A Perspectiva Estratégica na Decisão de Implantação das
Tecnologias de ERP e E-Business
Mauricio dos Santos Neves
UERJ, IBMEC-RJ e BNDES
e-mail: [email protected]
Adriano Proença
GPI / EE e COPPE / UFRJ
[email protected]
Abstract: the purpose of this article is show that the use of ERP and E-Business technology must be
oriented for analyses based on the contemporary strategic theory and in a real evaluation of
sustainable competitive advantages obtained.
Key-Words: Strategy, ERP, Integrated Systems and E-Business
Resumo: este artigo tem como objetivo mostrar que a utilização de tecnologias de ERP (Enterprise
Resource Planning) ou de negócios digitais pela Internet (E-Business) deve estar orientada por
análises baseadas na teoria contemporânea de Estratégia Empresarial e em uma real avaliação das
possibilidades de geração de vantagens competitivas sustentáveis.
Palavras-chave: Estratégia, ERP, Sistemas Integrados e E-Business.
1. Introdução
Após os anos da Qualidade Total, da Reengenharia, e da Automação Industrial, até como um
necessário desdobramento dos mesmos, o mundo empresarial tem hoje uma nova e forte tendência: a
utilização de Sistemas Integrados de Gestão Empresarial (SIGs) - também conhecidos como
tecnologias de ERP (Enterprise Resource Planning) - e da Internet para negócios digitais. Tal
movimento aponta para o uso de ferramentas capazes de viabilizar a entrada das empresas em fase
onde as operações não são mais vistas e pensadas isoladamente, mas estão inseridas em um contexto
maior: é o paradigma da visão por processos, intra e entre organizações.
As estatísticas e pesquisas recentes apontam para um crescimento notável na implantação de softwares
integrados, que são capazes de absorver em suas funcionalidades as mais diversas atividades e
processos conseqüentes. A cada ano que passa, ainda maiores são o número de usuários e as cifras
neste mercado de SIGs, estando estes presentes em praticamente todas as grandes corporações
mundiais. Além disso, também é crescente a utilização de tecnologias apoiadas na Internet (ECommerce, Business to Business ou B2B, Supply Chain Management ou SCM, Customer Relationship
Management ou CRM)
Diante deste contexto, na tentativa de depurar as opções presentes nesta vertente de modernização,
faz-se necessário refletir sobre o tema, o que iniciamos formulando questões relativas aos padrões de
comportamento histórico das empresas.
Será que todas as corporações e unidades de negócio são “obrigadas” pela configuração atual do
mercado (entendido em sentido amplo, formado por concorrentes, fornecedores e clientes), a utilizar
SIGs e a Internet como forma natural de sobrevivência na competição globalizada? Caso sim, qual a
relevância do processo de Planejamento Estratégico e sua ligação com a tomada de decisão nos
moldes da gestão por Sistemas Integrados? Ainda é necessário pensar-se estrategicamente antes e
durante a implementação de tais sistemas de ERP, ou é possível apenas seguir os padrões mundiais de
sucesso do mercado (“benchmarking”)?
Baseado nestas e em outras questões correlatas, este artigo tem como objetivo externar os elos que
devem nortear o processo de implantação de SIGs e de tecnologias baseadas na Internet, apoiando-se
em parte da teoria de Estratégia. Pretende-se contribuir para o modelo de condução do processo
decisório em tecnologia da informação, inclusive apontando novas abordagens que poderão ser fontes
de vantagens competitivas quando corretamente aproveitadas na constituição de diferenciais.
2. A vantagem competitiva em eficiência e eficácia operacional
Considerando que a implantação de sistemas de ERP e E-Business deve estar inserida em um contexto
estratégico maior, isto é, a tecnologia da informação é um meio para a finalidade competitiva, inicia-se
a análise da perspectiva estratégica de tais sistemas através das possibilidades de ganhos imediatos que
a tecnologia proporciona. No curto prazo, a grande vantagem da implementação dos SIGs advém da
sua própria concepção integrada (DAVENPORT, 1998). Como toda informação fica centralizada em
um único banco de dados, uma vez que esta seja disponibilizada por um dos departamentos da
organização, fica acessível em tempo real para o restante da empresa.
Quanto maior for a empresa (em número de empregados, localidades físicas, etc.), ainda mais
positivos são os efeitos desta integração, podendo resultar em consideráveis melhoras na eficiência e
eficácia dos processos de negócio e nos indicadores de desempenho operacionais pertinentes. Portanto,
a maneira pela qual funciona uma organização integrada pelo SIG já é estruturalmente diferente, com
potencial para ganhos imediatos tanto em eficiência como em eficácia.
Em relação aos sistemas para Internet, em uma primeira visão, a mesma colocação pode ser feita, não
mais apoiada em um banco de dados centralizado mas no fluxo on-line de informações entre bancos de
dados, que viabiliza aumento de eficiência e eficácia nos processos entre empresas, isto é, cria a
integração nos elos do Sistema de Valores (PORTER, 1985). No caso de E-Commerce este impacto
viria da interface precisa de dados com os clientes.
Diante desta característica inerente às tecnologias, considerações sobre eficiência e eficácia
operacional devem ser feitas, até por não serem sempre tão intuitivas, devido à própria complexidade
das escolhas possíveis para o modelo de gestão a ser implementado com o sistema integrado e com o
apoio de Internet. Neste ponto, para uma maior profundidade de abordagem, é importante o debate em
separado das características pertencentes à cada atributo.
2.1. Vantagem competitiva pela eficiência
Se a nível macro o fluxo de informações para o processo decisório torna-se rápido e preciso, a nível
operacional a integração intra e entre empresas garante uma maior eficiência para o trabalho do dia a
dia. Por exemplo, suponha que o departamento comercial de uma empresa deseje gerenciar o crédito
de seus clientes para que não ultrapassem um determinado limite, incluindo neste as ordens de vendas
em aberto, as entregas em andamento, as contas a faturar e as contas a receber. Suponha também que
uma autorização especial de crédito para um pedido que ultrapasse o limite possa ser dada pelo
departamento financeiro. Este pequeno sub-processo de gerenciamento de crédito, realizado em
apenas dois departamentos, poderia levar horas para o levantamento dos dados sobre o limite já usado
por um cliente e para a autorização suplementar, além de não ser confiável em ambientes
convencionais com sistemas isolados. Em um sistema integrado, acontece em minutos, já que ambos
os departamentos acessam as mesmas informações e todos os dados de operações passadas ou em
aberto ficam registrados, garantindo atualização e operação em tempo real. Isto sem falar na
possibilidade do uso de um sistema de Workflow para gerenciar e acelerar a seqüência de atividades.
Do ponto de vista competitivo, estamos falando em ganhos de curto prazo no atributo velocidade
(SLACK et all., 1997) pela simples utilização da arquitetura integrada, ou seja, aumenta-se a eficiência
dos processos operacionais. Repare que se um dos objetivos iniciais deste sub-processo for prover a
informação do limite de crédito para o cliente, de modo a que este saiba que estará sendo analisada
uma suplementação, a utilização da Internet permite uma interface mais ágil e precisa, isto é, aumentase pontualmente a eficiência percebida.
Se por um lado existe notório ganho em velocidade e agilidade para a operação, por outro a própria
tomada de decisão é favorecida já que os dados necessários para as análises estarão sempre
disponíveis e atualizados, fato que não acontece em sistemas tradicionais isolados devido a grande
quantidade de transações realizadas diariamente nas organizações, que geram necessidade de um
tempo considerável para consolidação. Resumindo, a eficiência dos processos de gestão também
aumenta pela velocidade e atualidade das informações que podem ser obtidas, fato que fica ainda mais
marcante para processos interdepartamentais.
No caso de tecnologias para Business-to-Business, por exemplo, os processos de suprimento que
ocorrem entre duas empresas (fornecedor e comprador) também podem funcionar de maneira
integrada, mudando inclusive as atividades realizadas em cada Cadeia de Valor (PORTER, 1985).
Imagine que uma empresa queira disponibilizar por Internet, para fornecedores credenciados, acesso
ao seu banco de dados de informações sobre estoque e, usando o método do ponto de pedido, quando
baixam os níveis de matéria-prima, esta receba automaticamente de seus fornecedores uma cotação de
preço e, também em comparação automática, emita uma ordem de compra para o vencedor da cotação.
Essa prática difere da lógica “normal” onde cada empresa controla seu estoque e muda os elos
existentes no Sistema de Valores, tornando-o integrado nos processos entre organizações distintas e
que se relacionam comercialmente.
Pensando em termos estratégicos, a comparação entre uma empresa que implanta um sistema
integrado ou sistemas para E-Commerce ou B2B, e outra ainda sem estas tecnologias, faz com que a
primeira necessariamente sobressaia em atributos ligados à eficiência se, para o seu tamanho e
negócio, existe um grande e complexo fluxo de informações. Essa garantia pode vir a ser dada
simplesmente pelo aumento da padronização, confiabilidade e disponibilidade das informações, a
nível operacional e gerencial, internamente e para parceiros externos. Aqui abre-se exceção para as
pequenas organizações que não precisam deste gerenciamento integrado informaticamente para
garantir agilidade, já que suas operações, atendendo a nichos específicos de mercado e com estruturas
enxutas, podem ser fonte importante de suas vantagens estratégicas.
Repare que, a luz da teoria de Estratégias Empresariais, as vantagens em eficiência inerentes à esta
primeira fase podem conduzir a organização para melhoramento da sua posição competitiva, porém
constituem-se de diferenciais temporários, dado que estão galgados diretamente nas características de
recurso (sistemas) disponível e difundido no mercado, o que não satisfaz uma análise de “escassez” da
teoria estratégica chamada de Visão Baseada em Recursos (COLLIS e MONTGOMERY, 1997).
2.2. Vantagem competitiva pela eficácia
De qualquer forma, o raciocínio anterior mostra que a teoria de análise estratégica para a decisão entre
o ter ou não ter um ERP ou ter negócios na Internet pode ser irrelevante. Pelo menos para as grandes
empresas, onde a correta implantação dos sistemas para o nível operacional já garante diferencial
competitivo pelo salto no patamar de atuação dos atributos de desempenho, como a flexibilidade,
tempo de entregas e outros, trazendo uma posição competitiva (PORTER, 1980) mais vantajosa.
Para aqueles que dispensam análises e etapas de planejamento em suas decisões, a afirmação anterior
deve ser de bom grado. Entretanto, sabe-se que na maioria dos segmentos de negócios que operam nas
condições citadas, muitas empresas já implementaram ou estão em fase de implementação de seus
sistemas integrados e de suas soluções para B2B. Sabe-se também que os sistemas atuais, como por
exemplo o R/3 da SAP, admitem extensas possibilidades de customizações através de parametrizações
em suas tabelas (KELLER e TEUFEL, 1998), isto é, sem necessidade de programação; e que estas
podem alterar substancialmente o modo como são executados os processos de negócios e os resultados
conseqüentes em seus atributos de desempenho. Além disso, a utilização de linguagem de
programação também é capaz de criar novas funcionalidades, embora trate-se de projeto mais
demorado e custoso.
Cabe portanto uma primeira conclusão: mesmo que as grandes empresas estejam impelidas a
modernizar-se tecnologicamente com o uso de ERPs e de sistemas para E-Business, já que estes
podem proporcionar ganhos imediatos em eficiência operacional, será de fundamental importância a
elaboração de uma orientação estratégica capaz de definir as prioridades de desempenho dos processos
de negócio, de modo a garantir a eficácia dos mesmos.
Isso significa que, apesar do sistema ser capaz de, por exemplo, aumentar a velocidade de um
processo, a consideração estratégica pode priorizar outros atributos competitivos a ponto de, no caso
mais extremo, fazer com que este processo nem sequer exista ou seja implantado sem uma estrutura
informatizada. No meio termo, onde defini-se o uso dos SIGs, o aparecimento das opções estará
inerente à fase de implementação onde devem ser escolhidas quais as funcionalidades presentes na
melhor solução específica para cada organização, isto é, aquela que suporta a criação de uma
capacitação única, tornando o recurso de real valor para a existência de vantagens competitivas.
Como exemplo de opções possíveis que ilustram a necessidade de uma escolha orientada
estrategicamente para o caso específico de sistemas de ERP, vale citar o quadro desenvolvido por
BUCKHOUT et al (1999), onde para cada decisão crítica de negócio, existe mais de uma abordagem
cabível, inclusive sem o uso dos Sistemas Integrados:
Decisão de Negócio
Solução típica em SIGs
Alternativas
Que partes produzir e quando
MRP – ‘explode’ BOM e faz Fazer de acordo com a taxa de
programação detalhada
consumo da parte
Programação fina da produção MRP indica próxima ordem
FIFO, sem sistema de informação
Como estimar necessidades de Rodar módulo de CRP com Estimativa com base em demanda
Capacidade
base em dados por parte
agregada no gargalo
Como calcular os custos de Sistema calcula os custos para Cálculo periódico dos custos com
produção
cada ordem, incluindo tempo base na produção agregada - Custeio
variável
de preparação e execução
Tabela 1: Decisões de negócio e existência de prioridades
Fonte: BUCKHOUT et al, 1999
A tabela anterior representa uma mínima fração das decisões tomadas na escolha do modelo de gestão
de uma organização. A vertente estratégica associada à análise da natureza dos processo existentes e
suas variáveis, constitui-se como base para a decisão sobre qual a alternativa é mais eficaz para cada
organização. Do ponto de vista prático, a decisão de como competir, isto é, qual a posição competitiva
a ocupar e quais os recursos desenvolver, cria uma orientação que deve guiar o projeto de escolha e
implementação dos sistemas, de modo a garantir reais vantagens em eficácia.
Esta conclusão é ainda mais relevante se for considerada a concorrência com outras organizações que
também estão integradas informaticamente e que também operam em rede com fornecedores e
clientes, com os mesmos potenciais de ganhos em eficiência. Resumindo, os objetivos estratégicos
traçados devem nortear todo o processo inicial, onde serão decididas as funcionalidades e
parametrizações necessárias às atividades informatizadas, bem como sobre os sistemas legados
remanescentes, aqui também incluídos os processos cuja maior eficácia se dá sem o auxílio da
Tecnologia da Informação.
O que se está querendo colocar é que, se hipoteticamente existe um setor onde todos os concorrentes
implantaram um mesmo software, a competitividade sentida unicamente pela melhora de eficiência
será diminuída comparativamente e as decisões de funcionalidades e customizações nos processos de
negócios, tanto a nível de parâmetros como a nível de linguagem ou uso de outros sistemas
complementares, tornam-se cruciais para o desenvolvimento de vantagem competitiva sustentável no
contexto do uso de softwares de gestão empresarial.
Além disso, a escolha dos modelos de gestão a serem implementados não pode acontecer apenas a
nível de módulos funcionais, mas deve considerar a empresa como um todo, e o impacto de cada
decisão nas demais funcionalidades, bem como nos atributos de desempenho priorizados.
Hipoteticamente, caso seja definido que o modelo de gestão de custos ABC é superior ao rateio
simples com base em tempo de mão-de-obra direta, os reflexos desta determinação para demais áreas,
como por exemplo, para o custeio de ordens de produção, devem ser avaliados, no mínimo, por uma
questão de consistência do modelo a ser implementado.
No Brasil, muitas empresas estão passando pela etapa de compra e implantação de ERPs e, na
chamada segunda onda, de sistemas para E-Business, sem atentar para estas discussões. Os efeitos
nocivos deste comportamento serão tão mais rapidamente sentidos quanto maior for a própria
disseminação do uso destas tecnologias, que tende a acabar com a vantagem percebida pela mera
utilização da mesma, focada apenas em aumento de eficiência.
3. Vantagens competitivas dinâmicas
Considerar que o final do processo de implantação dos sistemas corresponde ao final da exploração do
potencial de ganhos competitivos proporcionados pelos mesmos é, no mínimo, uma subtilização dos
recursos. Na prática, muitas das empresas usuárias de sistemas integrados começam a ter retornos
concretos apenas após um certo tempo para estabilização e aprendizado organizacional.
Sendo assim, existe uma segunda esfera de vantagens competitivas possíveis de serem obtidas, que
encontram-se diante de um componente temporal, isto é, em fase de pós-implementação. Suas
classificações diferem das vantagens descritas anteriormente e, no contexto estratégico, ligam-se à
uma abordagem de cunho dinâmico cujo esforço analítico abrange maior complexidade, até por lidar
com mais incertezas inerentes à sua natureza, no processo de construção dos diferenciais estratégicos.
Na tentativa de sistematizar a discussão, pode-se dizer que os novos potenciais de vantagem
competitiva pós-implementação estão relacionados a quatro fontes distintas: o aprendizado entendido
enquanto melhorias na cultura organizacional e/ou inovação tecnológica; o uso de softwares
complementares com funcionalidades mais avançadas, capazes de adicionar “inteligência” aos
sistemas; o reposicionamento estratégico baseado em novas capacitações de caráter dinâmico, isto é,
anteriormente não concebidas; e a reconfiguração de forças competitivas da Indústria, para o caso de
tecnologias baseadas na Internet.
3.1.
Vantagem competitiva pelo aprendizado
Para entender a possibilidade de um próximo passo na busca por vantagens competitivas
proporcionadas pelo uso dos ERPs e tecnologias de E-Business, é necessário citar-se o conceito de
curva de aprendizado, já largamente difundido na literatura de estratégia e operações (PORTER, 1980
e HAYES e WHEELWRIGHT, 1984). Imagine que um determinado consumidor adquire uma TV a
cores com controle remoto na versão mais moderna. Nos primeiros dias, a operação do controle é
feita de maneira vagarosa e nem sempre com sucesso, isto é, aparecem os “apertões” errados. Após
um mês usando o aparelho, em geral, consegue-se operar as teclas até de maneira intuitiva, sem grande
concentração, além do descobrimento das funcionalidades mais avançadas.
Estendendo-se esse conceito para empresas nas suas operações mais complexas, fica claro que a curva
de aprendizado, ao longo do tempo, é capaz de proporcionar um uso mais eficiente dos recursos
disponíveis, o que tem como conseqüências possíveis a redução de custos, aumento de produtividade e
qualidade. Obviamente, este fato pode ser também desdobrado por analogia aos sistemas e, em nossa
visão, vertentes advindas do conceito serão capazes de explicar a próxima etapa de buscas por
vantagens competitivas nas empresas usuárias das tecnologias citadas.
Primeiramente, iniciar a etapa produtiva após a implementação não significa o fim do projeto de
implantação do sistema, mas o inicio deste em sua fase mais promissora. Neste momento, a
organização deve extrair todo o potencial do recurso através do aprendizado coletivo, segundo sua
orientação estratégica, que já foi a baliza para as decisões sobre as funcionalidades postas em prática.
Por exemplo, em geral, os sistemas de ERP permitem configurações de relatórios e telas específicas
por usuário (acionadas pela senha de entrada ou “log-on”). Portanto, cabe a cada gestor ou operador,
pós-customização geral, detalhar ainda mais como prefere ter sua interface com os dados disponíveis.
Obviamente, antes de atingir esta funcionalidade, é preciso que estes usuários estejam firmemente
capacitados no uso do SIG para o suporte da operação diária da empresa, de maneira estável.
Cabe lembrar que o próprio costume com o modo de operação dos processos integrados, suas
seqüências e localizações no sistema, torna o uso do mesmo mais eficiente, e aprimora a disciplina
para entrada e tratamento de dados nas operações da organização. Sob este aspecto, um
desdobramento possível decorrente do aprendizado é a necessidade de novo apoio externo para
implementar outras parametrizações antes desconsideradas, por falta de um maior conhecimento
inicial sobre as potencialidades do recurso na primeira fase da implantação.
Além da fase de estabilização da utilização, uma outra e mais importante curva de aprendizado
acontece não necessariamente seqüencialmente, mas de maneira paralela, e também constituí-se de
importante figura nesta segunda etapa.
Gerenciar uma função, uma atividade, um departamento, um processo ou uma rede de operações
(cadeia de suprimentos) com informações integradas é completamente diferente do trabalho isolado
em silos funcionais. Esta mudança também exige aprendizado, pois as informações antes inacessíveis
de outras áreas, agora são disponibilizadas e servem para a consideração de impactos entre os modelos
e as decisões de gestão. Por exemplo, um gerente de vendas que trabalhou durante anos enxergando o
desempenho de seu departamento pelos relatórios tradicionais de quantidades vendidas por
cliente/vendedor, tem agora a possibilidade de verificar na prática, o quanto a atividade de seus
vendedores impacta no desempenho do setor de produção, pois, por exemplo, técnicas de
favorecimento à venda de produtos específicos mais padronizados poderiam ter reflexos positivos na
redução do lead-time e custos de fabricação.
Resumindo o quadro apresentado, nesta segunda etapa, o aprimoramento das vantagens competitivas
advém do próprio uso contínuo do recurso, através do aprendizado em relação à como operar e gerir a
empresa, com o potencial da ferramenta de integração, tanto dentro como entre empresas. É a fase de
estabilização vista de maneira expandida, como possível alavancadora de melhores desempenhos.
Sobressairão aquelas organizações que, com maior velocidade, consigam transformar o aprendizado
pessoal em crescimento organizacional (SENGE, 1990), através da difusão interna de modelos de
operação e gestão mais eficientes, provenientes do uso dos recursos.
Além disso, uma orientação estratégica oriunda de trabalho anterior à fase 1 tem papel acelerador
neste processo, seja diretamente pela implementação de um modelo aderente de sistema ao negócio da
empresa, seja indiretamente pela difusão de informações consistentes entre os diversos departamentos
da organização. Do ponto de vista estratégico, sob o quadro da VBR, esta segunda fase torna o
recurso ainda mais valioso, pois pode proporcionar aumento do seu grau de unicidade, isto é, suporte à
construção de uma capacitação demandada pelo mercado, cuja imitação é ainda mais difícil e cuja
apropriação pode estar toda interna à organização.
3.2.
Vantagem competitiva pelo uso de sistemas complementares avançados
Uma vez normalizado e estabilizado o uso do sistema, orientado pelas decisões estratégicas de como a
empresa compete, existe uma nova possibilidade dada pelo advento de tecnologias ainda mais
avançadas, que favorecem a dimensão analítica e estratégica. Nesta terceira fase, as empresas buscam
complementos aos Sistemas instalados e aos seus legados remanescentes, visando alavancar novo salto
no patamar dos resultados de seus atributos competitivos.
De certa forma, este movimento é natural dado que os novos complementos podem adicionar mais
“inteligência” ao sistema como um todo, pois em geral constituem-se de ferramentas avançadas, com
algoritmos de ponta para tomada de decisão e otimização de funções. Por exemplo, a otimização
matemática de todo o fluxo logístico de materiais entre diversas empresas componentes de um sistema
de valor (PORTER, 1985), torna-se possível com a implementação de tecnologias como por exemplo
o APO (Advanced Planner and Optimizer) da SAP, o Rhythm da I2, o Manugistics, entre outros, que
seguem lógicas internas estabelecidas pelos próprios gestores, entre diversos modelos existentes.
Repare que não se trata de ganho pontual de eficiência pelo mero uso do recurso, mas sim de ganhos
em competitividade atrelados a um melhor uso das ferramentas, que permitem múltiplas opções
analíticas mas deixam para o tomador de decisão papel fundamental na busca dos ganhos superiores.
Esta vertente de novas aplicações está fortemente relacionada à própria velocidade de
desenvolvimento de hardwares e softwares, já que a teoria que está por trás dos novos sistemas já é
amplamente conhecida, como por exemplo a Teoria das Restrições para a gestão e sequenciamento da
produção (GOLDRATT e COX, 1997).
Outro exemplo nesta linha, é a corrente de trabalho em gestão de conhecimento, que começa a se
configurar na prática com o lançamento de produtos pelas grandes software houses. Ainda outro, o
Balanced Scorecard (NORTON e KAPLAN, 1998), conceito difundido na segunda metade da década
de 90 como conjunto articulado e balanceado de indicadores de desempenho para gestão estratégica,
encontra agora, na convergência com os sistemas integrados, a oportunidade de base de dados
abrangente e confiável para sua operacionalização. Por exemplo, sistemas como o SEM (Strategic
Enterprise Management) da SAP ou o OBSC (Oracle Balanced Scorecard) da Oracle podem ter desde
nenhuma até imensa utilidade para gestão, dependendo de como são implementados e utilizados. Em
outras palavras, diferentemente dos sistemas transacionais, o ganho não está atrelado a simples
implantação, nem no que diz respeito a eficiência, pois, se por exemplo não forem escolhidos
indicadores críticos consistentes e consonantes com a estratégia da empresa, as informações vindas
destas funcionalidades não passarão de meros dados.
Vale a pena acrescentar que esta fase de busca de vantagens com a implementação de outros sistemas
ainda mais complexos, exige mais uma vez investimentos, e só admite pertinência conceitual para
organizações que realmente conseguem passar pela fase de aprendizado gerencial, e para o caso de
implementações sob a perspectiva estratégica descrita na fase 1.
Por outro lado, um ponto que merece destaque é a oportunidade de pioneirismo, já que muitas das
soluções ainda são incipientes ou não difundidas. Obviamente, o posicionamento advindo do fato de
ser o primeiro usuário de uma funcionalidade mais avançada tem as vantagens pertinentes associadas
ao preço pago por um maior esforço de aprendizado e desenvolvimento, até por parte do próprio
fabricante do sistema.
Os saltos de melhoramentos desta fase são difíceis de estimar dado que, na realidade empresarial, ela
está apenas iniciando-se, não havendo resultados de pesquisas disponíveis acerca do assunto.
Por fim, da mesma forma que o conceito de curva de aprendizado olha para os ganhos futuros gerados
após o uso contínuo dos sistemas integrados, esta fase assume a existência desta possibilidade, onde as
vantagens competitivas principais iniciam apenas com a prática sobre o sistema avançado implantado.
3.3.
A abordagem por capacitações dinâmicas
Apesar do esforço analítico necessário para as fases anteriores já ter certo grau de complexidade, até
pelo volume de decisões e oportunidades existentes, uma consideração de caráter dinâmico aparece ao
longo de todo o processo e não pode ser descartada já que, embora de maior dificuldade de
enquadramento dentro de quadro sistêmico, pode ser fonte de vantagens sustentáveis nem sequer
anteriormente pensadas.
Um problema de natureza dinâmica reside no fato que mesmo quando a preocupação de suporte à
posição competitiva imediatamente almejada está presente, pode-se incorrer na não-consideração dos
eventuais posicionamentos imaginados mais para o futuro.
Por exemplo, suponha agora que uma firma esteja no dilema entre dois softwares de CAD para projeto
de produtos. O primeiro é mais barato, mais fácil e resolve a contento seus problemas presentes, de
atendimento aos segmentos de mercado com os quais a empresa opera no momento, tipicamente de
pequenas empresas. O segundo é mais caro, mais difícil de aprender; mas não só resolve os problemas
presentes como também é conectável ao CAD de clientes de grande porte, o melhor segmento do
mercado e, portanto, prospects favoritos da área de Marketing da firma. A decisão entre um outro tem
de contemplar, portanto, a possibilidade de deslocamento posterior da firma.
Como o futuro é por definição incerto, o que se deve considerar, portanto, é o que DRUCKER (1973)
chama de “a futuridade das decisões presentes”. Isto é, o quanto a escolha de agora limitará/sustentará
os passos futuros da empresa. Ou seja, o grau de comprometimento (GHEMAWAT, 1991) com uma
determinada combinação de trajetória tecnológica – competitiva
A questão aqui levantada chama ainda mais atenção para o fato de que os investimentos em Sistemas
Integrados e E-Business dependerão, para uma maior eficácia, de melhores conhecimentos sobre suas
operações e de um melhor entendimento da prática da gestão estratégica.
Genericamente falando, empresas usuárias de ERPs e B2B que já atravessaram ou que entrarão em
breve nas fases de grande investimento de recursos organizacionais, mesmo quando de posse de
opções de grande eficiência estratégica, tem reduzido seu leque de opções futuras pela natureza
complexa dos próprios sistemas. Isto é, trata-se de opção de baixa flexibilidade estratégia, o que
condiciona uma posição vantajosa futura ao acerto na escolha do presente. Tratando-se de SIGs,
projetos implementados sem o componente estratégico podem ter efeitos ainda mais nocivos quando
da consideração de impactos futuros, pelo seu alto grau de comprometimento com a solução adotada.
Porém, da mesma forma que esta consideração de futuro gera maior necessidade de esforço analítico,
a dinamicidade temporal na tomada de decisão também tem suas componentes emergentes que podem
favorecer ao gestor em SIGs.
Por exemplo, capacitações anteriormente não previstas podem vir a surgir e acabam por virar a base
para uma nova posição competitiva anteriormente não pensada (PROENÇA, 1995). Nessa abordagem
por capacitações dinâmicas, os SIGs tem papel estratégico importante, porém de difícil cálculo a
priori, já que cada organização terá sua solução única e reagirá a mesma de maneira diferente, em
função de seus quadros, sua cultura e seu arranjo organizacional.
3.4.
A reconfiguração de forças competitivas
Especificamente para os sistemas que viabilizam via Internet o E-Commerce ou o B-2-B, uma outra
fonte de vantagem potencial está na mudança estrutural da Indústria, principalmente para produtos
onde existem canais de distribuição e de vendas com alto poder de barganha.
Nas Indústrias onde a menor rentabilidade advém do maior poder de barganha da força compradores
(PORTER, 1980), e estes são intermediários na Cadeia de Suprimentos, cuja agregação de valor está
no contato, venda e distribuição de produtos, usar tecnologias de E-Commerce ou B2B possibilita
mudanças na estrutura setorial pois os clientes finais passam a comprar diretamente os produtos dos
fabricantes, diminuindo o poder de barganha desses intermediários.
Obviamente esta última colocação não assume caráter genérico, e deve ser estudada caso a caso,
podendo ser mais relevante dependendo do setor em questão. No entanto, sua análise é primordial
pois seu efeito pode representar tamanha reestruturação que, em alguns casos, o próprio projeto dos
sistemas transacionais deveriam ser revistos para contemplar a operação em nova fase onde as forças
que disputam rentabilidade foram reconfiguradas.
4. Conclusão
Na reflexão até aqui executada, colocar a perspectiva estratégica na utilização de ERPs e tecnologias
de E-Business, significa ter uma orientação de priorização de atributos em todas as fases do projeto
(escolha e implementação).
À luz da VBR, tanto a fase de configuração como a de aprendizado, quando inseridas em um contexto
estratégico, estarão formando um recurso mais valioso, por serem continuamente atendidos os
requisitos de demanda, escassez e apropriabilidade, enquadrados por um potencial de melhoria no uso
contínuo e estruturado dos sistemas.
Portanto, em todos os casos citados, quanto maior for a preocupação com a criação do pano de fundo
estratégico, mais coerente serão as ações propostas, não apenas do ponto de vista interno, mas também
na relação com o ambiente competitivo. Criar vantagens com o uso de ERPs e tecnologias de EBusiness pode parecer missão das mais lógicas, porém, garantir que as vantagens são consonantes com
o longo prazo e sustentam posições contra movimentos adversários, é missão que não se resume à
simples implementação do recurso.
É preciso saber gerenciar, extraindo o máximo do recurso nos aspectos de suporte aos objetivos do
negócio. Enfim, é imprescindível pensar e agir estrategicamente, desde a escolha dos softwares e ao
longo de toda sua vida útil, independente da fase do projeto de implantação. Se isso vale para ERPs,
ainda maior e mais coerente é esta lógica aplicada a sistemas mais avançados, como por exemplo,
aqueles que consideram esforços analíticos consistentes ou a integração entre diversas empresa.
Concluindo, Sistemas Integrados de Gestão e E-Business em sua forma básica são, afinal, apenas
ativos comercializáveis e torná-los chaves para obtenção de vantagem sustentável está
necessariamente atrelado à sua forma de utilização, que deve ser única para cada organização.
5.
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