I N S T I T U T O P Ó L I S e sociedade governo IDÉIAS PARA A AÇÃO MUNICIPAL N o 186 2001 MINISTÉRIO PÚBLICO E A DEFESA DE DIREITOS Para uma administração democrática, o Ministério Público é um aliado na efetivação dos mecanismos de gestão participativa, na garantia dos direitos e na luta contra a corrupção. A Constituição Federal de 1988 garantiu direitos sociais para todos os residentes em nosso País, brasileiros e estrangeiros. O artigo 6º define estes direitos: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Legislações posteriores, como a do Sistema Único de Saúde (Lei nº 8.080/90 e 8.142/90), da Assistência Social (Lei nº 8.742/93), da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/96), dentre outras, decorreram das diretrizes obrigatórias da Constituição e asseguraram a todos as políticas públicas sociais. Apesar deste respaldo constitucional e legal, estes direitos nem sempre são plenamente atendidos. É direito dos cidadãos exigir a implementação de políticas que efetivem estes direitos. Mas os cidadãos não constituem um bloco homogêneo de reivindicações. Com tantos interesses de grupos e classes sociais em jogo nem sempre é tarefa fácil para o administrador saber qual a melhor política a ser adotada. Dada a complexidade das demandas, bem como a necessidade de se verificar se a administração pública está de fato atuando em conformidade com a Constituição e com as leis, foi preciso criar instituições que fiscalizassem e controlassem sua atuação. Para que houvesse o aprofundamento da democracia, além de órgãos de fiscalização, foram criados também mecanismos de comunicação mais permanentes entre os cidadãos e a administração pública. O Ministério Público, por exemplo, que originalmente atuava como braço do Estado, ao longo da última década passou a defender interesses coletivos, ou seja, interesses de um grupo, categoria ou classe e não de um indivíduo isolado, como por exemplo, o direito de um grupo de moradores afetados por uma desapropriação de terras para a construção de uma barragem; interesses difusos, ou seja, interesses que não são específicos de uma pessoa ou grupo de indivíduos mas de toda a sociedade, como por exemplo, o direito de todos respirarem ar puro; e interesses individuais homogêneos, ou seja, quando diferentes indivíduos têm em comum uma identidade de direitos, como o direito de consumidores lesados de uma mesma maneira, por exemplo. Em conjunto com outras instituições, o Ministério Público fiscaliza a administração pública, funciona como um canal de expressão dos direitos da população e, quando estes não são atendidos, atua como um advogado da sociedade. Poucas vezes na história do Brasil uma instituição ganhou tanta importância no cenário público em tão pouco tempo. Por um lado, o Ministério Público tem publicizado inúmeros casos de corrupção, desvio de dinheiro público e abuso de poder por parte de administradores públicos, que tiveram que responder pelos seus atos. Por outro lado, tem sido um grande aliado dos administradores públicos que buscam cumprir melhor a sua função e aprofundar a democracia. O Ministério tem contribuído, assim, para distinguir entre os bons e os maus governantes, principalmente no que se refere à garantia dos direitos sociais e ao uso dos recursos públicos. O QUE É? O Ministério Público é uma instituição permanente, cuja função é defender e fiscalizar a aplicação das leis, representando os interesses da sociedade; zelar pelo respeito aos direitos constitucionais por parte dos poderes públicos e pela garantia dos serviços de relevância pública garantidos na Constituição. Não está subordinado ao Poder Judiciário e age de forma independente. Seus membros são formados em Direito, selecionados por concurso público e não podem atuar como advogados defendendo interesses particulares. Seus integrantes têm as mesmas prerrogativas dos membros do Judiciário: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. O Ministério Público está dividido em Ministério Público da União, cuja estrutura é mantida pelo governo federal e que inclui o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar, o Ministério Público do Distrito Federal; e o Ministério Público dos Estados, cuja estrutura é mantida por cada um dos estados da federação. Os instrumentos de atuação disponíveis e a organização de ambos são iguais. A diferença na competência de cada um deles está disciplinada em suas leis orgânicas. Em regra, os membros do Ministério Público Federal trabalham com questões de responsabilidade da administração federal como utilização das verbas públicas e crimes federais (definidos na Constituição) e os membros dos Ministérios Estaduais com questões atinentes às administrações estaduais e municipais e verbas destas esferas da administração. O Ministério Público pode atuar junto ao Judiciário. Por exemplo, se alguém comete um crime, o Ministério pode oferecer uma denúncia perante o Judiciário. Se a denúncia for aceita, o processo terá seguimento. O Ministério Público também pode agir fora do Judiciário. Por exemplo, se em determinada cidade não existe o Conselho de Saúde determinado por lei, o Ministério pode investigar junto ao prefeito, vereadores e associações locais o motivo da não existência do Conselho, procurando resolver o problema sem acionar o Judiciário. Caso isto não surta efeito, o Ministério pode propor uma ação contra aqueles que tinham a obrigação de criar o Conselho e não o fizeram. Neste caso, estará agindo junto ao Judiciário. Isso também pode acontecer quando a lei municipal não atende as diretrizes da Constituição ou da lei federal respectiva. INSTRUMENTOS ação do conselho, como os Ministérios e Secretárias de Educação, Saúde, entre outros. O Ministério Público pode utilizar vários instrumentos de ação. A Ação Civil Pública é quando o Ministério Público propõe uma ação contra aqueles que causam danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor estético, histórico, turístico e paisagístico, patrimônio público e qualquer outro interesse difuso ou coletivo, e ainda por infração da ordem econômica e da economia popular. A ação civil pública também pode ser proposta por uma associação, que esteja constituída há pelo menos um ano e inclua entre suas finalidades a defesa dos interesses e direitos sociais. Caso seja necessário investigar para verificar se determinado direito foi violado ou não, antes de propor a Ação Civil, o Ministério Público deve abrir um inquérito civil público. A Ação de Improbidade visa punir os administradores dos patrimônios e dos bens públicos quando cometem atos que prejudicam a receita do município ou quando se enriquecem burlando as leis. O mau uso de verbas públicas pode caracterizar ato de improbidade. Esta ação está prevista pela Lei n.º 8.429/92. A Ação de Improbidade não pode ser movida por associações e, portanto, as denúncias precisam ser necessariamente encaminhadas ao Ministério Público ou aos próprios órgãos de fiscalização e controle da administração, dependendo da área de atu- MINISTÉRIO PÚBLICO E O MUNICÍPIO Em quase todos os municípios há pelo menos um representante do Ministério Público, que pode ser encontrado em sua própria sede ou no Fórum do Poder Judiciário da cidade. Apesar de boa parte da atuação do Ministério Público estar focada na investigação de ações de improbidade administrativa, denúncia de desvio de dinheiro público e encaminhamento de processos para o Poder Judiciário, também há muitas ações do Ministério Público de aproximação com a população, exercendo o papel de uma espécie de “ouvidor público”. Nestes casos, a atuação do Ministério Público é feita fora do Poder Judiciário e em geral é complementar à ação da administração pública. As recomendações feitas pelo Ministério Público podem ajudar o gestor a perceber quais áreas da sua administração não estão cumprindo as determinações constitucionais e legais e, assim, percebendo as falhas, pode-se buscar corrigir os rumos da gestão. Além disso, muitas vezes os interesses dos diferentes grupos da população são conflitantes entre si. Nestes casos, o Ministério Público tem assumido o papel de defensor de direitos coletivos, especialmente de grupos mais vulneráveis. Em algumas áreas específicas, a atuação do Ministério Público auxilia o administrador a tomar atitudes que enfrentam resistência por parte de setores da sociedade, especialmente por falta de esclarecimento e informação. São exemplos deste tipo de atuação, que vem ao encontro dos interesses de uma administração democrática: a inclusão das crianças e adolescentes portadores de deficiência na rede regular de ensino (veja DICAS Nº 160); o problema dos lixões nos municípios, agregado à presença de crianças que trabalham nos lixões (veja DICAS Nº 132); o trabalho infantil nos municípios (veja DICAS Nº 134); a efetividade da municipalização dos serviços de saúde e a preservação do patrimônio histórico, cultural e ambiental (veja DICAS Nº 180). Há também questões ambientais como o controle da queima da canade-açúcar, loteamentos irregulares perto de áreas de manancial, prevenção de poluição de rios e exigência por parte dos municípios de EIA/ RIMA nos empreendimentos realizados pela iniciativa privada ou pelo próprio setor público. Todos esses são problemas cotidianos que, quando respaldados pelo Ministério Público, podem ser mais facilmente enfrentados pelas administrações democráticas que buscam desenvolver seu município de forma integrada e auto-sustentável. RESULTADOS O município de Franca-SP (267 mil hab.) há alguns anos enfrentava problemas com a Fundação Civil Casa de Misericórdia, que criava dificuldades para realizar cirurgias eletivas pelo SUS, até declarar publicamente a suspensão das realizações de tais cirurgias. O Ministério Público Federal, que vinha realizando auditorias na Santa Casa, após esta declaração recomendou à prefeitura que fizesse uma intervenção na entidade. A prefeitura consultou o Conselho Municipal de Saúde, que aprovou a intervenção. A iniciativa do Ministério Público, somada ao apoio do Conselho de Saúde, foi importante para respaldar a atitude da prefeitura, minimizando os custos jurídicos e políticos de uma atitude como esta que, tomada isoladamente, poderia ser muito desgastante para o prefeito. O município de Sacramento-MG (20.781 hab.) sofria graves problemas de mortandade de peixes no Rio Grande. A prefeitura e a Câmara de Vereadores desde a década de 70 queriam resolver este problema, causado pela Usina Hidrelétrica de Jaguara, gerenciada pela CEMIG (empresa públi- ca de energia). O Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual atuaram em conjunto para que a Cemig assinasse um Termo de Ajuste de Conduta. Neste termo, a Cemig se comprometeu a fazer um canal de passagem e um sistema de transposição para que o problema de mortandade de peixes fosse solucionado. Neste caso, os Ministérios Públicos atuaram como intermediários entre o município e a em- Leia os Boletins DICAS na Internet: http://www.polis.org.br/publicacoes/dicas v es Teix eira. Autora: Ana Claudia Cha Chav eixeira. Consultores: Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, Jefferson Dias, Jefferson Ribeiro e Edmar Machado. Instituto Pólis- Rua Cônego Eugênio Leite, 433 - São Paulo - SP - Brasil CEP 05414-010 - Telefone: (011) 3085-6877 - Fax: (011) 3063-1098 http://www.polis.org.br - e-mail: [email protected] presa do Estado, contribuindo para solucionar uma situação de conflito. A Procuradoria da República de Marília-SP, com base em diagnóstico realizado sobre os problemas ambientais que afetavam os municípios da região organizou um evento sobre a destinação de resíduos sólidos, reunindo prefeitos e representantes de 38 cidades. Com as informações obtidas durante o evento, o município de Pompéia-SP (18.157 hab.) tomou a iniciativa de construir um aterro sanitário para a destinação adequada de seu lixo, com recursos obtidos junto ao Comitê das Bacias Hidrográficas dos Rios Aguapeí-Peixe.