensão) da imagem D, na realidade, passou a ser o primeiro (reconhecimento) devido a sua experiência acadêmica e profissional: ele olha a imagem e reconhece um esquema que simboliza a situação de equilíbrio de um corpo rígido com os conceitos físicos atribuídos a ela. Assim, ao haver a compreensão da mensagem, esta passa a ser reconhecimento. Ao contrário da pintura de Antonio Bandeira, que parece não possuir um código a ser decifrado, isto é, que parece não utilizar uma linguagem construída socialmente que sejamos capazes de descodificar, a última imagem foi criada a partir de um código originado da ciência com o objetivo de ser traduzido. Mesmo sendo composta de elementos mais fáceis de reconhecer, “Quatro homens em pé” carrega um sentido talvez mais complexo que a imagem D: enquanto a leitura desta última é direcionada a um sentido preferencial (todos que estudaram equilíbrio de corpos rígidos devem entender a imagem da mesma forma), o quadro deixa o leitor livre para a compreensão de seu sentido. Com as limitações impostas pelo modelo científico representado pela última imagem (D), ela representa a situação da imagem (C), entretanto os elementos que a compõe parecemse muito pouco com os da fotografia, mas seu sentido não depende da “semelhança” (GOMBRICH, 1982 apud MANGUEL, 2001), o esquema foi criado para explicar o equilíbrio de qualquer corpo rígido, independente de sua forma, cor, textura, peso etc. Enquanto a fotografia trata de um momento, lugar, pessoas e objetos específicos, o esquema generaliza o fenômeno e os objetos e modeliza a situação concreta. A discussão acima serve para refletirmos acerca de alguns aspectos da leitura. Ao descodificar a mensagem produzimos um sentido para o que lemos, ou, como Barthes e Compagnon (1997) afirmam, sobrecodificamos, criamos um novo texto influenciado por nossos conhecimentos, experiências e leituras anteriores, por aquilo que identificamos de nós no texto e aquilo que nos perturba pela diferença com o já conhecido. Assim, a leitura é polissêmica, cada leitor produzirá sentidos diversos para o mesmo texto de acordo com suas relações com o mundo. Dessa forma, ler é escrever, é a produção de um outro texto, carregado de sentidos segundos, mais próximos ou mais distantes dos pensados pelo autor do texto lido. É escrever um texto único que faz relações com aquele que está a nossa frente, com os que foram lidos antes dele, com sentimentos e vivências pessoais. 45 Ao ler entramos em contato com um texto elaborado por determinada pessoa, em determinado momento e com um determinado objetivo (mesmo que o autor não tenha plena consciência de qual seja ele). Isto é, o texto é criado a partir de um contexto pressupondo-se um leitor; ele é direcionado para alguém que espera-se que compreenda o sentido produzido pelo autor. Em maior ou menor medida, o autor direciona a leitura para um sentido preferencial que será apreendido ou não. No texto científico (verbal e imagético), busca-se ao máximo o controle da polissemia da leitura: tenta-se conduzir todos os leitores à mesma produção de sentido, de modo a generalizar os conceitos da ciência. Dependendo dos códigos utilizado pelo autor do texto e dos códigos disponíveis ao leitor para a sua leitura, o texto pode se situar num “vácuo semiótico” (MANGUEL, 2001). Neste caso, quem lê não tem condições de se aproximar do sentido preferencial do texto pois este não lhe “provoca ecos porque se situa fora da história” (MANGUEL, 2001, p. 276) conhecida/vivida pelo leitor. Figura 11: Ultrassonografia – vácuo semiótico Fonte: <http://www.usbipanema.com.br/site/atuacoes/pagina/163/Ultrassonografia-Mamria-Masculina-> Acesso em: 01 abr. 2011. A Figura 11 expõe um exame de ultrassonografia. Essa é a única informação que podemos fornecer a respeito dessa imagem. Nossas vivências não nos habilitam a fazer uma leitura mais profunda nos níveis de reconhecimento e de compreensão. Não podemos afirmar se é referente ao corpo humano ou de um animal, qual parte do corpo mostra e que interpretações podemos ter a respeito dela, como a presença ou não de alguma anomalia. Nossa formação acadêmica não nos preparou para lermos esse tipo de imagem. É possível uma técnica para ler imagens como desenvolvemos uma técnica para a leitura do texto verbal? 46 Não sei se é possível algo como um sistema coerente para ler as imagens, similar àquele que criamos para ler a escrita (um sistema implícito no próprio código que estamos decifrando). Talvez, em contraste com um texto escrito no qual o significado dos signos deve ser estabelecido antes que eles possam ser gravados na argila, ou no papel, ou atrás de uma tela eletrônica, o código que nos habilita a ler uma imagem, conquanto impregnado por nossos conhecimentos anteriores, é criado após a imagem se constituir – de um modo muito semelhante àquele com que criamos ou imaginamos significados para o mundo à nossa volta, construindo com audácia, a partir desses significados, um senso moral e ético para vivermos (MANGUEL, 2001, p.32-33) Talvez não seja possível ensinar uma técnica para ler uma imagem artística; essa capacidade de leitura pode surgir por meio de um contato frequente com obras de arte, com a história de sua criação e de seus criadores, com o aprendizado sobre o modo de compreender o mundo de sua época. O que vemos em uma obra de arte pode não traduzir integralmente o que o autor quis exprimir. Nossa leitura talvez não coincida com a leitura preferencial do autor. O conhecimento acerca da produção da obra de arte pode nos ajudar a uma aproximação do que seu autor quis comunicar, mas nunca saberemos com exatidão o que ele quis exprimir. Mesmo que, posteriormente, o autor revele suas intenções ao realizar a obra, neste momento, ele não será o mesmo de quando a criou, já estará impregnado de outras influências. Isso também parece acontecer com alguns textos verbais: afinal de contas, o que Drummond quis dizer com “No meio do caminho tinha uma pedra / tinha uma pedra no meio do caminho”? A linguagem artística está relacionada ao contexto de produção da obra, influências recebidas por seu autor. O leitor precisa passar por um período de adaptação visual (MESSARIS, 1994 apud MANGUEL, 2001). Essa adaptação parece ocorrer naturalmente no caso de imagens analógicas representadas por meio de fotografia, TV, cinema e suporte digital. As que estão no âmbito da ciência, como as originadas de exames de ultrassonografia, por exemplo, demandam uma alfabetização para sua leitura que não é conseguida apenas pela exposição do leitor a elas. Ensinar a ler uma imagem científica parece possível, uma vez que sua tentativa de ser expressa em modelos universais, sua capacidade de generalização e, assim, sua diminuição de polissemia ajudariam no controle dos sentidos expressos por ela. Diferentemente da imagem artística, seus sentidos são atribuídos antes de sua criação. Qualquer que seja o texto (verbal ou imagético), sua leitura pressupõe uma “educação do olhar”: Percepção e interpretação são faces de um mesmo processo: o da educação do olhar. Existem regras de leitura dos textos visuais que são compartilhadas pela comunidade de leitores. Tais regras não são geradas espontaneamente; na verdade, resultam de 47 uma disputa pelo significado adequado às representações culturais. Sendo assim, sua aplicação por parte dos leitores/destinatários envolve, também, a situação de recepção de textos visuais (MAUAD, 2008, p.39) Pelo exposto até aqui, é difícil observar uma imagem admitindo-a como “transparente”, isto é, afirmar que os sentidos percebidos são naturais à imagem, que não fazem parte de uma construção social. Esses sentidos, relacionados à produção e à leitura da imagem, têm a ver, dentre outros, com seu autor, com os leitores a quem é destinada, com o momento em que é lida, com as áreas do conhecimento em que foi originada e em que são utilizadas. Do mesmo modo que a linguagem verbal é desenvolvida através do contato com o mundo ao redor que nos alfabetiza para participarmos do processo de comunicação, a capacidade de leitura e construção de imagens também depende de uma alfabetização visual. 48 Há uma barreira entre o que os seus olhos olham e o “eu” que olha pelos seus olhos. Karl Erik Schøllhammer 3 IMAGEM E CIÊNCIAS NATURAIS 3.1 A CIÊNCIA NO RENASCIMENTO Segundo Ivins Jr (1975), três acontecimentos no Renascimento foram responsáveis por mudanças nas ciências naturais que marcaram a maneira como elas são feitas e reconhecidas até os dias de hoje. A seguir, trataremos de alguns aspectos desses acontecimentos. 3.1.1 A invenção da imprensa A invenção da imprensa possibilitou a reprodução exata de textos verbais e, com o surgimento de processos de impressão a partir da fotografia, de textos imagéticos. No que diz respeito à dificuldade de se reproduzir um texto fielmente à mão, talvez a técnica de impressão da imprensa aliada à da fotografia tenha tido maior impacto para as imagens do que para as palavras. Para as descrições e definições da ciência as imagens são úteis se não sofrerem mudanças: elas precisam ser reproduzidas de forma exata, para ter o mesmo sentido em lugares e épocas distintas. Plínio, o Velho, em seu livro “História Natural” (século I), fala dos obstáculos enfrentados pelos botânicos gregos na ilustração de suas declarações verbais (IVINS JR, 1975). Apesar de considerarem as imagens importantes para a compreensão da mensagem verbal, acabaram renunciando à reprodução das ilustrações, pois, realizada à mão por vários copistas, causava distorções que não ajudavam no entendimento de suas descrições verbais. Mas, ao fazê-las apenas com palavras, tornavam impossível o reconhecimento das plantas, uma vez que as mesmas, dependendo do local, eram conhecidas por nomes diferentes ou os mesmos nomes significavam coisas distintas. Decidiram, então, limitar-se a citar os nomes conhecidos para cada planta e seus possíveis usos no tratamento de doenças, produzindo-se “um complexo colapso da descrição e análise científicos enquanto permaneceram confinados às palavras sem imagens ilustrativas”2 (IVINS JR, 1975, p.28-29, tradução nossa). 2 “un complejo colapso de la descripción y el análisis científicos em cuanto éstos quedaron confinados a las palabras sin imágenes ilustrativas” (IVINS JR, 1975, p.28-29) 49 3.1.2 O método do desenho em perspectiva O segundo acontecimento foi a fundamentação e difusão do desenho em perspectiva, como método de representação tridimensional dos objetos em um suporte bidimensional. Tudo que se deve fazer é traçar linhas para esse ponto a partir de qualquer parte da superfície do objeto. Aquelas que estão por trás de um corpo opaco ficarão escondidas, as que tiverem passagem livre serão vistas. Além disso, o fato de enxergamos só ao longo de linhas retas basta para explicar a diminuição do tamanho à distância (GOMBRICH, 1995, p.264 apud COSTA; ALVES; SILVA, 2007, p.2). Derivados das leis da óptica geométrica, a representação em perspectiva e o contraste de luz e sombra são resultados do Renascimento italiano (EDGERTON JR, 1985). O desenvolvimento da ilustração científica na Europa desse período foi proporcionado, em grande medida, pela profissão de “ingegnere” (“engenheiro-artesão”) atuante como conselheiro militar na instrução para a construção de “armas de defesa e de ataque e também de máquinas hidráulicas, moinhos, pontes e todas as outras necessárias para um exército em marcha e luta num ambiente hostil”3 (EDGERTON JR, 1985, p.173, tradução nossa), tendo em vista o medo da Turquia e o desejo de recuperar a Terra Santa. (A) (B) Figura 12: O desenho em perspectiva Fonte: (A) http://www.uh.edu/engines/epi1562.htm (Acesso em: 05 mar. 2011) (B) http://www.lutzhoepner.de/uebersetzen/Brunelleschi.htm (Acesso em: 05 mar. 2011) As imagens (A) e (B) da Figura 12 são atribuídas, respectivamente, ao engenheiro e médico Guido da Vigevano (séc XIV) e ao engenheiro-artesão Filippo Brunelleschi (séc XIVXV). O desenho de Guido refere-se a uma máquina que trabalha a partir da energia eólica. 3 “offensive and defensive weapons and also hydraulica machinery, mills, pontoon bridges, and all other needs for an army on the march and fighting in a hostile environment” (EDGERTON JR, 1985, p.173) 50 Apesar de representar a máquina com detalhes, seu desenho carece do método da perspectiva (ele não apresenta a noção de profundidade, a terceira dimensão) e não deixa claro o mecanismo de transferência de energia que faz a máquina funcionar. Já na Figura 12(B), a utilização da perspectiva no desenho de Brunelleschi permite-nos compreender a transmissão do movimento de uma peça a outra, além de haver uma preocupação em expressar as relações de tamanho observadas na realidade concreta. (A) (B) Figura 13: A técnica da "visão transparente" Fonte: (A) http://history-science-technology.com (Acesso em: 05 mar. 2011) (B) http://en.wikipedia.org/wiki/File:Carnet_Francesco_di_Giorgio_Martini.jpg (Acesso em: 05 mar. 2011) Taccola (1382-1453), um engenheiro-artesão, seguiu os passos de Brunelleschi no uso da perspectiva: um ponto de vista mais ou menos uniforme para todos os objetos na mesma figura e a representação das escalas de tamanho que correspondem ao mundo real (EDGERTON JR, 1985). Alguns dos aparelhos desenhados por ele possuíam elementos identificados por letras que assim eram referenciados no texto verbal explicativo. Também repetia no desenho partes isoladas do aparelho que achava necessário detalhar, sem se preocupar com a “lei da gravidade”: elas apareciam soltas como que flutuando no ar. Mas, talvez, sua maior contribuição para o desenho científico tenha sido a “visão transparente” de uma bomba de sucção (Figura 13(A)), em que o dispositivo dentro do cilindro pode ser observado, como se o cilindro fosse transparente: “... o desenho de Taccola tornou possível a compreensão do princípio de funcionamento da bomba e sua construção sem a necessidade de vê-la trabalhando”4 (EDGERTON, JR, 1985, p.179, tradução nossa). 4 “... Taccola's drawing now made it possible for anyone to understand the principle and to construct the pump without having to see first hand an actual working model” (EDGERTON, JR, 1985, p.179). 51 Diferentemente de Taccola, que não inventou máquinas, mas utilizou convenções novas ou aperfeiçoadas para desenhá-las, Francesco di Giorgio Martini, empregou as ideias de Taccola para a criação de máquinas e a correção de desenhos de seus predecessores (Figura 13(B)). Seus exemplos podem ter inspirado Leonardo da Vinci, que foi o primeiro engenheiro-artesão a aplicar o método da perspectiva na representação anatômica. (A) (B) Figura 14: Representações na anatomia humana Fonte: (A) http://www.sciencephoto.com/images/download_lo_res.html?id=780500065 (Acesso em: 05 mar. 2011) (B) http://veja.abril.com.br/041202/p_130.html (Acesso em: 05 mar. 2011) As imagens (A) e (B) da figura acima são, respectivamente, de Guido da Vigevano (séc XIV) e de Leonardo da Vinci (séc XVI). É possível perceber, mesmo sem muito conhecimento de anatomia, a riqueza de detalhes da segunda proporcionada pelo uso da noção de profundidade e de aspectos mais desenvolvidos de contraste (efeitos de luz e sombra), além da presença da técnica da visão transparente e de uma preocupação com a semelhança com a realidade concreta. As imagens da Figura 15, ambas do século XVI, embora pertençam a áreas distintas do conhecimento, possuem algumas semelhanças em relação à forma de representação. A primeira mostra uma bomba de sucção e pertence a um tratado de mineração e metalurgia; a segunda, refere-se a detalhes do corpo humano para um texto sobre cirurgia. Elas apresentam uma “vista em corte”, em que é possível visualizar o interior da mina, assim como os órgãos do corpo. Partes da máquina são repetidas separadamente no lado direito do desenho, bem como a cabeça no segundo desenho. O mecanismo da bomba é mostrado utilizando-se o método da visão transparente. É representado o passo-a-passo da remoção do cérebro, 52 inserindo-se, assim, a noção de passagem do tempo. (A) (B) Figura 15: Desenhos da Engenharia e Cirurgia Fonte: (A) http://www.pauillac.inria.fr. (Acesso em: 05 mar. 2011) (B) http://www.clendening.kumc.edu. (Acesso em: 05 mar. 2011) Por todos esses exemplos, percebe-se que a preocupação nos desenhos científicos do Renascimento não se limitava a ilustrar um texto verbal: o objetivo era explicar, dar informações sobre a realidade concreta. 3.1.3 A concepção do real Por último, o terceiro acontecimento no Renascimento que mudou as ciências naturais, teve início em 1440, quando o teólogo e filósofo alemão Nicolau de Cusa, “enunciou as primeiras doutrinas completas sobre a relatividade do conhecimento e a continuidade existente entre os extremos através das transições e dos meios-termos”5 (IVINS JR, 1965, p.40, tradução nossa), em seu livro “De Docta Ignorantia”. Para Nicolau, nosso conhecimento sempre é baseado em comparações, em aproximações. Nossas representações do mundo se aproximam, mais ou menos, da realidade, mas nunca são a realidade. “Nossa mente, nossa razão, nossa ciência precisam de uma “assimilação contínua” do real, porque a realidade está sempre ao mesmo tempo se revelando a nós e nos escapando.”(KONDER, 2002, p.10). 3.2 A REPRESENTAÇÃO DA REALIDADE Conhecemos o mundo ao nosso redor e nós mesmos no mundo através dos sentidos. Essa percepção pode se dar de forma consciente ou não. No momento em que estou falando 5 “enunció las primeras doctrinas completas sobre la relatividad del conocimiento y la continuidad existente entre los extremos a través de las transiciones y los términos medios” (IVINS JR, 1965, p.40) 53 ao telefone, alguém me pergunta se eu tenho cachorro em casa. Ao responder que não, me dou conta que um cachorro na rua está latindo e eu não havia notado. Havia percebido, pois era capaz de ouvir o latido, mas não tinha prestado atenção, não tinha tomado consciência do que ouvia. Da mesma forma, enquanto escrevo este texto, tenho contato com estímulos (o som da furadeira na casa do meu vizinho, imagens visuais de objetos sobre a minha mesa, o cheiro do sabonete, o gosto do bolo que acabei de comer, o vento frio que entra pela minha janela) que talvez não tivesse percebido se não parasse para pensar neles. Quando a percepção é consciente, ela se torna representação: ao tentar identificar esses estímulos passo a representá-los através de nomes e/ou imagens que conheço. “A representação quebra o automatismo da percepção inconsciente, mas sempre à custa da imperfeição, pois o empenho subjetivo de representar não atinge um resultado que corresponda plenamente àquilo que é imediatamente vivido” (SCHØLLHAMMER, 2007, p.165-166). Sendo a imagem um modo de representação do real, surgem algumas questões: O que é o real? O que percebemos é a realidade? Existe uma realidade diferente para cada um de nós? Se as leituras da realidade realizada por observadores distintos podem não coincidir, como representar o real? (A) (B) (C) Figura 16: Imagens que podem representar diferentes realidades Fonte: (A) http://www.misskedimpp4.wordpress.com (Acesso em: 25 fev. 2011) (B) http://www.portaldascuriosidades.com (Acesso em: 25 fev. 2011) (C) http://www.psicoblogado.wordpress.com (Acesso em: 25 fev. 2011) A ideia que a maioria de nós possui sobre realidade pode ser encontrada em definições de dicionário, como “aquilo que existe efetivamente, que é real” (FERREIRA, 2000, p. 583). Entretanto, essa explicação deixa margem para várias interrogações porque apreendemos a realidade à nossa volta por meio dos sentidos e não sentimos da mesma forma, em todos os 54 momentos. Ao examinarmos as imagens da Figura 16, podemos perceber elementos diferentes e, portanto, admitir que elas representam várias realidades. A imagem (A), por exemplo, pode representar duas pessoas de perfil ou um vaso. E qual dessas interpretações seria a correta? O idealismo é a doutrina filosófica que admite a realidade como produto exclusivamente mental, ou seja, ela só existe a partir do momento que é percebida por alguém. Consequentemente, cada um de nós pode construir a sua realidade diante de um objeto ou fenômeno e todas serão verdadeiras. Por outro lado, embora na Filosofia existam várias formas de realismo, todas elas defendem a “existência de algo independentemente do que pensamos, imaginamos, desejamos, acreditamos, sentimos, etc., a seu respeito. A ideia é a de que há coisas que têm uma existência real e independente da mente” (ALMEIDA, 2003). O realismo ingênuo (ou científico) reconhece a realidade como algo exterior à mente e ao qual temos acesso direto, sendo, portanto, exatamente como a percebemos. Ao contrário do idealismo, nessa doutrina, existe apenas uma verdade que deve ser percebida por todos. Para o realismo crítico, apreendemos a realidade através de representações construídas por nossa mente, mas a realidade não é essas representações, ela tem uma existência independente da forma como a percebemos. Uma vez que as representações não são o mundo exterior, o mundo não é exatamente como o conhecemos. Assim, há características que dependem da maneira como a nossa percepção funciona (as qualidades secundárias) e outras que existem de forma independente nos próprios objectos (as qualidades primárias). Esta distinção está na base da concepção moderna de ciência e corresponde à distinção entre aparência e realidade. (ALMEIDA, 2003, grifos do autor) Dentro dessa perspectiva, podemos ainda distinguir a realidade em ontologicamente objetiva, epistemologicamente objetiva, epistemologicamente subjetiva e ontologicamente subjetiva (SAYEG, 1997). Para tentarmos ver a diferença entre essas realidades vamos analisar o objeto “lenço”. Um lenço é um pedaço de pano que continuaria existindo mesmo que toda a humanidade fosse exterminada; portanto, ele é ontologicamente objetivo: como um pedaço de pano, ele existe independente do que pensamos sobre ele. Esse pedaço de pano é tratado como lenço pelos seres humanos, ele não é tratado como uma toalha ou como uma fronha, mas como um lenço. Nomeamos ele dessa forma por ter uma função específica para nós, distinta das funções de uma toalha ou de uma fronha. Isso faz com que o lenço seja epistemologicamente objetivo: se não existíssemos, esse pedaço de pano não seria tratado 55 como lenço. O lenço também é ontologicamente subjetivo, uma vez que ele só é chamado de lenço por termos a representação mental desse pedaço de pano como lenço. Esse lenço se torna epistemologicamente subjetivo quando adicionamos a ele um juízo de valor, como “esse lenço é bonito”, pois outra pessoa poderia dizer “esse lenço é feio” e ambas estariam corretas. Mas, poderíamos imaginar um contexto cultural em que as pessoas não conhecessem um lenço, isto é, vissem esse pedaço de pano e não reconhecessem sua função; elas poderiam tratá-lo como qualquer outra coisa, com uma utilidade muito diferente da que estamos acostumados: esse pedaço de pano deixaria de ser um lenço, isto é, teria uma objetividade epistemológica diferente para essas pessoas. Nós, educadores, geralmente, buscamos que a realidade tenha a mesma objetividade epistemológica para todos. Em algumas áreas essa característica é mais evidente que em outras. Queremos e precisamos, para que a vida em sociedade seja possível, que todos leiam ou ouçam a palavra “copo” e saibam de que objeto estamos falando; que reconheçam numa placa a figura de um cigarro com uma faixa na diagonal e saibam que é “proibido fumar”. Na Física, é preciso que os estudantes vejam uma seta para a direita em cima de uma letra e reconheçam que se trata de uma grandeza vetorial, com todas as propriedades que esse nome “vetor” carrega. Esse vetor, epistemologicamente objetivo, portanto, construído pelo ser humano, trata-se de uma representação da realidade. Para Medeiros e Medeiros (2001), Galileu, no século XVII, “inaugura uma atitude de idealizar o real, afastando-se, aparentemente, do mesmo em sua objetividade ontológica, para construir um real pensado e mais simples, criação da mente humana e dotado de uma realidade epistemologicamente objetiva” (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001, p.108-109). Nesse sentido, idealizar significa produzir uma realidade mental (pensada) que não é idêntica à realidade, mas é uma representação da mesma que pode ser compartilhada por uma determinada comunidade (científica). Essa realidade mental parte da simplificação da realidade concreta, que torna possível sua matematização. (A) Figura 17: Real concreto e real pensado Fonte: A) http://fisica.ufpb.br (Acesso em: 28 fev. 2011); B) http://www.sites.google.com. (Acesso em: 28 fev. 2011) (B) 56 Podemos pensar no movimento de uma bala lançada por um canhão (Figura 17(A)). Geralmente, esse exemplo é utilizado nas aulas e nos livros didáticos de Física para tratar do tema “Lançamento de projéteis”. A trajetória do movimento da bala e sua velocidade em vários pontos da mesma podem ser representados pela Figura 17(B), que se refere ao modelo mental (realidade pensada) utilizado para descrever esse movimento (realidade concreta). Para sairmos da realidade concreta e chegarmos à realidade pensada várias simplificações foram efetuadas. Primeiramente, admitimos a bala como uma partícula: suas dimensões são desprezíveis se comparadas às outras dimensões envolvidas no fenômeno (altura – H - e alcance horizontal – A – atingidos) e ela não realiza o movimento de rotação. Desprezamos a resistência do ar e a variação da aceleração da gravidade com a altitude, que impediriam a trajetória de ser parabólica. Desconsideramos a curvatura da Terra, reconhecendo o alcance como uma distância horizontal. Assim, o modelo matemático empregado para a descrição desse movimento se refere à uma realidade mental que pouco tem a ver com a realidade concreta do lançamento da bala. Encontraremos enormes discrepâncias se utilizarmos esse modelo para descrever o movimento de um projétil que alcance uma distância de, aproximadamente, cem quilômetros (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001). Assim, de pressuposto em pressuposto, construímos uma realidade pensada, um fato social, consensualmente aceito; portanto, dotado de uma realidade epistemologicamente objetiva, mas que não é uma cópia, em absoluto, da complexidade da realidade concreta. Se os humanos morressem, por exemplo, numa grande epidemia, nossa teoria de projéteis deixaria de existir. Mesmo que restassem registros escritos, não haveria ninguém para os ler e compreender e para conferirlhes sua existência epistemológica. Mas a Terra, as pedras antes arremessadas, continuariam a existir, sem sombra de dúvidas enquanto que o nosso projétil, objeto ideal do pensamento humano, por ser socialmente construído, deixaria certamente de existir. (MEDEIEROS; MEDEIROS, 2001, p.111) A primeira imagem da Figura 17 (A) é mais icônica que a segunda imagem (B), ela se assemelha mais à realidade concreta. Relacionada à idealização da realidade concreta, a imagem (B) se parece mais com o modelo mental (realidade pensada), ela está mais próxima do conteúdo científico que se quer transmitir. Se o interesse for a representação visual do modelo mental, a imagem (B) é mais icônica que a imagem (A), pois possui maior semelhança com a realidade pensada que se quer representar. Mas, podemos pensar: se os modelos não servem para explicar a realidade concreta, para quê utilizá-los? Se são apenas produtos mentais, por que investirmos tempo ensinando e aprendendo algo que não pode ser empregado para compreendermos a natureza? A questão é que a realidade pensada explica a realidade concreta em determinados contextos de validade 57 (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001). O modelo de “Lançamento de projéteis” ensinado no Ensino Médio, é válido no contexto em que o projétil possa ser considerado uma partícula, sua forma e velocidade atingida não acarretem uma resistência do ar considerável, a altura atingida não seja suficiente para alterar significativamente o valor da aceleração da gravidade e o alcance possa ser admitido como horizontal. Infelizmente, geralmente, não mencionamos os contextos de validade: passamos da realidade concreta para realidade pensada, e viceversa, como se a segunda representasse fielmente a primeira. Para Galileu, fazer ciência implica, após idealizarmos o real, percorrer o caminho de volta através do experimento: é a atividade experimental que aproxima a realidade pensada da realidade concreta (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001). Pensando na iconicidade como analogia com a realidade concreta, Galileu defende que o processo de conhecimento da realidade comece com uma diminuição de iconicidade (da realidade concreta para a pensada) e termine com um aumento de iconicidade (da realidade pensada para a concreta). Embora o nível de iconicidade do experimento seja inferior ao da realidade cotidiana, pois o experimento parte de uma modelização de aspectos presentes no cotidiano. Tentamos explicar a realidade por meio de signos artificiais (SCHAFF, 1968 apud FIORIN, 2005a), como palavras, imagens visuais e imagens sonoras, que, por sua vez, podem dar origem a outras palavras e imagens. Como alguém que, observando uma imagem presente em uma revista, cria e conta uma estória para uma criança dormir. Se a natureza e os frutos do acaso são passíveis de interpretação, de tradução em palavras comuns, no vocabulário absolutamente artificial que construímos a partir de vários sons e rabiscos, então talvez esses sons e rabiscos permitam, em troca, a construção de um acaso ecoado e de uma natureza espelhada, um mundo paralelo de palavras e imagens mediante o qual podemos reconhecer a experiência do mundo que chamamos de real (MANGUEL, 2001, p.22-23) Schøllhammer (2007) defende que a diferença sígnica entre a palavra e a imagem visual é que a primeira significa por diferença e a segunda, por semelhança. Ao nomearmos a realidade (objetos, fatos e emoções), excluímos outras possibilidades: se chamamos um objeto de “caderno”, estamos dizendo, também, que ele não é um livro, um lápis ou uma geladeira; ele é diferente de outros objetos que possuem um nome diferente. A imagem, por sua vez, nos remete a algo real semelhante à ela, seja em aparência física (realidade concreta) ou mental (realidade pensada). Na percepção consciente e compreensão do real necessitamos de palavras e imagens, porque “dificilmente conseguimos distinguir aquilo que não podemos nomear” (MANGUEL, 2001, p.48). 58 As ciências naturais utilizam-se de signos artificiais próprios dos modelos científicos. Termos como fusão, ebulição, movimento retilíneo uniforme, aceleração e elementos como vetores, gráficos e expressões algébricas fazem parte da maneira como a ciência representa a realidade. Essa forma de representação é transmitida pela educação e, em especial, através dos livros didáticos. Por isso, na próxima seção discutimos alguns aspectos da formação dos profissionais das ciências naturais e dos livros didáticos que fazem parte desse processo. 3.3 IMAGEM DA CIÊNCIA NA FORMAÇÃO SUPERIOR Kuhn (2005), ao tratar do progresso das ciências naturais, divide o trabalho científico em ciência normal e ciência extraordinária. Segundo o referido autor, a primeira é transmitida pelos manuais didáticos, constitui a formação dos cientistas e é predominante em sua atuação profissional. A última surge apenas quando a ciência sofre uma mudança de paradigma, isto é, quando ocorre uma revolução científica. Kuhn (2005) entende por paradigmas “as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modulares para uma comunidade de praticantes de uma ciência” (KUHN, 2005, p.13). A ciência normal tem como fundamento realizações científicas do passado. Assim, o trabalho do cientista é baseado em conceitos estabelecidos por estudiosos anteriores. Esses conceitos orientam a visão de mundo do cientista, conduzindo-o a perguntas sobre esse mundo que podem levá-lo a medições, tendo em vista o refinamento da teoria aceita pela comunidade científica. Sua preocupação, geralmente, não é descobrir novos conceitos ou formular uma nova teoria, mas ajustar a natureza aos conceitos e teorias reconhecidos. Os problemas da ciência normal podem ser resumidos em: pesquisar fatos identificados como importantes para a compreensão da natureza, de acordo com o paradigma em vigor; conciliar fenômenos com os resultados antecipados pela teoria do paradigma; e, articular a teoria do paradigma por meio do trabalho empírico, buscando a solução de suas possíveis ambiguidades e de questões ainda não aprofundadas. Para o bem do progresso da ciência, de vez em quando, durante esse processo da ciência normal, acontece algo não programado pela teoria do paradigma: surge uma anomalia, que, como tal, não era prevista pela teoria e, portanto, não era imaginada pelo cientista e com a qual ele não foi preparado para lidar. O fracasso da teoria em explicar uma anomalia leva cientistas a uma crise que pode culminar em três efeitos. A primeira atitude da comunidade 59 científica é tentar, de várias maneiras, fazer com que a anomalia se adapte ao paradigma, ou seja, realizar a tarefa da ciência normal. Algumas vezes a ciência normal consegue resolver o problema. Quando isso não acontece, faz-se necessário pensar em novas abordagens. Se a anomalia resistir a essas abordagens, pode-se, momentaneamente, abrir mão de sua solução, admitindo-se que não se tem conhecimento suficiente para explicá-la. Em outros casos, responsáveis pelas revoluções científicas, a crise pode dar origem a um novo candidato a paradigma, que se mostra capaz de solucionar a anomalia, e pelo qual alguns lutarão por sua aceitação. A ciência nunca abandona um paradigma se não houver outro para substituí-lo e, a essa transição para um novo paradigma, Kuhn (2005) denomina revolução científica, que caracteriza a ciência extraordinária. Os sintomas dessa transição são “a proliferação de articulações concorrentes, a disposição de tentar qualquer coisa, a expressão do descontentamento explícito, o recurso à filosofia e ao debate sobre os fundamentos...” (KUHN, 2005, p.123). Revoluções científicas, geralmente, são associadas às pessoas que as viveram ou que desenvolveram teorias e/ou medições que foram utilizadas para defendê-las ou opor-se a elas. Assim, podemos citar a astronomia copernicana contra a ptolomaica, a teoria de Lavoisier sobre a combustão do oxigênio, a mudança de visão da dinâmica aristotélica para a galileana. A elaboração e aceitação de um novo paradigma não ocorre de forma instantânea e passiva pela comunidade científica cuja anomalia incide sobre os fundamentos de seus conhecimentos. A crise que acompanha o aparecimento da anomalia se deve por questionar as bases do trabalho de um campo de estudos, as crenças de um grupo de profissionais, os métodos utilizados durante anos de pesquisas, a visão de mundo que norteou as perguntas sobre a natureza. Por tocar em pontos tão importantes, a transição entre paradigmas vem acompanhada por resistências da parte de estudiosos da área abalada pela anomalia, uma vez que novos conhecimentos não surgem para ocupar o lugar da ignorância, mas para substituir outros conhecimentos. Após a aceitação do novo paradigma, ele começa a direcionar a pesquisa da ciência normal e a formação de novos profissionais, incluindo-se os livros didáticos que “são produzidos somente a partir dos resultados de uma revolução científica. Eles servem de base para uma nova tradição de ciência normal” (KUHN, 2005 p.185). Ao renunciar a um paradigma, a comunidade científica, geralmente, exclui da 60 educação científica livros e artigos baseados no mesmo. Os estudantes, iniciados na ciência em um novo paradigma, dificilmente terão contato com o anterior. Quando esse contato ocorre, a visão que terão do passado é como um processo de acumulação, como se o paradigma atualmente aceito e, consequentemente as teorias que abarca, tivessem sido originadas a partir do paradigma anterior e não como uma disputa entre paradigmas ocasionada por uma revolução (KUHN, 2005). A imagem de ciência como um processo de adições de conhecimentos se deve, principalmente, aos livros didáticos por se referirem “a um corpo já articulado de problemas, dados e teorias, e muito frequentemente ao conjunto particular de paradigmas aceitos pela comunidade científica da época em que esses textos foram escritos” (KUHN, 2005, p.176). Ao negligenciar ou distorcer a história da ciência, o progresso da ciência parece ser um acontecimento cumulativo. É característica dos manuais científicos conterem apenas um pouco de história, seja um capítulo introdutório, seja, como acontece mais frequentemente, em referências dispersas aos grandes heróis de uma época anterior. Através dessas referências, tanto os estudantes como os profissionais sentem-se participando de uma longa tradição histórica. Contudo, a tradição derivada dos manuais, da qual os cientistas sentem-se participantes, jamais existiu. [...] os manuais científicos (e muitas das antigas histórias da ciência) referem-se somente àquelas partes do trabalho de antigos cientistas que podem facilmente ser consideradas como contribuições ao enunciado e à solução dos problemas apresentados pelo paradigma dos manuais. Em parte por seleção e em parte por distorção, os cientistas de épocas anteriores são implicitamente representados como se tivessem trabalhado sobre o mesmo conjunto de problemas fixos e utilizado o mesmo conjunto de cânones estáveis que a revolução mais recente em teoria e metodologia científica fez parecer científicos. (KUHN, 2005, p.177-178) Talvez, devido, principalmente, aos livros didáticos, a maioria dos estudantes de ciência compartilhem da opinião dos leigos de que o estado atual de desenvolvimento científico só foi possível graças a esforços individuais de pessoas com capacidade intelectual sobre-humana e dedicação sacerdotal à ciência, que foram juntando, sequencialmente, fatos, ideias, definições, leis ou teorias para formarem o conjunto de informações apresentadas pelos livros didáticos. Além disso, parece que suas descobertas já faziam parte de seus objetivos iniciais, sendo apenas consequências de todo um processo direcionado para tal e não como resultado de algo que elas não previam. Assim, os livros didáticos relatam, quase que exclusivamente, a atividade da ciência normal, não tratando da transição presente na ciência extraordinária. Esses manuais didáticos formam gerações de profissionais. Embora, ao longo do tempo eles sofram mudanças devido ao desenvolvimento de novas técnicas de impressão e à 61 demanda por uma organização visual adaptada às formas de leitura contemporâneas, sua organização, conteúdo, exemplos, exercícios e, consequentemente, sua visão de ciência, geralmente, permanecem os mesmos. Diferentemente dos livros didáticos de Ciências (para o Ensino Fundamental) e de Física (para o Ensino Médio), que experimentam alterações significativas devido à demanda surgida a partir de pesquisas na área da Educação, da prática educacional e de políticas públicas, verificamos poucas alterações nos livros didáticos destinados ao nível superior. Os primeiros têm passado por modificações ao incorporarem contribuições da Filosofia e da História da Ciência, das teorias da cognição, do movimento de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), da abordagem sociológica da escola, dos estudos da cultura e da valorização das atividades de experimentação, entre outros (GOUVÊA; OLIVEIRA, 2010). Segundo Kuhn (2005), na formação acadêmica nas áreas das artes gráficas, literatura e música os manuais possuem um papel secundário, pois ela se baseia na exposição dos estudantes às obras de outros profissionais, especialmente as que não lhe são contemporâneas. Nas ciências sociais, os estudantes têm a possibilidade de pensar em problemas que não possuem uma única solução (como os problemas enfrentados pela educação brasileira). Eles entram em contato com diferentes opiniões sobre as causas e possíveis soluções para esses problemas através de pesquisas recentes e de aspectos históricos envolvendo os mesmos. Os manuais têm um papel importante em sua formação, mas não são fonte de informação exclusiva. Nas ciências naturais atuais, até que o estudante comece sua própria pesquisa, sua vida acadêmica se fundamenta nos manuais didáticos: ele não tem contato com resultados de pesquisas recentes nem com o desenvolvimento do pensamento que originou as ideias presentes nos manuais. Por que deveria o estudante de física ler, por exemplo, as obras de Newton, Faraday, Einstein ou Schrodinger, se tudo que ele necessita saber acerca desses trabalhos está recapitulado de uma forma mais breve, mais precisa e mais sistemática em diversos manuais atualizados? (KUHN, 2005 p.209) Ao iniciar-se em uma comunidade científica, o estudante passa a partilhar de sua “matriz disciplinar”, composta pelos paradigmas aceitos pela comunidade, que podem ser expressos, dentre outros, pelas generalizações simbólicas, crenças em modelos, valores e exemplares (KUHN, 2005). Generalizações simbólicas são expressões utilizadas pela comunidade sem questionamentos e divergências, funcionando como leis ou definições, como a lei da inércia e 62 a lei de Hooke. Na seção 3.2 tratamos da realidade pensada em contraponto com a realidade concreta, mencionando os modelos da ciência para representar o real. Esses modelos proporcionam ao grupo as comparações permitidas entre a realidade pensada e a concreta. Assim, podemos utilizar a metáfora do sistema hidrodinâmico em equilíbrio para analisar o comportamento de um circuito elétrico. Os valores são utilizados, por exemplo, para avaliar teorias, predições e o papel da ciência. Embora esse três elementos da “matriz disciplinar” estejam presentes nos livros didáticos, talvez nenhum deles tenha um papel tão importante no aprendizado de uma ciência quanto os “exemplares”. Tratam-se de “soluções concretas de problemas que os estudantes encontram desde o início de sua educação científica, seja nos laboratórios, exames ou no fim dos capítulos dos manuais científicos” e em publicações periódicas (KUHN, 2005, p.234). Qual estudante de Física não resolveu problemas de roldanas, planos inclinados, movimento de satélites, alavancas, pêndulos, associação de resistores e calorímetros? Não basta ser colocado em contato com as generalizações simbólicas da ciência para entendermos os conceitos presentes em um modelo científico: a resolução de problemas se faz necessária para o aprendizado desses conceitos. O estudante “absorve” uma maneira de ver que o ajuda a compreender semelhanças entre os problemas, a determinar relações entre os símbolos, e a empregá-los em outras situações. “As aplicações não estão lá simplesmente como um adorno ou mesmo como documentação. Ao contrário, o processo de aprendizado de uma teoria depende do estudo das aplicações, incluindo-se aí a prática na resolução de problemas” (KUHN, 2005, p.71) Os “exemplares”, geralmente, apresentam imagens visuais que também fazem parte da formação do estudante. Assim, seu aprendizado inclui a leitura das imagens que se torna recorrente e padronizada. (A) (B) (C) Figura 18: Imagens recorrentes no ensino de Física Fonte: (A) http://www.brasilescola.com (Acesso em: 01 mar. 2011) (B) http://www.efeitojoule.com (Acesso em: 01 mar. 2011) (C) http://www.educar.sc.usp.br (Acesso em: 01 mar. 2011) A Figura 18 apresenta imagens às quais os estudantes de Física são familiarizados: 63 elas tratam, respectivamente, de situações referentes ao estudo do movimento de uma partícula, às leis de Newton e ao movimento planetário. Para compreendê-las, o estudante precisa passar por uma transformação de visão que acompanha a aceitação de um paradigma. “O que um homem vê depende tanto daquilo que ele olha como daquilo que sua experiência visual-conceitual prévia o ensinou a ver” (KUHN, 2005, p.150). Ao expor essas imagens para uma criança de 5 anos e para um licenciando em Física, ambos estarão em contato com os mesmo estímulos visuais, mas terão sensações diferentes: “[...] o caminho que leva o estímulo à sensação é parcialmente determinado pela educação.[...] Evidentemente, na medida em que os indivíduos pertencem ao mesmo grupo e portanto compartilham a educação, a língua, a experiência e a cultura, temos boas razões para supor que suas sensações são as mesmas” (KUHN, 2005, p.240241). É de se esperar que profissionais com formações acadêmicas na mesma área do conhecimento compartilhem da mesma leitura de imagens provenientes dessa área. Por seu contato exaustivo com determinadas imagens, principalmente, através dos “exemplares”, eles devem reconhecer os elementos que a compõem e compreender seus sentidos, conduzidos por um paradigma, mesmo sem terem passado por um processo direcionado à alfabetização para sua leitura. Admitimos que as formas como a imagem é produzida e lida em atividades de ensino e suas relações com a mensagem verbal nos livros didáticos podem indicar quais concepções de ciência estão sendo transmitidas para os estudantes. Nas próximas seções deste capítulo, expomos alguns aspectos sobre a imagem que têm sido considerados relevantes em pesquisas direcionadas à Educação, e em especial, no ensino de Física. 3.4 PESQUISAS SOBRE IMAGEM NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS Com o objetivo de compreender como a imagem fixa é tratada nas pesquisas que vêm sendo desenvolvidas, realizamos um estudo em parceria com a também aluna de doutorado deste Programa de Pós-Graduação, Lucia Helena Pralon de Souza, sendo orientado pela professora Guaracira Gouvêa, que deu origem ao artigo “A imagem em artigos publicados no período 1998-2007 na área de Educação em Ciências” publicado na Revista Ensaio (SOUZA; REGO; GOUVÊA, 2010). Neste estudo analisamos artigos presentes em periódicos avaliados pela CAPES como A e B na área de Ensino de Ciências e Matemática, em janeiro de 2008. A partir de abril de 64 2008, a classificação dos periódicos disponibilizada pelo Qualis6 sofreu modificações e passou a ser composto de oito estratos indicativos de qualidade (A1, A2, B1, B2, B3, B4, B5 e C), em que o primeiro (A1) se refere ao nível mais elevado e o último (C) possui peso zero. Foram consultados 74 periódicos, dos quais 20 possuíam artigos com o tema imagem, totalizando 47 artigos analisados (a lista de artigos encontra-se no Anexo). Para encontrarmos os artigos que abordavam a imagem fixa, examinamos seus títulos na busca de palavras que nos indicassem relevância para o estudo. As palavras encontradas foram: imagem(ns), representação(ões), visual(is), ilustração(ões), gráfico(s), desenho(s), quadrinho(s), tirinhas, foto(s), fotografia(s). Deste levantamento achamos 13 artigos (correspondendo a, aproximadamente, 28%) que se referiam ao ensino de Física. É um número significativo ao se levar em conta que a área de Ensino de Ciências e Matemática inclui, além da Matemática e da Física, a Biologia, a Química, a Geociências e a disciplina Ciências ministrada no Ensino Fundamental. Entretanto, como o estudo diz respeito a um período de 10 anos de publicações, na média, esse número corresponde a menos de 2 artigos por ano. As categorias utilizadas na análise, originadas a partir da primeira leitura de alguns artigos, foram: a) papel da imagem: diz respeito à função da imagem na pesquisa, isto é, se ela possui o papel de objeto de estudo ou se ela foi utilizada como recurso na problematização de outras questões; b) natureza da imagem, suporte e mídia: a natureza da imagem se refere ao estudo apenas da imagem fixa ou, juntamente com ela, da imagem em movimento; suporte é o meio material onde a imagem é produzida ou reproduzida (papel, tela, acetato, couro, fita magnética, meio digital); a mídia é o objeto cultural que veicula a imagem (livro didático, TV, jornal, revista, computador, gravura, cartaz, folheto, panfleto, etc); c) abordagem: está relacionada ao momento de produção ou leitura da mensagem imagética, ou seja, se o artigo se preocupa em pesquisar diferentes técnicas de produção de imagens, seus aspectos composicionais e as leituras preferenciais e/ou a tradução da imagem por parte de quem a lê; d) campo de estudos de referência: referencial teórico assumido pelo autor no estudo ou, 6 “Qualis é o conjunto de procedimentos utilizados pela Capes para estratificação da qualidade da produção intelectual de programas de pós-graduação” (<http://www.qualis.capes.gov.br/avaliacao/qualis>. Acesso em: 06 nov. 2009.) 65 quando não explícito por ele, inferido por nós através de sua leitura. Foram encontrados os seguintes campos de estudo: da semiótica, da cognição, da didática, da cultura, da epistemologia, do currículo, da arte, da comunicação, históricos e etnográficos; e) natureza do estudo: classificamos os estudos como empíricos ou teóricos. Entendemos como empíricos aqueles que realizavam levantamentos de dados retirados da experiência em campo, com a presença ou não de sujeitos e teóricos os que apresentavam uma discussão conceitual sem, para isso, respaldarem-se em um levantamento ou análise de dados empíricos; f) cenário dos estudos empíricos: esta categoria é subdividida em “contexto” (escolar ou não-escolar), “nível de ensino” (Fundamental, Médio ou Superior), “disciplina de referência” (Biologia, Ciências, Física etc), “tema” (Mecânica, Células, Óptica etc) e “sujeitos” (estudantes e professores) e contempla apenas os artigos empíricos; g) instrumentos de coleta de dados: também relacionada somente aos estudos empíricos, trata da ferramenta (questionário, entrevista, grupo focal e análise de material) utilizada para o levantamento dos dados; h) tipo de análise de dados: referencial adotado pelos autores na análise dos dados empíricos. Nossas leituras dos artigos foram orientadas, a princípio, por uma necessidade em conhecer as pesquisas relacionadas ao tema imagem em Educação em Ciências e tendo em vista os aspectos relevantes para os estudos conduzidos pelas autoras. O levantamento realizado evidenciou algumas características predominantes nas publicações. Primeiramente, pudemos observar um aumento significativo da produção intelectual sobre o tema ao longo dos anos: dos 47 artigos analisados, 30 (63,8%) foram publicados de 2004 a 2007. Verificamos que grande parte dos artigos (35) abordava a imagem como objeto central de estudo e não como recurso na investigação de outras questões, demonstrando, talvez, uma necessidade sentida pelos pesquisadores de trabalhar na construção dos aspectos teóricos do estudo da imagem para sua posterior utilização como ferramenta na investigação de diferentes temas. Os artigos referentes ao ensino de Física não fugiam dessa realidade: 12 tinham a imagem como objeto de estudo e 1 a utilizava como recurso para investigar concepções alternativas de estudantes (AGUILAR; MATURANO; NÚNEZ, 2007). 66 Tipo de Imagem Imagem Fixa Imagem fixa e em Movimento Total Total de Suporte artigos 37 Papel 10 Total de artigos 31 Tela 1 Fotografia Digital 2 Papel Meio digital Meio magnético (VHS) Acetato 4 5 2 1 Mídia Livros didáticos Apostilas Revistas de divulgação Fotos Tirinhas Testes Desenhos (alunos e profs.) Gravuras Livro Didático Revistas de divulgação Softwares Vídeos T.V. Total de artigos 22 2 1 2 3 1 4 1 3 1 3 3 2 47 Quadro 4: Natureza da imagem, suporte e mídia No que diz respeito à natureza da imagem, suporte e mídia, os dados foram apresentados no Quadro 4. Na área do ensino de Física, somente um artigo trata da imagem fixa e da imagem em movimento (OTERO; GRECA; SILVEIRA, 2003). Nele os autores investigaram a possibilidade de alteração no rendimento dos estudantes devido a utilização de imagens numa sequência de aulas, fazendo uso de várias mídias: applets, livro didático, provas, quadro negro, simulações no computador, softwares. Os demais estudos em Física utilizaram como mídia o livro didático (7), apostilas (1), fotos (1), tirinhas (1) e testes (2). Cinco artigos abordaram a produção e a leitura da imagem, enquanto 31 se referiam apenas à produção e 11 às formas de leituras efetivamente realizadas da mensagem imagética. Percebemos uma predominância da utilização dos campos de estudos da semiótica (19) e da cognição (17). Inicialmente, consideramos que a imagem visual poderia ser abordada como objeto de pesquisa em qualquer campo de referência, mas após a análise dos dados, acompanhada de uma reflexão teórica sobre a questão, pareceu-nos que apenas os artigos baseados nos estudos da semiótica poderiam tratar a imagem como objeto, uma vez que o tema dessa ciência é o estudo das linguagens, incluindo, portanto, a linguagem imagética. A ciência cognitiva utiliza os conceitos de signo e de representação para entender as representações mentais, mas estas sempre possuem sua origem, de alguma forma, nas 67 imagens visuais (SANTAELLA e NÖTH, 2008). Embora, no ensino de Física também encontremos uma influência maior dos campos da semiótica e da cognição, o segundo prevalece sobre o primeiro. Foram encontrados estudos da cognição (6), didática (3), semiótica (1), currículo (1), cognição e semiótica (1) e semiótica e epistemologia (1). Apenas 16 artigos foram classificados como teóricos e, destes, 3 abordavam o ensino de Física. Nos estudos empíricos (31), a pesquisa é exclusivamente direcionada ao âmbito escolar, mais precisamente à educação básica (23). Em relação à disciplina, verificamos a presença marcante das Ciências (no Ensino Fundamental) e da Física (no Ensino Médio), esta última referindo-se mais ao tema Mecânica. Dos 31 artigos empíricos, 16 se limitavam à análise de material sem a presença de sujeitos. Professores e estudantes fizeram parte de 5 estudos empíricos referentes ao ensino de Física. Estudantes do ensino superior participaram de 2 estudos: nas investigações das dificuldades apresentadas na interpretação de gráficos de Cinemática (AGRELLO; GARG, 1999) e das concepções alternativas acerca do movimento dos corpos (AGUILAR; MATURANO; NÚNEZ, 2007). Para a análise dos dados, em geral, os estudos utilizaram a categorização a partir dos dados coletados, sem referenciar ou mencionar um embasamento teórico para isso. Os instrumentos de coleta de dados são apresentados no quadro a seguir: Instrumento Quantidade de artigos Não especificado 1 Grupo focal 1 Entrevista 4 Questionário 10 Análise de material Livro didático 15 Material produzido pelos sujeitos 5 Apostilas 1 Vídeo 2 Fotos 2 Softwares educativos 1 Revistas 1 Obras de arte (pinturas, esculturas) 1 Quadro 5: Instrumentos de coleta de dados 68 O desenvolvimento dessa pesquisa nos possibilitou identificar algumas dificuldades no acesso aos artigos e às informações relevantes na forma de resumos e palavras-chave. Além disso, percebemos uma preocupação acadêmica em construir os alicerces do estudo teórico da imagem na área da Educação necessários para sua utilização de uma forma mais consistente no ensino e como ferramenta na pesquisa de diferentes temas. Apesar de, em nossas classificações, o campo de estudos da semiótica abranger uma quantidade considerável de artigos, observamos uma discussão muito incipiente dos aspectos da imagem como signo. Poucas pesquisas mencionaram autores desse campo e se detiveram em considerações sobre a imagem como seu objeto de estudo, embora, seus trabalhos a admitissem como tal. Essa carência pode ter tido influência na análise dos dados dos artigos, uma vez que as categorias parecem ter surgido a partir dos próprios dados coletados, sem referência a autores de qualquer campo de estudos. Os livros didáticos foram a mídia mais utilizada nos artigos (25), seja com um olhar sobre suas imagens separadamente, em sua relação com a mensagem verbal ou utilizando-se de suas imagens na investigação de outras questões. Isso reflete a importância do livro didático na Educação em Ciências. Em relação à abordagem, os números indicam a preferência em examinar as formas de produção ao invés da leitura da imagem. Ao nos determos às formas de produção, dependendo da análise, estaremos dialogando com as leituras do autor, isto é, com aquilo que consideramos ser a leitura preferencial a que ela se destina. Mas, ao refletirmos sobre a leitura de terceiros, a polissemia da imagem pode nos direcionar a leituras não esperadas. Ainda que os textos verbais nos ofereçam infinitas possibilidades de leituras, o fato de expressarmos a leitura de imagens por meio de palavras parece trazer elementos distintos da leitura de palavras por meio de palavras. Além disso, toda a análise de leitura envolve uma análise de produção, porque ao examinarmos a leitura estaremos nos relacionando com a produção textual de alguém. De qualquer maneira, se pensarmos apenas na realização das pesquisas, dependendo da área do conhecimento, o contexto de análise de leituras de sujeitos pode abranger etapas mais trabalhosas que a análise da produção dos textos, como o acesso aos sujeitos, a infraestrutura necessária para o levantamento dos dados, a construção dos instrumentos e a escolha dos referenciais de análise. Como nossa análise tem seu foco na imagem utilizada no ensino de Física, a seguir, 69 fazemos um exame mais minucioso dos artigos encontrados que se referem a essa área do conhecimento. 3.5 IMAGENS EM PESQUISAS NO ENSINO DE FÍSICA Utilizando os mesmos critérios e buscando atingir os mesmos objetivos mencionados na seção 3.4, realizamos um levantamento dos periódicos classificados como A1 e A2 pela CAPES na área de Educação, em agosto de 2009. Entretanto, focalizamos, neste momento, os artigos que tratavam de reflexões sobre a imagem no ensino de Física. Deste levantamento, foi adicionado apenas 1 artigo (DAVIES, NERSESSIAN; GOEL, 2005) aos 13 que já haviam sido encontrados na investigação da área de Ensino de Ciências e Matemática. As imagens utilizadas em livros didáticos são o tema de 5 artigos, sendo 4 referentes a livros do Ensino Médio e 1 tratando dos níveis médio e superior. Os demais tratavam de temas variados, conforme expomos a seguir. Por meio de um teste de múltipla escolha, Agrello e Garg (1999) examinaram a leitura de gráficos de Cinemática realizada por calouros dos cursos de Ciência da Computação, Engenharia Civil, Engenharia de Redes de Comunicação, Engenharia Elétrica, Engenharia Mecânica, Engenharia Mecatrônica, Física, Geologia, Matemática e Química da Universidade de Brasília, com a finalidade de, a partir de suas respostas, identificarem suas dificuldades na leitura de gráficos e, de posse dessas informações, ajudá-los em seu aprendizado na disciplina de Física 1. Utilizando imagens provenientes, basicamente, da Internet, Peduzzi (1999) complementou o material didático de uma disciplina do curso de Física da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), apresentando algumas vantagens de seu uso no ensino da Mecânica. O autor categorizou as imagens em: imagens de caráter predominantemente ilustrativo; imagens que estreitam os laços da ciência e da arte; imagens “provocativas”; imagens que objetivam contribuir, explicitamente, para um melhor entendimento conceitual; imagens que questionam, diretamente, o aluno; e, imagens que, necessariamente, resultam estéreis ao aluno sem a fundamentação teórica do texto. Otero, Greca e Silveira (2003), baseando-se no campo de estudos da cognição, investigaram influências que atividades de ensino fundamentadas no uso de imagens pudessem ter no rendimento escolar de estudantes do Ensino Médio. Para isso, utilizaram o tema “Oscilações livres, forçadas e amortecidas e suas aplicações” em aulas de dois grupos de 70 estudantes. Em um dos grupos, as aulas foram trabalhadas de forma tradicional, basicamente com alguns esquemas e gráficos quando eram necessários. Os estudantes do outro grupo foram apresentados a diversas imagens fixas e em movimento. O rendimento dos grupos foi verificado com pré e pós testes por meio de análises estatísticas de suas respostas. De acordo com os autores, “A análise indica que não se detectaram, neste experimento, diferenças estatisticamente significativas entre as médias dos pontos obtidos pelos sujeitos”7 (OTERO; GRECA; SILVEIRA, 2003, p.16, tradução nossa). Um projeto em que estudantes criaram “tirinhas”, onde expuseram corretamente ideias ou princípios científicos, foi descrito por González-Espada (2003), com o objetivo de familiarizar professores, principalmente de Física, com a utilização de cartoons e tirinhas como meios de facilitar o aprendizado. Para investigar as ideias acerca das imagens como recurso pedagógico e partindo de um referencial do campo de estudos da cognição, Fanaro, Otero e Greca (2005) elaboraram um questionário a partir da análise de livros didáticos de Física, que foi aplicado a professores dos níveis médio e superior. Seus resultados indicaram que um número considerável de professores compartilhava da crença sobre as vantagens e benefícios do uso das imagens visuais no aprendizado para diminuir a abstração dos conhecimentos científicos, facilitar sua compreensão, aproximá-los do cotidiano do estudante, dentre outros. Costa e Almeida (2005) discutiram características da formação de imagens tridimensionais em espelhos e lentes, assunto, geralmente, negligenciado pelos livros didáticos de Física e nos cursos de Licenciatura em Física. Um modelo computacional de analogia visual para a resolução de problemas foi descrito por Davies, Nersessian e Goel (2005), exemplificando-se sua utilização para representar um pouco do raciocínio de Maxwell sobre o eletromagnetismo. Galili e Zinn (2007) sugerem a inclusão de exemplos de obras de arte no currículo de ciências para a compreensão de alguns conceitos de Óptica através da discussão de seus contextos de criação. Os autores apresentam a ciência e a arte como duas formas de denotar a natureza: a primeira fornecendo um conhecimento objetivo (na medida em que tenta controlar a polissemia) e a segunda um conhecimento subjetivo. Imagens selecionadas de livros didáticos de Física do nível universitário, foram utilizadas por Aguilar, Maturano e Núñez (2007) em duas provas (pré e pós testes) para 7 “El análisis indica que no se detectaron en este experimento, diferencias estadísticamente significativas entre las medias de los puntajes obtenidos por los sujetos” (OTERO; GRECA; SILVEIRA, 2003, p.16) 71 pesquisar concepções alternativas de estudantes dos cursos de Astronomia e Geofísica sobre movimento. 3.5.1 Imagens em livros didáticos Jiménez Valladares e Perales Palacios (2001) tomaram como objeto de estudo o livro didático de Física e Química do nível secundário. Seu interesse no livro didático foi justificado por o considerarem como o meio mais utilizado e aceito pela comunidade educativa para a transmissão da ciência escolar. Seu objetivo foi “desenvolver um instrumento de análise das sequências didáticas de livros didáticos de ciências que possibilite, por um lado, determinar o papel que os autores atribuem às ilustrações e, por outro, dispor de um sistema de indicadores relativos à metodologia de ensino subjacente a cada livro”8 (JIMÉNEZ VALLADARES; PERALES PALACIOS, 2001, p.4, tradução nossa). A análise foi focalizada na estrutura sintática (sequência dos conteúdos) e curricular (metodologia didática subtendida), e consistiu em dividir o texto em unidades e classificá-las de acordo com a sua função segundo categorias empíricas (evocação, definição, aplicação, descrição, interpretação e problematização), tendo em vista compreender quais são os princípios que orientam a posição espacial e o papel das imagens no livro. Foram examinados os temas de Estática e Dinâmica em 10 livros (2 da década de 1960, 1 da década de 1980 e o restante da década de 1990). Entre suas conclusões, os autores identificaram uma maior utilização de imagens em situações para exemplificar e definir conceitos e delinear problemas. Além disso, perceberam uma tendência de mudanças significativas na estrutura dos livros que demandam novas formas de análise. Analisando as imagens desses livros, Jiménez Valladares e Perales Palacios (2002a) discutiram alguns exemplos de imagens utilizadas de forma inconveniente como argumento visual para convencer os leitores da veracidade dos conceitos trabalhados por eles. As imagens eram usadas como evidências experimentais, do que, geralmente, são interpretações fundamentadas na teoria científica que se deseja demonstrar. Utilizando-se da mesma amostra de livros e do mesmo conteúdo didático, os autores aplicaram uma taxonomia para a categorização de ilustrações (JIMÉNEZ VALLADARES; 8 “desarrollar un instrumento de análisis de las secuencias didácticas de libros de texto de ciencias que posibilite, por un lado, determinar el papel que los autores atribuyen a las ilustraciones relativo a la metodología de enseñanza subyacente a cada libro” (JIMÉNEZ VALLADARES; PERALES PALACIOS, 2001, p.4) 72 PERALES PALACIOS, 2002b). Antes de propor essa taxonomia e uma metodologia de análise das imagens, eles apresentaram a fundamentação teórica em que se basearam para avaliar a adequação das imagens nos livros. Essa fundamentação se refere a algumas contribuições do campo de estudos da Psicologia e a investigações empíricas anteriores. As categorias de análise foram: função da sequência didática em que a aparece a ilustração, nível de iconicidade, funcionalidade das imagens, relação com o texto principal, texto verbal dentro das ilustrações e conteúdo científico que as sustentava. Os autores encontraram várias deficiências e incoerências nas ilustrações, a falta de texto verbal nas mesmas e uma fraca relação entre elas e o texto principal. A relação de iconicidade entre as representações visuais em livros didáticos de Física e as ideias que elas têm a intenção de comunicar foi investigada por Medeiros e Medeiros (2001). Seu problema de pesquisa foi “até que ponto tais representações efetivamente guardam semelhanças com os objetos epistemológicos da Física ou apenas com os objetos da realidade concreta.” (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001, p.104). A título de exemplos, eles examinaram três imagens de livros didáticos para o Ensino Médio. Essa análise indicou que as imagens apresentavam diferenças profundas em relação aos modelos construídos pela ciência para a compreensão da natureza, embora fossem muito semelhantes à realidade concreta, podendo acarretar uma confusão entre essas realidades. O único artigo que trata do uso de imagens em livros didáticos de Física no Ensino Superior, juntamente com livros do nível médio, se fundamenta no campo de estudos da cognição para investigar “a influência que determinadas representações externas proporcionadas ao sujeito, poderiam ter nas representações mentais que constrói sobre um fenômeno físico”9 (OTERO; MOREIRA; GRECA; p. 128, 2002, tradução nossa). Foram examinados 41 livros, sendo 10 universitários (1 de 1960, 3 da década de 1970, 1 de 1986 e 5 dos anos de 1990) . As categorias sobre as quais se baseou o exame dos textos surgiram a partir do trabalho empírico sobre os mesmos e seu tratamento se deu numa análise estatística. Essas categorias foram: 1- características gerais da imagem: ênfase notacional (imagens icônicas e simbólicas); funções da imagem (estética, motivadora, ilustrativa, facilitadora) e formas de utilização da imagem (tradicional, introdutória, imagística); 9 “la influencia que determinadas representaciones externas proporcionadas al sujeto, podrían tener en las representaciones mentales que construye para comprender un fenómeno físico” (OTERO; MOREIRA; GRECA; p. 128, 2002) 73 2 – relação entre imagem e texto verbal: associativa, descritiva e interativa; e, 3 – características do livro didático: colorido ou preto e branco; nível educativo a que se destina; e, estilo (textual ou hipertextual). Os autores verificaram que as características das imagens e sua relação com o texto verbal estava significativamente associado ao nível educativo do livro, que parecia orientar o uso de recursos visuais, o estilo de comunicação e o tipo de notações privilegiadas. Além disso, não detectaram a influência dos resultados de pesquisas atuais sobre a utilização das imagens visuais no campo da cognição. Ao que se refere à relação entre texto e imagem, esta apareceu em duas formas básicas: descritiva (30 livros) e associativa (9 livros). No primeiro caso, as imagens são descritas e explicadas pelo texto verbal e, no segundo, há poucas referências às imagens no texto. Somente 2 livros apresentaram uma relação entre textoimagem claramente interativa, isto é, a imagem era empregada como fonte de informação para para gerar conhecimento. 3.5.2 Considerações É importante ressaltar que esse levantamento não contemplou produções apresentadas em eventos e em trabalhos de final de curso (graduação, mestrado e doutorado) no período considerado. Mas, parece que, através dele, podemos ter uma visão geral das pesquisas desenvolvidas acerca do uso da imagem no ensino de Física, uma vez que a maioria das produções de fim de curso acabam sendo, em parte, publicadas em forma de artigos. Embora 13 artigos tenham a imagem como seu objeto de estudo, apenas em 1 trabalho houve a preocupação de identificar seu campo de estudos com o da semiótica, juntamente com o da epistemologia (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001). Aqueles que assumiram, explicitamente, uma referência a alguma área de estudos, o fizeram com a ciência cognitiva, mesmo os que analisaram a relação entre texto e imagem em livros didáticos e examinaram a iconicidade das imagens (OTERO; MOREIRA; GRECA; p. 128, 2002; JIMÉNEZ VALLADARES; PERALES PALACIOS, 2002b). Os artigos que analisaram os livros didáticos abordaram aspectos da produção da imagem. A análise da leitura de imagens foi realizada para investigar as dificuldades na compreensão de gráficos (AGRELLO; GARG, 1999) e as concepções alternativas (AGUILAR; MATURANO; NÚÑEZ, 2007) de estudantes universitários. O exame de livros didáticos universitários esteve presente em apenas 1 artigo. 74 Como instrumentos de coleta de dados, além da análise de livros didáticos, os autores empregaram testes para investigar o conhecimento dos estudantes acerca da disciplina e questionário que levantasse a opinião dos professores com relação ao uso da imagem no ensino. Ainda houve a realização de uma reflexão sobre o material produzido por estudantes (tirinhas) e utilizados em aula. Ao proceder ao tratamento dos dados, os estudos empíricos utilizaram categorias originadas a partir do exame do material, com exceção de Medeiros e Medeiros (2001) que analisaram imagens de livros didáticos tendo em vista a discussão epistemológica apresentada no artigo. Dos 5 artigos que tiveram a presença de sujeitos no levantamento dos dados, 1 se reportou a professores, 2 a estudantes do Ensino Médio e 2 do Ensino Superior. Alguns resultados das análises de livros didáticos realizadas por Jiménez Valladares e Perales Palacios (2001; 2002a) parecem concordar com as considerações de Medeiros e Medeiros (2001) no que diz respeito à carência de uma discussão sobre aspectos da realidade concreta que não fazem parte da realidade pensada. A identificação de uma grande utilização de imagens na exemplificação de conceitos (JIMÉNEZ VALLADARES; PERALES PALACIOS, 2001), pode indicar uma tentativa de aproximar os modelos da ciência de situações cotidianas. Além disso, o exame dos mesmos livros mostrou (JIMÉNEZ VALLADARES; PERALES PALACIOS, 2002a) um uso equivocado das imagens como meio de convencer os estudantes de que esses modelos se originaram de experiências ou são comprovadas pelas mesmas, sem mencionar os contextos de validade. Pudemos perceber, no artigo em que os professores foram sujeitos da pesquisa (FANARO; OTERO; GRECA, 2005), que suas ideias acerca dos benefícios do uso da imagem no ensino, geralmente, têm a ver com a aproximação dos conceitos científicos de situações cotidianas, diminuindo, assim, seu nível de abstração, podendo indicar que, para os professores, essas duas realidades são equivalentes. Em relação aos artigos encontrados no levantamento, o presente trabalho inova no sentido de analisar imagens presentes em livros didáticos utilizados na formação de professores de Física, tendo em vista a análise das imagens e de sua relação com o texto escrito a partir do campo de estudos da semiótica. Além de utilizar categorias que surgiram de pesquisas empíricas anteriores (GOUVÊA; OLIVEIRA, 2010), fizemos uso de categorias originadas do referencial teórico adotado, também empregado para a análise da leitura de 75 imagens realizada pelos licenciandos, cujo objetivo foi investigar como eles leem as imagens. Por último, mas não menos importante, o exame da leitura de imagens provenientes de outras áreas do saber (arte, jornalismo, propaganda) realizada por estudantes de Física parece ser incomum nas pesquisas acadêmicas. 76 E o fim de todas as nossas explorações será chegar ao lugar de onde partimos e conhecê-lo então pela primeira vez. T. S. Eliot 4 OS CURSOS, OS MATERIAIS E AS LEITURAS DOS ESTUDANTES Uma vez que a leitura é polissêmica e depende da cultura em que o leitor está inserido, consideramos necessário expor alguns aspectos do contexto acadêmico do qual os sujeitos da pesquisa faziam parte e em que o material didático analisado era trabalhado. Por isso, antes de apresentarmos os resultados das análises do material didático e das leituras dos estudantes, descrevemos algumas características dos cursos de Licenciatura em Física da UFRJ, no momento da coleta de dados (setembro de 2010), e das disciplinas para as quais o material didático examinado era destinado. 4.1 DESCRIÇÃO DOS CURSOS DE LICENCIATURA EM FÍSICA DA UFRJ Originada da união entre a Escola Politécnica, a Faculdade de Direito e a Faculdade de Medicina, a UFRJ, denominada assim desde 1965, foi criada em 1920 com o nome de Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ, 2008). Passou a se chamar Universidade do Brasil, em 1937, após um processo de reorganização em que foram criadas a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, a Faculdade Nacional de Educação e a Faculdade Nacional de Política e Economia, além de se prever a formação de novos Institutos, entre eles o Instituto de Física, que somente ocorreu na década de 1960. O Instituto de Física tem sua origem na Faculdade Nacional de Filosofia, instituída em 1939 tendo por objetivos: a) preparar trabalhadores intelectuais para os exercícios das atividades culturais de ordem desinteressada ou técnica; b) preparar candidatos ao magistério do ensino secundário e normal e c) realizar pesquisas nos vários domínios da cultura constituidores de objeto do seu ensino. (UFRJ, 2009a) Para isso, ela era composta das “seções” de Ciências, Didática, Filosofia, Letras e Pedagogia que ofereciam cursos de bacharelado e licenciatura, além de cursos de aperfeiçoamento, especialização e doutorado. A seção de Ciências era responsável pelos cursos de bacharelado em Ciências Sociais, Física, História e Geografia, História Natural, Matemática e Química, com duração de 3 anos. A formação no curso de Licenciatura se dava por meio de uma complementação de 1 ano, através do curso de Didática. A partir de 1946, os 77 departamentos foram adicionados à sua organização, inclusive o de Física. Atualmente, o Instituto de Física faz parte do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN), juntamente com os cursos de Astronomia, Ciências Atuariais, Ciências da Computação, Estatística, Geografia, Geologia, Matemática, Meteorologia e Química, sendo formado pelos departamentos de Física Matemática, Física Nuclear, Física dos Sólidos e Física Teórica. Suas atividades de pesquisa e pós-graduação tiveram início na década de 1970 e, hoje, seu Programa de pós-graduação é avaliado pela Capes como de nível internacional (UFRJ, 2009b). Esse Programa conta com os cursos de Mestrado e Doutorado nas áreas de Física das Partículas Elementares e Campos, Física Nuclear/Hadrônica e Astrofísica/Cosmologia, Física Atômica, Molecular e Óptica, Física da Matéria Condensada, além do Mestrado Profissional em Ensino de Física. O Instituto de Física é responsável pelo oferecimento de disciplinas dos seus próprios cursos (Bacharelado em Física, Habilitação em Física Média e Licenciatura em Física) e das disciplinas do ciclo básico de cursos do Centro de Tecnologia (CT), CCMN e do Centro de Ciências da Saúde (CCS). Disciplinas da formação pedagógica do curso de Licenciatura são de responsabilidade da Faculdade de Educação. 4.1.1 O curso presencial Em estudo realizado por Gouvêa (1985), onde foram apresentadas as atividades acadêmicas do Instituto de Física da UFRJ, encontram-se aspectos dos cursos de Licenciatura e Bacharelado oferecidos por esse Instituto. Até 1962, os currículos dos cursos eram os mesmos, sendo que os estudantes que desejassem fazer o curso de Licenciatura deveriam complementar o currículo com disciplinas pedagógicas. A partir de 1963, devido à resolução 296/62 do Conselho Federal de Educação (CFE), a Licenciatura ganhou um novo currículo que manteve uma parte comum com o currículo do curso do Bacharelado. Em 1969, o currículo da Licenciatura sofreu alguns acréscimos, mantendo-se o currículo mínimo estabelecido pelo CFE. Os currículos passaram por novas modificações em 1976, quando “observa-se um afastamento maior entre os cursos, acentuando-se os aspectos da física moderna no curso de bacharelado. Em contrapartida, no curso de Licenciatura, tanto a física clássica como a física moderna têm seus enfoques metodológicos modificados” (GOUVÊA, 1985, p.117, grifos da autora). Em 1992, ano em que ingressei no curso de Licenciatura em Física da UFRJ, o 78 currículo permanecia praticamente o mesmo de 1976, com algumas alterações nos nomes das disciplinas, mas que continuavam com as mesmas ementas. As disciplinas que o compunham eram: Cálculo Diferencial I, II, III e IV; Computação I; Física I, II, III e IV; Física Experimental I, II, III e IV; Química Geral I; Álgebra Linear II; Física Moderna I; Física Moderna Experimental I; Evolução da Física Clássica I e II; Instrumentação para o Ensino I, II e III; Física Teórica I e II; Termodinâmica; Física Ondulatória; Didática Geral; Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º e 2º graus; Didática Especial da Física I e II; Prática de Ensino da Física; Psicologia da Educação I e II; Sociologia da Educação I; e, duas disciplinas de livre escolha. Em relação ao currículo vigente em 1984, foram retiradas as disciplinas Educação Física Desportiva I e II e Estudos de Problemas Brasileiros I e II. Primeiro período Introdução à Física Química Geral 1 Português Instrumental 1 Cálculo Diferencial e Integral 1 Cálculo Vetorial e Geometria Analítica Quinto Período Sociologia da Educação 1 Psicologia da Educação 1 CP Introdução à Física Ondulatória Laboratório de Física Ondulatória Informática no Ensino de Ciências Segundo Período Mecânica da Partícula Laboratório de Física Básica 1 Química Geral Experimental Português Instrumental 2 Cálculo Diferencial e Integral 2 Sexto Período Estrut. e Func. do Ensino de 1º e 2ºgraus Psicologia da Educação 2 CP Mecânica Newtoniana Laboratório Física Moderna - Eletrônica Aval. do Ensino-Aprendizado em Física Terceiro Período Educação no Brasil Mecânica do Sistema e Física Térmica Laboratório de Física Básica 2 Inglês Instrumental 1 Cálculo Diferencial e Integral 3 Sétimo Período Didática Especial da Física 1 Didática Geral Prática de Ensino da Física Tópicos de Física Moderna Instrumentação para o ensino Quarto período Fundamentos Filosóficos da Educação CP Introdução ao Eletromagnetismo Laboratório de Eletromagnetismo Computação 1 Cálculo Diferencial e Integral 4 Oitavo Período Didática Especial da Física 2 Introdução à Termodinâmica Laboratório de Física Moderna 1 História da Física Nono Período Tópicos de Eletromagnetismo Trabalho de Instrumentação Atividades acadêmicas de livre escolha Quadro 6: Grade curricular do curso presencial 79 O curso passou a ser ministrado no turno noturno em 1993. A partir daí, o curso diurno foi sendo extinto conforme os alunos anteriormente matriculados foram se formando. Sua carga horária mínima é de 2625 horas, correspondentes a 136 créditos distribuídos em disciplinas obrigatórias (124 créditos), requisitos curriculares suplementares – projeto de final de curso (4 créditos) e disciplinas complementares de livre escolha (8 créditos). Consta de disciplinas teóricas e/ou práticas. Sua grade curricular é apresentada no Quadro 6. 4.1.2 O curso semipresencial A UFRJ oferece o curso de Licenciatura em Física na modalidade semipresencial por meio do Consórcio Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro (CEDERJ) criado em 2000, com os objetivos de contribuir para a interiorização do ensino superior público gratuito e de qualidade no Estado do Rio de Janeiro; concorrer para facilitar o acesso ao ensino superior daqueles que não podem estudar no horário tradicional; atuar na formação continuada, a distância, de profissionais do Estado, com atenção especial para o processo de atualização de professores da rede estadual de ensino médio; aumentar a oferta de vagas em cursos de graduação e pós-graduação no Estado do Rio de Janeiro. (CONSÓRCIO CEDERJ, 2009) Além da UFRJ, fazem parte do Consórcio a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), a Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), que oferecem, atualmente, os seguintes cursos: Administração, Licenciatura em Ciências Biológicas, Licenciatura em Física, Licenciatura em História, Licenciatura em Matemática, Licenciatura em Pedagogia, Licenciatura em Química, Licenciatura em Turismo e Tecnologias em Sistemas de Computação. O Consórcio conta com polos regionais onde são realizadas avaliações presenciais, atendimento com tutores, seminários presenciais e distribuição de material didático, além de disponibilizarem aos estudantes bibliotecas, salas de estudo, laboratórios didáticos e laboratórios de Informática com acesso à Internet. As Universidades consorciadas são responsáveis pela expedição de diplomas, avaliações dos estudantes, orientação acadêmica, realização das tutorias presencial e a distância, preparação dos conteúdos dos materiais didáticos, estabelecimento dos currículos dos cursos, o registro acadêmico dos estudantes e capacitação dos tutores que atuam de forma presencial e a distância. 80 Os materiais didáticos das disciplinas dos cursos são distribuídos aos alunos de forma impressa (Guia do Aluno, Guia Didático da disciplina, Caderno Didático da disciplina e Caderno de Exercícios e Experimentos da disciplina), audiovisual (programas em vídeo e áudio, distribuídos em fitas, DVDs ou via canais de TV e Rádio), virtual (programas computacionais educativos via CD-ROM, disquetes etc), páginas e portais na Internet (versões eletrônicas dos conteúdos do Guia do Aluno, do Guia Didático da disciplina, do Caderno Didático da disciplina e do Caderno de Exercícios e Experimentos da disciplina). É recomendado que os cadernos didáticos das disciplinas (módulos) sejam elaborados, preferencialmente, por, no mínimo, dois professores conteudistas das Universidades consorciadas e por uma equipe técnica. Como os estudantes não participam de aulas sistemáticas, sua relação com o material didático pode ser estritamente individual ou eles podem contar com a mediação do tutor que, diferentemente do professor do curso presencial, não ministra aulas, mas é designado para esclarecer as dúvidas dos estudantes, acompanhá-los e orientá-los academicamente e atribuir notas as suas avaliações presenciais e a distância. Nas disciplinas com atividades de laboratório, o tutor presencial ainda é responsável pela realização das atividades nos polos regionais e controle da frequência dos estudantes, pois essas atividades são obrigatórias. Os polos em que encontram-se cursos de Licenciatura em Física são: Angra dos Reis, Campo Grande, Duque de Caxias, Itaperuna, Macaé, Nova Iguaçu, Paracambi, Três Rios e Volta Redonda. As disciplinas específicas da formação em Física são oferecidas pela UFRJ, enquanto que UERJ, UFRRJ e UENF proporcionam as disciplinas da formação pedagógica. Sua estrutura curricular é planejada para uma carga horária mínima de 3280 horas, distribuídas da seguinte forma (CONSÓRCIO CEDERJ, 2006): (a) disciplinas introdutórias (435 horas); (b) disciplinas de conteúdo acadêmico específico (1625 horas); (c) disciplinas de conteúdo multidisciplinar (160 horas); (d) disciplinas de prática de ensino (400 horas); (e) disciplinas eletivas (240 horas); e, (f) estágio supervisionado (420 horas). Como no curso semipresencial a maioria das atividades de estudo são realizadas individualmente pelo aluno, não existe a exigência do cumprimento da carga horária, como também não é possível o seu controle pelas Instituições. Cabe ao estudante se organizar, tendo por base a distribuição anterior. O curso de Licenciatura em Física apresenta duas propostas de grade curricular, de acordo com o tempo que os estudantes dispõem para a dedicação ao mesmo. As grades 81 possuem as mesmas disciplinas dispostas, respectivamente, em nove ou doze períodos semestrais. Como a grade curricular do curso presencial possui nove períodos, apresentamos apenas a grade curricular do curso semipresencial também em nove períodos (Quadro 7). Primeiro período Introdução às Ciências Físicas 1 Pré-cálculo Introdução à Probabilidade Números Complexos Introdução à Informática Quinto Período Fundamentos da Educação 3 Prática de Ensino 2 Física 2b Cálculo 4 Álgebra Linear 2 Segundo Período Introdução às Ciências Físicas 2 Cálculo 1 Geometria Analítica 1 Eletiva Eletiva Sexto Período Fundamentos da Educação 4 Prática de Ensino 3 Física 3a Física 3b Equações Diferenciais Terceiro Período Fundamentos da Educação 1 Física 1a Física 1b Cálculo 2 Geometria Analítica 2 Sétimo Período Informática no Ensino de Física Física 4a Física 4b Mecânica Eletiva Quarto período Fundamentos da Educação 2 Prática de Ensino 1 Física 2a Cálculo 3 Álgebra Linear 1 Oitavo Período Instrumentação para o Ensino 1 Eletromagnetismo e Ótica Introdução à Mecânica Quântica Laboratório Avançado História de Física 1 Nono Período Instrumentação para o Ensino 2 Física Estatística e Matéria Condensada História da Física 2 Tópicos em Física Contemporânea Eletiva Quadro 7: Grade curricular do curso semipresencial 4.1.3 As disciplinas introdutórias à Física Para o exame do material didático, foram utilizadas as disciplinas Introdução à Física (IF) e Introdução às Ciências Físicas 1 (ICF1), respectivamente, dos cursos presencial e 82 semipresencial. As duas são ministradas no primeiro período dos cursos e têm como objetivo, como os próprios nomes indicam, iniciar o curso trabalhando com conceitos básicos da Física. As disciplinas apresentam ainda a finalidade de preencher algumas lacunas deixadas pelo Ensino Médio, de modo a possibilitar uma menor evasão através de uma preparação melhor do estudante para as disciplinas dos períodos seguintes. Ambas possuem atividades de laboratório. Realizamos a análise das imagens que são apresentadas no conteúdo referente à Cinemática e às Leis de Newton, presentes nos materiais das duas disciplinas. 4.1.3.1 Introdução às Ciências Físicas 1 (ICF1) Inicialmente, a disciplina Introdução às Ciências Físicas era ministrada no primeiro período do curso semipresencial, com o seguinte programa: Carga horária: 80h de trabalho teórico e 40h de trabalho prático Ementa: O método científico: a observação de um fenômeno, a elaboração de um modelo para descrevê-lo, previsões a partir desse modelo e verificação dessas previsões usando a óptica geométrica através do estudo da propagação linear da luz. A evolução das idéias sobre o sistema solar: movimentos planetários e da Lua; Tycho Brahe, Kepler e Galileu; lei da gravitação universal de Newton; as ideias recentes sobre a formação e estrutura do sistema solar. A observação experimental e a realização de medidas: planejamento e execução de uma experiência; medidas diretas, suas incertezas e unidades de medidas usando aplicações em termometria, medidas elétricas e hidrostática. Apresentação e interpretação de resultados experimentais: tabelas e gráficos Sistemas de referência: grandezas vetoriais: força, posição e velocidade; cinemática e situações de equilíbrio; Leis de Newton. Bibliografia: Material impresso (módulos) elaborado pelos professores conteudistas, além da indicação das seguintes referências como material complementar: MÁXIMO, A.; ALVARENGA, B. Física. Scipione, Volume único, 2001. GREF (Grupo de Reelaboração do Ensino de Física - USP) Física. EDUSP, vols. 1, 2 e 3, 1990. 83 A professora coordenadora do curso e autora do material didático analisado de ICF1, em entrevista, nos informou que a maioria dos estudantes não conseguia acompanhar a disciplina, tornando a repetência e a evasão do curso muito grandes. Isso fez com que Introdução às Ciências Físicas fosse dividida em 1 e 2, ministradas, respectivamente, no primeiro e segundo períodos do curso de Licenciatura em Física. Apesar dessa divisão, não houve um aumento significativo na aprovação e a evasão continuava em torno de 50%. Essas disciplinas têm como objetivo trabalhar de forma mais profunda conceitos científicos apresentados no Ensino Médio e introduzir os estudantes na realização de atividades didáticas de laboratório. Atualmente, Introdução às Ciências Físicas 1 abrange os conteúdos de Ótica, Astronomia e Mecânica, enquanto que Eletricidade e Termodinâmica são abordados em Introdução às Ciências Físicas 2. No Quadro 8, encontram-se os sumários dos Módulos 1, 2 e 3 da disciplina ICF1. A Ótica é utilizada para a ilustração da elaboração de um modelo científico sem a necessidade de ferramentas da matemática mais avançadas do que as desenvolvidas na educação básica. Os conceitos fundamentais da Física são estudados na Mecânica. A inserção da Astronomia ajuda os futuros professores de Física a compreenderem noções presentes no cotidiano referentes à observação do céu, como as fases da Lua, as marés e as estações do ano. A Eletricidade e a Termodinâmica são importantes para a formação dos professores por fazerem parte do conteúdo abordado no Ensino Médio e também recebem uma ênfase em aspectos do cotidiano. O material didático, além de ser fundamental para o acesso ao conteúdo e o auxílio em sua compreensão, no curso semipresencial também tem a finalidade de promover a interação entre estudantes e professor: é a forma como o professor “chega” ao estudante. Essa interação se dá por meio de material impresso, audiovisual e virtual. O material virtual (em suporte informático) diz respeito ao armazenamento em CDROM ou distribuído pela Internet. Através deles devem ser disponibilizados “programas interativos com demonstrações, exercícios, desafios e outras atividades educativas, além de um banco de dados com sons, imagens, textos e demais informações sobre as áreas de conhecimento” (CONSÓRCIO CEDERJ, 2000, p.104). 84 Módulo 1 Módulo 2 Módulo 3 Para começar... Recomeçando... Recomeçando... Aula 1: Construindo um Aula 1: Orientação no espaço Aula 1: A modelo geométrico para a luz movimento descrição Aula 2: A propagação da luz, sua reflexão e refração Aula 2: Orientação no tempo Aula 2: Os vetores e suas bases Aula 3: Espelhos planos e esféricos: as imagens formadas Aula 3: O espaço que nos cerca Aula 4: Meios ópticos transparentes: as imagens formadas Aula 5: Lentes e instrumentos ópticos E para terminar... Complemento 1: Os olhos emitem luz Complemento 2: Unidades de medida Complemento 3: Incerteza numa medida experimental Complemento 4: A lei da reflexão Complemento 5: A determinação da velocidade da luz Complemento 6: A lei da refração da luz Complemento 7: Newton e a dispersão da luz Complemento 8: Computando algebricamente a profundidade aparente numa piscina Referências bibliográficas do Aula 3: Cinemática vetorial Aula 4: O que muda o movimento Aula 5: Leis de Newton Aula 6: Outros tipos de movimento Aula 7: A flutuação dos corpos E para terminar... Complemento 1: O centro de massa Complemento 2: Propagação de Erros Complemento 3: Construção de um gráfico Referências bibliográficas Agradecimentos Glossário Referências Agradecimentos Quadro 8: Sumários dos módulos de Introdução às Ciências Físicas 1 Áudios ou vídeos tutoriais, programas ficcionais ou jornalísticos em áudio ou vídeo, 85 teleconferências ou videoconferências, ilustrações de experimentos e fenômenos naturais por meio de vídeos fazem parte do material audiovisual. O material impresso é composto pelo: (a) guia do aluno: apresenta informações institucionais, normas e procedimentos acadêmicos; (b) guia da disciplina: aborda assuntos referentes à disciplina em que o estudante se inscreve; e, (c) cadernos didáticos: expõe o conteúdo da disciplina. De acordo com o Manual de Produção do Material Didático (CONSÓRCIO CEDERJ, 2000), nos Cadernos didáticos, juntamente com a apresentação do conteúdo é preciso haver referências a outras fontes de consulta, especialmente livros-texto. Ele ainda deve conter uma introdução que informe os objetivos da disciplina, os assuntos fundamentais e conhecimentos necessários à compreensão do conteúdo. Além da parte textual, onde é trabalhado o conteúdo, é aconselhável que sejam apresentados exercícios avaliativos. São estimuladas inserções de gráficos, ilustrações e tabelas acompanhadas de análises textuais. Algumas características do ensino a distância, como a separação entre professor e aluno no que diz respeito a encontros semanais no mesmo espaço físico, demandam que o estudante se torne autônomo e aprenda a conduzir seus estudos. Para isso, o material didático precisa oferecer o máximo de interação possível, facilitada por uma linguagem mais próxima do cotidiano do estudante. Para realizar essa mediação pedagógica, faz-se necessário priorizar a forma como se utilizam os elementos visuais e verbais. São considerados visuais todos os elementos que dão forma ao material (tamanho, tipologia, destaques), suas divisões estruturais (sumários, títulos, unidades didáticas, seções, aulas/atividades) e recursos (símbolos, ilustrações, quadros etc.). Os elementos verbais precisam ser empregados com rigor e cuidado, visando-se à melhor comunicação possível. (CONSÓRCIO CEDERJ, 2000) Os cadernos didáticos da disciplina ICF1 sugerem como bibliografia complementar os livros de Alvarenga e Máximo (2001) e Gref (1990). De acordo com a professora entrevistada, o primeiro é destinado àqueles estudantes com deficiência no aprendizado de conteúdos de Física abordados no Ensino Médio; o segundo, fornece um ponto de vista diferente do conteúdo para a formação de professores. A professora coordenadora ainda informou que, apesar dos tutores presenciais e a distância atenderem aos estudantes com os cadernos didáticos e livros recomendados, verifica-se que a procura pelas tutorias é feita com o objetivo de realizar as atividades de laboratório e de estudar apenas os exercícios resolvidos disponibilizados pela Internet. 86 Ela declarou que a presença de imagens no material didático é importante para o aprendizado através da ilustração dos conceitos trabalhados. Além disso, elas “quebram o texto”, tornando-o mais leve. Por não ter contato direto com os estudantes, ela não pôde nos fornecer informações sobre as formas como eles utilizam as imagens. 4.1.3.2 Introdução à Física Como o projeto pedagógico do curso de Licenciatura em Física da UFRJ encontravase, no momento da coleta de dados, em processo de submissão, a disciplina de Introdução à Física possuía um programa desatualizado, onde constavam as seguintes informações: Carga horária: 15h de trabalho teórico e 30h de trabalho prático. Ementa: Introdução ao pensamento em Física; teoria e realidade física; explanação em Física; estudo da lógica do pensamento científico; modelos; hipóteses; princípios fundamentais da Física; estudo de alguns conceitos básicos da Física; movimento; leis de Newton; calor; gravitação; leis de Kepler; momento linear – conservação; campo elétrico e magnético; ótica; modelos corpuscular e ondulatório para a luz; espectro atômico. Bibliografia: Projeto Física: Unidade 1. Conceitos do movimento (capítulos 1 a 4) e Unidade 3. O triunfo da Mecânica (capítulos 9, 10 e 11). Tradução Ed. Fundação Calouste Goubelkian, Lisboa, 1978. Em entrevista realizada com um dos professores que lecionam a disciplina, obtivemos algumas informações sobre a mesma, as quais passamos a expor a seguir. A inclusão dessa disciplina no primeiro período do curso tem por finalidade atender às necessidades dos alunos que ingressam com um nível de conhecimento em Física insuficiente para a progressão no curso. Assim, são trabalhados conceitos básicos da Física buscando-se que os estudantes desenvolvam formas de pensamento, de observação e de expressão oral e escrita demandados para a compreensão de conceitos científicos. A disciplina é ministrada por dois professores e um tutor. Sua parte prática é feita através de apresentações de demonstrações em vídeo, atividades de laboratório realizadas em pequenos grupos e ilustrações de fenômenos para a visualização de grandezas físicas. O material apresentado aos estudantes é uma apostila, criada para o curso em forma de fotocópia, do Projecto Física (HARVARD PROJECT PHYSICS, 1978), composto por 6 Unidades que constam de 24 capítulos: Unidade 1 - Conceitos de Movimentos, Unidade 2 Movimento nos céus, Unidade 3 - O triunfo da Mecânica, Unidade 4 - Luz e 87 eletromagnetismo, Unidade 5 - Modelos do átomo e Unidade 6: O núcleo. Pensado, primeiramente, para ser ministrado nos níveis, equivalentes no Brasil, do Ensino Médio e dos cursos de tecnólogo oferecidos pelas universidades em dois anos, o Harvard Project Physics foi formado, no fim dos anos de 1960, por um grupo de cientistas e professores de escolas secundárias dos Estados Unidos, coordenados por James Rutherford, com o objetivo de desenvolver um novo tipo de curso de Física. Fizeram parte do projeto “físicos, astrônomos, químicos, historiadores e filósofos da ciência, professores de universidades e de escolas secundárias, educadores de ciências, psicólogos, especialistas de avaliação, engenheiros, realizadores, artistas e projetistas” (HARVARD PROJECT PHYSICS, 1978). Além do livro didático, fazem parte do Projeto testes, filmes, transparências, kits para realização de atividades de laboratório e artigos de revistas. Ao longo da primeira metade do século XX, foi verificado que o número de estudantes que escolhiam fazer Física no Ensino Médio no Estados Unidos estava em constante declínio. O Harvard Project Physics visou criar um conjunto de materiais que ajudassem a aumentar a procura aos cursos de Física das escolas médias. Seus objetivos não se restringiam a motivar a procura por carreiras científicas, mas pretendiam fornecer aos estudantes que continuariam seus estudos nas Ciências Humanas e Sociais um curso que mostrasse a Física como uma construção humana e inacabada ao invés de um conjunto de fatos isolados e teorias úteis apenas para um grupo de especialistas. Para aqueles que não poderiam continuar seus estudos, o Projeto intencionava trabalhar uma base conceitual mínima em Física demandada por uma sociedade que vivenciava uma crescente utilização dos conhecimentos científicos. O curso foi elaborado para ter, na prática, os seguintes efeitos: 1- Ajudar os alunos a aumentarem o seu conhecimento do mundo físico concentrando-os nas ideias que melhor caracterizam a física enquanto ciência, em vez de os centrar em pedaços isolados de informação. 2- Ajudar os alunos a verem a física como uma maravilhosa actividade com muitas facetas humanas. Isto significa apresentar o assunto numa perspectiva cultural e histórica, e mostrar que as ideias da física têm uma tradição ao mesmo tempo que modos de adaptação e mudança evolutivos. 3- Aumentar a oportunidade de cada aluno na participação em experiências de ciência, imediatamente compensadoras, mesmo enquanto adquirindo o conhecimento e as capacidades úteis a longo prazo. 4- Tornar possível aos professores a adaptação do curso aos interesses e capacidades variados dos seus alunos. 5- Ter em conta a importância do professor no processo educativo no vasto espectro de situações de ensino. (HARVARD PROJECT PHYSICS, 1978) Apesar do esforço de vários profissionais, de ensaios de suas versões experimentais e de fornecimento de cursos para a preparação de professores para seu uso, o material não foi 88 muito aceito nas escolas dos Estados Unidos. Segundo a professora entrevistada, a escolha do livro como bibliografia da disciplina Introdução à Física se deveu à formação básica na cultura científica objetivada pelo material com ênfase numa construção histórica. Optou-se por trabalhar no curso apenas os capítulos 1, 2, 3, 4, 9, 10 e 11 (Quadro 9) por apresentarem uma linguagem mínima para fornecer as bases do estudo da Física, tratarem de fenômenos cuja observação macroscópica é simples e relacionados a leis válidas para a natureza microscópica. O livro é utilizado em todas as aulas e a sequência dos conteúdos é seguida. Os estudantes respondem às questões de compreensão apresentadas pelo livro, trabalham os exercícios, analisam as imagens e leem partes do texto em aula. A professora considera as imagens necessárias para uma construção sistemática de conceitos científicos porque apresentam elementos que os estudantes precisam observar e discutir para a compreensão dos fenômenos. Elas apontam para características básicas de grandezas físicas presentes em situações do cotidiano, além de auxiliar o entendimento, a análise e a obtenção de informações através de gráficos. Embora, a professora não conseguisse perceber como os estudantes utilizavam as imagens para o aprendizado, ela julgava importante que eles desenvolvessem habilidades de representar seus pensamentos de forma imagética. Unidade 1: Conceitos de Movimento Unidade 3: O Triunfo da Mecânica Prólogo Prólogo Capítulo 1: A Linguagem do Movimento Capítulo 9: Conservação da Massa e do Momento Linear Capítulo 2 – A Queda Livre – Galileu Descreve o Movimento Capítulo 10 – Energia Capítulo 3 – O Nascimento da Dinâmica – Capítulo 11 – Teoria Cinética dos Gases Newton Explica o Movimento Capítulo 4 – A Compreensão do Movimento Epílogo Quadro 9: Sumário das Unidades 1 e 3 do Projeto Física 4.2 O MATERIAL DIDÁTICO Na análise do material didático, consideramos as categorias: forma de produção, 89 composição, nível de iconicidade, denotação e conotação. Antes de apresentarmos os resultados, fazemos algumas observações acerca do material examinado e das categorias de análise. 4.2.1 O material de Introdução às Ciências Físicas 1 (Material A) O Quadro 10 apresenta o sumário do Módulo 3 (As medidas experimentais e as observações terrestres). Este módulo foi elaborado para ser estudado após os Módulos 1 (Ótica) e Módulo 2 (Astronomia). Atualmente, o conteúdo de Astronomia é o último da disciplina ICF1. Recomeçando... Forças e suas características Definição Aula 1 – A descrição do movimento Forças de contato Intensidade, Introdução direção e sentido de uma força O que sei sobre partículas, trajetórias e os Identificando as forças que atuam vetores deslocamentos? sobre os corpos Partículas e suas trajetórias Leituras e exercícios 6 Referências, observadores e sistemas As Leis de Newton de coordenadas Primeira Lei de Newton Leituras e exercícios 1 As ideias de Galileu sobre o Vetores movimento Exercícios 2 Inércia A primeira Lei de Newton Aula 2 – Os vetores e suas bases Leituras e exercícios 7 Introdução Segunda Lei de Newton O que sei sobre a decomposição de vetores Leituras e exercícios 8 em bases ortogonais? Terceira Lei de Newton Decomposição de vetores Leituras e exercícios 9 Exercícios 3 Aula 6 – Outros tipos de movimento Aula 3 – Cinemática vetorial Introdução Introdução O que sei sobre a força gravitacional, a força O que sei sobre os vetores cinemáticos e suas de atrito e os movimento planos? relações com as trajetórias? Conhecendo melhor as forças gravitacionais Vetores cinemáticos Conhecendo melhor a força de atrito Vetor deslocamento Leituras e exercícios 10 Vetor posição Cinemática do movimento de um projétil e Leituras e exercícios 4 do movimento circular Vetor velocidade Trajetórias parabólicas Vetor aceleração Leituras e exercícios 11 Movimento unidimensional Movimento circular Componentes dos vetores cinemáticos Explicando a Terceira Lei de Kepler 90 Significado geométrico da componente da velocidade e da aceleração no movimento unidimensional Problema inverso Movimento retilíneo uniforme Movimento retilíneo uniformemente acelerado Leituras e exercícios 5 Movimento de corpos onde atuam forças impulsivas Leituras e exercícios 12 Aula 4 – O que muda o movimento Prática 1 Complemento 1: O Centro de massa Complemento 2: Propagação de erros Complemento 3: Construção de um gráfico Referências bibliográficas Agradecimentos Aula 5 – Leis de Newton Introdução O que sei sobre as leis do movimento e as forças? Aula 7 – A flutuação dos corpos Prática 2 E para terminar... Quadro 10: Sumário do Módulo 3 – As medidas experimentais e as observações terrestres Na seção “Recomeçando”, são expostas algumas informações iniciais sobre o Material A. Ela consta de um breve resumo referente aos conceitos trabalhados no Módulo 2, os objetivos do Módulo 3, a indicação da bibliografia complementar, a duração do Módulo, conhecimentos prévios necessários para seu acompanhamento, os principais conceitos abordados, a indicação de realização de experimentos, os títulos das aulas e seus assuntos principais. De acordo com a autora do módulo, ele é programado para ser estudado, em média, em três semanas e meia. Sua intenção é “descrever quantitativamente os movimentos de sistemas simples e entender as suas causas” (ALMEIDA, 2004, p.9). Ele possui dois experimentos, a serem realizados nos polos, que dizem respeito às aulas 4 e 7. Cada aula, com exceção das experimentais, tem início com a apresentação de seus objetivos e da forma como ela é dividida (introdução). “O que sei sobre...?” é uma seção que contém perguntas relacionadas ao conteúdo da aula e tem por finalidade levar o estudante a examinar e expor seus conhecimentos prévios sobre os conceitos principais a serem discutidos, sem recorrer a fontes de consulta (porque o objetivo não é obter respostas corretas). Ele ainda é orientado a voltar a responder o questionário após o estudo da aula e comparar com as respostas fornecidas anteriormente. As aulas 4 e 7 não foram examinadas por se referirem a atividades experimentais, bem como os complementos 2 e 3. Por estar relacionado ao conteúdo da disciplina Física 1, o complemento 1 também não foi observado. É exposta no Quadro 11 a quantidade de imagens 91 encontradas em cada aula. Foram examinadas 99 páginas, o que nos indica que cada página apresenta, em média, pelo menos, 1,5 imagem. Aproximadamente, 20% das imagens contem algum tipo de erro. O material ainda consta de 15 imagens presentes nos exercícios. Aula Imagens encontradas Imagens com erro Imagens analisadas 1 30 5 25 2 15 4 11 3 30 4 26 5 46 10 36 6 36 9 27 Total 157 32 125 Quadro 11: Quantidade de imagens encontradas no Material A 4.2.2 O material de Introdução à Física (Material B) Todas as Unidades desse material iniciam-se com um Prólogo. Além de expor o objetivo do curso, o Prólogo da primeira unidade apresenta alguns aspectos históricos do trabalho do físico Enrico Fermi (1901-1954), com a preocupação de examinar as fases do processo que, geralmente, desenvolvem-se na construção de uma teoria, como a cooperação entre pesquisadores, a utilização das descobertas de cientistas do passado e as etapas de observação e realização de medidas. Com isso, tenta-se iniciar os estudantes no que são a Física e a atividade científica. Os capítulos começam com um índice de suas seções e a exposição de uma imagem relacionada, de alguma forma, com o conteúdo discutido. O sumário da unidade analisada (Unidade 1: Conceitos de Movimento) é mostrado no Quadro 12. Conforme os conceitos são discutidos, apresentam-se questões que os alunos devem responder e recomendam-se outras leituras e a resolução de exercícios contidos no guia de estudo (apresentado ao final de cada capítulo). O Epílogo expõe a finalidade da Unidade, o resumo dos conceitos estudados, a necessidade dos conceitos a serem trabalhados nas próximas unidades para uma compreensão mais aprofundada do tema Movimento, assim como a importância das discussões desenvolvidas na Unidade 1 como base para o entendimento dos conteúdos seguintes, e o que, por falta de espaço, deixou de ser apresentado, mas que também contribuiu para o progresso da ciência. 92 Prólogo Capítulo 1: A linguagem do movimentos 1.1 O movimento dos objectos 1.2 Uma experiência frustrada sobre movimento 1.3 Uma experiência mais satisfatória 1.4 Os “50 metros” de Leslie e o significado de velocidade média 1.5 O gráfico do movimento e a obtenção do declive 1.6 Altura apropriada para um aviso 1.7 Velocidade instantânea 1.8 Aceleração – por comparação Capítulo 2: A queda livre – Galileu descreve o movimento 2.1 A teoria aristotélica do movimento 2.2 Galileu e o seu tempo 2.3 As Duas Novas Ciências, de Galileu 2.4 Porque se estuda o movimento de queda livre dos corpos? 2.5 Galileu escolhe uma definição de aceleração uniforme 2.6 Galileu não consegue verificar directamente sua hipótese 2.7 Procurando as consequências lógicas da hipótese de Galileu 2.8 Galileu escolhe uma verificação indirecta 2.9 Dúvidas sobre o procedimento de Galileu 2.10 Consequências do trabalho de Galileu sobre o movimento Capítulo 3: O nascimento da dinâmica – Newton explica o movimento 3.1 A “explicação” e as leis do movimento 3.2 A explicação aristotélica do movimento 3.3 Forças em equilíbrio 3.4 Vectores 3.5 A primeira lei do movimento de Newton 3.6 O significado da primeira lei 3.7 A segunda lei do movimento de Newton 3.8 Massa, peso e queda livre 3.9 A terceira lei do movimento de Newton 3.10 Utilização das leis do movimento de Newton 3.11 As forças básicas da natureza Capítulo 4: A compreensão do movimento 4.1 Uma viagem à Lua 4.2 Movimento de um projéctil 4.3 Qual a trajectória de um projéctil? 4.4 Sistemas de referência em movimento 4.5 Movimento circular 4.6 Aceleração centrípeta e força centrípeta 4.7 O movimento dos satélites terrestres 4.8 E a respeito de outros movimentos? Epílogo Quadro 12: Sumário da Unidade 1 – Conceitos de Movimento Retirando-se as imagens presentes no Guia de Estudo, foram encontradas 128 imagens em 111 páginas, representando, aproximadamente, 1,2 imagem por página. Três imagens continham erros (Quadro 13). 93 Capítulo Imagens encontradas Imagens com erro Imagens analisadas Prólogo 8 0 8 1 37 2 35 2 14 0 14 3 33 0 33 4 31 1 30 Epílogo 5 0 5 128 3 125 Total Quadro 13: Quantidade de imagens encontradas no Material B 4.2.3 Categorias de análise 4.2.3.1 Forma de produção Sendo a produção o momento de construção da mensagem imagética, ela se refere às diferentes “tecnologias” utilizadas em sua criação (DUBOIS, 1999): pintura (desenho, escultura), fotografia, cinema, televisão (vídeo) e imagem informática. Pela grande incidência de desenhos encontrados no material, decidimos separá-los da pintura. Por desenho entendemos todas as imagens que pudessem ser originadas da ação do lápis sobre o papel, mesmo que elas tenham sido desenvolvidas com suporte informático, ou seja, figuras que poderiam ser criadas substituindo-se o “mouse” pelo lápis e a tela do computador pela folha de papel. Incluímos como desenhos, as tabelas e gráficos. 4.2.3.2 Composição das imagens Esta categoria se relaciona aos elementos que compõem as imagens analisadas, ou seja, o que as imagens apresentam ao leitor (artefatos, homem, partes do corpo humano, esquemas de Física etc). As imagens foram classificadas de acordo com a distribuição apresentada no Quadro 14, onde acrescentamos os tipos E6, H e I do quadro construído por Gouvêa e Oliveira (2010). Algumas observações devem ser feitas a respeito da análise das imagens de acordo com as classificações desse quadro: 1 - Como artefatos foram considerados todos os tipos de objetos produzidos culturalmente; 2 - como cotidiano entende-se lazer ou atividade doméstica; 3 - como atividades de produção e serviço entende-se àquelas referentes ao mundo do 94 trabalho; 4 - elementos da natureza englobam todos os seres vivos, em parte ou inteiros, e minerais. 5 - consideramos elementos do mundo natural e cultural aqueles que dão conta dos equipamentos, máquinas, seres vivos etc. A – Artefatos Tipo 1: aqueles específicos de atividades em laboratório. (A1) Tipo 2: aqueles relacionados às atividades de produção e serviço. (A2) Tipo 3: objetos do cotidiano. (A3) B - Artefatos + Homem Tipo 1: homem com artefato específico de atividades de laboratório. (B1) Tipo 2: homem com artefato específico de atividades de produção e serviço. (B2) Tipo 3: homem com objetos do cotidiano. (B3) C - Artefatos + parte do corpo humano Tipo 1: parte humana em experimento. (C1) Tipo 2: parte humana com artefato do tipo A2. (C2) Tipo 3: parte humana com artefato do tipo A3. (C3) D - Elementos com intervenção técnica Tipo 1: Imagens do mundo natural e cultural ou do homem em atividade (laboratório ou serviço) que passaram por tratamento pictórico para evidenciar aspectos que não podem ser visíveis sem tal procedimento. (D1) E - Elementos do mundo natural e cultural + esquemas da física Tipo 1: Artefatos do tipo A1 e esquemas da física. (E1) Tipo 2: Artefatos do tipo A2 e esquemas da física (E2) Tipo 3: Artefatos do tipo A3 e esquemas da física (E3) Tipo 4: Elementos da natureza e esquemas da física (E4) Tipo 5: Elementos da natureza, artefatos e esquemas da física (E5) Tipo 6: Elementos da natureza, artefatos com intervenção técnica e esquemas da física (E6) F - Tirinhas/desenhos Tipo 1: Tirinhas de personagens e de autoria, adotadas para ilustrar partes do conteúdo. (F1) Tipo 2: Tirinhas construídas especialmente para ilustrar o conteúdo. (F2) G – Imagens Ilustrativas Tipo 1: Imagens que não estão na cadeia argumentativa de uma demonstração conceitual e não ilustram experimento. (G) H – Esquemas da Física Tipo 1: Como esquemas da física, entendem-se os sinais, fórmulas e indicações de algum objeto, 95 fenômeno e processo que são traduzidos em linguagem matemática ou símbolos. (H) I – Elementos da natureza Tipo 1: Apenas elementos do mundo natural (I) Quadro 14: Composição da imagem 4.2.3.3 Nível de iconicidade Para analisar o nível de iconicidade, utilizamos a escala de Moles (1976) mencionada por Aparici, García Matilla e Valdivia Santiago (1992) e apresentada no Quadro 3 (Capítulo 2). Em nosso estudo, quando uma imagem era constituída por elementos de diferentes níveis de iconicidade (por exemplo, um desenho acompanhado de uma fotografia), classificamos a imagem no menor nível, porque entendemos que para compreendê-la totalmente, o leitor necessita ser capaz de decodificar mensagens em níveis maiores de abstração. 4.2.3.4 Denotação e conotação A mensagem verbal que acompanha a imagem pode ter a função de enfatizar a imagem ou produzir nova conotação (BARTHES, 1990). Relacionada à denotação da imagem, a primeira função diz respeito à “identificação” dos elementos que a compõem, isto é, a sua descrição. A produção de sentidos que não são evidentes na imagem pode ser feita por “interpretação” ou “relais”. Nos dois casos, o texto serve para orientar o leitor à compreensão pretendida pelo autor e/ou editor da imagem. O relais é mais comum nas imagens em movimento, por ser fundamental para a leitura de sequências de imagens que indicam uma passagem de tempo. Não é fácil classificar as finalidades do texto associado a uma imagem segundo essas categorias. Numa mesma leitura o texto tem a possibilidade de admitir mais de uma função, estabelecendo relações diversas com a imagem. Além disso, para cada leitor, a mensagem linguística pode exercer funções variadas. Para a compreensão de imagens presentes em livros didáticos de Física, as relações estabelecidas entre a mensagem linguística e a imagética serão diferentes para um professor de Física que leciona no nível superior, um estudante do curso de Física e um formando da educação básica. Talvez, por serem usadas constantemente, algumas imagens sejam tão evidentes para o professor, que nem precisem de texto para serem compreendidas. 96 4.2.4 Resultados da análise Examinamos apenas as imagens que faziam parte da discussão conceitual do conteúdo, pois as relacionadas aos exercícios e atividades experimentais têm objetivos diferentes das primeiras, necessitando de uma investigação particular. Também não fizeram parte da análise as imagens que não tinham uma finalidade didática diretamente relacionada à compreensão do conteúdo apresentado, como a da Figura 19 (ela indica apenas que o estudante pode recorrer a outro texto para um estudo mais aprofundado de um determinado conceito). Figura 19: Imagem não analisada Fonte: ALMEIDA, Maria Antonieta T. de. Introdução às Ciências Físicas: v. 3. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2004 Imagens que possuíam mais de um elemento em sua constituição foram consideradas como uma única imagem por conterem a mesma legenda. Aquelas imagens pertencentes a uma sequência, como as das histórias em quadrinhos, foram analisadas separadamente ao terem legendas diferentes. A princípio, poderíamos pensar que essas imagens, construídas como sequência, não pudessem ser lidas separadamente por fazerem parte de uma narrativa. Mas, a leitura de uma imagem isolada pode dar origem a uma história, por termos a capacidade de supor o que ocorreu antes da cena registrada na imagem e o que poderia acontecer após a cena. Da forma como procedemos à análise do material didático, consideramos que a leitura das mensagens verbais e imagéticas anteriores à apresentação e à referência à imagem no texto influenciariam em sua leitura. Não analisamos o caminho na direção oposta: ao lermos duas imagens, separadamente, como a leitura da segunda imagem poderia ajudar na compreensão da primeira imagem, isto é, o que mudaria na leitura da primeira imagem ao lermos a segunda. Apesar de Moles (1976), citado por Aparici, García Matilla e Valdivia Santiago 97 (1992), considerar como imagens toda forma de representação do real, atribuindo um nível de iconicidade a cada uma delas, não foram consideradas como imagens equações e fórmulas que não tivessem acompanhadas de ilustrações. As imagens que continham algum tipo de erro, seja no corpo do texto que faz referência a ela, na legenda ou dentro da própria imagem, não fizeram parte da análise final. Procedemos dessa forma considerando que qualquer erro desse tipo acarretaria uma leitura equivocada da imagem. É exibida na Figura 20 um exemplo de imagem com erro: ao discutir o procedimento para a soma de grandezas vetoriais, o Material A apresenta um vetor, como o representado abaixo. Na imagem existe um texto que indica que o ponto B é o início do vetor e, abaixo da imagem, o estudante é orientado a ligar o início deste vetor (na realidade, o ponto A) ao final de um segundo vetor para obter o vetor resultante. B A Figura 20: Exemplo de imagem com erro Figura 21: Imagem incompreensível Fonte: HARVARD PROJECT PHYSICS. Projeto Física. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1978. O texto ao lado da imagem exposta na Figura 21, faz referência ao movimento da hélice principal de um helicóptero. Entretanto, não foi possível identificar através da imagem, os elementos das realidades concreta e pensada que auxiliariam em sua compreensão. Por conta disso, a imagem também foi descartada da análise. Apesar de se referirem aos mesmos temas da Física e serem trabalhados no mesmo nível acadêmico, optamos por expor os resultados quantitativos da análise, separadamente, para cada material, por se tratarem de objetos com diferentes contextos de produção. Entretanto, essa distinção na forma de apresentar os resultados não deve ser vista como uma tentativa de avaliar qual material é mais adequado ao curso: nossa intenção não foi estabelecer 98 juízos de valor, mas considerar apenas alguns aspectos semióticos dos materiais. 4.2.4.1 Formas de produção das imagens Encontramos imagens produzidas através do desenho, fotografia, pintura, escultura e imagem rupestre. Apesar de haver a possibilidade de uma imagem presente num livro didático ser originada de televisão, vídeo e cinema, não encontramos referências a essas “tecnologias”. Verificamos a presença preponderante dos desenhos, seguidos das fotografias e das pinturas (Figura 22). Bruzzo (2004), refletindo sobre o papel da imagem em livros didáticos de Biologia, afirma que “Nesta área, assim como na educação em geral, há uma predileção particular pelo desenho” (BRUZZO, 2004, p.1362). Ela destaca como uma das vantagens do desenho em relação à fotografia o fato de que ele facilita a simplificação de partes complexas, isto é, com o desenho podemos apresentar apenas os elementos de uma imagem que são imprescindíveis para a discussão conceitual a que ele se destina (na Cinemática do ponto material, um automóvel pode ser representado por um ponto uma vez que sua forma, tamanho, cor e os dispositivos que o compõem não vão fazer diferença). Além disso, um desenho é capaz de mostrar elementos que necessitariam de várias fotografias, como as etapas de um procedimento experimental. No desenho também podem-se destacar aspectos da imagem, isolar detalhes importantes e retirar características que podem desviar a atenção do leitor ou levá-lo a uma compreensão equivocada do modelo científico representado na imagem. 140 120 100 80 Material A 60 Material B 40 20 0 Desenho Pintura Fotografia Desenho e f otografia Figura 22: Formas de produção das imagens A fotografia, por registrar uma cena que se deu em determinado lugar e em um momento específico com objetos e pessoas únicas, tem, em relação ao desenho, uma 99 capacidade menor de generalização. O que, numa fotografia, é uma maçã caindo de uma macieira num jardim do Brasil, num desenho pode se transformar num objeto abandonado de uma altura H próximo à superfície da Terra. Na Figura 23 são mostradas algumas imagens presentes no Material B e originadas de diferentes formas de produção. A primeira imagem (A) é proveniente da pintura “A Noite Estrelada” de Van Gogh, a segunda (B) se refere a uma fotografia do quilograma e do metro padrão e a última (C) contém uma fotografia seguida de um desenho que representam a colisão de uma bola com um taco de golfe. (A) (C) (B) Figura 23: Imagens com diferentes formas de produção Fonte: HARVARD PROJECT PHYSICS. Projeto Física. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1978. 4.2.4.2 Composição das imagens No Material A não encontramos imagens referentes às classificações A1, B1, C1, C2, C3, E1, E2, F1 e I do Quadro 14, enquanto no Material B não foram encontradas imagens das categorias B2, C2, C3, E1 e E2 (Figura 24). 100 50 40 30 Material A 20 Material B 10 0 A1 A2 A3 B1 B2 B3 C1 C2 C3 D1 E1 E2 E3 E4 E5 E6 F1 F2 G H I Figura 24: Composição das imagens Como era de se esperar, muitas imagens apresentam esquemas da Física (classificações E e H), entretanto, no Material A eles fazem parte de 82% das imagens (102) e, no Material B, 45% (56). Essa diferença talvez possa ser explicada pelo público alvo a que se destina os dois materiais: o primeiro foi criado pensando-se na iniciação do estudante no curso de graduação, enquanto o segundo tem por finalidade a formação do estudante de Ensino Médio. Na classificação E temos a inserção da realidade pensada (esquemas da Física) na realidade concreta (artefatos e elementos da natureza), enquanto a H representa apenas a realidade pensada. No Material A, as classificações E e H são responsáveis, respectivamente, por 48% e 34% das imagens. Embora no Material B os números sejam menores, a classificação E também ultrapassa a H: são, respectivamente, 26% e 19%. Esses valores talvez indiquem uma tentativa de relacionar os modelos físicos a situações concretas, mais próximas do cotidiano dos estudantes. (A) (B) Figura 25: Imagens com diferentes elementos em sua constituição Fonte: ALMEIDA, Maria Antonieta T. de. Introdução às Ciências Físicas: v. 3. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2004 A Figura 25 mostra duas imagens provenientes do Material A que apresentam esquemas 101 da Física. Os esquemas são vetores que, na primeira imagem (A), vêm acompanhados de elementos da natureza (a maçã) e artefatos com intervenção técnica (o desenho do elevador com a técnica da “visão transparente”), sendo categorizados com E6. A imagem (B) foi classificada como H por conter apenas vetores. 4.2.4.3 Nível de iconicidade das imagens Numa primeira análise, verificamos que quase todas as imagens possuíam alguma mensagem linguística em seu interior, sejam palavras, números, relações algébricas e letras nomeando eixos coordenados, indicando pontos a serem considerados ou designando grandezas vetoriais. Isso agruparia a maioria das imagens no nível de iconicidade 0. Sendo assim, achamos mais proveitoso para o exame das imagens, desconsiderar qualquer texto que as acompanhavam (com exceção das tabelas, que também foram consideradas como imagens, e classificadas no nível de iconicidade 0). 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Material A Material B 11 9 8 7 6 5 3 2 1 0 Figura 26: Iconicidade das imagens Como os materiais examinados são textos didáticos utilizados no ensino de Física para o nível superior, já era esperada uma predominância de imagens mais abstratas devido à necessidade de construção de modelos que generalizassem as situações estudadas. Através da Figura 26, observamos o predomínio dos níveis de iconicidade 1 (62%) e 2 (20%) no Material A e, 9 (35%), 2 (22%) e 1 (16%), no Material B, indicando que as imagens do Material A possuem maior grau de abstração que as do Material B, ou seja, o primeiro utiliza elementos que representam a realidade com nível de semelhança menor com a realidade concreta. Devido à presença dos esquemas da Física, já tínhamos a expectativa de um baixo grau de iconicidade, mas não esperávamos uma diferença tão grande entre os dois materiais (82% e 38% das imagens nos níveis 1 e 2 de iconicidade, respectivamente, nos materiais A e B) que, 102 novamente, talvez possa ser explicada pela origem dos mesmos. Os números também sugerem a escassez de passagens de níveis de maior iconicidade para os de maior abstração. De acordo com essa classificação, as imagens da Figura 27, por exemplo, possuem, respectivamente, os seguintes níveis de iconicidade: 9 (fotografia), 2 (combinação de elementos esquemáticos abstratos (reta e plano), 1 (esquema vetorial) e 0 (descrição em palavras e números). (A) (B) (C) (D) Figura 27: Imagens com diferentes níveis de iconicidade Fontes: (A) e (D) HARVARD PROJECT PHYSICS. Projeto Física. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1978. (B) e (C) ALMEIDA, Maria Antonieta T. de. Introdução às Ciências Físicas: v. 3. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2004 4.2.4.4 Denotação e conotação Para uma análise minuciosa da relação entre o texto e a imagem, separamos o texto de acordo com sua proximidade geográfica da imagem: texto dentro da imagem, legenda e texto que referencia a imagem na discussão conceitual. Primeiramente, examinamos apenas a mensagem imagética, isto é, admitindo que não houvesse texto que a acompanhasse. Em seguida, incluímos na observação a mensagem linguística apresentada dentro da imagem. Para 103 a análise da imagem com legenda reconhecemos que a leitura já era influenciada pelo texto inserido na mensagem imagética. Da mesma forma, o exame do texto que faz referência à ilustração levou em conta que a legenda e o texto na imagem já faziam parte de sua leitura. A análise das relações entre texto e imagem foi realizada partindo-se do princípio que as disciplinas foram elaboradas para atender estudantes que ingressaram no curso de Licenciatura em Física sem os conceitos científicos mínimos necessários para a permanência no curso. Sendo assim, pensamos na leitura realizada por um estudante que não conhecesse os conceitos apresentados pelos materiais. Conforme esses conceitos iam sendo trabalhados ao longo dos textos, foram tratados como já apreendidos. Das 250 imagens analisadas, 171 apresentavam alguma mensagem linguística em seu interior. As legendas estão presentes em 175 figuras. Todas as imagens do Material A são referenciadas no texto que apresenta a discussão conceitual, enquanto, no Material B, 99 possuem referências no texto seja explícita ou implicitamente. Figura 28: Relação texto-imagem Fonte: ALMEIDA, Maria Antonieta T. de. Introdução às Ciências Físicas: v. 3. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2004 Com o objetivo de exemplificar a forma como procedemos para a análise da relação entre texto e imagem, apresentamos na Figura 28 uma imagem proveniente do Material A com o texto que a acompanha. A mensagem verbal (v1 e v2), presente no interior da imagem, fornece uma interpretação para as duas setas: elas são vetores que representam a velocidade da bolinha. Além disso, exercem a função de relais por proporcionar uma ideia de passagem 104 do tempo (v1 e v2 são a velocidade da bolinha, respectivamente, antes e depois de tocar a raquete). Tanto a legenda como o texto que referencia a imagem atuam de modo a identificar elementos na imagem (bolinha e raquete) e a oferecer outros sentidos de conotação interpretação (“raquete lisa”, “refletida como um raio luminoso em um espelho plano”, “o módulo da sua velocidade não muda”). 4.2.4.4.1 Relação texto-imagem na mensagem verbal inserida na imagem Mensagens linguísticas estão presentes em 86% (107) e 52% (65) das imagens, respectivamente, nos materiais A e B. A relação dessas mensagens com a imagem está expressa na Figura 29. 100 90 80 70 60 50 Material A 40 Material B 30 20 10 0 Identificação Interpretação Relais Figura 29: Relação texto-imagem na imagem Nos dois materiais percebe-se uma frequência maior da relação de interpretação, indicando que o texto é mais utilizado para produzir novos sentidos de conotação, provavelmente, relacionados à inserção do estudante na linguagem necessária à compreensão de conceitos científicos. Em seguida, no Material A, o texto possui uma função maior de identificação, enquanto que, no Material B, essa função é de relais. Parece que no primeiro a identificação seja mais necessária por se tratarem de imagens menos icônicas e com uma presença superior de esquemas da Física. 4.2.4.4.2 Relação texto-imagem na legenda Legendas acompanham 98% (122) das imagens no Material A e 42% (53) das imagens no Material B. Notou-se uma presença maior do uso da mensagem verbal na interpretação (Figura 105 30), seguida da identificação e do relais nos dois materiais. Considerando-se que a quantidade de imagens com legenda no Material A é superior ao dobro da quantidade no Material B, a frequência da função de interpretação parece quase equiparada nos dois materiais. 120 100 80 60 Material A 40 Material B 20 0 Identificação Interpretação Relais Figura 30: Relação texto-imagem na legenda 4.2.4.4.3 Relação texto-imagem no texto de referência Enquanto, no Material A, a discussão conceitual presente no texto faz referências, explícitas ou implícitas, a todas as imagens, no Material B isso ocorre em 79% (99) das imagens. As referências explícitas dizem respeito às imagens que são indicadas no texto, como, por exemplo “observe a figura X”. Nas implícitas essa relação entre o texto e a imagem não é tão direta, mas na leitura é possível identificá-la. No Material A, embora a interpretação e a identificação sejam realizadas frequentemente nas imagens e nas legendas que as acompanham, observamos que isso se repete no texto de referência, com as frequências das duas relações muito próximas. Já o relais acontece mais no corpo do texto de referência (Figura 31). 120 100 80 60 Material A Material B 40 20 0 Identificação Interpretação Relais Figura 31: Relação texto-imagem no texto de referência 106 As funções de identificação e interpretação da mensagem verbal na relação textoimagem são mais marcantes, no Material B, no texto de referência, até porque a frequência da relação texto-imagem no texto de referência é maior que na legenda e no texto interior à imagem. Apesar da mensagem linguística ser menos presente no Material B, verificamos que nos dois materiais, a função do texto na interpretação da imagem parece ser mais necessária que as outras. 4.2.5 Algumas considerações sobre a análise do material didático De acordo com os critérios utilizados para a contagem das imagens dos materiais didáticos, percebemos um número maior de imagens no Material A em um número menor de páginas. Mas, ao descartarmos as imagens com erros, acabamos analisando o mesmo número de imagens para os dois materiais, que correspondem, em média, à presença de mais de uma imagem por página. Isso pode indicar a importância atribuída à imagem no ensino do conteúdo analisado e/ou à necessidade de seu uso para a compreensão dos conceitos físicos envolvidos. Por serem criados em épocas, com finalidades e para públicos distintos, era esperado encontrar diferenças nas análises dos materiais A e B. Mas, por se tratarem de textos relacionados ao ensino de Física, mais propriamente, de Mecânica, alguns aspectos em comum eles deveriam ter. Apesar do Material B ter sido desenvolvido, aproximadamente, 30 anos antes do Material A, encontramos no primeiro uma diversidade muito maior de imagens em relação às formas de produção. No segundo, elaborado já com as possibilidades da digitalização e impressão fornecidas pela informática, não foram encontradas referências a imagens provenientes de programas de simulações, por exemplo. A maioria das imagens é originada de desenhos. Entretanto, os meios utilizados na construção desses desenhos é bem diferente para cada material: no B, os desenhos, incluindo-se as tabelas e gráficos, são quase todos originados da ação manual de um lápis ou caneta sobre o papel, enquanto no A, eles são elaborados a partir de suporte informático. As fotografias tiveram uma forte influência no Material B, muitas delas sendo criadas pelos próprios produtores do material, fornecendo à discussão conceitual uma proximidade maior com o real concreto representado pela imagem, uma vez que o estudante observa objetos, pessoas e situações que estiveram na frente da câmera em determinado momento. 107 Nenhum dos materiais fez menção ao uso de imagens originadas de programas de televisão, vídeo e cinema, talvez por serem mais difíceis de serem produzidas pelos autores e por envolverem toda a problemática dos direitos autorais para sua utilização. Os elementos que compõem as imagens analisadas, por mais icônicos que pudessem ser, geralmente, apresentaram-se acompanhados de esquemas da Física. Isso parece indicar que não houve uma preocupação de inserir esses esquemas após uma exploração de aumento ou diminuição gradual no nível de abstração das representações. Mas, como as imagens foram contadas de acordo com suas legendas, seria necessário observar se elas foram construídas em forma de sequência, como as apresentadas nas figura 4 e 5 (Capítulo 2). Essas figuras, se fossem analisadas segundo nossos critérios, seriam classificadas como, desenho (forma de produção), elementos da natureza, artefatos e esquemas da física - E5 (elementos da imagem) e nível de iconicidade 1, por apresentarem vetores (não consideramos os textos e expressões algébricas à nossa análise). O fato do Material B ter sido produzido para atender estudantes do Ensino Médio pode ter influenciado na escolha da composição das imagens no que diz respeito à utilização de esquemas da Física que é bem menor que no Material A, direcionado a estudantes do Ensino Superior. Talvez sinta-se na educação básica uma necessidade maior de aproximar os conceitos da Física de elementos conhecidos dos estudantes (A2 e A3), de aproximá-los das atividades de laboratório (A1) e de mostrar que o trabalho do cientista é uma atividade humana (B1, B2 e B3). Isso ainda é capaz de explicar o nível de iconicidade das imagens: o Material B apresenta um número menor de imagens com alto grau de abstração, haja vista a quantidade de fotografias (iconicidade 9) encontradas, que tendem a trazer a discussão conceitual para eventos que fazem parte da realidade concreta. Por nossas experiências como professoras de Física, já esperávamos encontrar uma forte influência de imagens com funções simbólicas, isto é, cujo “significado de seus elementos só pode ser entendido com a ajuda do código de uma convenção cultural” (SANTAELLA e NÖTH, 2008, p.150), código esse compartilhado por determinados grupos. Além disso, como analisamos o conteúdo de Mecânica, tínhamos a expectativa de uma alta frequência de vetores, gráficos e tabelas, todos construídos socialmente para a representação de conceitos científicos com pouca ou nenhuma relação de semelhança com a realidade concreta representada.. Entretanto, observamos uma diferença significativa nos dois materiais: em relação à 108 presença de imagens com mais baixos níveis de iconicidade (níveis 2, 1 e 0): no Material A elas representam 82% das imagens analisadas, enquanto no Material B elas somam 47%. Os esquemas vetoriais (nível de iconicidade 1) são as imagens mais utilizadas (62%) no primeiro material, e as fotografias (iconicidade 9) são as mais frequentes no segundo (35%). Talvez por ser destinado ao Ensino Superior, o Material A dê uma importância maior às representações vetoriais que o Material B, construído para ser utilizado no Ensino Médio. Entretanto, como o Material A é destinado ao estudo a distância, pareceria interessante aproximar sua linguagem da realidade concreta do estudante, por ser menos frequente a interação com professores e/ou tutores que possam fazer essa relação entre o abstrato e o concreto. Mas isso não foi detectado em nossa análise das imagens. Uma análise mais minuciosa das imagens poderia nos informar se o material explora a passagem de representações mais icônicas para as mais abstratas ou vice-versa, o que talvez ajudasse na aquisição, por parte dos estudantes, do código necessário à leitura das imagens, com os quais não estejam habituados a trabalhar. Além disso, essa passagem poderia facilitar a compreensão dos aspectos da realidade concreta que não são considerados nos modelos construídos pela realidade pensada. Para confirmar essa suposição precisaríamos examinar isoladamente os elementos constituintes de cada imagem e seus níveis de iconicidade. Com respeito à denotação e conotação da imagem no Material A, os números parecem indicar que, para conduzir a leitura da mensagem imagética ao sentido preferencial, faz-se necessário a descrição dos seus elementos e a orientação para diferentes conotações através da mensagem linguística. E essa tarefa não é finalizada inserindo-se o texto na figura, ou apresentando-se uma legenda, ela continua no corpo do texto que circunda a imagem. A frequência da função de identificação do texto verbal nesse material é maior, provavelmente, por conter mais imagens com alto grau de abstração do que o Material B. A frequência da mensagem linguística no conteúdo das imagens foi grande nos dois materiais, embora a do curso semipresencial exceda de forma considerável a do curso presencial (86% no A e 52% no B). A necessidade maior do texto nas imagens do Material A parece ser devido ao baixo nível de iconicidade das mesmas, demandando do texto a função de ajudar na identificação dos elementos que compõem a imagem. No Material B, como temos uma frequência maior de imagens com alto nível de iconicidade, não se exige tanto do texto para o reconhecimento dos elementos da imagem. Esse reconhecimento é realizado mais através da legenda e do texto que referencia as imagens. 109 Os dados das Figuras 29, 30 e 31 apontam para a importância da mensagem verbal na interpretação da mensagem imagética, que ocorre com uma frequência muito maior que a de relais e não se finda com o texto dentro da imagem, mas é necessário complementá-la com as mensagens da legenda e do texto de referência. Podemos perceber a presença da função de relais que o texto exerce na imagem, por se tratar de um conteúdo que se refere, várias vezes, à observação de conceitos relacionados à passagem do tempo, principalmente porque diz respeito ao conteúdo que aborda o assunto sobre movimento. No material B, a mensagem linguística no interior da imagem é quase que exclusivamente utilizada para produzir novos sentidos de conotação que supõe-se que a imagem sozinha não seja capaz de transmitir. E esse texto também não é capaz de esgotar esses novos sentidos, sendo necessário utilizar as legendas e o texto de apresentação do conteúdo para complementá-los. A percepção dos elementos que constituem a imagem é feita pelo texto na função de identificação da imagem com mais frequência no texto de referência. Apesar das limitações do estudo, o exame do material sugere a necessidade de uma alfabetização para a leitura de imagens utilizadas no ensino de Física, referente à apropriação dos códigos culturais requeridos para a compreensão dos conceitos científicos. O fato do material analisado ser utilizado na formação de futuros professores torna essa alfabetização ainda mais importante, pois se trata de prepará-los para trabalhar com a linguagem científica expressa em imagens nos níveis de ensino Fundamental e Médio, o que talvez, possibilitaria uma melhor compreensão dos conceitos físicos, tão temidos e não entendidos por grande parte dos estudantes. 4.3 PADRÕES DE LEITURA DOS ESTUDANTES Com a finalidade de perceber alguns aspectos da leitura de imagens realizada por estudantes, apresentamos 11 questões (Figuras 32, 33, 34 e 35) a 25 licenciandos em Física da UFRJ, no mês de setembro de 2010. Pertencentes às modalidades presencial (21 estudantes) e semipresencial (4 estudantes) do curso, estas oficinas aconteceram após uma aula do primeiro período do curso presencial e após atividades de laboratório de Física do 2º e 3º períodos do curso semipresencial. Os professores da disciplina Introdução à Física e o tutor coordenador da Física do polo Campo Grande, apresentaram a autora deste estudo como professora de Física, 110 licenciada pela UFRJ e que precisava de suas respostas a algumas perguntas, para conduzir sua pesquisa de doutorado na mesma Universidade. As atividades foram realizadas pela autora sem a presença de professores e tutores dos dois cursos. Os estudantes foram informados que a atividade não consistia de uma avaliação da disciplina, sendo orientados a não se identificar nas folhas de respostas. Com exceção das questões 10 e 11, distribuídas impressas aos estudantes, as demais foram projetadas na parede da sala de aula, sucessivamente. Eles responderam individualmente de forma escrita, tendo, aproximadamente, 3 minutos para responder cada questão. Os estudantes puderam fazer perguntas ao longo da apresentação das questões para esclarecer suas dúvidas quanto ao enunciado das mesmas. Antes dessas oficinas com os licenciandos, para examinarmos se a forma de elaboração das questões estava clara e coerente com o que desejávamos observar das leituras dos estudantes, aplicamos as questões a uma turma do terceiro ano do ensino médio da Unidade de Ensino Descentralizada de Nova Iguaçu do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ), onde a autora desse estudo leciona. Conduzimos essa oficina em um tempo de aula de Física cedido pela professora da turma, que esteve presente durante sua execução. Vinte e nove estudantes participaram da oficina e, a partir de suas respostas e observações ao longo da oficina, fizemos algumas alterações nas questões. Com exceção das imagens das questões 3 e 5, as demais foram escolhidas por possuírem aspectos relacionados ao conteúdo da Mecânica. Além disso, procuramos inserir imagens parecidas com aquelas trabalhadas nos materiais didáticos e que contivessem diferentes elementos composicionais e fossem originadas de formas de produção distintas (fotografia, desenho, pintura). As imagens das questões 3 e 5, provenientes, respectivamente, dos campos da arte e propaganda, foram mostradas buscando-se trazer leituras de áreas do conhecimento distintas da formação acadêmica dos estudantes. As questões 1, 2 , 3, 4, 5, 6 e 7, apresentadas à turma do Ensino Médio, possuíam os seguintes enunciados: “Explique esta imagem”, “Interprete esta imagem”, “O que você vê nesta imagem?” e “O que você lê nesta imagem?”. Optamos por manter apenas o primeiro porque notamos que: (a) os estudantes não associavam o termo “leitura” à imagem (para eles, ler estava relacionado apenas à mensagem verbal); e, (b) “interpretar” estimulava uma atitude de conotação da mensagem imagética, enquanto “o que você vê” fazia-os permanecer no nível 111 da denotação. 1) Explique esta imagem. 2) Explique esta imagem. Fonte: <http://www.correiodopovoal.com.br/v2/article/curiosidades/11016/> Acesso em: 01 ago. 2010 Fonte: <http://www.mspc.eng.br>. Acesso em: 01 ago. 2010 3) Explique esta imagem. 4) Explique esta imagem. Fonte: Fonte: YOUNG, Hugh D. e FREEDMAN, Roger A. <http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT380 Física I: Mecânica. 12ª edição. São Paulo: Pearson Addison Wesley, 2008 717-1653,00.html>. Acesso em: 01 ago. 2010 5) Explique esta imagem. 6) Explique esta imagem. Fonte: REVISTA GALILEU. São Paulo: Editora Globo, n. 225, abr. 2010. 7) Explique esta imagem Conservando um objeto em movimento com velocidade uniforme. Fonte: <http://www.ultimosegundo.ig.com.br>. Acesso em: 01 ago. 2010 Fonte: ALMEIDA, Maria Antonieta T. de. Introdução às Ciências Físicas. Vol. 3. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2004 Figura 32: Questões apresentadas aos estudantes (questões 1 a 7) 112 Substituímos três imagens (questões 3, 7 e 11B) por outras cuja leitura era similar, devido à falta de nitidez na projeção (3 e 7) e na impressão (11B). A princípio havíamos pensado, posteriormente, em entrevistar alguns licenciandos acerca das escolhas realizadas nas questões 10 e 11, mas percebemos que seria muito difícil conseguir reuni-los novamente no final de período letivo devido às suas atividades na Universidade. Por isso, inserimos nas duas últimas questões a solicitação para justificar a escolha realizada (o que não foi feito na oficina do Ensino Médio). Com essas modificações, as questões respondidas pelos licenciandos ficaram da forma apresentada nas Figuras 32, 33, 34 e 35, com exceção da presença das fontes de onde retiramos as imagens, que não foram apresentadas aos estudantes. Diferentemente do que fizemos na análise do material didático, apresentamos os resultados das leituras dos estudantes não distinguindo a amostra da modalidade presencial da semipresencial, uma vez que, uma análise inicial de suas leituras não indicou diferenças significativas. Descartamos da análise as respostas às questões 8 e 9, pois, com as leituras realizadas pelo licenciandos, observamos que nessas questões necessitaríamos examinar aspectos que não nos propomos a analisar nesse estudo (a habilidade dos estudantes em inserir informações e escrever legendas e se os conceitos físicos representados estariam corretos). 8) Insira informações (texto, números, 9) Desenhe uma imagem que represente as funções, equações etc) na imagem a seguir e informações contidas no texto a seguir. escreva uma legenda que auxiliem em sua leitura. “Sobre uma mesa, inicialmente em repouso sobre uma superfície horizontal, age uma força que a mantém com aceleração constante”. Fonte: <http://www.efisica.if.usp.br>. Acesso em: 01 ago. 2010 Figura 33: Questões apresentadas aos estudantes (questões 8 e 9) 113 10) “Todos os objetos permanecem no seu estado de repouso ou de movimento uniforme ao longo de uma linha reta, a não ser que seja exercida sobre eles a ação de uma força resultante não nula”. Das 10 imagens a seguir, qual você escolheria para representar o texto acima? Escolha apenas uma. Justifique sua escolha. 1) 6) Fonte: <http://www.educar.sc.usp.br>. Acesso em: 11 ago. 2010 Fonte: <http://www.acruzeagraca.blogspot.com>. Acesso em: 11 ago. 2010 2) 7) Fonte: <http://www.sete-online.nireblog.com>. Acesso em: 11 ago. 2010 Fonte: <http://www.oglobo.globo.com>. Acesso em: 11 ago. 2010 3) 8) Fonte: <http://www.sempretops.com>. Acesso em: 11 ago. Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. 2010 Acesso em: 11 ago. 2010 4) 9) Fonte: <http:www.aprovadonovestibular.com>. Acesso em: Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 11 ago. 2010 11 ago. 2010 5) 10) Fonte: <http://www.coladaweb.com>. Acesso em: 11 ago. 2010 Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 11 ago. 2010 Figura 34: Questões apresentadas aos estudantes (Questão 10) 114 11) De posse das 8 imagens a seguir, qual seria a sequência de imagens que você escolheria para construir uma aula cujo tema fosse “Lançamento de Projéteis”? Você não precisa escolher as 8 figuras. Justifique a sequência escolhida. A) E) Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 11 ago. Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 2010 11 ago. 2010 B) F) Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 11 ago. Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 2010 11 ago. 2010 C) G) Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 11 ago. Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 2010 11 ago. 2010 D) H) Fonte: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 11 ago. Fonte: <http://www.educar.sc.usp.br>. Acesso em: 2010 11 ago. 2010 Figura 35: Questões apresentadas aos estudantes (Questão 11) 115 4.3.1 Discussão dos resultados Como as imagens tratavam de representações originadas de diferentes meios de comunicação e para fins diversos, a seguir, as respostas dos estudantes serão examinadas separadamente por questão. A análise das questões 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 se baseou na proposta de Barthes (1990) acerca das mensagens denotada e conotada apresentadas por uma imagem, tendo em vista as funções exercidas pela mensagem linguística na mensagem imagética, ou seja, se o texto verbal produzido pelos estudantes atuava como fixação (identificação e interpretação) e/ou relais (Figura 36). Além disso, o exame das respostas levou em conta se os estudantes leram as imagens utilizando elementos próprios do conteúdo escolar da Física ou não (Quadro 15). Em nenhum momento houve a preocupação com a compreensão correta dos conceitos trabalhados nessa disciplina. 30 25 20 15 Identificação Interpretação 10 Relais 5 0 1 2 3 4 5 6 7 Questão Figura 36: Relação texto-imagem Questão Identificação Interpretação Relais 1 2 3 4 5 6 7 Sem Física 18 0 14 11 22 14 1 Com Física 7 23 0 14 0 10 22 Sem Física 7 1 24 0 25 10 1 Com Física 9 23 0 20 0 14 21 Sem Física 0 0 0 4 0 0 4 Com Física 0 0 0 10 0 0 9 Quadro 15: Respostas dos estudantes 116 Apesar das categorias utilizadas para a análise terem sido originadas da reflexão acerca da função que a mensagem verbal que acompanha uma imagem exerce em sua leitura (BARTHES, 1990), consideramos que ao produzir um texto sobre as imagens, os estudantes estavam realizando a leitura das mesmas, podendo esta se limitar ao nível do reconhecimento (identificação) ou atingir o nível da compreensão (interpretação/relais) da mensagem (BARTHES; COMPAGNON, 1997). Ao citarmos textos produzidos pelos estudantes, eles foram mencionados como L1, L2,..., L25 (licenciando 1, 2,..., 25). 4.3.1.1 Questão 1 A imagem desta questão é uma fotografia de uma cena do cotidiano retirada de um jornal eletrônico. Percebemos que todos os estudantes identificaram alguns elementos presentes na imagem, a maioria (18), sem utilizar a linguagem própria da Física (pessoas, automóvel, pista, neve, casas, árvores). Apenas 7 mencionaram a “aplicação de forças” sobre o mesmo, o que indica uma identificação com uma grandeza física. Dezesseis estudantes chegaram ao nível da compreensão da imagem, interpretando a situação mostrada na fotografia. Os que utilizaram aspectos da Física citaram a ação do atrito (5), a temperatura (2) e a segunda lei de Newton (2), mostrando uma tentativa de, pelo menos, aproximar a realidade concreta representada na imagem com a realidade pensada dos conceitos científicos. Isso parece claro na resposta de L8, que apenas interpretou a imagem transformando-a em algo semelhante à figura a seguir: F1 FG F2 Figura 37: Resposta de L8 à Questão 1 Em sua resposta, L8 substituiu as pessoas e a neve pelo que ele compreendeu como as forças que elas faziam no carro e, este, por um retângulo, abstraindo aspectos concretos de sua forma original, podendo ser pensado como qualquer corpo. Ele ainda expressou em sua resposta que: “Quando F1 + F2 > FG ocorre o movimento do corpo”. Isto é, L8 não apenas aproximou o real concreto do pensado, mas fez o modelo científico tomar o lugar da situação cotidiana. Os demais tentaram explicar o estado em que se encontrava o carro (4), as possíveis 117 justificativas para sua imobilidade (2) e leram a atitude das pessoas como um gesto de solidariedade (1). L19 indicou que a imagem não fornecia detalhes sobre a situação do carro: “Vemos na imagem um carro sobre a neve, e que duas pessoas empurram o automóvel. Não podemos precisar se o carro está funcionando, quebrado” (L19, grifos nossos). A presença da leitura com códigos da cultura científica da disciplina escolar Física, tanto no nível do reconhecimento quanto da compreensão, talvez possa ser explicada por esta ter sido a primeira imagem apresentada na atividade, desenvolvida no ambiente da universidade, apresentada por professores e tutores de Física e conduzida pela autora (também professora de Física). Assim, provavelmente, alguns estudantes entenderam que as respostas esperadas deveriam estar relacionadas ao conteúdo da Física. 4.3.1.2 Questão 2 Utilizada na Internet para a discussão de conceitos básicos da Mecânica, a segunda imagem é uma construção social que faz uso de símbolos (vetores) referentes ao domínio científico. Como os estudantes já haviam estudado as Leis de Newton no curso universitário e conheciam a mensagem verbal que acompanha a figura (F1, F2, F3), consideramos que, ao utilizarem termos como vetores e forças para nomear os elementos que compõem essa imagem, eles estariam fazendo uma leitura no nível do reconhecimento (identificação) empregando termos da Física. A compreensão da imagem (interpretação/relais) se daria quando observassem uma relação entre os vetores (soma de vetores, posição inicial e final de deslocamentos). Por conter elementos que fazem parte do seu contexto acadêmico, 23 estudantes foram capazes de identificar e interpretar essa imagem fazendo uso de termos da Física. Apenas um estudante compreendeu a imagem sem mencionar grandezas físicas: “Duas possibilidades de caminho para chegar em um ponto em comum, sendo que um é mais rápido que o outro” (L13). Ele foi o único que expressou uma tentativa de utilizar os conceitos científicos representados na imagem em alguma situação concreta, trazendo a ideia de um “caminho” a percorrer para se “chegar em um ponto”. O texto produzido por L13, apesar de não conter termos próprios da Física, possui, implicitamente, a noção de “deslocamentos”, grandeza física trabalhada na Mecânica. Com exceção de L13, as leituras se limitaram à realidade pensada. Os estudantes entenderam o contexto de produção da imagem como um modelo da ciência Física e 118 realizaram sua identificação e interpretação sem relacioná-la à realidade concreta. 4.3.1.3 Questão 3 Essa questão contém o detalhe da pintura de Hans Melling (1472) intitulada “Juízo Final”, acessado em uma revista eletrônica. Como ela foi apresentada após imagens originadas do cotidiano (Questão 1) e da ciência Física (Questão 2), passíveis de leituras relacionadas ao contexto acadêmico de realização da leitura, alguns estudantes, tanto do Ensino Médio quanto da Graduação, tiveram dúvidas quanto às respostas a essa questão: eles não percebiam como poderiam inserir elementos da Física na sua leitura e perguntaram se queríamos que eles “respondessem de acordo com a Física”. A orientação dada foi a de que eles deveriam simplesmente explicar o que viam. Um estudante não respondeu essa questão. Todos que responderam (24) conseguiram atingir o nível da compreensão. Nenhuma identificação e interpretação utilizou elementos da Física. Como a imagem é uma produção relacionada à religião cristã, que faz parte do meio social em que os estudantes se encontram, consideramos aspectos do reconhecimento da imagem, além da identificação dos elementos como pessoas, armadura, lança e trombetas, a nomeação de Jesus (Deus), anjos e demônios e a menção da imagem como relacionada à religião, igreja e ao cristianismo. Diferentemente da primeira questão, todos produziram um texto que interpretava a imagem apresentada, fazendo alusão à cena que dividia dois mundos: “A imagem retrata o céu e o inferno, onde no céu temos pessoas elegantes, creio que devem ser oriundos da classe economicamente favorecida da época. Já no inferno temos os pobres da época. Enfim, acho que a imagem retrata que os nobres, clérigos, artistas (desde que não fossem de encontro à igreja) iam para o céu e os pobres, ou aqueles que fossem contra a igreja iriam para o inferno” (L2); “Seres, supostamente divinos, mostrando-se superiores aos humanos” (L10); “Mostra Deus como o Sol iluminando os seres e o demônio como a noite. E os seres humanos como servos dos dois lados” (L14); “Apocalipse, […], buscando o contraste entre o bem e o mal, vida e morte, paz e sofrimento...” (L17) “Mostra que há um paralelo entre o céu e o inferno...” (L24) Apenas um estudante não fez alusão a aspectos da religião cristã: 119 “Uma pintura em que destaca-se o mais sábio, e os que não tem intelecto não tem nenhuma chance no mundo de hoje. Pois há muita competição, então, você tem que ser o melhor, mais dedicado, mais esforçado e o mais capaz na sua área; ou pode ser encarado como um juri, onde o de cima irá ter mais competência que o de baixo, pois o de baixo prova pouca capacidade ao contrário do de cima” (L18). Talvez sua explicação da imagem manifeste uma necessidade de referir-se às atividades acadêmicas e/ou profissionais em que está inserido, como uma tentativa de aproximá-la da área científica, uma vez que, parece muito difícil utilizar elementos da Física ou do cotidiano em sua leitura. Expressões como “intelecto”, “competição”, “dedicado”, “esforçado”, “mais capaz na sua área” e “competência” são próprias dessas atividades. Percebemos que os estudantes compreenderam que a imagem era própria das Artes, não denotando-a e conotando-a segundo leituras científicas. 4.3.1.4 Questão 4 Como a imagem dessa questão (uma fotografia estroboscópica retirada de um livro de Física) está presente nos materiais didáticos utilizados pelos estudantes no primeiro período de seus cursos, admitimos que nomear os objetos e fenômenos representados estava no nível do reconhecimento uma vez que esperava-se que os estudantes, anteriormente, tivessem lido essa imagem. Por exemplo, a resposta de L23: “Um fundo preto, linhas uma fotografia e uma bola sendo [sic] em queda-livre, e a mesma bola em outro sentido, fazendo uma parábola” (grifos nossos), foi classificada apenas como identificação com elementos da Física. Todos os estudantes (25) apresentaram em suas respostas aspectos da denotação, mas 11 não utilizaram, explicitamente, elementos da Física nessa identificação. Os que reconheceram a imagem com aspectos da Física (14), mencionaram a altura de queda, a queda livre, os objetos como projéteis, a trajetória do movimento e a fotografia estroboscópica. Os que leram a imagem no nível da compreensão (20) se reportaram a aspectos da Física: entenderam a imagem originada de uma experiência, citaram a velocidade e aceleração e disseram que a gravidade é constante. Diferentemente das forças referentes às questões 1 e 2, a menção da aplicação de forças foi considerada como interpretação por se tratarem de forças de ação à distância. Na Questão 1, as forças de contato entre as pessoas e o carro eram mais fáceis de reconhecer; na Questão 2, os vetores estavam nomeados pela letra F, indicando, para aqueles estudantes, se tratarem de forças. Por isso nessas questões, a citação de forças foi 120 considerada como identificação. A conotação da imagem por meio do relais (o registro da passagem do tempo) foi realizada por 14 estudantes, que mencionaram as “etapas de queda de uma bolinha” (4) e a verificação de que “elas levam o mesmo tempo para chegarem ao chão” (10). L17 admitiu que os dois projéteis tinham o mesmo peso, talvez por, de acordo com ele, chegarem juntos ao chão. Vinte e quatro estudantes utilizaram elementos da Física para explicar a imagem, seja na identificação, interpretação ou relais, buscando relacionar a realidade concreta representada na imagem com a realidade pensada que, provavelmente, originou-a, pois a fotografia parece ter sido produzida para exemplificar o modelo científico elaborado no estudo do movimento de projéteis, isto é, foi uma tentativa de aproximar o real pensado do real concreto por meio de um experimento. Apenas um estudante não utilizou elementos da Física em sua resposta: “A imagem mostra a diferença na queda de duas bolas uma lançada verticalmente e a outra horizontalmente” (L14). À primeira vista, a ausência de elementos da Física poderia indicar uma leitura apenas relacionada à realidade concreta. Entretanto, a referência à “diferença na queda” pode indicar a presença de conceitos científicos na leitura da imagem. Ao reconhecerem a imagem como do âmbito do ensino da Física, sua conotação (interpretação e relais) parece ter sido orientada para a realidade pensada. A tendência a aproximar sua leitura da realidade concreta limitou-se aos aspectos do experimento, ou seja, ao modelo que ele representa de eventos do cotidiano. 4.3.1.5 Questão 5 A imagem dessa questão apresenta a fotografia da propaganda de um monitor retirada de uma revista impressa. Em nenhum nível de leitura foram citados elementos da Física. Apenas 1 estudante compreendeu a mensagem preferencial da imagem que era a de fazer a propaganda do monitor enfatizando a variação de altura através da remoção do pedestal, indicando que ele não utilizou o texto que acompanhava a imagem para sua leitura. Os demais foram influenciados pela mensagem linguística. Na identificação os estudantes (22) mencionaram o “chefe”, a pessoa na frente do computador, o atraso ou a antecipação de 10 minutos. No nível da compreensão a imagem foi lida como se referindo ao funcionário de uma empresa tentando se esconder ou aparecer por conta de sentimentos de 121 orgulho ou vergonha devido a uma atitude correta ou errada no trabalho. Também houve quem entendesse que em uma das situações a pessoa estava se divertindo e na outra estava trabalhando: “A figura apresenta um rapaz em duas condições. A primeira ele esta se divertindo no computador provavelmente fazendo o que ele gosta antes de aparecer o chefe e a segunda ele aparenta está envolvido com a tarefa que supostamente o chefe mandou ele fazer. Algo que podemos notar também é a diferença de postura, na primeira figura ele se apresenta relaxado e já na segunda ele apresenta-se mais ereto” (L5) L4 interpretou a imagem, simplesmente, como “transparência”(L4). Parece que o texto serviu como condução para a leitura da imagem para a maioria dos estudantes, abrindo caminho para novos sentidos de conotação que sem ele, provavelmente, não seriam possíveis. Tanto o texto quanto a imagem ajudam a construir uma narrativa: a leitura da primeira situação influencia na leitura da segunda e vice-versa. Talvez fosse interessante, apresentar a imagem sem o texto verbal para possibilitar uma análise mais profunda sobre a influência da mensagem linguística sobre a imagética. Durante a oficina, percebemos que essa imagem foi lida como uma situação cômica: foi a única questão em que os estudantes riram ao ver a imagem. Mesmo sem ter a clareza do objetivo final da imagem, que era promover a venda do monitor, provavelmente, eles notaram que ela se referia a uma propaganda. Por entenderem que o contexto de produção e leitura não faziam parte do meio científico, em sua identificação e interpretação não se reportaram a nenhuma realidade pensada pela ciência. 4.3.1.6 Questão 6 Essa questão apresenta uma imagem muito parecida com a imagem da Questão 1. O objetivo era tentar perceber o papel da legenda na leitura da mesma, entretanto, apenas 6 estudantes citaram termos presentes na legenda (velocidade, velocidade uniforme, velocidade constante) para explicar a imagem, diferentemente da Questão 5, em que 24 estudantes usaram a mensagem linguística em suas respostas. Entretanto, comparando-se as questões 1 e 6, verificamos que na Questão 6 mais estudantes utilizaram aspectos da Física para identificar e interpretar a imagem. Isso pode indicar uma influência da mensagem verbal na leitura da mensagem imagética. A identificação sem aspectos próprios da Física se deu em 14 respostas, onde os 122 estudantes explicaram a imagem citando pessoas que empurravam um carro na água proveniente da chuva. Dez estudantes mencionaram na denotação da imagem as forças que os homens e a água exerciam no carro e sua velocidade constante. Os estudantes conotaram a imagem sem utilizar elementos da Física ao se referirem à ação da água sobre o carro (facilitar ou dificultar sua mobilidade), à tentativa das pessoas de impedir o arraste do carro pela água e ao estado do carro, como no texto a seguir:“Temos um carro em uma enchente em que 04 pessoas empurram o carro. Existem também uma correnteza na água, mas não sabemos precisar se ela está a favor ou contra o movimento exercido pelas pessoas” (L19). A compreensão fazendo uso de termos da Física se deu ao lerem a imagem inserindo a ação da força de atrito, o sentido ou módulo da força da água, a mudança de estado da água devido à temperatura, aceleração nula do carro e a relação entre forças que atuavam sobre ele. Embora termos presentes na legenda da imagem só apareçam em 6 leituras no nível do reconhecimento, percebemos no nível da compreensão, em 12 respostas, uma tentativa de explicar o movimento uniforme do carro expresso na legenda, como, por exemplo, a resposta de L24: “Quatro pessoas empurram o carro, com a mesma força indo em sentido contrário a força da água” (L24,grifos nossos). Ainda que, em muitas explicações, os conceitos físicos tenham sido empregados de forma inadequada, assim como na Questão 1, houve uma preocupação em inserir o real pensado na leitura do real concreto. L8 substitui a realidade concreta por termos da Física (como ele já havia feito na Questão 1), dizendo que: “A velocidade de um corpo se torna uniforme quando não há aceleração, no caso da figura isso era [sic] ocorrer quando a soma das forças que atuam sobre o carro for zero logo: FR = 0: ou seja: 0 = m.a, como m é constante a a = 0” (L8). A única referência que L8 faz da realidade concreta expressa na imagem é a presença do carro. Parece que o texto verbal ajudou a direcionar a leitura da imagem na inserção de elementos da realidade pensada na realidade concreta exposta na imagem. Mesmo assim, muitos estudantes não associaram essas duas realidade, talvez por terem entendido que a origem da imagem era cotidiana e não do contexto do ensino da Física. 4.3.1.7 Questão 7 A imagem presente nessa questão é utilizada no Material A na abordagem da Primeira 123 Lei de Newton. Além de nomear os elementos que compõem a imagem (bloco, mesa, mão, pessoa que empurra um cubo), foi considerada leitura no nível da denotação a repetição de termos apresentados na imagem já conhecidos dos estudantes (movimento retilíneo uniforme, velocidade, força, força nula). Apenas um estudante não usou nenhum desses termos na leitura da imagem, interpretando a mensagem da imagem como: “Inércia” (L10). Outro não apresentou termos próprios da Física (não mencionou grandezas físicas), embora sua resposta estivesse totalmente impregnada da linguagem usada no ensino da Mecânica: “Como não existe nada impedindo o movimento da caixa, ela continua a mover-se indefinidamente” (L22). A interpretação com elementos da Física se deu mencionando-se a 1ª e a 2ª leis de Newton, a força resultante nula sobre o bloco, sua aceleração nula, a velocidade constante, a falta de atrito, a inércia, o impulso imprimido pela força e a figura se tratar de um experimento físico. A percepção da passagem do tempo (relais) foi realizada por 13 estudantes, dos quais 9 se referiram a termos da Física, como o impulso inicial, a velocidade não variando no tempo, o bloco partir do repouso e o aumento da distância com o tempo. Já os 4 estudantes que não fizeram essa relação da passagem do tempo com elementos da Física citaram o fato do bloco estar “andando” em linha reta, se “mover” indefinidamente, ter uma “tendência” a não “parar”. A imagem, apesar de representar elementos concretos (a mão e a caixa), também contém conceitos do real pensado: a expressão algébrica (F = 0), os vetores (F e v) e a mensagem verbal (movimento e movimento retilíneo uniforme). Tanto na identificação quanto na interpretação, sua leitura foi a que mais apresentou aspectos da Física, com exceção da Questão 2, cuja imagem diz respeito apenas à realidade pensada. L20, por exemplo, leu a imagem com termos da Física na identificação, interpretação e relais: “Uma força F é aplicada sobre um bloco em uma superfície plana e em um certo instante, para de ser exercida a força sobre o bloco e este continua em movimento retilíneo uniforme, o que sugere que não há força de atrito entre o bloco e a superfície e a força resultante é nula” (L20). Nas respostas dos estudantes, tanto na denotação quanto na conotação, está clara a percepção de que a imagem se refere à realidade pensada, embora eles utilizem elementos da realidade concreta em sua leitura, como, por exemplo, fez L25: “Há uma caixa sendo 124 empurrada por uma pessoa em uma pequena fração de tempo. Esta caixa adquire uma velocidade constante, e entrando em estado de inércia, movimenta-se indefinidamente com essa mesma velocidade. Trata-se de uma situação ideal, onde não há atrito” (grifos nossos). L25 foi capaz de diferenciar a realidade concreta do modelo científico, sua leitura levou em consideração o fato de se tratar de uma situação idealizada (pensada), válida, portanto, em determinado contexto (na ausência de atrito). 4.3.1.8 Questão 10 Diferentemente das questões anteriores, a explicação dos estudantes não se referia apenas à leitura da imagem, mas à sua escolha para representar o texto apresentado que enunciava a Primeira Lei de Newton. A Figura 38 mostra a quantidade de estudantes que escolheu cada uma das imagens. 12 10 8 6 Estudantes 4 2 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Imagem Figura 38: Análise da Questão 10 A imagem 3 foi selecionada para representar o texto por 11 estudantes. Apesar de se referir à representação de um instante, 9 estudantes criaram uma estória (interpretaram) baseados na imagem para explicar sua escolha, como, por exemplo, na resposta de L15: “O homem estava em movimento com o cavalo, quando o cavalo para, o corpo do homem que continuou em movimento é lançado para frente”. Em todas as estórias é imaginada uma cena anterior à ilustrada pela figura, em que o menino estava sobre o cavalo em movimento. No instante registrado na imagem, o cavalo para e o menino continua em movimento. Essa noção de passagem de tempo (relais) expressa pelo antes e depois, pelo movimento e sua mudança, pode ter origem no texto que enuncia a Primeira Lei de Newton ou na própria imagem. Seria interessante se pudéssemos saber qual seria a leitura da imagem realizada pelos estudantes sem a presença do texto verbal inicial ao qual ela deveria representar, isto é, até que ponto a 125 mensagem verbal influenciou na leitura do relais. Dois estudantes selecionaram a imagem por associar o conteúdo expresso na Primeira Lei de Newton à uma situação cômica que “prende a atenção do aluno” (L8). Dos 5 estudantes que escolheram a imagem 1, 3 utilizaram uma explicação semelhante às estórias criadas com a imagem 3. Eles leram a imagem como sendo passageiros num ônibus em duas situações consecutivas: primeiramente, o ônibus em movimento retilíneo uniforme (passageiros em repouso em relação ao ônibus), e, em seguida, o ônibus freando (passageiros lançados para frente). Nessa imagem, o movimento inicial, apenas subtendido na imagem 3, é expresso juntamente com o movimento posterior, como uma estória em quadrinhos. Entretanto, L19 parece ter percebido o ônibus em movimento, mas não a mudança em seu movimento: “Os passageiros estão em repouso em relação ao ônibus mas em movimento em relação ao passageiro na rua”(L19). Já L13, diz ter selecionado a imagem 1, mas sua justificativa, provavelmente, refere-se à imagem da Questão 1: “Pois a força que as pessoas exercem não será capaz de vencer a massa do carro mais a neve, anulando as forças” (L13). A possibilidade da pessoa ser lançada para frente foi mencionada nas justificativas de escolha da imagem 7 por 3 estudantes. Dois deles admitiram a pessoa em repouso dentro do carro em movimento que, ao ser freado, faria a pessoa tender a ir para frente, explicando o uso do cinto de segurança. As imagens 2, 4, 6, 8, 9 e 10 foram selecionadas, cada uma, por 1 estudante. L5, na escolha da imagem 9, admitiu que o astronauta nela representado estava em repouso, por não haver força alguma atuando nele, mas que ele entraria em movimento retilíneo uniforme, caso surgisse uma força sobre ele. A imagem 2 foi a opção de L6, mas sua justificativa não faz sentido em relação à mensagem do texto inicial nem a uma situação do cotidiano: “A imagem de número 2, pois a força resultante é a força centrípeta FR = FC, ma=mv2/R, cortando m com m temos que a aceleração centrípeta seria a resultante” (L6). Ele não explica sua escolha utilizando aspectos da Primeira Lei de Newton que podem ser representados por ela e não menciona a situação do cotidiano (um automóvel em movimento curvilíneo). Ao invés disso, L6 menciona apenas aspectos da realidade pensada, aceleração-a (presente em seu texto), aceleração centrípeta-aC (presente na imagem) e desenvolve um raciocínio matemático sobre o movimento, isto é, ele utiliza a modelização do movimento. 126 L10 preferiu a imagem 10, explicando que nela “Não há variação” (L10), o que, deve indicar que a balança está em equilíbrio. A imagem 8 foi selecionada por L16, por representar “carros que tendem a manter seu movimento sem a interferência de força resultante contrária” (L16). Simplesmente por oferecer “melhor adequação ao princípio descrito”, L17 escolheu a imagem 6, que é parecida com a imagem 1, no que diz respeito à representação de uma passagem de tempo expresso em figuras como uma sequência. As respostas indicaram que a maioria dos estudantes procurou relacionar a realidade pensada expressa na Primeira Lei de Newton a situações concretas, buscando conotar as situações representadas nas imagens com o modelo científico. O enunciado da Questão 10 parece ter conduzido a leitura dos estudantes da realidade pensada à realidade concreta: ao reconhecerem o texto apresentado como referente ao modelo da Física, compreenderam as imagens como explicações desse modelo. 4.3.1.9 Questão 11 Analisamos as sequências de imagens escolhidas pelos estudantes e a justificativa apresentada para essa escolha de acordo com sua relação com as realidades concretas e pensada discutidas no Capítulo 3. Das 8 imagens presentes na questão 11, 4 são referentes à realidade concreta (A, B, C e D são fotografias, possuindo nível de iconicidade 9 de acordo com a classificação de Moles (1976) apud Aparici, García Matilla e Valdivia Santiago (1992), 3 incluem elementos da realidade pensada em figuras da realidade concreta (E, F e G são desenhos, tendo E e F níveis de iconicidade 2, enquanto G, é categorizada como de nível de iconicidade 1 pelos critérios utilizados por nós na análise do material didático) e H diz respeito à realidade pensada (também é um desenho, mas possui nível de abstração máximo por conta da presença exclusiva de elementos da Física). As respostas de 5 estudantes à essa questão foram descartadas da análise. L13 e L17 informaram a sequência através de numeração, como, 4, 5, 2, 3, 8, 7, 6 e 1, ao invés de usarem as letras correspondentes a cada figura, não sendo possível identificá-las adequadamente. L9, L16 e L19 explicaram a escolha das figuras, mas não sua sequência. Por exemplo, L19 empregou todas a imagens na sequência, por serem “as que apresentam melhor visualização” (L19). O critério utilizado por 6 estudantes (L3, L8, L14, L15, L22 e L25) para a seleção da 127 sequência foi iniciar com exemplos do cotidiano para, em seguida, apresentar o modelo teórico utilizado para explicá-los. Assim, eles começariam suas aulas sobre “Lançamento de projéteis” apresentando elementos da realidade concreta e terminariam com aspectos da realidade pensada. O estudante L3 pareceu se preocupar com um aumento gradual do nível de abstração das imagens (A, B, D, G, E e H): “Nas figuras (A), (B) e (D) podemos mostrar os objetos do dia-a-dia que podemos usar para lançamento de projéteis. Nas figuras (G) e (E) começamos a mostrar como seria o tipo de trajetória dos lançamentos e finalmente na (H) temos a parte teórica finalizando o conceito do assunto”(L3). As justificativas apresentadas por L8, L14, L15, L22 e L25 indicam suas convicções de que a realidade pensada representa fielmente a realidade concreta. L25, através da sequência A, B, D, E, H e F, inseriu elementos da realidade concreta (F) após apresentar a realidade pensada (H), “no início citaria exemplos comuns, depois, explicaria detalhadamente o funcionamento deles” (L25). Provavelmente, ele pense que os modelos da ciência apresentados em H e F sejam aplicados aos movimentos representados pelas imagens A, B, D e E sem necessidade de contextos de validade (MEDEIROS; MEDEIROS, 2001). L20 também iniciou sua sequência da forma descrita acima. Entretanto, após apresentar o modelo da ciência (F e H), ele finalizou com a imagem E, que apresenta aspectos das duas realidades, com o objetivo de verificar o aprendizado dos estudantes. Assim, ele pareceu fazer o caminho de volta da realidade concreta para a pensada, após as abstrações científicas. Apesar de sua seleção se basear na facilitação do entendimento do aluno, L6 traçou o mesmo caminho: começando com uma imagem mais icônica (D), aumentou progressivamente seu nível de abstração (E, F, G e H), para finalizar voltando à realidade concreta (A, B e C). L1 foi o único estudante que preferiu começar pelo modelo da ciência (H e G) para, em seguida, exemplificar esse modelo com imagens mais concretas (D, B, A e F), fazendo o processo inverso ao do modelo de ciência galileano, discutido no Capítulo 3. Priorizando a passagem de tempo (relais) de um lançamento de projéteis, 4 estudantes (L5, L7, L10 e L21) também terminaram sua sequência com imagens que representam a realidade pensada após elementos da realidade concreta. L10 escolheu a sequência A, D e H, porque A mostra o início da trajetória do projétil, D, uma parte intermediária da trajetória e H, a trajetória completa. 128 Três estudantes (L2, L4 e L11) selecionaram uma sequência com base no critério de iniciar com imagens mais simples para irem aumentando o nível de complexidade, embora, não tenham explicado o que consideravam como nível de complexidade. A sequência de L2 foi E, A, B, D, C, G e H, parecendo indicar que as imagens com elementos do cotidiano são mais simples e as que representam modelos da ciência são mais complexas. Já, L4, com a sequência H, B, F, E,G e D, começou com elementos da realidade pensada e terminou com a realidade concreta, enquanto L11 iniciou e finalizou a sequência com imagens que apresentam aspectos das duas realidades (E, H, C, D, G, B, A e F). Ambos, no meio da sequência, alternaram imagens entre as duas realidades. O estudante L24 foi o único a escolher apenas imagens da realidade concreta (A, B e C) e expôs como justificativa: “Pois cada lançamento tem um sentido e uma direção, para acertar um alvo qualquer” (L24). Consideramos que, para ele, A, B e C representavam 3 tipos de lançamentos de projéteis. Utilizando a mesma justificativa, L18 formou a sequência A, B, E e F, introduzindo aspectos da realidade pensada após exemplos concretos. A sequência B, D e G foi selecionada por L23, por tratarem do mesmo tipo de movimento. Todas as imagens foram escolhidas por L12, na seguinte sequência: E, D, H, G, A, B, C e F. A primeira (E) seria utilizada para explicar o que é trajetória, D forneceria um exemplo de trajetória parabólica, H mostraria os elementos da Física presentes na representação do movimento, A, B e C exemplificariam os movimentos de projéteis que acontecem segundo uma trajetória parabólica e F seria utilizada para relacionar o conteúdo às Leis de Newton. Esse estudante transitou pelas realidades concreta e pensada, aumentando e diminuindo o nível de abstração das imagens várias vezes. Em nenhuma das respostas pôde ser percebida uma preocupação com o contexto em que são válidos os conceitos embutidos no modelo da ciência; como se pudéssemos passar da realidade concreta para a pensada, e vice-versa, ou de uma imagem mais icônica para uma mais abstrata, sem precisarmos fazer ajustes, sem precisarmos adaptar uma realidade à outra. Pareceu que, para os estudantes, essas realidades e essas imagens tratavam dos mesmos elementos. 129 O que os objetos são, em si mesmos, fora da maneira como a nossa sensibilidade os recebe, permanece totalmente desconhecido para nós. Não conhecemos coisa alguma a não ser nosso modo de perceber tais objetos um modo que nos é peculiar e não necessariamente compartilhado por todos os seres...” Immanuel Kant 5 CONSIDERAÇÕES Durante todo esse estudo, consideramos as imagens como signos com expressão derivativa (ADAM SCHAFF, 1968 apud FIORIN 2005a), isto é, com exceção da linguagem verbal, todos os outros signos são imagens que podem ter a função de sinais ou de substituir, por meio da representação, objetos concretos ou abstratos (ver Capítulo 2). Essa representação parte de uma percepção consciente dos mesmos: ao criarmos uma imagem, fazemos com algum objetivo, expressando algo que outro possa ler (mesmo que sua leitura não coincida com a leitura preferencial do autor); da mesma forma, ao lermos uma imagem, dirigimos nossa atenção para ela e utilizamos a linguagem verbal em sua leitura para representá-la. A mensagem linguística que acompanha a imagem, seja em sua produção ou na leitura que fizermos delas, pode apresentar as finalidades de denotação ou conotação, sendo a primeira um tipo de conotação que ocorre na identificação (reconhecimento) dos elementos da imagem. Mas a conotação pode ir além disso, referindo-se a aspectos mais profundos da cultura do seu autor e dos leitores, incorporando, ainda, julgamentos e valores. A esse nível de leitura, Barthes e Compagnon (1997) chamam de compreensão. Se o sentido criado na leitura das imagens é influenciado por nossa cultura, ou seja, por nossas vivências anteriores, temos a possibilidade de investigar aspectos da produção de imagens utilizadas nos livros didáticos de ciências, assim como sua leitura realizada por estudantes, com o intuito de perceber o modelo da ciência com o qual eles estão tendo contato em sua formação. Ao falarmos de imagem nas ciências naturais, podemos relacioná-las à realidade concreta ou à realidade pensada (ver Capítulo 3) representadas por ela. E, talvez, nos seja permitido afirmar que o nível de percepção consciente para o reconhecimento e a compreensão da realidade pensada seja mais profundo que o necessário para o reconhecimento e a compreensão da realidade concreta. Das leituras que realizamos de artigos sobre imagens no ensino de Física, apenas 130 Galili e Zinn (2007) trabalharam com duas formas de representar o mundo: a da ciência e a da arte. Os demais (ver Capítulo 3), geralmente, indicaram uma suposição de que as imagens podem auxiliar na compreensão de conceitos físicos, na medida em que os aproximam de situações concretas, permitindo exemplificar a realidade pensada através de elementos e fenômenos da realidade concreta. Entretanto, sem uma discussão sobre os contextos de validade em que os conceitos científicos podem ser empregados, os modelos criados pela ciência parecem substituir os elementos cotidianos, induzindo-nos a pensar que todo o conhecimento científico parte de uma observação da experiência e que a realidade concreta é totalmente representada e explicada pela realidade pensada. Dessa forma, poderíamos chegar a aceitar a ciência como a única maneira de se conhecer o mundo. No exame que realizamos dos materiais didáticos empregados nas disciplinas de Física introdutória dos cursos de Licenciatura da UFRJ, percebemos a predileção pela utilização dos desenhos, que, como discutimos no Capítulo 4, permitem a simplificação da realidade concreta de modo a aproximá-la da realidade pensada. Assim, comparando-se com imagens mais icônicas, como as possibilitadas pela fotografia, os desenhos possuem maior semelhança com as ideias transmitidas pela ciência através de materiais didáticos de Física. Os esquemas da Física (elementos da realidade pensada) estão presentes em mais de 80% das imagens do material desenvolvido para o curso semipresencial (Material A), e em menos de 50% das imagens do material trabalhado no curso presencial (Material B), podendose pensar que a leitura das imagens do primeiro material demanda um nível de percepção consciente mais profundo que o do segundo material. Ou seja, a bagagem cultural relacionada aos elementos próprios da cultura científica requisitada para a leitura das imagens do Material A talvez seja maior que no Material B. Isso parece fazer sentido ao se pensar nos destinatários originais dos dois textos: apesar de ambos serem utilizados nos cursos de Licenciatura em Física da UFRJ, o primeiro foi criado para atender estudantes do primeiro período do nível superior, e o segundo foi pensado na formação de estudantes do Ensino Médio. Mas, levando-se em conta que sua utilização no início da formação acadêmica de licenciandos de Física apresenta o mesmo objetivo, que é desenvolver uma base conceitual em Física que habilite os estudantes a prosseguir nos cursos, podemos imaginar, ao examinar suas imagens, que essa base está sendo desenvolvida de formas diferentes nas duas modalidades do curso. Também percebemos isso ao analisar o nível de iconicidade das imagens: a quantidade 131 de imagens abstratas é muito maior no Material A que no B. Essa utilização com menor frequência de imagens relacionadas à realidade pensada não significa, necessariamente, que o Material B, por usar mais imagens referentes à realidade concreta, estaria realizando uma forma de substituição entre as duas realidades. Para afirmarmos isso, necessitaríamos proceder a um outro tipo de análise das imagens, que não nos propomos fazer nesse estudo. Acerca da relação texto-imagem, verificamos um emprego mais frequente da mensagem linguística, nos dois materiais, na função de interpretação. Isto é o texto verbal direciona a leitura da imagem para novos sentidos de conotação que, a princípio, os leitores não teriam com a ausência do texto. O que pode indicar a necessidade da mensagem linguística para a compreensão da realidade pensada expressa pelas imagens. Acreditamos ser interessante investigar o caminho oposto: a função da imagem na leitura da mensagem linguística. No que se refere à leitura dos estudantes, apenas na questão que apresentava a imagem artística, houve um estudante que não explicou a imagem. Nas outras questões, devido à presença das respostas, podemos supor que os estudantes procederam à percepção consciente das imagens, tanto no reconhecimento (denotação) quanto na compreensão (conotação). Somente na primeira questão, que apresentava uma cena cotidiana, a função de identificação foi bem mais utilizada que a de interpretação. Enquanto na terceira questão, cuja imagem referia-se à cena do “Juízo final”, a percepção consciente de todos os estudantes que responderam a questão chegou ao nível da compreensão (interpretação), apesar de alguns também terem usado a mensagem linguística na identificação dos elementos da imagem. Nas questões 2, 4 e 7, que traziam imagens do âmbito do ensino de Física, a percepção consciente tanto na identificação quanto na interpretação se deu com maior frequência utilizando-se elementos da Física, assim como o uso da função de relais da mensagem linguística nas questões 4 e 7. Eles reconheceram as imagens como signos próprios da ciência. Comparando-se as questões 1 e 6, cujas imagens possuíam elementos semelhantes do cotidiano, parece que a mensagem linguística inserida na imagem da Questão 6 ajudou os estudantes a chegarem ao nível da compreensão da imagem. Entretanto, o fato do texto verbal se referir a conceitos da Física não parece ter influenciado num aumento significativo da utilização de termos da Física para sua interpretação: na Questão 1, 9 de 15 estudantes (60%) interpretaram fazendo uso da Física, enquanto, na Questão 6, foram 14 de 24 (58%). Por outro lado, nenhum estudante empregou termos próprios da Física na leitura das 132 imagens das questões 3 e 5, provenientes, respectivamente, das áreas da arte e propaganda. Provavelmente, por entenderem o contexto de leitura das imagens, isto é, que elas faziam parte de áreas do conhecimento diferentes da científica, os estudantes não direcionaram sua percepção e, portanto, não conseguiram ver relação com elementos da Física. Já nas fotografias de cenas do cotidiano, houve uma tentativa de aproximar a realidade concreta expressa por elas da realidade pensada construída pela ciência. Nas imagens reconhecidas pelos estudantes como representações da realidade pensada, utilizadas, geralmente, nos livros didáticos de Física, não parece ter havido a necessidade de explicá-las relacionando-as à realidade concreta. Talvez possamos dizer que ao entenderem o contexto de leitura proveniente da imagem, a percepção dos estudantes tenha sido direcionada a aspectos referentes a esse contexto. Dessa forma, se eles não entendessem o contexto de leitura, provavelmente, não teriam sido capazes de atingir a leitura preferencial proposta pelo autor da imagem. Entretanto, nas escolhas das imagens para representar o enunciado da Primeira Lei de Newton expressa na Questão 10, notamos a tentativa dos estudantes em utilizar imagens da realidade concreta com o objetivo de exemplificar a realidade pensada. Isso também foi percebido na construção das sequências de imagens da Questão 11: a maioria dos estudantes transitou entre essas duas realidades, sem mencionar os contexto de validade em que os modelos da ciência poderiam ser aplicados à realidade concreta. De todas as questões apresentadas aos estudantes, só foi percebida uma resposta (na Questão 7) fazendo menção ao fato de que a imagem se tratava de uma idealização de uma situação concreta, parecendo que os estudantes apresentaram uma dificuldade em modelizar, isto é, representar a realidade concreta por meio da realidade pensada de forma consciente, diminuindo-se, gradativamente, sua iconicidade com a realidade concreta, para alcançar os contextos de validade da realidade pensada. Isso talvez indique que, nas concepções de ciência impregnadas na formação acadêmica dos estudantes, os modelos elaborados pela ciência representem, integralmente, os objetos e fenômenos concretos. A análise do material didático indicou a presença marcante dos desenhos, dos esquemas de Física e da função de interpretação da imagem por meio da mensagem verbal em ambos os materiais, o que sugere uma relação forte com os modelos da ciência. No que se refere ao nível de iconicidade, no material do curso semipresencial houve a preponderância das imagens abstratas, enquanto no material do curso presencial, verificamos uma frequência 133 equilibrada entre as imagens concretas e abstratas, fazendo-nos pensar que no último houve uma preocupação maior de aproximar a realidade pensada da concreta. Embora nosso estudo não tenha se proposto a observar como se dava essa aproximação entre as realidades concreta e pensada nas imagens dos materiais didáticos e em suas relações com o texto verbal, consideramos esse assunto de extrema importância para investigações futuras, até mesmo para compreendermos melhor a leitura que os estudantes realizaram das imagens. No momento, o que a nossa análise nos sugere é que, pelo menos no Material A, em que há uma superabundância de esquemas da Física e imagens abstratas, a aproximação entre as duas realidades, se for feita, não ocorre de forma gradativa, ou seja, não leva em conta os contextos de validade da realidade pensada. Assim, nas discussões dos artigos analisados sobre a imagem no ensino da Física, nos manuais didáticos examinados e nas leituras dos estudantes, percebemos dificuldades em tratar os conhecimentos da Física como originados de um processo de modelização da realidade concreta, admitindo que a Física não explica essa realidade como ela é, mas que simplifica essa realidade para compreendê-la. Tentar utilizar argumentos pautados em situações concretas do cotidiano para validar os modelos da Física (a realidade pensada), não parece ser epistemologicamente consistente, mesmo porque, até os experimentos realizados em laboratório partem de uma modelização: algumas variáveis são controladas para simplificar elementos da realidade concreta. 134 REFERÊNCIAS AGRELLO, D.A; GARG, Reva. Compreensão de gráficos de Cinemática em Física introdutória. Revista Brasileira de Ensino de Física, Porto Alegre, v. 21, n. 1, p. 103-115, mar. 1999. Disponível em:<http://www.sbfisica.org.br/rbef/ojs/index.php/rbef>. Acesso em: 05 jan. 2008. AGUILAR, Susana; MATURANO, Carla; NÚNEZ, Graciela. Utilización de imágenes para la detección de concepciones alternativas: un estudio exploratorio con estudiantes universitarios. Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, Barcelona, v. 6, n. 3, p. 691-713, 2007. Disponível em: <http://www.saum.uvigo.es/reec/>. Acesso em: 05 jan. 2008. 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