Aula 4 – Processo Civil II. Das provas. Após a fase postulatória e a fase ordinatória, ingressa-sse na fase instrutória, onde o processo será instruído. Num primeiro momento serão vistos a teoria geral da prova, conceito e classificação, o objeto da prova, os princípios de direito probatório, assim como as fase probatórias. Daniel Ustárroz1, citando Michele Taruffo, afirma: A jutiça de uma decisão deve ser medida a partir de três balizas complementares e jamais excludentes: (1) a forma pela qual os fatos controvertidos são apercebidos pelo processo judicial (valoração das provas); (2) o modo pelo qual o magistrado descobre o melhor direito a ser interpretado e aplicado ao caso concreto (hermenêutica) e (3) o caminho percorrido para que a decisão seja tomada, e a possibilidade que as partes tenham tido de influenciar o convencimento judicial (garantias constitucionais ou precedural justice). Cumpre esclarecer que este pensamento emanado pelo doutrinador italiano traz um requisito que é a complementariedade de um e de outro, e nunca de exclusividade. O ideal seria que ao mesmo tempo em que as provas sejam efetivamente produzidas, exista uma hermenêutica e o processo esteja garantido pelo processo constitucional. Prova advém da expressão em latim probare e significa exame, verificação, demonstração, reconhecimento por excelência. Prova, para o jurista italiano Carnelutti, é o coração do processo. 1 USTÁRROZ, Daniel. Prova no processo civil. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2007, p. 15. Tentar provar alguma coisa é tentar convencer alguém, em nosso caso é a tentativa de convencimento do juiz sobre os fatos da causa. Conforme ressalta Bento Herculano Duarte2: Provar significa convencer alguém a respeito de fatos. Costuma-se dizer, genericamente, que alegar e nada provar significa nada alegar. No âmbito do processo judicial tal sentido se eleva, posto que o julgador é um representante do Estado cuja autoridade funda-se em sua imparcialidade e cujos maiores em proteção consubstanciam-se na justiça em sentido material e na chamada segurança jurídica. Logo, havendo controvérsia sobre alguma afirmação colocada no processo, deve o magistrado cuidar de bem apurar a verdade, sob pena de propiciar uma decisão injusta. Fundamentos de fato equivacamente avaliados podem fazer naufragar a nau da Justiça, por melhor que seja a compreensão do direito material. Conforme conceitua José Frederico Marques, a prova no Processo Civil constitui o meio e o modo usados pelos litigantes para convencer o juiz da verdade da afirmação de um fato, bem como o meio e modo de que se serve o juiz para firmar convicção sobre os fatos que constituem a base empírica da lide. Diz-se, então, que a conceituação de prova encerra dois sentidos, o objetivo (meios de demonstração da verdade, meio hábil para demonstrar a existência de um fato - documentos, testemunhas, perícia etc) e subjetivo (capacidade de convencimento do juiz, aparece como convicção formada no espírito do julgador em torno do fato alegado estado psíquico). Não é outro o entendimento de Bento Herculano Duarte3 ao 2 DUARTE, Bento Herculano. Elementos de teoria geral da prova. In Duarte, Bento Herculano; DUARTE, Ronnie Preuss. Processo civil: aspectos relevantes – estudos em homenagem ao Prof. Ovídio A. Baptista da Silva. São Paulo: Método, 2006, p. 13. assim conceituar o que vem a ser prova: Por conceito próprio, entendemos a prova como um meio pelo qual se estabelece a existência ou inexistência de um fato. O sujeito que produz a prova tanto pode ser a parte como o juiz ou mesmo um terceiro. Prevalece, portanto, o caráter instrumental da prova, pelo que se acentua seu aspecto objetivo. Não obstante, o centro da prova é o poder de convencimento sobre o julgador, que é quem lhe avalia e aquilata, pelo que não se pode desprezar seu sentido subjetivo. Contudo, pode-se dizer que os dois caminhos levam a um mesmo destino, qual seja a elucidação dos fatos, essencial a uma boa distribuição de justiça. É por isso que se pode concluir, no mínimo que os sentidos objetivo e subjetivo de prova são duas faces de uma mesma moeda. Marinoni aponta: A ideia de prova evoca, naturalmente, e não apenas no processo, a racionalização da descoberta da verdade. Realmente a definição clássica da prova liga-se diretamente àquilo ‘que atesta a veracidade ou a autenticidade de alguma coisa; demostração evidente”. Como vão as partes e o juiz reconstruir o passado? Essa é uma pergunta que necessariamente cai na teoria da prova, uma vez que somente através de algum tipo de prova o passado vai ser lembrado e comprovado. Grande parte do processo de conhecimento é dedicado a prova, pois ela é essencial para a investigação dos fatos. A prova deve colocar o juiz na condição de pronunciar sobre o objeto da demanda o mais perto possível da verdade comprovada no processo. 3 Op cit, p. 15-16. Novamente aponta Marinoni: Assim, nota-se que a ideia (ou o ideal) de verdade no processo exerce verdadeiro papel de controle da atividade do magistrado; é a busca incessante da verdade absoluta que legitima a função judicial e também serve de válvula regulatória de sua atividade, na medida em que a atuação do magistrado somente será legítima dentro dos parâmetros fixados pela verdadepor ele reconstruída no processo. Devemos nos perguntar: o que é verdade? Isso, por si só, já é polêmico. Consigo trazer a verdade absoluta para dentro do processo? Uma verdade relativa? Uma verdade possível? Miguel Reale traz uma expressão: quase-verdade, pois a verdade real é inatingível e imprestável. Não é a toa que o próprio Marinoni e Arenhart afirmam ser a noção de verdade “algo meramente utópico”4 no processo. Mas se a prova é algo meramente utópico, que dificilmente atingirá a verdade absoluta no processo, por qual motivo dá-se tanto valor a ela? Esse questionamento é respondido por Marinoni e Arenhart5 ao relatarem a função da prova no discurso jurídico: Tomando-se como adequada essa constatação, pode-se agora compreender a função da verdade no discurso jurídico: constitui ela uma das pretensões de validade que autoriza o discurso. Se acaso os sujeitos processuais não acreditassem que a verdade tem função no processo, não haveria motivo para a sua celebração, que se tornaria mera sucessão de fatos, sem nenhum objeto útil. A busca da verdade, embora seja meio retórico, preenche axiologicamente o processo, outorgando-lhe legitimidade e fundamentação. 4 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 256. 5 Op cit, p. 259. Marinoni diz: Deveras, a reconstrução de um fato ocorrido no passado sempre é influenciada por aspectos subjetivos das pessoas que o assistiram, ou ainda daquele que (como o juiz) há de receber e valorar a evidência concreta. Sempre, o sujeito que percebe uma informação (seja presenciando diretamente o fato, ou conhecendo-o através de outro meio) altera o seu real conteúdo, absorve-o à sua maneira, acrescentando-lhe um toque pessoal que distorce (se é que essa palavra pode ser aqui utilizada) a realidade. Paradoxo: descobrir a verdade o juiz deve, mas encontra certos limites como o direito ao silêncio. Novamente Marinoni e Arenhart6 apontam: Assim, nota-se que a ideia (ou o ideal) de verdade no processo exerce verdadeiro papel de controle da atividade do magistrado; e a busca incessante da verdade absoluta que legitima a função judicial e também serve de válvula regulatória de sua atividade, na medida em que a atuação do magistrado somente será legítima dentro dos parâmetros fixados pela verdade por ele reconstruída no processo. Dupla dimensão: refere Eduardo Arruda Alvim7: A expressão ‘prova’ pode ser compreendida em dois significados: um objetivo, abrangente dos meios destinados a convencer o juiz dos fatos relativos ao processo; outro subjetivo, relativo à ‘convicção que as provas produzidas no processo geram no espírito do juiz quanto à existência ou inexistência dos fatos’. Em fechamento a questão da verdade no processo, Bento Herculano Duarte8 assim traz sua consideração: 6 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 255. 7 ALVIM, Eduardo Arruda. Direito processual civil. 2. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 455. 8 Op cit, p. 13-14. De tal sorte, o instituto da prova em juízo possui uma enorme importÇancia, como instrumento até mesmo de credibilidade da instutuição Poder Judiciário. Certamente, uma das maiores angústias que se pode imaginar é alguém perder uma demanda porque a verdade por si apontada foi declarada inverdade; o bom direito sucumbiu rente ao mau direito; tevese um estelionato pela via processual. O Poder Judiciário, apesar de todas as mazelas que lhe povoam, em geral é tido como instituição garante da verdade logo é lastimável quando se emite uma decisão judicial injusta, mormente em face de uma má avaliação dos fatos. Uma das máximas em matéria probatória ainda vigente é que aquele fato não provado é tido como fato inexistente. O que não consta nos autos o juiz não terá obrigação de saber (quod non est in actis non est in mundo). O juiz conhece o direito (iura novit curia), sendo que narrados os fatos o juiz dará o direito (narra mihi factum dabo tibi jus). Outra importante lição é a de que a prova é de livre convicção do juiz, ou seja, a parte pode acreditar que está provando algo estupendo de uma forma, mas o juiz poderá se convencer em outra prova que sequer está sendo alvo de prova pela parte no processo. Assim como outros institutos do direito processual, o direito probatório encontra alguns princípios a latere daqueles já estudados. Princípios são proposições genéricas, abstratas, que fundamentam e inspiram o legislador na elaboração da norma. Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que princípio: [...] é por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhe o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. Os princípios também atuam com uma tríplice função, ora fazendo o ofício de fonte integradora da norma, ora de informativa e ora de interpretativa, suprindo as omissões e lacunas do ordenamento jurídico. Pode falar que os princípios têm função informativa, pois são proposições genéricas que sustentam e inspiram o legislador no momento da produção da norma, durante o processo legislativo, a função normativa serve como fonte integradora do Direito, ao suprimir lacunas e omissões do ordenamento e, por fim, temos o princípio como fonte interpretativa, pois orientam o intérprete no momento da interpretação. O primeiro princípio a ser relembrado é o da necessidade da prova, ou seja, a parte deve fazer prova de suas alegações naquilo que há necessidade. Por óbvio, muitas vezes a lei faculta ao mais fraco não necessitar realizar algumas provas, mas esta é a exceção, sendo a regra que, aquele que alega, deve provar. O juiz não pode formar seu convencimento senão pelos dados existentes no processo ('o que não está nos autos não está no mundo' = verdade formal). Outro princípio importante a ao ser mencionado é o de que a prova deve ser apreciada em seu conjunto, ou seja, o princípio da apreciação em conjunto da prova. A lealdade da prova ou autorresponsabilidade das partes é algo inerente ao direito probatório, tendo em vista que a prova ilícita deve ser severamente combatida, a teor do que preconiza o artigo 5, LVI da Constituição Federal e artigo 14 do Código de Processo Civil brasileiro. As partes devem proceder com lealdade e boa-fé (art. 14, II e IV, CPC). São responsáveis pela sua inatividade,negligência, ou atos maliciosos ou de má-fé que praticarem no processo, como ocultação de provas, requerer diligências procrastinatórais, sob pena de ser responsabilizado pelo dano processual causado (litigância de má-fé, CPC, arts. 16 a 18). Princípio do contraditório e da ampla defesa, o que ensina que, apresentada a prova pela parte contrária, deve a outra parte ter a possibilidade de se manifestar. Só pode haver prova com a possibilidade de contra-prova (CPC, art.398). Daí possibilitar-se às partes a fiscalização da produção da prova, pela presença das partes. Pelo princípio da oportunidade ou da preclusão da prova, todos tem o direito de apresentar sua prova e fazer prova nos momentos adequados no processo. As partes têm o ônus de oferecer os seus meios de prova nos prazos estabelecidos na lei, sob pena de, não o fazendo, terem preclusa a oportunidade para tanto. Em princípio, as partes propõem as provas basicamente na petição inicial e na defesa, pois têm as melhores condições para o fornecimento e indicação de evidências apropriadas à confirmação das respectivas alegações, além do natural interesse no convencimento do julgador (CPC, arts. 282, VI, 276, 283, 278 e 300). Em situações específicas, admite a intervenção judicial ex officio (CPC, arts. 130, 342, 355, 437, 440 etc). O deferimento da prova como ato judicial fica subordinado ao critério do juiz, considerada a utilidade, conveniência e pertinência do meio de prova perquirido. No procedimento ordinário as provas são admitidas no saneador (CPC, art. 331, §2º, CPC). O princípio da comunhão da prova leciona que esta diz respeito a ambas as partes. Assim, a prova apresentada por uma das partes, ao beneficiar uma delas, prejudicará a outra. Uma vez produzida a prova, esta passa a integrar o 'campo probatório', podendo ser utilizado para a demonstração do direito de qualquer dos litigantes e no interesse da Justiça na investigação da verdade real. A prova, assim, não pertence a esta ou aquela parte, mas sim ao processo, cabendo ao juiz apreciá-la livremente para formar o seu convencimento. O princípio da legalidade diz que as provas são aquelas previstas na lei, ainda que não taxativamente, assim como aquelas ditas moralmente legítimas. O princípio da imediação aponta o titular da prova, ao dizer que a mesma é feita, de preferência, diante do juiz para que ele se convença do direito alegado pelas partes. O princípio da obrigatoriedade da prova afirma que não é de interesse só das partes, mas também do Estado. É óbvio o princípio, tendo em vista que o Estado tem a obrigação de dar as partes um processo justo, o que somente será efetivado caso também tenha interesse na produção da prova. Pelo princípio da aptidão da prova ou da teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova, afirma que aquele que tiver melhores condições de fazer a prova fará. Essa idéia rompe com as regras rígidas e estáticas da distribuição do "onus probandi" tornando-as mais flexíveis e dinâmicas, adaptáveis a cada caso especificamente. No dizer dessa teoria, não importa a posição da parte, se autora ou ré; também não interessa a espécie do fato, se constitutivo, impeditivo, modificativo, ou extintivo; o importante é que o juiz valore, no caso concreto, qual das partes dispõe das melhores condições de suportar o ônus da prova, e imponha o encargo de provar os fatos àquela que possa produzir a prova com menos inconvenientes, despesas, delongas etc. O princípio da disponibilidade da prova diz que a prova será feita em momentos próprios previstos na lei ou para a instrução do processo. Princípio do impulso oficial das provas. Em princípio, cabe às partes a produção das provas, de modo a convencerem o julgador da veracidade dos fatos alegados. Ao juiz cabe julgar a lide de acordo com o alegado pelas partes. Todavia, poderá o juiz, de ofício, determinar as provas que entender necessárias para o correto equacionamento da lide (CPC, art. 130). "No Direito pátrio, o juiz, cujo dever fundamental é a imparcialidade (CPC, art. 125, I), tem iniciativa probatória inconfundível com auxílio reprovável a qualquer dos litigantes. Não se trata de prática processual indiscriminada, abusiva, desarrazoada e atentatória à dignidade da função judicante. Quando o debate envolve direitos disponíveis, a verdade processual será encontrada de modo preponderante pela atividade probatória dos conflitantes. Mas, se o juiz fica em estado de perplexidade ou está diante de direitos indisponíveis de intenso colorido publicístico, a atividade ex officio na esfera instrutória deve ser, quando possível, prudente e medida, podendo o julgador suprir a indolência ou a inércia das partes usando a regra do art. 130." (Ney Ahrends, Artigo). Princípio da oralidade. Em matéria de prova, predomina a palavra oral. Sempre que possível, deverá a prova ser realizada oralmente perante o magistrado. Princípio da identidade física do juiz é aquele que afirma que o juiz que encerra a instrução é aquele que deverá julgar o feito. Princípio da concentração ou unidade afirma que a prova deve ser colhida, preferencialmente, em uma única audiência. Princípio da liberdade na apreciação da prova. O juiz tem ampla liberdade de valorar a prova existente nos autos. Pode o juiz preferir uma prova a outra, desde que fundamente a sua decisão persuasão racional - (CPC, art. 336). Em matéria de prova, vige o princípio da verdade real, inexistindo provas previamente hierarquizadas. Princípio da liberalidade da prova. Em princípio, há plena liberdade na produção da prova (CPC, art. 332). Depoimento pessoal, confissão, exibição de documento ou coisa, testemunhas, perícia, inspeção judicial etc. Valem provas emprestadas (produzidas em outros processos, mas desde que entre as mesmas partes -contraditório), slides, microfilmes, fotografias, gravações etc, desde que coletados de maneira legítima e não moralmente reprovável (princípio da imaculação). Ney da Gama Ahrends, em seu artigo sobre o tema, escreve: "O sentido geral das doutrinas estrangeira e nacional é o de ver respeitada a intimidade para assegurar a vida da família, a vida interior espiritual e a personalidade do homem. Não tem valor prova captada ilicitamente por ser produto imoral e até delituoso. A regra do art. 332 não pode ser bem entendida com abstração do sistema. A jurisprudência não chancela a violação da intimidade, a afronta à dignidade, bem como a deslealdade e a subreptícia coleta de evidências com crime (...). Mesmo em se tratando de dar combate à criminalidade de rigor é a observância dos preceitos éticos. Prova criminosamente obtida não tem valor. Os juristas e juízes devem estar atentos ao problema, em virtude, principalmente, dos freqüentes assaltos à intimidade com filmagens ilícitas, minigravadores, teleobjetivas possantes, montagens fotográficas e publicações ilegais de documentos particulares e privados. O Supremo Tribunal Federal, pela Colenda 2ª Turma, desprezou prova gravada espúria (RE nº 85.439, RJ, 11.11.1.977, Rel. Min. Xavier de Albuquerque): 'Prova civil. Gravação Magnética feita clandestinamente pelo marido de ligações da mulher. Inadmissibilidade de sua utilização no processo judicial, por não ser meio legal nem moralmente legítimo (art. 332, CPC). Recurso Extraordinário conhecido e provido.' Desvaliosas são as provas obtidas por meios moralmente indignos." Princípio da proibição da prova ilícita. Nelson Neri Jr., sobre o tema, manifesta-se da seguinte forma: "Prova ilícita. A CF 5º LVI rege a matéria, vedando os meios de prova que não são obtidos por meios ilícitos. A doutrina se manifesta de forma bastante controvertida a respeito da validade e eficácia da prova obtida ilicitamente. A proposição da doutrina quanto à tese intermediária é a que mais se coaduna com o que se denomina modernamente de princípio da proporcionalidade. De fato, não devem ser aceitos os extremos: nem a negativa peremptória de emprestar-se validade e eficácia à prova obtida sem o conhecimento do protagonista da gravação sub-reptícia, nem a admissão pura e simples de qualquer gravação fonográfica ou televisiva." (CPC Comentado, 2ª ed., p. 755). Para Daniel Ustárroz9: Questão ainda tormentosa para o operador diz respeito à possibilidade de utilização de prova obtida por meio ilícito em processo judicial. De um lado, encontram-se aqueles que defendem a interpretação literal do comando constitucional (art. 5º, LVI), proibindo em qualquer hipótese sua validade dentro do processo. Corrente diversa sugere a aplicação do princípio da proporcionalidade, como forma de suavizar o rigorismo que a leitura literal pode ensejar. Em comum, ambas 9 Op cit, p. 41. as teorias têm a preocupação com os resultados nocivos que o aproveitamento irrestrito da prova ilícita traz à vida das pessoas, na medida em que afeta sua própria dignidade (atacando a privacidade, prejudicando o relacionamento interpessoal, etc). As provas ilícitas por derivação são aquelas que, conquanto lícitas em si, por decorrerem de prova considerada ilícita, tornam-se, por isso, contaminadas por sua ilicitude (fruits of the poisonous tree). Essa teoria da árvore dos frutos envenenados, uma metáfora jurídica, advém do direito norte-americano, mas é adotada pelo nosso direito. Assim, dispõe o artigo 157, §1º, do Código de Processo Penal que são “inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.” Destarte, tanto lá nos Estados Unidos da América, quanto aqui, no Brasil, a teoria encontra algumas limitações, portanto, ela não é de uso irrestrito. Com efeito, no atinente a essa teoria, ensina a doutrina que cabe observar: 1. nexo de causalidade – estará contaminada a prova que realmente tenha sido realizada em decorrência direta ou indireta de prova ilícita; ao revés, não estará contaminada se provier de fonte independente. 2. descoberta inevitável – a prova será admitida sempre que fique demonstrado que ele seria obtida inevitavelmente, ou seja, ela viria aos autos “de qualquer modo”. 3. limitação da contaminação – a prova deve ser admitida se o vício for convalidado. Por fim, importante estudar a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre esse tema. Também tem as provas uma classificação que pode ser dividida em direta, indireta, pré-constituída e causal. Segundo Bento Herculano Duarte10: A nossa doutrina processual costuma classificar a prova, fundamentalmente, em direta ou indireta. Aquela se refere à demonstração do fato colocado no âmago da controvérsia; esta evidencia um fato que, por sua vez, conduz a averiguação do fato principal. Já no concernente a prova pré-constituída e a causal, evidenciam-se os conceitos pelos próprios nomes, ao passo que préconstituída é aquela prova já existente para a comprovação de algo, como um contrato de compra e venda, sendo que a causal seria a prova a ser realizada. Questão do concurso para Promotor de Justiça do Mato Grosso do Sul: É possível a utilização de provas obtidas ilicitamente na fundamentação da decisão judicial? Discorra e exemplifique. 10 Op cit, p. 21.