ANÁLISE DOS NEGÓCIOS DOS ARRANJOS DE PRODUTOS NATURAIS NA
BAIXADA CUIABANA: UMA ECONOMIA DE ESCOPO1
José Manuel Carvalho Marta
Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo
RESUMO – Este estudo trata do processo de coleta e distribuição de produtos naturais em
Mato Grosso, na Baixada Cuiabana, em 2003. A questão em foco envolve o reconhecimento
de cadeias produtivas de produtos naturais, fitoterápicos e semelhantes, com o intuito maior
de descrever a cadeia como um todo e sugerir estratégias de fomento. Com base em dados de
campo assim como de pesquisas bibliográficas locais, constatou-se a inexistência de uma
cadeia completa dentro do estado, mas com potencial importante para a viabilização de
propriedades rurais pequenas e médias, além de processos de agregação de valor, tais como
infusões, chás e processos químicos farmacêuticos em geral. Tal estudo surge como
importante fonte de informações locais para empreendimentos na atividade de coleta e
distribuição, principalmente fitoterápicos, cujo potencial foi detectado. Nesse sentido, formas
de organização comercial, de logística e de gestão foram sugeridas, semelhantes às
experiências observadas em outros estados. Em um seminário de avaliação, constatou-se a
dificuldade dos empreendedores em relação aos requisitos sanitários legais, recomendando-se
alternativas para a realidade mostrada.
PALAVRAS-CHAVES: comercialização, Mato Grosso, recursos naturais.
1. Introdução
Os negócios de produtos naturais, nestes primeiros anos do século XXI, apresentam-se
como um nicho econômico de atividades crescentes. Esse espaço, enquanto nicho, vem sendo
retomado sob a inspiração de grupos preocupados com o culto ao corpo, o ambientalismo e o
respeito à natureza, entre outros elementos. Caracteriza-se, entretanto, no consumo rotineiro
do uso de chás e essências de outro conjunto de menor renda, com preocupações de outra
natureza, fazendo explicitar a oferta como um escopo de mercadorias para diversos usos e
diferentes formas de apresentação.
Naturalmente, ao se constituir um nicho de consumo, identificam-se com alguns
valores sociais e se difundem através de diversos meios de comunicação moderna, específicos
ou genéricos, em muitos países e culturas de todos os continentes. Portanto, são esses valores,
apoiados por organizações não-governamentais (ONGs) e o terceiro setor, comprometidos
com a preservação e conservação da natureza, constituindo uma economia própria ou como
parte da economia globalizada.
Ao se analisar os processos produtivos, nos quais se obtêm os produtos naturais para
consumo, distribuição e a conseqüente acumulação, desses nichos acima referidos, pode-se
entender a existência de algumas mercadorias com imensos potenciais e margens, mas
carentes de investimentos. Isso decorre das características apresentadas através de uma
estratégia econômica conhecida como economia de escopo, em face da miríade de produtos
naturais, incorporados na lista de artigos ofertados. Tal lista apresenta chás, condimentos,
perfumes, flores, essências, artesanato, especiarias, utilizados na manufatura de enfeites,
alimentos, remédios, utilitários. Assim, estando a matéria-prima, disponível na natureza e
passível de apropriação pelo mercado, para uma população urbana ou rural, pode, também, ser
1
Pesquisa financiada pelo SEBRAE/MT em convênio com a Fundação Uniselva, em setembro de 2003.
cultivada em quintais, vasos e hortas caseiras, certamente, permitindo margens importantes.
Porém a “vida moderna” exige formas e embalagens diferentes, em estabelecimentos
acessíveis em shopping centers, lojas urbanas ou adequados modos de comercialização ainda
não incorporados pelos comerciantes e manufaturadores desses produtos.
Este artigo busca a melhor compreensão da cadeia produtiva de produtos naturais na
Baixada Cuiabana, em Mato Grosso. Especificamente, pretende-se detectar os pontos de
estrangulamento no fluxo de produtos e de incentivos para a produção, comercialização e
industrialização destes, numa visão estratégica junto aos segmentos envolvidos.
A contribuição deste artigo está na análise econômica regional do tema, uma vez que o
enfoque farmacêutico não permitiu solucionar os entraves e, ainda, dar sugestões de políticas
para fomentar o setor, numa região carente de investimentos e opções de negócios ao pequeno
e médio proprietário rural.
Na próxima seção discute-se a metodologia utilizada, seguida pela discussão do
negócio de recursos naturais na seção 3. Na seção 4, tem-se alguns aspectos da construção da
demanda de produtos naturais. A produção dos “fitoterápicos, corantes e especiarias”, é
discutida na seção 5. Na seção 6, trata-se do comércio de produtos naturais no Brasil.
Finalmente, na seção 7, têm-se as conclusões do trabalho.
2. Metodologia
Ao se discutir aspectos da viabilidade econômica de atividades extrativistas, Anderson
(1994), utilizou o conceito de reserva extrativista como um conceito para entender a
exploração dos recursos naturais – não madeireiros – como a borracha (hevea brasiliensis),
castanha do Pará (bertholletia excelsa), açaí (euterpe oleracea) e babaçu (orbignya phalerata).
Por extensão, entendeu-se importante para acatá-lo parcialmente no estudo.
A viabilidade econômica do extrativismo não-madeireiro é duvidosa às vezes
contraditória. Argumentam os críticos, com relação aos aspectos econômicos – volume,
freqüência, disponibilidade, escala – exceto para alguns produtos como: açaí, palmitos,
castanha do Pará e borracha. Para os defensores dessa atividade as economias baseadas no
extrativismo são instáveis e sujeitas à concorrência de outras atividades, cuja racionalidade
capitalista, decorre da eficiência e da escala, conceitos estes, em geral, industriais.
Esse processo leva à perda de importância dos produtos de origem extrativista, cuja
sustentação de preços é feita de maneira subsidiada – como no caso da borracha. Algumas
limitações na produção podem ser caracterizadas como elementos de inviabilidade como: a
dispersão da ocorrência das espécies, a rarefação da população coletora, a baixa demanda, alta
competitividade comercial, alto custo de transporte (Anderson, 1994).
Não pode, certamente, ser tratada como uma panacéia de diversas questões do
extrativismo ou da agricultura familiar. Pode, entretanto, ter um papel importante na discussão
sobre o desenvolvimento regional e complemento da renda das atividades rurais, como um
elemento do processo, tendo uma base muito precária. Essa precariedade ocorre em função do
acesso aos mercados, dificultando a formação de valor e a geração de emprego e renda. Há
dificuldades quando se considera a permanência das populações no campo, cujo atendimento
social ofertado, pelas políticas publicas, são de difícil solução na área de educação e saúde,
considerando a dispersão da população. Certamente as pequenas localidades são privilegiadas
nesse aspecto.
Considerar aspectos de estudo de custo-benefício tradicional não permite a consideração
da análise da viabilidade econômica do extrativismo em sentido mais amplo:
1) O uso da terra e da floresta (como bens de produção permanente, sem intervenção de
outros meios de produção, com uma lógica própria e, em geral desconhecida do ser
humano, para o seu desenvolvimento);
2) Análise histórico-social, abstraindo-se das mudanças sociais, como por exemplo, a
melhoria dos processos para produtos não madeireiros; (ao tratar como variável no
processo de produção, desconsidera questões tecnológicas, cuja evolução vem
ocorrendo, em função do próprio avanço social existente em outros setores da
sociedade).
A primeira questão a ser considerada é a do “uso da terra como fonte da produção
natural”. Ao compararem-se os diversos os usos dados a terra, os indicadores de ocupação e
uso, em algumas regiões brasileiras são extremamente baixos. Como exemplo, a pecuária
extensiva realizada permite entender a possibilidade da comparação ora proposta. A pecuária
extensiva foi estudada por Buschbacher (1986) e Hecht et al (1988), ambos citados por
Anderson (1994). A agricultura itinerante foi estudada por Fearnside (1985), citado por
Anderson (1994). Ambos os casos, observaram baixos retornos e alta desistência de projetos
de colonização.
Em todos os casos estudados, podem ser considerados os apoios de políticas
governamentais, através de crédito subsidiado, preço mínimo, construção de estradas para
escoamento da produção, construção de armazéns e a geração de novas tecnologias. Os
programas mais destacados neste sentido foram: Programa de Pólos Agropecuários e Minerais
da Amazônia (POLOAMAZÔNIA); Programa de Desenvolvimento dos Cerrados
(POLOCENTRO); e Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil
(POLONOROESTE).
Quanto à análise do investimento e os retornos não econômicos, foram levados em conta
a questão da sustentabilidade da terra, os custos sociais e os custos ambientais. Dessa maneira,
os custos reais para a implantação de pecuária extensiva em áreas cobertas por matas, devem
considerar investimentos como o desmatamento, demarcação, construção de cercas,
manutenção e tratos culturais. Na Amazônia, conforme Gasques e Yokomizo (1986), citado
por Anderson (1994), cada vaga de trabalho criada em projetos da Superintendência da
Amazônia (SUDAM) custou US$ 50,000.00.
Os custos ambientais, não contabilizados naquele estudo, deveriam ainda considerar:
perdas de nutrientes da biomassa queimada, aumento da erosão, aumento das enchentes,
aumento das queimadas nas áreas adjacentes, as transferências de carbono para a atmosfera
(segundo Uhl e Mattos, citado por Anderson (1994), a transferência do carbono para a
atmosfera deve considerar uma perda de US$ 1,250.00), e a perda da biodiversidade.
Outros valores sociais não considerados na análise são: a organização social e política
dos extratores de plantas, contrariando o “status quo” do latifúndio e da propriedade pouco
produtiva como elemento do poder e da apropriação dos recursos públicos; reconhecimento
de direitos preteridos às populações locais – direito a terra onde nasceram e foram criados;
redução ou desaparecimento de relações exploratórias para produtos naturais; criação de
novos produtos e desenvolvimento de um comércio local de castanha do Pará sem
intermediários, através de cooperativas, a preços duplicados ao produtor sem aumentar o do
consumidor, comercialização com entidades não governamentais, beneficiamento
descentralizado de castanhas permitindo o aumento da renda familiar dentro de uma nova
política para o beneficiamento da castanha.
O extrativismo como opção econômica única indica limitação, podendo ser superadas
pelo o uso complementar à agricultura (ou pecuária) com o extrativismo relevante na
Amazônia, contrapondo-se à exclusividade da produção quando tratada pela população
ribeirinha (Anderson, 1994).
Alguns autores como Schwartzman (1989) e Almeida, Anderson e Iori (1992), ambos
citados por Anderson (1994) estudaram o papel do extrativismo vegetal na sustentação das
populações e concluíram: a) raramente a atividade se apresenta como única fonte de renda; b)
o extrativismo é complemento de outras atividades econômicas – agricultura familiar, pesca,
pequena pecuária; e c) essa atividade pode se caracterizar por: baixos investimentos, baixo
risco, destinado a população de baixa renda.
Assim, a produção extrativista deve estar integrada ao contexto mais amplo que requer
não somente a ampliação da coleta junto à atividade agropecuária, mas também associada ao
conjunto de atores que formam o Arranjo Produtivo Local, buscando o desenvolvimento não
apenas da atividade mas da região como um todo.
Arranjos Produtivos Locais (APLs) como estratégia de desenvolvimento
As estratégias recentes de desenvolvimento têm alternado entre abordagens
diferenciadas pelo nível de análise, dividindo-se em: Sistemas Agroindustriais (SAI),
Complexos Agroindustriais (CAI), ou ainda, Cadeias de Produção Agroindustrial (CPA)
(Batalha, 2001; Zylbersztajn e Neves, 2000).
O SAI é o conjunto de atividades e processos produtivos agroindustriais que ocorrem
entre a indústria de insumos e o consumidor final. Envolve vários produtos e matérias-primas
e é composto por vários CAIs. Assim, dada sua amplitude, tem sua análise dificultada e de
pouca aplicação.
O CAI tem como ponto de partida a matéria-prima base que dá origem a vários
produtos analisados. Assim, como exemplo, pode-se citar o CAI da soja, o CAI do café, o
CAI do algodão. Cada CAI pode conter várias cadeias produtivas (CPA). O CAI da
camomila, como exemplo, pode conter a cadeia produtiva do chá de camomila, a cadeia
produtiva do xampu de camomila entre outras. Pode ser de grande utilidade se o formulador
de políticas desejar analisar o fomento da produção de matéria-prima, como o caso da
camomila, ou mesmo se desejar verificar possíveis usos da mesma.
A análise da CPA (Cadeia Produtiva Agroindustrial) foi a que mais se destacou nos
últimos anos, pela especificidade do enfoque e vantagens associadas na análise. A CPA
caracteriza-se pelo foco de análise no produto final, por exemplo, no xampu de camomila, ao
invés do enfoque na matéria-prima camomila. Assim, envolve todas as relações comerciais e
financeiras, operações de transformação do produto, transporte e outras, desde o produtor do
insumo básico até o consumidor final do produto em análise.
Normalmente divide-se a análise de cadeias em Produção de matérias-primas,
Comercialização e Industrialização como os macrossegmentos de análise, para facilitar a
compreensão do fluxo de produtos e serviços entre os atores. As análises recentes do Sebrae,
em nível nacional, vêm sendo conduzidas utilizando-se esse enfoque, em conformidade com
Sebrae (2000).
No presente estudo, dividiu-se o objeto em três segmentos:
o primeiro bloco incorpora as produções regionais, nacionais e as importações de espécies
tradicionalmente conhecidas e utilizadas em países da Europa, Ásia e América Latina,
especialmente o Chile, onde merece destaque o boldo e a cáscara sagrada, utilizados no
contexto regional nos tratamentos de obesidade e problemas estomacais.
o segundo bloco diz respeito ao comércio formal, realizado principalmente por farmácias,
lojas e supermercados, principalmente em seções de chás, folhas e condimentos.
o terceiro bloco, do comércio informal, é abastecido pela coleta regional e por atacadistas de
Goiás, São Paulo e Paraná, com destaque para os produtos da Mata Atlântica.
De modo geral, a análise de CPA - Cadeias Produtivas Agroindustriais mostram uma
fragilidade ao deixar com menor ênfase a questão da localização dos diferentes agentes (ou
atores) dentro da cadeia. A localização torna-se importante ao se considerar muitos pontos de
estrangulamento dentro das cadeias analisadas surgiam pelo fato dos atores estarem muito
longe entre si.
A distância aparece como possibilidades de negócio para novos agentes,
intermediários facilitadores do fluxo de produtos e serviços entre as localidades. Nesse
contexto, o foco de análise passa pela consideração dos chamados Clusters (ou o mesmo que
Sistemas Produtivos Locais – SPL) ou, ainda, os Arranjos Produtivos Locais (APL).
O conceito de cluster ou sistemas produtivos locais considera a aglomeração
geográfica de atividades similares ou relacionadas, condicionantes históricos e culturais,
assim como economias externas gerando economias de escala e vantagens para os agentes.
O Sistema Produtivo Local é uma aglomeração geográfica de um grande número de
empresas de tamanhos diferentes, normalmente não integradas verticalmente, fabricantes de
um produto semelhante, assim como seus fornecedores de produtos e serviços (Suzigan,
2000).
O uso de fitoterápicos deriva, em grande parte, destes condicionantes históricos e
culturais, considerando que a população utiliza esses produtos com base em receitas e
formulações passadas através das gerações.
O enfoque do arranjo produtivo local busca captar fatores de natureza setorial,
cultural, social e histórica no setor produtivo e no mercado, para compreender como estes
fatores condicionam as inovações locais, a adoção de estratégias tecnológicas, a integração
entre os agentes, sempre em busca de maior eficiência no funcionamento do arranjo como um
todo. Esta metodologia foi utilizada por Lastres e Cassiolato (2002) para análise do arranjo
produtivo têxtil-vestuário do Vale do Itajaí/SC.
A maioria dos estudos envolve a identificação de uma região com o maior número de
empresas produtoras de um produto similar ou igual. Uma vez detectado o arranjo, busca-se
pela identificação dos agentes envolvidos, que de uma forma ou de outra facilitam o fluxo de
bens e serviços, auxiliando o arranjo. Alguns fatores importantes são a estrutura de mercado
(quantidade e tamanho das empresas, imperfeições de mercado etc), as relações de mercado
entre os agentes, os aspectos institucionais que transpassam pelos diferentes níveis de
mercado e aspectos da demanda pelos produtos. Estes fatores foram analisados e considerados
para produtos fitoterápicos na região da Baixada Cuiabana, tendo sido identificados, em todos
os segmentos, a presença de indivíduos capazes de responder às demandas existentes.
Parte da análise dos arranjos inclui a comercialização do produto. Neste contexto, os
canais de comercialização utilizados pelas empresas podem permitir a expansão destas numa
região, e o projeto de novos canais pode auxiliar na consolidação de um arranjo produtivo
local. Para o caso de arranjos não perfeitamente constituídos, um aspecto importante será a
formação de capacidade de inovação local, com vistas a autodesenvolver o arranjo.
Outras estratégias passam pela “importação” de um agente externo promovendo a
incorporação de novas técnicas no arranjo, alterando assim o estado tecnológico inicial. No
caso do presente estudo, para produtos naturais, grande parte da análise requer a visualização
de novos canais de comercialização, assim como o aperfeiçoamento dos canais existentes.
Nesse sentido, o desenvolvimento de instituições, organizações de atores da cadeia,
incubadoras tecnológicas, ou cooperativas de produção e comercialização dos referidos
produtos, assim como “farmácias vivas”, poderão ser sugestões para o fortalecimento dos
canais de comercialização.
Análise de canais de comercialização
Segundo Coughlan et al (2002), um Canal de Comercialização (CC) é um aglomerado
de organizações interdependentes envolvidas no processo de disponibilizar um produto ou
serviço para o consumidor final. Segundo os autores, o intermediário tem um papel de suma
importância no processo de comercialização dos produtos, pois torna mais fácil para o
produtor vender o seu produto, já que o intermediário dispõe de um prévio conhecimento do
mercado. Os membros de um canal de comercialização são os fabricantes, os intermediários e
os usuários finais.
“O estudo de Canais de Comercialização é útil como forma de ampliar a compreensão
da organização da comercialização nos seus aspectos externos ou estruturais” (Rezende, 2001:
43). Ao fazer uma análise dos Canais de Comercialização, é possível: a) detectar pontos de
estrangulamento nos canais, ou seja, problemas a serem enfrentados na hora de colocar o
produto no mercado; b) localizar graus de competição e imperfeições de mercado; c)
diagnosticar quais os canais menos eficientes e possíveis alternativas; d) verificar a eficiência
na logística de distribuição de produtos e serviços; e e) determinar qual o fluxo físico dos
produtos agrícolas e agroindustriais, ou seja, fazer a rastreabilidade do produto.
Para a análise específica do mercado de produtos naturais, é importante entender como
projetar um canal de comercialização.
O mercado segmentado, busca separar grupos de usuários, cujas características são
homogêneas dentro de cada grupo,mas heterogêneas entre eles. Os usuários finais terão
demandas diferentes para cada grupo caracterizado, requerendo, em muitos casos, canais de
comercialização especifica. Sugere-se, assim, separar a análise das demandas considerando-se
o tipo de serviço ou produto conforme a divisão de quantidade do serviço ou produto, da
conveniência espacial, do tempo de entrega/espera, do sortimento/variedade desejada ou ainda
pode-se especificar outra demanda por prestação de serviço. Como exemplos, para produtos
naturais, os usuários finais poderão desejar: pacotes ou caixas grandes x envelopes plásticos;
nas farmácias x nos supermercados; a cada semana x cada mês; de vários coletores x do
mesmo coletor. De acordo com as demandas, especificam-se ou aperfeiçoam-se tipos distintos
de canais.
O posicionamento ou configuração do canal é a etapa na qual o analista busca definir
as características do produto, seu preço e componente promocional, tentando avaliar se, com
os recursos disponíveis no canal, poderá atender a este ou àquele segmento do mercado
apontado na segmentação.
Da mesma forma, esta etapa pode revelar segmentos atraentes para seu produto.
Ainda, o analista prevê os agentes que participarão do canal a ser criado, ou verifica a
ausência ou imperfeições naqueles agentes dentro dos canais existentes, configurando a
estrutura do canal.
Pode-se, ainda, ter agentes pequenos, médios ou grandes. Muitos, de um determinado
tipo. Poucos, de outro. Muitas vezes, envolvidos com produtos diferentes daquele com o qual
se trabalha. As escolhas considerando quais e quantos agentes estarão atuando, sendo vitais
para a eficácia do canal.
A terceira etapa é a Definição de Alvos. São definidos, principalmente, os focos do
canal e os segmentos a serem deixados de lado na condução do mesmo. Os limites de atuação
dos segmentos, dentro do canal, poderá determinar o seu alcance. Isso implica, muitas vezes,
na definição de canais específicos e diferenciados. Tal situação emerge, por exemplo, quanto
a necessidade para cobrir grandes extensões territoriais ou mesmo fazer negócios com o
exterior.
Realizadas as etapas anteriores, procura-se pela existência de canais que atendam as
necessidades apontadas nas outras etapas, buscando seu aperfeiçoamento, ou providencia-se a
criação de novos canais.Para os canais existentes, a questão será avaliar considerando as
falhas e o desempenho dos fluxos do canal e a estrutura, comparando-os com o projetado nas
etapas iniciais e as necessidades apontadas. Para os novos canais, a questão deverá avaliar o
desempenho dos fluxos do canal e a estrutura desejada. Feito isso, inicia-se a implementação
do canal.
A Implementação do Canal deve considerar a identificação de fontes de poder entre os
agentes e identificar os conflitos entre eles.
O objetivo principal deve ser coordenar o canal de forma que os interesses sejam conciliados
e que se possa, finalmente, viabilizar os fluxos, fazendo o produto chegar ao usuário final.
Estrutura e imperfeições de mercado
A análise de comercialização é a discussão e observação da estrutura de mercado.
Assim, entende-se estrutura de mercado, através de algumas características essenciais a serem
observadas, a saber: número de empresas ou atores em cada segmento de mercado, tamanho
das empresas ou dos agentes em cada nível de mercado, relação entre os agentes (contratos,
líder x seguidor, fixação de preços), presença x ausência de intermediários, associativismo no
mercado, facilidade de acesso ao mercado, diferenciação do produto, localização entre outras.
O posicionamento desses fatores permite definir as estruturas de mercado ou seja, o
mercado poderá ser de concorrência perfeita ou imperfeita entre os agentes. Eventualmente,
haverá alguma transferência de poder, entre as lideranças apresentadas no mercado, e a
capacidade de fixar preços e margens de comercialização.
A presença de poucos agentes, em determinado elo da cadeia, pode ocasionar a
formação de oligopólios na venda de produtos, podendo estabelecer preços com lucro acima
do normal ou mesmo praticar estratégias para barrar a entrada de novos agentes no mercado.
Muitas vezes, existem poucos atores por haver alguma exigência jurídica que dificulta a
operação da empresa ou, ainda, pela necessidade de elevados investimentos, como no caso da
indústria farmacêutica, por exemplo.
A questão do tamanho dos agentes também é importante, ao considerar que mesmo na
presença de vários produtores, a presença de poucos grandes poderá desviar o centro das
decisões para aquele grupo de grandes produtores que, provavelmente, direcionará as práticas
de mercado adotadas.
Estratégias associativistas e empreendoristas considerando a compra de insumos e
venda de produtos, devem levar em conta a diferenciação do produto. Nessa perspectiva,
incubadoras tecnológicas e de empresas, ou cooperativas de produção e comercialização dos
referidos produtos devem ser prospectadas como alternativas de negócio. Há, ainda, projetos
como “farmácias vivas”, que se apresentam como alternativas razoáveis para reduzir a força
dos grandes agentes.
A diferenciação do produto confere status desigual entre as mercadorias, cujos
consumidores apresentam condições de identificar o produto desejado de um vendedor em
particular entre os vários existentes. Tal prática também gera imperfeições de mercado ao
criar uma espécie de monopólio para aquele produto específico, seja via qualidade, marca ou
local de origem.
Esses fatores, como a segurança na identificação de um produto natural, ou a
orientação passada, por exemplo, receitada por um raizeiro, poderão ser fatores determinantes
para a escolha de onde e de quem comprar um produto natural. Dessa maneira, o raizeiro
procura utilizar propaganda para destacar as vantagens de seu produto e muitas vezes chegam
até mesmo a desvalorizar os produtos de outros “concorrentes” por meio desta propaganda.
Dados e fonte
Do ponto de vista metodológico, o estudo baseia-se, além dos autores já citados, em
Batalha (2001), Santana (2002) e Zylbersztajn e Neves (2000), que enfocam a questão da
comercialização e o processo agroindustrial em cadeias produtivas. Os estudos de Lastres e
Cassiolato (2002) e Cassiolato et al (2000) fazem o detalhamento da metodologia de Arranjos
Produtivos Locais como meio de organização das atividades na economia regional.
Outros instrumentos foram aplicados, como, por exemplo, entrevistas semiestruturadas e questionários, cuja tabulação, permitiu a interpretação da realidade dessa cadeia
produtiva. Foram aplicados dois tipos de questionários: sobre os comerciantes informais e
sobre os comerciantes informais. Como comerciantes informais, foram identificados 13
agentes em Cuiabá e Várzea Grande. Entre os comerciantes formais, foram constatadas 30
farmácias. Entre os supermercados que comercializam produtos naturais na forma de chás,
foram contatados dois supermercados em Cuiabá. Essa pesquisa de campo ocorreu entre os
meses de agosto e setembro, junto aos raizeiros comerciantes e distribuidores daquelas
mercadorias junto à população de Cuiabá e de outras pequenas cidades da região.
Em outubro, ao participar do Seminário Mato-Grossense de Produtos Naturais, onde
foram apresentados os resultados parciais sobre o tema, foram recebidas contribuições e
indagações, principalmente na atividade institucional e as operações desenvolvidas em alguns
estados da Amazônia .Assim, em função do objeto ao qual se pretendia entender viu-se a
necessidade de conhecer a realidade do mercado de maneira ampliada. Em dezembro e janeiro
desenvolveram-se estudos complementares no interior de Minas Gerais, capital do estado de
São Paulo, Curitiba no Paraná e litoral de Santa Catarina.
3. Negócios de produtos naturais.
Para um estudo de produtos naturais necessita-se levar em conta duas ordens de
conhecimento: empírico e cientifico. O primeiro, empírico, é relacionado com o saber popular
e derivado da tradição cultural da população, tendo como base as observações dos animais e
mesmo as populações primitivas e suas reações. É desse saber que se constituem sacerdotes,
pajés, xamãs e boticários, cuja arte de curar transcende o tempo, mantendo-se até a atualidade.
É dessa prática que se estimularam as grandes navegações de busca de especiarias na Ásia e
desenvolvimento de jardins e hortos na Europa e na Ásia, importantes para a nova arquitetura,
mas que pode ser considerada como uma espécie de banco genético primitivo, nos séculos
anteriores.
O conhecimento científico moderno está ligado uma farmacopéia especifica moderna e
racional. Entretanto, deriva, primeiro, da alquimia - origem da química do século XVIII - e,
em seguida, das boticas, gênesis das farmácias atuais e da medicina moderna. Estão nesses
métodos os processos e técnicas científicas, reconhecidos na eficiência de higiene e sanidade
para os produtos e instrumentos utilizados, que aprofundou a racionalização e incluiu a
divisão do trabalho e o mercado nesse sistema. A necessidade de eliminar a concorrência e a
tradição, como elemento essencial de atendimento, marginalizou o conhecimento empírico.
Essa substituição introduziu algumas características no processo de produção,
comercialização e acumulação da riqueza, cuja necessidade de um negócio lucrativo se fez
apresentar, como um complexo químico farmacêutico.
De certa maneira, é possível afirmar que a gênesis dos negócios de produtos naturais,
principalmente dos fitoterápicos, assim como, a manipulação de ervas para condimentos e
corantes, deriva da observação popular da arte dos antigos curandeiros, bruxos e pajés, que
observando o comportamento de animais, quando utilizando os produtos da natureza, tinham
determinadas reações. Depois, com o desenvolvimento da química moderna esses processos
se consolidaram através de ensaios e experimentos criando novas formas de produtos.
O sistema econômico vigente, ao considerar o uso dessas mercadorias, construiu uma
demanda a partir dos produtos de alimentação humana, conservação de alimentos e tratamento
de doenças, cujos volumes vêm crescendo significativamente ao longo dos anos. Entretanto, a
diversidade e peculiaridade dos produtos, as estatísticas são falhas e insuficientes.
No caso da alimentação humana, a sociedade, partiu de algumas especiarias e produtos
nativos nas terras descobertas pelos europeus. Posteriormente, passou a produzir espécies
antes desconhecidas e apropriadas, a partir do século XV, com alguma racionalidade,
aprofundada com o tempo. Esse processo permitiu outras opções pelas quais passam e
passaram pela diferenciação do produto.
Ao ampliar a escala de produtos agrícolas, abandonando a categoria especiarias e
transformando-se em alimentos, há um ponto principal: a ampliação de sua escala de
produção. Como conseqüência apresentou-se a redução da recorrente fome da Europa, com
vantagens ambientais, como foi o caso do açúcar, do café, do chocolate, do milho, do arroz,
da batata, por exemplo, cuja mudança de ecossistema manteve os inimigos naturais à distância
e o volume de produção crescente.
Outros produtos, de uso mais restrito, como as especiarias, mantendo-se como tal,
ganharam escala e permitiram o consumo popular para conservação de alimentos, antes do
uso da refrigeração e da eletricidade. Assim, as pimentas, noz moscada, cravo, canela,
cinamomo, salsa, sálvia, orégano, erva doce, etc. passaram cada vez mais a fazer parte da
alimentação humana e continuaram sendo usados no tratamento da saúde das populações
metropolitanas, mas, principalmente, nas regiões periféricas.
Ao longo do tempo, esses produtos foram se adaptando e ampliando seu uso. Alguns
deles se transformaram na base da economia de paises, como o caso do café para o Brasil e a
Colômbia. O chocolate para países da costa oriental africana. O arroz para países do sudeste
asiático.
Recentemente, o comércio mundial dos produtos naturais tem crescido,
principalmente os fitoterápicos2. Esse crescimento mundial está estimado entre 10% a 20% ao
ano. As razões que impulsionaram esse crescimento são: a valorização de uma vida com
hábitos mais saudáveis, permitindo a ampliação de consumo de produtos naturais; os
evidentes efeitos colaterais dos medicamentos sintéticos; a descoberta de novos princípios
ativos nas plantas; a comprovação científica de fitoterápicos; e o preço, de maneira geral,
mais acessível à população com menor poder aquisitivo.
A estimativa do mercado mundial para medicamentos é de US$ 300 bilhões por ano,
sendo US$ 20 bilhões derivados de substâncias ativas de plantas medicinais. Já a estimativa
do mercado nacional de medicamentos é de aproximadamente US$ 8 bilhões por ano, com os
derivados de plantas medicinais correspondendo a US$ 1,5 bilhão. Desse total, outras opções
passam pela diferenciação do produto.
No Brasil, a legislação pertinente aos produtos naturais tem sido modificada sob
inspiração de diversos interesses (como em todas as políticas), como é possível depreender da
história e da antropologia, relativa à medicina e seus grupos de pressão. Atualmente, vigora
como regulamento básico à resolução 17 da ANVISA - Agência Nacional de Vigilância
Sanitária de 2.000. Os limites definidos por essa legislação, buscam padronizar e caracterizar
os princípios ativos a serem implantados, além de definir, através das demais normas,
investimentos, em geral, inacessíveis aos micros e pequenos empresários, principais
operadores desses produtos. Dessa maneira, em função da inacessibilidade, há uma burla
sistemática, condicionando fitoterápicos como alimentos, na forma de chás produzidos como
alimento.
Esse negócio vem sendo difundido sob a proteção e manto popular. É estimulado pela
mídia e mesmo por instituições religiosas, sendo ampliado, especialmente, pelo modismo de
uma certa “geração saúde”, cujos ícones estão nas atividades físicas corporais e controle
alimentar. Não é desprezível, por outro lado, o prazer alimentar desenvolvido em confrarias e
grupos de amigos, cujo uso de ervas e corantes em alimentos sofisticados, ocorre com
freqüência, em experiências gastronômicas e culinárias, sendo apropriado, nesse caso, o uso
de temperos e condimentos. Ao mesmo tempo, desenvolvem-se chás, ungüentos e essências
utilizadas no tratamento de obesidade, anti-stress, anti-reumáticos, antidiabético, tratamento
de cabelo e pele.
Surge, então, uma primeira contradição a ser analisada: a relativa segurança
preconizada pela agência de vigilância sanitária, preocupada em estabelecer padrões de
qualidade para os produtos de origem orgânica e a demanda popular, buscando produtos
sabidamente diferenciados dos padrões definidos pela agência. A questão, assim considerada,
2
Essa denominação vem sendo adotada para os produtos naturais destinados ao tratamento de saúde.
incorpora razões relativas à antiguidade e tradição, inerentes ao processo cultural, negando
aquilo que poderia ser considerado um modismo e como tal passível de retalhamento à
fiscalização. Não é.
Nota-se, desde logo, os volumosos recursos que envolvem os negócios da saúde,
principalmente os laboratórios químicos, para produção e comercialização de produtos de fins
de usos fitoterápicos. Portanto, a mera apropriação do conhecimento implica em
comportamento ético e passível de discussão política. Por outro lado, há razões mais
objetivas: o desenvolvimento de um medicamento sintético custa em torno de US$ 500
milhões, considerando técnicas randomizadas e duplo cego, necessárias à validação do
remédio, caindo para US$ 50 milhões no caso dos fitoterápicos, que podem chegar ao
mercado num tempo dez vezes menor.
4. Construção da demanda de produtos naturais
A demanda por produtos naturais é, portanto, em geral, construída em nichos cuja base
consumidora é uma população de baixa renda e pessoas envolvidas pelo conceito de saúde na
sua melhor qualidade. A agregação desses consumos é fornecida por “raizeiros” e
“comerciantes” de raízes, cascas de caules, sementes, e principalmente folhas de árvores e
ervas, que “aviam” receitas prescritas por benzedores, curandeiros e até médicos envolvidos
com a arte milenar de curar.
A busca desses profissionais está nos limites impostos pelo padrão da população de
baixa renda cujos cuidados com higiene são desejáveis mas nem sempre rigorosos,
acreditando-se, inclusive, serem praticados alguns usos não recomendáveis desse ponto de
vista, como misturas de teias de aranha, ossos de cadáveres etc.
Efetivamente, nos anos noventa, alguns aspectos da política de saúde, notadamente os
preços dos remédios, mostraram a elevação e alteração na demanda. Como conseqüência e
reação a esses aspectos os consumidores pressionaram com a redução o consumo e a busca de
alternativas nos fitoterápicos. Outra evidência como reação à elevação dos preços foi a
atuação governamental de liberar os genéricos, considerando a redução de preços para
remédios junto à população. Esse aspecto pouco alterou o oligopólio de produção, ao qual
está submetido o mercado, constituído por laboratórios poderosos, formadores de preços e, em
geral, internacionais.
Outro limite, também derivado do padrão de renda do consumidor e da política
sanitária governamental, é o atendimento dado à população por alguns profissionais de saúde
em postos e centros de saúde quanto ao atendimento dos pacientes3.
Assim, o descuido de alguns profissionais para com a população e o preço de remédios
praticado no mercado, provoca uma busca de alternativas para o tratamento da população de
baixa renda, cuja solução mediata é o “curandeiro” do bairro ou da vila próxima.
Evidentemente, a razão de comprar tem outros fatores, além dos já citados. O fator
cultural certamente é importante nesse conjunto. Ele deriva da necessidade e da tradição, familiar ou do grupo comunitário, aqui considerando parentes, vizinhos, lideranças e
“especialistas” cujo relato de casos de cura na comunidade é o principal fator de consideração,
cuja transmissão ocorre pela oralidade.
Nesse sentido, há uma importante ligação entre o conhecimento empírico transmitido,
através de gerações e o produto considerado. Assim, a tradição se traduz pelo uso ao longo do
tempo, como na cultura chinesa, na qual o uso de produtos naturais se desenvolve a mais de
cinco mil anos, evoluindo no seu uso. Ou em certas regiões da Europa, onde chás e ungüentos
são utilizados a centenas de anos trazidos pelos “bárbaros”, inclusive da China e outras
regiões da Ásia.
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Existem profissionais, quando procedem à consulta, sequer conversam com o paciente, retirando-lhe a
confiança necessária na relação médico-paciente, ou profissional de saúde-paciente.
Para o comércio, entretanto, esse aspecto às vezes é desprezado. Pela necessidade de
atendimento do “cliente”, apresentando-se espécies para tratamentos similares. Os efeitos de
cura, nesses casos, podem ser discutíveis, ou mesmo diferentes, em função das características
de solo, clima, enfim ambiental. Assim, espécies conhecidas e usadas na Mata Atlânticas,
muitas vezes, não têm a mesma característica na região do cerrado de Mato Grosso, ou viceversa, mesmo sendo considerada a mesma espécie. Porém seu uso ocorre.
5. Produção dos Fitoterápicos, Corantes e Especiarias.
Há duas formas de produção dos produtos naturais fitoterápicos, corantes e
especiarias: a coleta e a produção racional. Ambas ocorrem de maneira complementar às
atividades principais do coletor nas unidades produtoras agrícolas ou extrativistas.
Raramente existe a produção exclusiva de alguma das espécies coletadas ou
cultivadas. Grande parte dos produtos naturais, consumidos no Brasil, é oriunda de plantios
onde ocorre coleta ou cultivos em outros países como o Chile e países do Oriente. No Brasil,
a atividade de coleta ocorre em quase todos os estados, entretanto, em pequeno volume, sendo
que o processo de apanha se dá de forma individual por espécie, por encomenda e quando
solicitada. A apanha pode, eventualmente, se ocorrer a aproximação, ser feita com dois ou três
produtos, cujo interesse comercial é evidente, mas em menor quantidade. Diferentemente,
ocorre a produção em canteiros e hortas de fundo de quintal, cuja destinação é feita para
alguns comerciantes, produtores de chás e extratos.
A maior parte desses produtos, depois de colhidos, necessita ter a sua umidade
retirada, sem incidência direta dos raios solares havendo, para tanto, o preparo de isolamento
da superfície onde deverão ser depositadas as folhas (outras partes da planta) para não ficar
sujeita a fungos e bolor. Quando se trata de quantidades maiores, essa secagem é realizada em
fornos, cuja energia pode ser solar, elétrica ou a própria biomassa local.
Depois de secas, as folhas são rasgadas e separadas as ranhuras e partes mais
irregulares, cujo destino são os moinhos de bola que as processam como matéria-prima para
saches de chá.
Assim, o produto natural é embalado. Em folhas inteiras quando for comercializado no
atacado. Rasgado, picado e outras formas de manipulação quando comercializado em
empresas de caráter regional. Em saches de pó moído para chás.
Há também o produto processado verde como essência, ou extraído por processos
químico-farmacêutico.
6. O Comércio de Produtos Naturais no Brasil
O comerciante de produtos naturais origina-se, portanto, da necessidade de
atendimento de uma demanda crescente por mercadoria culturalmente aceita para a qual a
população migra em função do mau atendimento, altos preços, tradição de consumo ou
modismo.
A mercadoria é produzida em diversas regiões do país, mas tem agregação dos
volumes em São Paulo. Além disso, há a produção de alguns paises, de onde são importados
e, em geral reunidos nos mesmos atacadistas. Reunidas, a produção nacional e internacional,
no principal centro de comércio geral: São Paulo, pode-se identificar os atacadistas, na região
do mercado Municipal ou da 25 de março, controlada por aproximadamente 20 comerciantes.
O que pode ser caracterizado no grande centro distribuidor brasileiro, é a base do
complexo desses produtos. Os demais centros, como esse, dificilmente apresentam todas as
espécies, agora transformada em mercadorias do mercado de especiarias, fitoterápicos e
corantes, considerando os arranjos produtivos locais, em função das especificidades regionais
de clima, vegetação etc.
Para atender a demanda, os comerciantes lançam mão de produtos das diferentes
procedências nas diferentes regiões nacionais e internacionais, e não na origem regional. Isso
é mais evidente nas regiões de colonização recente, onde as espécies locais são desconhecidas
para a maioria da população, como é o caso de Mato Grosso, apesar da existência de grande
potencial de alguns produtos ainda desconhecidos, considerando a mata, não derrubada, cuja
produção sistematizada desses produtos necessita ser realizada.
Dessa maneira, algumas regiões passam a ser consideradas como tradicionais no trato
de produtos naturais. Nessa categoria estão Belém, para os produtos da Amazônia; Salvador,
para coletas da região baiana; e, naturalmente, São Paulo que abarca produtos atacadistas de
todo o Brasil. Note-se que são regiões tradicionalmente usuárias desses produtos.
É possível desenvolver uma verdadeira antropologia a partir dos cuidados com os
produtos do atacado, a partir da análise dos produtos adquiridos naquela região. As
embalagens, segundo os cuidados e apresentação, a maior ou menor mistura de plantas
indicando a pureza daquelas espécies; a maior ou menor sujeira, mistura de plantas com teia
de aranha, poeira e, indicam as regiões de origem para os consumidores varejistas e
processadores dos produtos. E, esse é um fator definidor dos preços no atacado.
A “geração saúde”, como pode ser denominada a parte da população consumidora
desse “modismo”, tem merecido respeito pela garra e perseverança com as quais busca manter
seus valores. Por outro lado, um outro contingente, preocupado com o preço e sua renda
utiliza os mesmos produtos com outra apresentação e por outros motivos menos prosaicos.
A apresentação tem recebido tratamento especial nos últimos anos. Nos
supermercados do país existem prateleiras exclusivas para produtos naturais, onde empresas
especialistas, por exemplo, em pimentas, oferecem verdadeiras bulas sobre as vantagens das
diversas espécies apresentadas; grande variedade de chás e curas, listados em folhetos ou nas
embalagens distribuídos em encartes, por outras empresas, cujo padrão eram ervas
tradicionais como o mate e o chá da Índia ou Preto e incursionaram para novos produtos
naturais, apresentados em embalagens tradicionais como saches, em caixas.
Lojas de estilo, nos shoppings centers, passaram a comercializar extratos, essências e
ervas destinadas a fabricação de perfumes, águas de cheiro, além de óleos aromáticos para
odorizar quartos e ambientes, além de outros produtos naturais. Para tanto, o uso de materiais
de construção como granitos ou porcelanatos passaram a ser incluídos na sua decoração,
trabalhados por arquitetos que poderiam ser consideradas butiques de plantas, com uma
característica de rusticidade.
Entretanto, a decoração verdadeiramente de lojas rústicas, mas higiênicas, com
sacaria em algodão de fibras naturais, expondo produtos em estrados de madeira seca e sem
odor, ou de metal, portanto mais simples e de bom gosto, também estão vem sendo utilizados
em algumas regiões, onde os usos ficam didaticamente expostos. Essas lojas vendem toda a
linha de produtos como: fitoterápico, gastronômico, condimentar, corante. Destinam-se a
população de baixa renda e estão colocadas principalmente em mercados municipais
restaurados.
Por último, as hortas medicinais. Com elas, é possível reduzir as doenças da
população periférica encontrada nos postos de saúde. Para tanto, a semeadura em canteiros de
alguns produtos, permitiria reduzir 70% das doenças apresentadas naqueles locais. Esse
projeto foi desenvolvido no Ceará e é certo um excelente resultado na área publica.
7. Conclusões
O artigo parte das teorias de cadeias e arranjos produtivos para investigar o processo
de produção, comercialização e industrialização de produtos naturais em Mato Grosso,
especificamente da Baixada Cuiabana, em 2003.
O arranjo não foi detectado como consolidado, mas existe um potencial para a
agregação de valor para os pequenos e médios proprietários rurais. Entretanto, não se detectou
a possibilidade de trabalhar com escala na comercialização destes produtos naturais, pelo fato
do mercado ser restrito e contar com várias barreiras sanitárias e legais.
Também, o produto tem características intrínsecas que dificultam a obtenção de escala
de produção. Para se viabilizar o processo, deve-se ter uma finita quantidade de diferentes
produtos, gerando economia de escopo e criando nichos de mercado tais que cada produtor
pode se articular com outras etapas como artesanato ou produtos dermatológicos, aromáticos,
alimentícios entre outros.
Iniciativas como as do projeto nordestino de farmácias vivas são colocadas como
alternativas para o fomento e criação de demanda por produtos naturais.
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análise dos negócios dos arranjos de produtos naturais na baixada