ANÁLISE DOS NEGÓCIOS DOS ARRANJOS DE PRODUTOS NATURAIS NA BAIXADA CUIABANA: UMA ECONOMIA DE ESCOPO1 José Manuel Carvalho Marta Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo RESUMO – Este estudo trata do processo de coleta e distribuição de produtos naturais em Mato Grosso, na Baixada Cuiabana, em 2003. A questão em foco envolve o reconhecimento de cadeias produtivas de produtos naturais, fitoterápicos e semelhantes, com o intuito maior de descrever a cadeia como um todo e sugerir estratégias de fomento. Com base em dados de campo assim como de pesquisas bibliográficas locais, constatou-se a inexistência de uma cadeia completa dentro do estado, mas com potencial importante para a viabilização de propriedades rurais pequenas e médias, além de processos de agregação de valor, tais como infusões, chás e processos químicos farmacêuticos em geral. Tal estudo surge como importante fonte de informações locais para empreendimentos na atividade de coleta e distribuição, principalmente fitoterápicos, cujo potencial foi detectado. Nesse sentido, formas de organização comercial, de logística e de gestão foram sugeridas, semelhantes às experiências observadas em outros estados. Em um seminário de avaliação, constatou-se a dificuldade dos empreendedores em relação aos requisitos sanitários legais, recomendando-se alternativas para a realidade mostrada. PALAVRAS-CHAVES: comercialização, Mato Grosso, recursos naturais. 1. Introdução Os negócios de produtos naturais, nestes primeiros anos do século XXI, apresentam-se como um nicho econômico de atividades crescentes. Esse espaço, enquanto nicho, vem sendo retomado sob a inspiração de grupos preocupados com o culto ao corpo, o ambientalismo e o respeito à natureza, entre outros elementos. Caracteriza-se, entretanto, no consumo rotineiro do uso de chás e essências de outro conjunto de menor renda, com preocupações de outra natureza, fazendo explicitar a oferta como um escopo de mercadorias para diversos usos e diferentes formas de apresentação. Naturalmente, ao se constituir um nicho de consumo, identificam-se com alguns valores sociais e se difundem através de diversos meios de comunicação moderna, específicos ou genéricos, em muitos países e culturas de todos os continentes. Portanto, são esses valores, apoiados por organizações não-governamentais (ONGs) e o terceiro setor, comprometidos com a preservação e conservação da natureza, constituindo uma economia própria ou como parte da economia globalizada. Ao se analisar os processos produtivos, nos quais se obtêm os produtos naturais para consumo, distribuição e a conseqüente acumulação, desses nichos acima referidos, pode-se entender a existência de algumas mercadorias com imensos potenciais e margens, mas carentes de investimentos. Isso decorre das características apresentadas através de uma estratégia econômica conhecida como economia de escopo, em face da miríade de produtos naturais, incorporados na lista de artigos ofertados. Tal lista apresenta chás, condimentos, perfumes, flores, essências, artesanato, especiarias, utilizados na manufatura de enfeites, alimentos, remédios, utilitários. Assim, estando a matéria-prima, disponível na natureza e passível de apropriação pelo mercado, para uma população urbana ou rural, pode, também, ser 1 Pesquisa financiada pelo SEBRAE/MT em convênio com a Fundação Uniselva, em setembro de 2003. cultivada em quintais, vasos e hortas caseiras, certamente, permitindo margens importantes. Porém a “vida moderna” exige formas e embalagens diferentes, em estabelecimentos acessíveis em shopping centers, lojas urbanas ou adequados modos de comercialização ainda não incorporados pelos comerciantes e manufaturadores desses produtos. Este artigo busca a melhor compreensão da cadeia produtiva de produtos naturais na Baixada Cuiabana, em Mato Grosso. Especificamente, pretende-se detectar os pontos de estrangulamento no fluxo de produtos e de incentivos para a produção, comercialização e industrialização destes, numa visão estratégica junto aos segmentos envolvidos. A contribuição deste artigo está na análise econômica regional do tema, uma vez que o enfoque farmacêutico não permitiu solucionar os entraves e, ainda, dar sugestões de políticas para fomentar o setor, numa região carente de investimentos e opções de negócios ao pequeno e médio proprietário rural. Na próxima seção discute-se a metodologia utilizada, seguida pela discussão do negócio de recursos naturais na seção 3. Na seção 4, tem-se alguns aspectos da construção da demanda de produtos naturais. A produção dos “fitoterápicos, corantes e especiarias”, é discutida na seção 5. Na seção 6, trata-se do comércio de produtos naturais no Brasil. Finalmente, na seção 7, têm-se as conclusões do trabalho. 2. Metodologia Ao se discutir aspectos da viabilidade econômica de atividades extrativistas, Anderson (1994), utilizou o conceito de reserva extrativista como um conceito para entender a exploração dos recursos naturais – não madeireiros – como a borracha (hevea brasiliensis), castanha do Pará (bertholletia excelsa), açaí (euterpe oleracea) e babaçu (orbignya phalerata). Por extensão, entendeu-se importante para acatá-lo parcialmente no estudo. A viabilidade econômica do extrativismo não-madeireiro é duvidosa às vezes contraditória. Argumentam os críticos, com relação aos aspectos econômicos – volume, freqüência, disponibilidade, escala – exceto para alguns produtos como: açaí, palmitos, castanha do Pará e borracha. Para os defensores dessa atividade as economias baseadas no extrativismo são instáveis e sujeitas à concorrência de outras atividades, cuja racionalidade capitalista, decorre da eficiência e da escala, conceitos estes, em geral, industriais. Esse processo leva à perda de importância dos produtos de origem extrativista, cuja sustentação de preços é feita de maneira subsidiada – como no caso da borracha. Algumas limitações na produção podem ser caracterizadas como elementos de inviabilidade como: a dispersão da ocorrência das espécies, a rarefação da população coletora, a baixa demanda, alta competitividade comercial, alto custo de transporte (Anderson, 1994). Não pode, certamente, ser tratada como uma panacéia de diversas questões do extrativismo ou da agricultura familiar. Pode, entretanto, ter um papel importante na discussão sobre o desenvolvimento regional e complemento da renda das atividades rurais, como um elemento do processo, tendo uma base muito precária. Essa precariedade ocorre em função do acesso aos mercados, dificultando a formação de valor e a geração de emprego e renda. Há dificuldades quando se considera a permanência das populações no campo, cujo atendimento social ofertado, pelas políticas publicas, são de difícil solução na área de educação e saúde, considerando a dispersão da população. Certamente as pequenas localidades são privilegiadas nesse aspecto. Considerar aspectos de estudo de custo-benefício tradicional não permite a consideração da análise da viabilidade econômica do extrativismo em sentido mais amplo: 1) O uso da terra e da floresta (como bens de produção permanente, sem intervenção de outros meios de produção, com uma lógica própria e, em geral desconhecida do ser humano, para o seu desenvolvimento); 2) Análise histórico-social, abstraindo-se das mudanças sociais, como por exemplo, a melhoria dos processos para produtos não madeireiros; (ao tratar como variável no processo de produção, desconsidera questões tecnológicas, cuja evolução vem ocorrendo, em função do próprio avanço social existente em outros setores da sociedade). A primeira questão a ser considerada é a do “uso da terra como fonte da produção natural”. Ao compararem-se os diversos os usos dados a terra, os indicadores de ocupação e uso, em algumas regiões brasileiras são extremamente baixos. Como exemplo, a pecuária extensiva realizada permite entender a possibilidade da comparação ora proposta. A pecuária extensiva foi estudada por Buschbacher (1986) e Hecht et al (1988), ambos citados por Anderson (1994). A agricultura itinerante foi estudada por Fearnside (1985), citado por Anderson (1994). Ambos os casos, observaram baixos retornos e alta desistência de projetos de colonização. Em todos os casos estudados, podem ser considerados os apoios de políticas governamentais, através de crédito subsidiado, preço mínimo, construção de estradas para escoamento da produção, construção de armazéns e a geração de novas tecnologias. Os programas mais destacados neste sentido foram: Programa de Pólos Agropecuários e Minerais da Amazônia (POLOAMAZÔNIA); Programa de Desenvolvimento dos Cerrados (POLOCENTRO); e Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil (POLONOROESTE). Quanto à análise do investimento e os retornos não econômicos, foram levados em conta a questão da sustentabilidade da terra, os custos sociais e os custos ambientais. Dessa maneira, os custos reais para a implantação de pecuária extensiva em áreas cobertas por matas, devem considerar investimentos como o desmatamento, demarcação, construção de cercas, manutenção e tratos culturais. Na Amazônia, conforme Gasques e Yokomizo (1986), citado por Anderson (1994), cada vaga de trabalho criada em projetos da Superintendência da Amazônia (SUDAM) custou US$ 50,000.00. Os custos ambientais, não contabilizados naquele estudo, deveriam ainda considerar: perdas de nutrientes da biomassa queimada, aumento da erosão, aumento das enchentes, aumento das queimadas nas áreas adjacentes, as transferências de carbono para a atmosfera (segundo Uhl e Mattos, citado por Anderson (1994), a transferência do carbono para a atmosfera deve considerar uma perda de US$ 1,250.00), e a perda da biodiversidade. Outros valores sociais não considerados na análise são: a organização social e política dos extratores de plantas, contrariando o “status quo” do latifúndio e da propriedade pouco produtiva como elemento do poder e da apropriação dos recursos públicos; reconhecimento de direitos preteridos às populações locais – direito a terra onde nasceram e foram criados; redução ou desaparecimento de relações exploratórias para produtos naturais; criação de novos produtos e desenvolvimento de um comércio local de castanha do Pará sem intermediários, através de cooperativas, a preços duplicados ao produtor sem aumentar o do consumidor, comercialização com entidades não governamentais, beneficiamento descentralizado de castanhas permitindo o aumento da renda familiar dentro de uma nova política para o beneficiamento da castanha. O extrativismo como opção econômica única indica limitação, podendo ser superadas pelo o uso complementar à agricultura (ou pecuária) com o extrativismo relevante na Amazônia, contrapondo-se à exclusividade da produção quando tratada pela população ribeirinha (Anderson, 1994). Alguns autores como Schwartzman (1989) e Almeida, Anderson e Iori (1992), ambos citados por Anderson (1994) estudaram o papel do extrativismo vegetal na sustentação das populações e concluíram: a) raramente a atividade se apresenta como única fonte de renda; b) o extrativismo é complemento de outras atividades econômicas – agricultura familiar, pesca, pequena pecuária; e c) essa atividade pode se caracterizar por: baixos investimentos, baixo risco, destinado a população de baixa renda. Assim, a produção extrativista deve estar integrada ao contexto mais amplo que requer não somente a ampliação da coleta junto à atividade agropecuária, mas também associada ao conjunto de atores que formam o Arranjo Produtivo Local, buscando o desenvolvimento não apenas da atividade mas da região como um todo. Arranjos Produtivos Locais (APLs) como estratégia de desenvolvimento As estratégias recentes de desenvolvimento têm alternado entre abordagens diferenciadas pelo nível de análise, dividindo-se em: Sistemas Agroindustriais (SAI), Complexos Agroindustriais (CAI), ou ainda, Cadeias de Produção Agroindustrial (CPA) (Batalha, 2001; Zylbersztajn e Neves, 2000). O SAI é o conjunto de atividades e processos produtivos agroindustriais que ocorrem entre a indústria de insumos e o consumidor final. Envolve vários produtos e matérias-primas e é composto por vários CAIs. Assim, dada sua amplitude, tem sua análise dificultada e de pouca aplicação. O CAI tem como ponto de partida a matéria-prima base que dá origem a vários produtos analisados. Assim, como exemplo, pode-se citar o CAI da soja, o CAI do café, o CAI do algodão. Cada CAI pode conter várias cadeias produtivas (CPA). O CAI da camomila, como exemplo, pode conter a cadeia produtiva do chá de camomila, a cadeia produtiva do xampu de camomila entre outras. Pode ser de grande utilidade se o formulador de políticas desejar analisar o fomento da produção de matéria-prima, como o caso da camomila, ou mesmo se desejar verificar possíveis usos da mesma. A análise da CPA (Cadeia Produtiva Agroindustrial) foi a que mais se destacou nos últimos anos, pela especificidade do enfoque e vantagens associadas na análise. A CPA caracteriza-se pelo foco de análise no produto final, por exemplo, no xampu de camomila, ao invés do enfoque na matéria-prima camomila. Assim, envolve todas as relações comerciais e financeiras, operações de transformação do produto, transporte e outras, desde o produtor do insumo básico até o consumidor final do produto em análise. Normalmente divide-se a análise de cadeias em Produção de matérias-primas, Comercialização e Industrialização como os macrossegmentos de análise, para facilitar a compreensão do fluxo de produtos e serviços entre os atores. As análises recentes do Sebrae, em nível nacional, vêm sendo conduzidas utilizando-se esse enfoque, em conformidade com Sebrae (2000). No presente estudo, dividiu-se o objeto em três segmentos: o primeiro bloco incorpora as produções regionais, nacionais e as importações de espécies tradicionalmente conhecidas e utilizadas em países da Europa, Ásia e América Latina, especialmente o Chile, onde merece destaque o boldo e a cáscara sagrada, utilizados no contexto regional nos tratamentos de obesidade e problemas estomacais. o segundo bloco diz respeito ao comércio formal, realizado principalmente por farmácias, lojas e supermercados, principalmente em seções de chás, folhas e condimentos. o terceiro bloco, do comércio informal, é abastecido pela coleta regional e por atacadistas de Goiás, São Paulo e Paraná, com destaque para os produtos da Mata Atlântica. De modo geral, a análise de CPA - Cadeias Produtivas Agroindustriais mostram uma fragilidade ao deixar com menor ênfase a questão da localização dos diferentes agentes (ou atores) dentro da cadeia. A localização torna-se importante ao se considerar muitos pontos de estrangulamento dentro das cadeias analisadas surgiam pelo fato dos atores estarem muito longe entre si. A distância aparece como possibilidades de negócio para novos agentes, intermediários facilitadores do fluxo de produtos e serviços entre as localidades. Nesse contexto, o foco de análise passa pela consideração dos chamados Clusters (ou o mesmo que Sistemas Produtivos Locais – SPL) ou, ainda, os Arranjos Produtivos Locais (APL). O conceito de cluster ou sistemas produtivos locais considera a aglomeração geográfica de atividades similares ou relacionadas, condicionantes históricos e culturais, assim como economias externas gerando economias de escala e vantagens para os agentes. O Sistema Produtivo Local é uma aglomeração geográfica de um grande número de empresas de tamanhos diferentes, normalmente não integradas verticalmente, fabricantes de um produto semelhante, assim como seus fornecedores de produtos e serviços (Suzigan, 2000). O uso de fitoterápicos deriva, em grande parte, destes condicionantes históricos e culturais, considerando que a população utiliza esses produtos com base em receitas e formulações passadas através das gerações. O enfoque do arranjo produtivo local busca captar fatores de natureza setorial, cultural, social e histórica no setor produtivo e no mercado, para compreender como estes fatores condicionam as inovações locais, a adoção de estratégias tecnológicas, a integração entre os agentes, sempre em busca de maior eficiência no funcionamento do arranjo como um todo. Esta metodologia foi utilizada por Lastres e Cassiolato (2002) para análise do arranjo produtivo têxtil-vestuário do Vale do Itajaí/SC. A maioria dos estudos envolve a identificação de uma região com o maior número de empresas produtoras de um produto similar ou igual. Uma vez detectado o arranjo, busca-se pela identificação dos agentes envolvidos, que de uma forma ou de outra facilitam o fluxo de bens e serviços, auxiliando o arranjo. Alguns fatores importantes são a estrutura de mercado (quantidade e tamanho das empresas, imperfeições de mercado etc), as relações de mercado entre os agentes, os aspectos institucionais que transpassam pelos diferentes níveis de mercado e aspectos da demanda pelos produtos. Estes fatores foram analisados e considerados para produtos fitoterápicos na região da Baixada Cuiabana, tendo sido identificados, em todos os segmentos, a presença de indivíduos capazes de responder às demandas existentes. Parte da análise dos arranjos inclui a comercialização do produto. Neste contexto, os canais de comercialização utilizados pelas empresas podem permitir a expansão destas numa região, e o projeto de novos canais pode auxiliar na consolidação de um arranjo produtivo local. Para o caso de arranjos não perfeitamente constituídos, um aspecto importante será a formação de capacidade de inovação local, com vistas a autodesenvolver o arranjo. Outras estratégias passam pela “importação” de um agente externo promovendo a incorporação de novas técnicas no arranjo, alterando assim o estado tecnológico inicial. No caso do presente estudo, para produtos naturais, grande parte da análise requer a visualização de novos canais de comercialização, assim como o aperfeiçoamento dos canais existentes. Nesse sentido, o desenvolvimento de instituições, organizações de atores da cadeia, incubadoras tecnológicas, ou cooperativas de produção e comercialização dos referidos produtos, assim como “farmácias vivas”, poderão ser sugestões para o fortalecimento dos canais de comercialização. Análise de canais de comercialização Segundo Coughlan et al (2002), um Canal de Comercialização (CC) é um aglomerado de organizações interdependentes envolvidas no processo de disponibilizar um produto ou serviço para o consumidor final. Segundo os autores, o intermediário tem um papel de suma importância no processo de comercialização dos produtos, pois torna mais fácil para o produtor vender o seu produto, já que o intermediário dispõe de um prévio conhecimento do mercado. Os membros de um canal de comercialização são os fabricantes, os intermediários e os usuários finais. “O estudo de Canais de Comercialização é útil como forma de ampliar a compreensão da organização da comercialização nos seus aspectos externos ou estruturais” (Rezende, 2001: 43). Ao fazer uma análise dos Canais de Comercialização, é possível: a) detectar pontos de estrangulamento nos canais, ou seja, problemas a serem enfrentados na hora de colocar o produto no mercado; b) localizar graus de competição e imperfeições de mercado; c) diagnosticar quais os canais menos eficientes e possíveis alternativas; d) verificar a eficiência na logística de distribuição de produtos e serviços; e e) determinar qual o fluxo físico dos produtos agrícolas e agroindustriais, ou seja, fazer a rastreabilidade do produto. Para a análise específica do mercado de produtos naturais, é importante entender como projetar um canal de comercialização. O mercado segmentado, busca separar grupos de usuários, cujas características são homogêneas dentro de cada grupo,mas heterogêneas entre eles. Os usuários finais terão demandas diferentes para cada grupo caracterizado, requerendo, em muitos casos, canais de comercialização especifica. Sugere-se, assim, separar a análise das demandas considerando-se o tipo de serviço ou produto conforme a divisão de quantidade do serviço ou produto, da conveniência espacial, do tempo de entrega/espera, do sortimento/variedade desejada ou ainda pode-se especificar outra demanda por prestação de serviço. Como exemplos, para produtos naturais, os usuários finais poderão desejar: pacotes ou caixas grandes x envelopes plásticos; nas farmácias x nos supermercados; a cada semana x cada mês; de vários coletores x do mesmo coletor. De acordo com as demandas, especificam-se ou aperfeiçoam-se tipos distintos de canais. O posicionamento ou configuração do canal é a etapa na qual o analista busca definir as características do produto, seu preço e componente promocional, tentando avaliar se, com os recursos disponíveis no canal, poderá atender a este ou àquele segmento do mercado apontado na segmentação. Da mesma forma, esta etapa pode revelar segmentos atraentes para seu produto. Ainda, o analista prevê os agentes que participarão do canal a ser criado, ou verifica a ausência ou imperfeições naqueles agentes dentro dos canais existentes, configurando a estrutura do canal. Pode-se, ainda, ter agentes pequenos, médios ou grandes. Muitos, de um determinado tipo. Poucos, de outro. Muitas vezes, envolvidos com produtos diferentes daquele com o qual se trabalha. As escolhas considerando quais e quantos agentes estarão atuando, sendo vitais para a eficácia do canal. A terceira etapa é a Definição de Alvos. São definidos, principalmente, os focos do canal e os segmentos a serem deixados de lado na condução do mesmo. Os limites de atuação dos segmentos, dentro do canal, poderá determinar o seu alcance. Isso implica, muitas vezes, na definição de canais específicos e diferenciados. Tal situação emerge, por exemplo, quanto a necessidade para cobrir grandes extensões territoriais ou mesmo fazer negócios com o exterior. Realizadas as etapas anteriores, procura-se pela existência de canais que atendam as necessidades apontadas nas outras etapas, buscando seu aperfeiçoamento, ou providencia-se a criação de novos canais.Para os canais existentes, a questão será avaliar considerando as falhas e o desempenho dos fluxos do canal e a estrutura, comparando-os com o projetado nas etapas iniciais e as necessidades apontadas. Para os novos canais, a questão deverá avaliar o desempenho dos fluxos do canal e a estrutura desejada. Feito isso, inicia-se a implementação do canal. A Implementação do Canal deve considerar a identificação de fontes de poder entre os agentes e identificar os conflitos entre eles. O objetivo principal deve ser coordenar o canal de forma que os interesses sejam conciliados e que se possa, finalmente, viabilizar os fluxos, fazendo o produto chegar ao usuário final. Estrutura e imperfeições de mercado A análise de comercialização é a discussão e observação da estrutura de mercado. Assim, entende-se estrutura de mercado, através de algumas características essenciais a serem observadas, a saber: número de empresas ou atores em cada segmento de mercado, tamanho das empresas ou dos agentes em cada nível de mercado, relação entre os agentes (contratos, líder x seguidor, fixação de preços), presença x ausência de intermediários, associativismo no mercado, facilidade de acesso ao mercado, diferenciação do produto, localização entre outras. O posicionamento desses fatores permite definir as estruturas de mercado ou seja, o mercado poderá ser de concorrência perfeita ou imperfeita entre os agentes. Eventualmente, haverá alguma transferência de poder, entre as lideranças apresentadas no mercado, e a capacidade de fixar preços e margens de comercialização. A presença de poucos agentes, em determinado elo da cadeia, pode ocasionar a formação de oligopólios na venda de produtos, podendo estabelecer preços com lucro acima do normal ou mesmo praticar estratégias para barrar a entrada de novos agentes no mercado. Muitas vezes, existem poucos atores por haver alguma exigência jurídica que dificulta a operação da empresa ou, ainda, pela necessidade de elevados investimentos, como no caso da indústria farmacêutica, por exemplo. A questão do tamanho dos agentes também é importante, ao considerar que mesmo na presença de vários produtores, a presença de poucos grandes poderá desviar o centro das decisões para aquele grupo de grandes produtores que, provavelmente, direcionará as práticas de mercado adotadas. Estratégias associativistas e empreendoristas considerando a compra de insumos e venda de produtos, devem levar em conta a diferenciação do produto. Nessa perspectiva, incubadoras tecnológicas e de empresas, ou cooperativas de produção e comercialização dos referidos produtos devem ser prospectadas como alternativas de negócio. Há, ainda, projetos como “farmácias vivas”, que se apresentam como alternativas razoáveis para reduzir a força dos grandes agentes. A diferenciação do produto confere status desigual entre as mercadorias, cujos consumidores apresentam condições de identificar o produto desejado de um vendedor em particular entre os vários existentes. Tal prática também gera imperfeições de mercado ao criar uma espécie de monopólio para aquele produto específico, seja via qualidade, marca ou local de origem. Esses fatores, como a segurança na identificação de um produto natural, ou a orientação passada, por exemplo, receitada por um raizeiro, poderão ser fatores determinantes para a escolha de onde e de quem comprar um produto natural. Dessa maneira, o raizeiro procura utilizar propaganda para destacar as vantagens de seu produto e muitas vezes chegam até mesmo a desvalorizar os produtos de outros “concorrentes” por meio desta propaganda. Dados e fonte Do ponto de vista metodológico, o estudo baseia-se, além dos autores já citados, em Batalha (2001), Santana (2002) e Zylbersztajn e Neves (2000), que enfocam a questão da comercialização e o processo agroindustrial em cadeias produtivas. Os estudos de Lastres e Cassiolato (2002) e Cassiolato et al (2000) fazem o detalhamento da metodologia de Arranjos Produtivos Locais como meio de organização das atividades na economia regional. Outros instrumentos foram aplicados, como, por exemplo, entrevistas semiestruturadas e questionários, cuja tabulação, permitiu a interpretação da realidade dessa cadeia produtiva. Foram aplicados dois tipos de questionários: sobre os comerciantes informais e sobre os comerciantes informais. Como comerciantes informais, foram identificados 13 agentes em Cuiabá e Várzea Grande. Entre os comerciantes formais, foram constatadas 30 farmácias. Entre os supermercados que comercializam produtos naturais na forma de chás, foram contatados dois supermercados em Cuiabá. Essa pesquisa de campo ocorreu entre os meses de agosto e setembro, junto aos raizeiros comerciantes e distribuidores daquelas mercadorias junto à população de Cuiabá e de outras pequenas cidades da região. Em outubro, ao participar do Seminário Mato-Grossense de Produtos Naturais, onde foram apresentados os resultados parciais sobre o tema, foram recebidas contribuições e indagações, principalmente na atividade institucional e as operações desenvolvidas em alguns estados da Amazônia .Assim, em função do objeto ao qual se pretendia entender viu-se a necessidade de conhecer a realidade do mercado de maneira ampliada. Em dezembro e janeiro desenvolveram-se estudos complementares no interior de Minas Gerais, capital do estado de São Paulo, Curitiba no Paraná e litoral de Santa Catarina. 3. Negócios de produtos naturais. Para um estudo de produtos naturais necessita-se levar em conta duas ordens de conhecimento: empírico e cientifico. O primeiro, empírico, é relacionado com o saber popular e derivado da tradição cultural da população, tendo como base as observações dos animais e mesmo as populações primitivas e suas reações. É desse saber que se constituem sacerdotes, pajés, xamãs e boticários, cuja arte de curar transcende o tempo, mantendo-se até a atualidade. É dessa prática que se estimularam as grandes navegações de busca de especiarias na Ásia e desenvolvimento de jardins e hortos na Europa e na Ásia, importantes para a nova arquitetura, mas que pode ser considerada como uma espécie de banco genético primitivo, nos séculos anteriores. O conhecimento científico moderno está ligado uma farmacopéia especifica moderna e racional. Entretanto, deriva, primeiro, da alquimia - origem da química do século XVIII - e, em seguida, das boticas, gênesis das farmácias atuais e da medicina moderna. Estão nesses métodos os processos e técnicas científicas, reconhecidos na eficiência de higiene e sanidade para os produtos e instrumentos utilizados, que aprofundou a racionalização e incluiu a divisão do trabalho e o mercado nesse sistema. A necessidade de eliminar a concorrência e a tradição, como elemento essencial de atendimento, marginalizou o conhecimento empírico. Essa substituição introduziu algumas características no processo de produção, comercialização e acumulação da riqueza, cuja necessidade de um negócio lucrativo se fez apresentar, como um complexo químico farmacêutico. De certa maneira, é possível afirmar que a gênesis dos negócios de produtos naturais, principalmente dos fitoterápicos, assim como, a manipulação de ervas para condimentos e corantes, deriva da observação popular da arte dos antigos curandeiros, bruxos e pajés, que observando o comportamento de animais, quando utilizando os produtos da natureza, tinham determinadas reações. Depois, com o desenvolvimento da química moderna esses processos se consolidaram através de ensaios e experimentos criando novas formas de produtos. O sistema econômico vigente, ao considerar o uso dessas mercadorias, construiu uma demanda a partir dos produtos de alimentação humana, conservação de alimentos e tratamento de doenças, cujos volumes vêm crescendo significativamente ao longo dos anos. Entretanto, a diversidade e peculiaridade dos produtos, as estatísticas são falhas e insuficientes. No caso da alimentação humana, a sociedade, partiu de algumas especiarias e produtos nativos nas terras descobertas pelos europeus. Posteriormente, passou a produzir espécies antes desconhecidas e apropriadas, a partir do século XV, com alguma racionalidade, aprofundada com o tempo. Esse processo permitiu outras opções pelas quais passam e passaram pela diferenciação do produto. Ao ampliar a escala de produtos agrícolas, abandonando a categoria especiarias e transformando-se em alimentos, há um ponto principal: a ampliação de sua escala de produção. Como conseqüência apresentou-se a redução da recorrente fome da Europa, com vantagens ambientais, como foi o caso do açúcar, do café, do chocolate, do milho, do arroz, da batata, por exemplo, cuja mudança de ecossistema manteve os inimigos naturais à distância e o volume de produção crescente. Outros produtos, de uso mais restrito, como as especiarias, mantendo-se como tal, ganharam escala e permitiram o consumo popular para conservação de alimentos, antes do uso da refrigeração e da eletricidade. Assim, as pimentas, noz moscada, cravo, canela, cinamomo, salsa, sálvia, orégano, erva doce, etc. passaram cada vez mais a fazer parte da alimentação humana e continuaram sendo usados no tratamento da saúde das populações metropolitanas, mas, principalmente, nas regiões periféricas. Ao longo do tempo, esses produtos foram se adaptando e ampliando seu uso. Alguns deles se transformaram na base da economia de paises, como o caso do café para o Brasil e a Colômbia. O chocolate para países da costa oriental africana. O arroz para países do sudeste asiático. Recentemente, o comércio mundial dos produtos naturais tem crescido, principalmente os fitoterápicos2. Esse crescimento mundial está estimado entre 10% a 20% ao ano. As razões que impulsionaram esse crescimento são: a valorização de uma vida com hábitos mais saudáveis, permitindo a ampliação de consumo de produtos naturais; os evidentes efeitos colaterais dos medicamentos sintéticos; a descoberta de novos princípios ativos nas plantas; a comprovação científica de fitoterápicos; e o preço, de maneira geral, mais acessível à população com menor poder aquisitivo. A estimativa do mercado mundial para medicamentos é de US$ 300 bilhões por ano, sendo US$ 20 bilhões derivados de substâncias ativas de plantas medicinais. Já a estimativa do mercado nacional de medicamentos é de aproximadamente US$ 8 bilhões por ano, com os derivados de plantas medicinais correspondendo a US$ 1,5 bilhão. Desse total, outras opções passam pela diferenciação do produto. No Brasil, a legislação pertinente aos produtos naturais tem sido modificada sob inspiração de diversos interesses (como em todas as políticas), como é possível depreender da história e da antropologia, relativa à medicina e seus grupos de pressão. Atualmente, vigora como regulamento básico à resolução 17 da ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária de 2.000. Os limites definidos por essa legislação, buscam padronizar e caracterizar os princípios ativos a serem implantados, além de definir, através das demais normas, investimentos, em geral, inacessíveis aos micros e pequenos empresários, principais operadores desses produtos. Dessa maneira, em função da inacessibilidade, há uma burla sistemática, condicionando fitoterápicos como alimentos, na forma de chás produzidos como alimento. Esse negócio vem sendo difundido sob a proteção e manto popular. É estimulado pela mídia e mesmo por instituições religiosas, sendo ampliado, especialmente, pelo modismo de uma certa “geração saúde”, cujos ícones estão nas atividades físicas corporais e controle alimentar. Não é desprezível, por outro lado, o prazer alimentar desenvolvido em confrarias e grupos de amigos, cujo uso de ervas e corantes em alimentos sofisticados, ocorre com freqüência, em experiências gastronômicas e culinárias, sendo apropriado, nesse caso, o uso de temperos e condimentos. Ao mesmo tempo, desenvolvem-se chás, ungüentos e essências utilizadas no tratamento de obesidade, anti-stress, anti-reumáticos, antidiabético, tratamento de cabelo e pele. Surge, então, uma primeira contradição a ser analisada: a relativa segurança preconizada pela agência de vigilância sanitária, preocupada em estabelecer padrões de qualidade para os produtos de origem orgânica e a demanda popular, buscando produtos sabidamente diferenciados dos padrões definidos pela agência. A questão, assim considerada, 2 Essa denominação vem sendo adotada para os produtos naturais destinados ao tratamento de saúde. incorpora razões relativas à antiguidade e tradição, inerentes ao processo cultural, negando aquilo que poderia ser considerado um modismo e como tal passível de retalhamento à fiscalização. Não é. Nota-se, desde logo, os volumosos recursos que envolvem os negócios da saúde, principalmente os laboratórios químicos, para produção e comercialização de produtos de fins de usos fitoterápicos. Portanto, a mera apropriação do conhecimento implica em comportamento ético e passível de discussão política. Por outro lado, há razões mais objetivas: o desenvolvimento de um medicamento sintético custa em torno de US$ 500 milhões, considerando técnicas randomizadas e duplo cego, necessárias à validação do remédio, caindo para US$ 50 milhões no caso dos fitoterápicos, que podem chegar ao mercado num tempo dez vezes menor. 4. Construção da demanda de produtos naturais A demanda por produtos naturais é, portanto, em geral, construída em nichos cuja base consumidora é uma população de baixa renda e pessoas envolvidas pelo conceito de saúde na sua melhor qualidade. A agregação desses consumos é fornecida por “raizeiros” e “comerciantes” de raízes, cascas de caules, sementes, e principalmente folhas de árvores e ervas, que “aviam” receitas prescritas por benzedores, curandeiros e até médicos envolvidos com a arte milenar de curar. A busca desses profissionais está nos limites impostos pelo padrão da população de baixa renda cujos cuidados com higiene são desejáveis mas nem sempre rigorosos, acreditando-se, inclusive, serem praticados alguns usos não recomendáveis desse ponto de vista, como misturas de teias de aranha, ossos de cadáveres etc. Efetivamente, nos anos noventa, alguns aspectos da política de saúde, notadamente os preços dos remédios, mostraram a elevação e alteração na demanda. Como conseqüência e reação a esses aspectos os consumidores pressionaram com a redução o consumo e a busca de alternativas nos fitoterápicos. Outra evidência como reação à elevação dos preços foi a atuação governamental de liberar os genéricos, considerando a redução de preços para remédios junto à população. Esse aspecto pouco alterou o oligopólio de produção, ao qual está submetido o mercado, constituído por laboratórios poderosos, formadores de preços e, em geral, internacionais. Outro limite, também derivado do padrão de renda do consumidor e da política sanitária governamental, é o atendimento dado à população por alguns profissionais de saúde em postos e centros de saúde quanto ao atendimento dos pacientes3. Assim, o descuido de alguns profissionais para com a população e o preço de remédios praticado no mercado, provoca uma busca de alternativas para o tratamento da população de baixa renda, cuja solução mediata é o “curandeiro” do bairro ou da vila próxima. Evidentemente, a razão de comprar tem outros fatores, além dos já citados. O fator cultural certamente é importante nesse conjunto. Ele deriva da necessidade e da tradição, familiar ou do grupo comunitário, aqui considerando parentes, vizinhos, lideranças e “especialistas” cujo relato de casos de cura na comunidade é o principal fator de consideração, cuja transmissão ocorre pela oralidade. Nesse sentido, há uma importante ligação entre o conhecimento empírico transmitido, através de gerações e o produto considerado. Assim, a tradição se traduz pelo uso ao longo do tempo, como na cultura chinesa, na qual o uso de produtos naturais se desenvolve a mais de cinco mil anos, evoluindo no seu uso. Ou em certas regiões da Europa, onde chás e ungüentos são utilizados a centenas de anos trazidos pelos “bárbaros”, inclusive da China e outras regiões da Ásia. 3 Existem profissionais, quando procedem à consulta, sequer conversam com o paciente, retirando-lhe a confiança necessária na relação médico-paciente, ou profissional de saúde-paciente. Para o comércio, entretanto, esse aspecto às vezes é desprezado. Pela necessidade de atendimento do “cliente”, apresentando-se espécies para tratamentos similares. Os efeitos de cura, nesses casos, podem ser discutíveis, ou mesmo diferentes, em função das características de solo, clima, enfim ambiental. Assim, espécies conhecidas e usadas na Mata Atlânticas, muitas vezes, não têm a mesma característica na região do cerrado de Mato Grosso, ou viceversa, mesmo sendo considerada a mesma espécie. Porém seu uso ocorre. 5. Produção dos Fitoterápicos, Corantes e Especiarias. Há duas formas de produção dos produtos naturais fitoterápicos, corantes e especiarias: a coleta e a produção racional. Ambas ocorrem de maneira complementar às atividades principais do coletor nas unidades produtoras agrícolas ou extrativistas. Raramente existe a produção exclusiva de alguma das espécies coletadas ou cultivadas. Grande parte dos produtos naturais, consumidos no Brasil, é oriunda de plantios onde ocorre coleta ou cultivos em outros países como o Chile e países do Oriente. No Brasil, a atividade de coleta ocorre em quase todos os estados, entretanto, em pequeno volume, sendo que o processo de apanha se dá de forma individual por espécie, por encomenda e quando solicitada. A apanha pode, eventualmente, se ocorrer a aproximação, ser feita com dois ou três produtos, cujo interesse comercial é evidente, mas em menor quantidade. Diferentemente, ocorre a produção em canteiros e hortas de fundo de quintal, cuja destinação é feita para alguns comerciantes, produtores de chás e extratos. A maior parte desses produtos, depois de colhidos, necessita ter a sua umidade retirada, sem incidência direta dos raios solares havendo, para tanto, o preparo de isolamento da superfície onde deverão ser depositadas as folhas (outras partes da planta) para não ficar sujeita a fungos e bolor. Quando se trata de quantidades maiores, essa secagem é realizada em fornos, cuja energia pode ser solar, elétrica ou a própria biomassa local. Depois de secas, as folhas são rasgadas e separadas as ranhuras e partes mais irregulares, cujo destino são os moinhos de bola que as processam como matéria-prima para saches de chá. Assim, o produto natural é embalado. Em folhas inteiras quando for comercializado no atacado. Rasgado, picado e outras formas de manipulação quando comercializado em empresas de caráter regional. Em saches de pó moído para chás. Há também o produto processado verde como essência, ou extraído por processos químico-farmacêutico. 6. O Comércio de Produtos Naturais no Brasil O comerciante de produtos naturais origina-se, portanto, da necessidade de atendimento de uma demanda crescente por mercadoria culturalmente aceita para a qual a população migra em função do mau atendimento, altos preços, tradição de consumo ou modismo. A mercadoria é produzida em diversas regiões do país, mas tem agregação dos volumes em São Paulo. Além disso, há a produção de alguns paises, de onde são importados e, em geral reunidos nos mesmos atacadistas. Reunidas, a produção nacional e internacional, no principal centro de comércio geral: São Paulo, pode-se identificar os atacadistas, na região do mercado Municipal ou da 25 de março, controlada por aproximadamente 20 comerciantes. O que pode ser caracterizado no grande centro distribuidor brasileiro, é a base do complexo desses produtos. Os demais centros, como esse, dificilmente apresentam todas as espécies, agora transformada em mercadorias do mercado de especiarias, fitoterápicos e corantes, considerando os arranjos produtivos locais, em função das especificidades regionais de clima, vegetação etc. Para atender a demanda, os comerciantes lançam mão de produtos das diferentes procedências nas diferentes regiões nacionais e internacionais, e não na origem regional. Isso é mais evidente nas regiões de colonização recente, onde as espécies locais são desconhecidas para a maioria da população, como é o caso de Mato Grosso, apesar da existência de grande potencial de alguns produtos ainda desconhecidos, considerando a mata, não derrubada, cuja produção sistematizada desses produtos necessita ser realizada. Dessa maneira, algumas regiões passam a ser consideradas como tradicionais no trato de produtos naturais. Nessa categoria estão Belém, para os produtos da Amazônia; Salvador, para coletas da região baiana; e, naturalmente, São Paulo que abarca produtos atacadistas de todo o Brasil. Note-se que são regiões tradicionalmente usuárias desses produtos. É possível desenvolver uma verdadeira antropologia a partir dos cuidados com os produtos do atacado, a partir da análise dos produtos adquiridos naquela região. As embalagens, segundo os cuidados e apresentação, a maior ou menor mistura de plantas indicando a pureza daquelas espécies; a maior ou menor sujeira, mistura de plantas com teia de aranha, poeira e, indicam as regiões de origem para os consumidores varejistas e processadores dos produtos. E, esse é um fator definidor dos preços no atacado. A “geração saúde”, como pode ser denominada a parte da população consumidora desse “modismo”, tem merecido respeito pela garra e perseverança com as quais busca manter seus valores. Por outro lado, um outro contingente, preocupado com o preço e sua renda utiliza os mesmos produtos com outra apresentação e por outros motivos menos prosaicos. A apresentação tem recebido tratamento especial nos últimos anos. Nos supermercados do país existem prateleiras exclusivas para produtos naturais, onde empresas especialistas, por exemplo, em pimentas, oferecem verdadeiras bulas sobre as vantagens das diversas espécies apresentadas; grande variedade de chás e curas, listados em folhetos ou nas embalagens distribuídos em encartes, por outras empresas, cujo padrão eram ervas tradicionais como o mate e o chá da Índia ou Preto e incursionaram para novos produtos naturais, apresentados em embalagens tradicionais como saches, em caixas. Lojas de estilo, nos shoppings centers, passaram a comercializar extratos, essências e ervas destinadas a fabricação de perfumes, águas de cheiro, além de óleos aromáticos para odorizar quartos e ambientes, além de outros produtos naturais. Para tanto, o uso de materiais de construção como granitos ou porcelanatos passaram a ser incluídos na sua decoração, trabalhados por arquitetos que poderiam ser consideradas butiques de plantas, com uma característica de rusticidade. Entretanto, a decoração verdadeiramente de lojas rústicas, mas higiênicas, com sacaria em algodão de fibras naturais, expondo produtos em estrados de madeira seca e sem odor, ou de metal, portanto mais simples e de bom gosto, também estão vem sendo utilizados em algumas regiões, onde os usos ficam didaticamente expostos. Essas lojas vendem toda a linha de produtos como: fitoterápico, gastronômico, condimentar, corante. Destinam-se a população de baixa renda e estão colocadas principalmente em mercados municipais restaurados. Por último, as hortas medicinais. Com elas, é possível reduzir as doenças da população periférica encontrada nos postos de saúde. Para tanto, a semeadura em canteiros de alguns produtos, permitiria reduzir 70% das doenças apresentadas naqueles locais. Esse projeto foi desenvolvido no Ceará e é certo um excelente resultado na área publica. 7. Conclusões O artigo parte das teorias de cadeias e arranjos produtivos para investigar o processo de produção, comercialização e industrialização de produtos naturais em Mato Grosso, especificamente da Baixada Cuiabana, em 2003. O arranjo não foi detectado como consolidado, mas existe um potencial para a agregação de valor para os pequenos e médios proprietários rurais. Entretanto, não se detectou a possibilidade de trabalhar com escala na comercialização destes produtos naturais, pelo fato do mercado ser restrito e contar com várias barreiras sanitárias e legais. Também, o produto tem características intrínsecas que dificultam a obtenção de escala de produção. Para se viabilizar o processo, deve-se ter uma finita quantidade de diferentes produtos, gerando economia de escopo e criando nichos de mercado tais que cada produtor pode se articular com outras etapas como artesanato ou produtos dermatológicos, aromáticos, alimentícios entre outros. Iniciativas como as do projeto nordestino de farmácias vivas são colocadas como alternativas para o fomento e criação de demanda por produtos naturais. 8. Referências Bibliográficas ANDERSON, Antony B. O extrativismo vegetal e as reservas extrativistas: limitações e oportunidades, in O destino da Floresta, Relume-Dumará, Curitiba-Pr, 1994, pp. 227-246. BATALHA, Mário O. (Coord.). Gestão Agroindustrial. São Paulo: Atlas, 2001. CASSIOLATO, J.E.; LASTRES, H.; SZAPIRO, M. Arranjos produtivos sistemas produtivos locais e proposições de políticas de desenvolvimento industrial e tecnológico. N.T.27, Rio de Janeiro: IE/UFRJ, 2000. COUGHLAN, A T.; ANDERSON, E.; STERN, L.; EL-ANSARY, A. 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