GT: 3- DIREITOS HUMANOS, POLÍTICAS SOCIAIS E POBREZA POBREZA URBANA: A AGRICULTURA URBANA COMO FERRAMENTA DE GESTÃO NA BUSCA DA QUALIDADE DE VIDA E DA SEGURANÇA ALIMENTAR1. OLIVEIRA, Igor Martins de. [email protected] RESUMO: Com o processo de expansão capitalista, cujos expoentes máximos são as diretrizes da globalização, as cidades ganharam novas configurações que determinam/condicionam as formas de vida dos citadinos, através do processo de urbanização. Com esse, as cidades tornam-se um cenário propicio à receber contingentes populacionais oriundos da migração campo/cidade, e cidade-cidade nas dimensões pequena/media/metrópole. Contudo, inúmeros problemas também surgiram e/ ou se intensificaram. Dentre esses, a fome/desnutrição é, sem dúvida, um dos mais graves, afetando uma grande parcela da população, especialmente, os menos favorecidos socioeconomicamente.Como produto das precárias condições socioeconômicas presente nos setores mais pobres da sociedade, a fome-desnutrição, desemprego e marginalização social são os sintomas, dentre outros, que agrava a “crise das cidades”. No Brasil, com a necessidade de alcançar a Segurança Alimentar e Nutricional-SAN, a Agricultura Urbana vem gradativamente integrando as pautas das discussões através de projetos governamentais, sobretudo, no âmbito do Programa Fome Zero e da criação do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome – MDS. A fim de se buscar a qualidade de vida, a geração de emprego e renda, o fortalecimento da segurança alimentar nas cidades Agricultura Urbana é utilizada como estratégia política voltada à produção de subsistência, uma vez que é capaz de gerar excedente que poderá ser comercializado, além de criar formas de emprego para grupos urbanos marginalizados. Este estudo tem base essencialmente teórico, cujo objetivo central é analisar a aplicabilidade da Agricultura Urbana, como ferramenta de gestão na busca da qualidade de vida, na geração de emprego e renda e, sobretudo, a melhoria da alimentação da população de baixa renda das cidades. Para tanto se fundamenta nos trabalhos de Le Bihan; Delpeuch; Maire (2009), Mougeot (2000), Oliveira; Veloso e Carneiro (2010), Novais (2008), Maluf (2006), Drescher; Jacobi e Amend (2000) entre outros autores que discutem a problemática abordada. Palavras Chave: Cidade, Urbanização, Agricultura Urbana, Segurança Alimentar. 1 Fragmentos do Trabalho de conclusão de curso intitulado “TRADIÇÕES RURAIS EM VIDAS URBANAS: A AGRICULTURA URBANA NO BAIRRO VILA ANÁLIA, MONTES CLAROS/MG. Apresentado pelo mesmo autor ao Departamento de Geociência da Universidade Estadual de Montes Claros para obtenção do grau de Licenciado em Geografia. 1 Considerações Iniciais: Quando estudamos as cidades nos trabalhos geográficos a grande maioria dos casos é para discutir a funcionalidade urbana, os fluxos do comércio, indústrias e pessoas. Em minhas pesquisas sobre as cidades por diversas vezes, me deparei com os temas referentes à pobreza e fome, mas foram poucos os trabalhos cujo cerne discorresse sobre esta temática. Assim achei válido, contribuir com o tema, através das pesquisas que tenho realizado sobre a Agricultura Urbana, minhas leitura dos últimos quatro anos foram imprescindíveis na concepção deste trabalho. Um antigo questionamento persiste em meus trabalhos: Com o crescimento das cidades, com a celeridade da vida e distanciamento das relações sociais, com a perda dos espaços naturais onde e como vamos produzir alimentos para abastecer a população, levando em consideração que a grande massa que vive nas cidades e grande parte dessas é pobre? Este questionamento foi sustentado nos trabalhos de Daniani (2001) e Pintaudi (2001), no livro “O Espaço no fim do Século”, quando as autoras analisam as cidades e o crescimento urbano, citando uma crise “da cidade” e/ou “na cidade”, não podemos ser presunçosos em afirmar que a cidade/urbano são os causadores da fome, da pobreza, desemprego, falta de habitação, pois, estes problemas sociais sempre foram presentes na historia da humanidade. Também não podemos ser displicentes em negligenciarmos a participação que o processo de urbanização teve e tem no agravamento desse cenário. As referências feitas permitem pensar que problemas identificados atualmente nas cidades, guardadas as devidas proporções, já eram bem conhecidos de nossos antepassados e são indicativos de que as cidades nunca foi um paraíso. Na atualidade, os problemas continuam com outros números, com outras conotações, entre localidades, às vezes; mas continuamos convivendo com crianças abandonadas, com pobres, com populações segregadas (PINTAUDI, 2001, 134). Desta maneira, a sociedade vivencia uma nova configuração do espaço geográfico, onde as relações sociais são moldadas a partir da lucratividade. Para Castells (2005) essa nova roupagem da sociedade se dá devido o processo de globalização uma vez que “uma revolução tecnológica concentrada nas tecnologias da informação começou a moldar a base material da sociedade em um ritmo acelerado” (CASTELLS, 20005, p.39). Contudo, sabemos que nem 2 todos participam de forma positiva dessas modificações, levando em consideração o número alarmante de pobres urbanos que estão às margens dos processos produtivos das cidades, ficando a mercê da segregação sócio espacial, do desemprego, fome e da insegurança alimentar. Baseando em questionamentos similares a estes, representantes de vários países e cidades reuniram-se entre os dias 16 a 20 de abril do ano de 2000, no seminário-oficina intitulado “A Agricultura Urbana e as cidades do século XXI” considerando três bases fundamentais para a discussão sendo elas: Pobreza urbana, Insegurança Alimentar e Degradação Ambiental. Recentemente, e de modo crescente, vêm sendo desenvolvidas diversas experiências com Agricultura Urbana na América Latina e Caribe, destinados à auto-produção, com o objetivo de aumentar o consumo de alimentos, gerar renda e emprego para a população vulnerável das cidades, e promover a segurança alimentar e a qualidade ambiental (DECLARAÇÃO DE QUITO, 2000). Durante o referido seminário representantes dos governos se comprometeram decididamente o desenvolvimento das práticas agrícolas urbanas, através da disponibilização dos recursos locais existes, institucionalizando e promovendo sua ampliação em nível nacional, bem como através da criação de uma rede de intercâmbio, relacionando as experiências vivenciadas no âmbito municipal, estadual, nacional e internacional relacionadas com as práticas, projetos e políticas vinculadas a Agricultura Urbana. (DECLARAÇÃO DE QUITO, 2000). Baseando nessas premissas vários países da América Latina e Caribe aderiram ao projeto de Agricultura Urbana como ferramenta de gestão na busca da diminuição do número de pobres urbanos, na busca na segurança alimentar, garantia da criação de ambiente urbano favorável a manutenção da vida, sendo eles: (Argentina: Arroyo Ceibal, Camilo Aldao, Carcaraña, Charnoudi, Corral de Bustos, Cruz Alta, General Roca, Guadalupe Norte, Justinano Posse, Lanteri, LasGarzas, Leones, Marcos Juárez, Monte Maíz, Villa Eiolea, Villa María; Bolívia: Santa Cruz; Brasil: Brasília, Curaçá, Maranguape, Teresina, Fortaleza; Colômbia: El Carmen Viboral; Cuba: Havana; República Dominicana: Santiago de los Caballeros; Equador: Cuenca, Manta,Otavalo, Pedro Moncayo, Pimampiro, Quito; Honduras: Puerto Cortés; México: Texcoco; Perú: Cajamarca, Villa El Salvador (Lima), Villa Maríadel Triunfo (Lima); Uruguai: Montevideo) reconhecem as políticas e ações locais de apoio à Agricultura Urbana como estratégias para uma gestão urbana mais sustentável e equitativa (CABANNES; 3 DUBBELING, 2000, p. 01). Para atingir os objetivos traçados na declaração de Quito os países contam com o apoio de órgão de grande notoriedade e respaldo internacional, como a Food and Agriculture Organization of the United Nations (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) – FAO, Programa de Gestão Urbana para América Latina e o Caribe, do IDRC e o Instituto de Promoção da Economia Social – IPES, a Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas - REDE e o Centro de Recursos em Agricultura e Silvicultura Urbanas –RUAF ( OLIVEIRA, 2011). Agricultura Urbana: Em busca de uma Definição Conceitos nada mais são que ferramentais mentais que criamos para compreender e interagir com o mundo, assim classificar determinado objeto depende da forma e função que o pesquisador irá aplicar em seu método de estudo. No caso da Agricultura Urbana, nos último quatorze anos muitos trabalhos foram desenvolvidos tipificando a prática. Contudo, em todos há unanimidade entre os autores ao relacionar o conceito da AU com a área onde é desenvolvida. Para Luc Mougeot (2000) um dos precursores do estudo sistemático da agriculta urbana, muitas das definições freqüentemente utilizadas para conceituar a Agricultura Urbana negligencia uma das características primordiais que a faz realmente “urbana”. Para ele, a característica marcante da Agricultura Urbana é que esta se integra no sistema econômico e ecológico urbano. No entanto, esta integração não é captada na maioria das definições de seu conceito (OLIVEIRA, 2011). A agricultura urbana é a praticada dentro (intra-urbana) ou na periferia (periurbana) dos centros urbanos (sejam eles pequenas localidades, cidades ou até megalópolis), onde cultiva, produz, cria, processa e distribui uma variedade de produtos alimentícios e não alimentícios, (re) utiliza largamente os recursos humanos e materiais e os produtos e serviços encontrados dentro e em torno da área urbana, e, por sua vez, oferece recursos humanos e materiais, produtos e serviços para essa mesma área urbana (MOUGEOT, 2000, p. 07). 4 A Organização das Nações Unidas Agricultura e Alimentação-FAO (1999) define a AU como qualquer prática agrícola produzida dentro da cidade ou em torno desta, tais como hortas e/ou criações voltadas para a subsistência ou para o comércio de pequeno porte. A. Machado e C. Machado (2002) corroboram com a conceituação de Mougeot (2000) ao estudar a Agricultura Urbana baseando-se no critério localização, afirmando que as definições da AU variam das áreas dentro ou em torno das cidades. Para eles, a área intra-urbana é constituída por todos os espaços ociosos das cidades que poderão ser ocupados por algum tipo de atividade agrícola. As vias públicas, praças e parques, lotes e terrenos baldios enquadram a classificação das áreas de abrangência da Agricultura Urbana. Aquino e Assis (2007, p. 143) apresentam uma definição mais detalhada da AU. Nas palavras dos autores: A agricultura urbana refere-se não somente à produção vegetal, mas também à criação de animais (aves, abelhas, peixes, coelhos e outros). O sistema agrícola urbano pode ser uma combinação de muitas atividades diferentes, incluindo desde a horticultura e o cultivo de cereais como milho e feijão à integração com a produção de animais, aproveitando-se restos vegetais na alimentação destes através de compostagem isoladamente ou em conjuntos com esterco oriundo das criações. Drescher; Jacob; Amend (2000, p.03) contribuem na conceituação da Agricultura Urbana salientando que o “sistema agrícola urbano é uma combinação de muitas atividades desde a horticultura, a produção de alimentos básicos, a coleta, a caça e inclusive a silvicultura urbana estão freqüentemente associados à produção de alimentos”. Baseando nessas premissas podemos agrupar a prática de desenvolvimento da AU em três grupos analíticos (representado pelo organograma 01) sendo eles: A relação tempo/espaço, nessa categoria agrupamos as práticas permanentes como o cultivo de árvores frutíferas nos quintais das residências e a criação de animais em lotes vagos, ou pelo sistema de pastoril. A segunda categoria seria o Produto, o que é cultivado, escala de produção e a destinação desses. Por fim tem-se a condição social, ou seja, a analisa da contribuição que a AU condiciona para a melhoria na qualidade de vida, através da geração de emprego, renda, enriquecimento alimento e preservação cultura. 5 Organograma 01: Baseado em Zeeuw; Gündel, Waibel (2000) e autores variados Org: OLIVEIRA, I. M. de, 2011. Segurança Alimentar de Nutricional: uma necessidade para as cidades. Na Geografia o tema produção de alimentos há muito tempo é campo de pesquisa através dos estudos da Geografia Rural e Agrária. No Brasil, desde os tempos coloniais existia uma preocupação por parte do governo com a alimentação da população (BELIK, 2003, p.02). Contudo, os trabalhos referentes à Alimentação e Segurança alimentar ganharam notoriedade a partir do século XX, destacando o trabalho do geógrafo Josué de Castro através da publicação do Livro Geografia da Fome. No entanto, somente a partir da década de 1980 que o tema Segurança Alimentar começou a permear os as discussões acadêmicas, pois, até então o tema era tido como “proibidos” e quando tratado era de forma simplória tendo em vista que “a utilização da noção de segurança alimentar limitava-se, até então, a avaliar o controle do estado nutricional dos indivíduos, sobretudo a desnutrição infantil” (MALUF, 1996, p.02). 6 Diante desta problemática, diversos países se reuniram no ano de 1996 na cidade de Roma – Itália na Cúpula Mundial da Alimentação, onde se firmaram os acordos para reduzir em 50% a quantidade de pessoas famintas até o ano de 2015 (BELIK, 2003, p.02). Cabe ressaltar que, essa Cúpula não foi o primeiro passo a luta contra a fome, no ano de 1993 durante a Conferência Mundial dos Direitos Humanos realizada na cidade de Viena o direito a alimentação, foi discutido e equiparado as diretrizes da Declaração Universal dos Diretos Humanos firmado em 1948. Ações como estas ressaltaram a necessidade dos governos se atentarem as carências alimentares da sociedade, colocando assim o Estado com provedor e responsável pela segurança alimentar e nutricional da população (BELIK, 2003, p.02). No Brasil, o governo aprovou a Lei n. 11.346, de 15 de setembro de 2006, criando o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) tendo como principais objetivos assegurar o direito humano a alimentação adequada; elaborar e implementar projetos, políticas e planos de ações que viabilizem a segurança alimentar e nutricional; estimular a ação conjunta entre a sociedade civil e o governo, além de promover o acompanhamento, monitoramento dos projetos implantados no país (http://www.mds.gov.br/segurancaalimentar/sisan). De acordo com esta Lei, no seu Art. 3, A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (CARNEIRO, M. de F. B., 2008). Atualmente o SISAN é constituído pela Conferencia Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional- CONSEA, Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional- CAISAN, Órgãos e entidades da SAN da união, dos estados, municípios e do Distrito Federal, Instituições Privadas com ou sem fins lucrativos que trabalham com a Alimentação. Os temas que envolvem a Segurança alimentar compõem as principais pautas das discussões sobre qualidade de vida, levando em consideração que, ao se falar de qualidade de vida não nos referimos ao acesso ao alimento, mas também a qualidade desses. Tendo em vista que, em uma 7 visão errônea considera-se que os grupos vulneráveis a insegurança alimentar são unicamente dos desnutridos e famintos, negligenciando o alto percentual de obesos da sociedade. Baseando-se nessas premissas Novais (2008, p.16) ao estudar a Segurança Alimentar e nutricional dos bancos de alimentos da cidade de Diadema – SP a define como: a garantia a todos de alimentos básicos e de qualidade e em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades especiais. O conceito prescreve a adoção de práticas alimentares saudáveis, de maneira a contribuir para uma existência digna em um contexto de desenvolvimento integral da pessoa humana. E agrega aspectos relativos à soberania alimentar, baseado no uso de tecnologias ecologicamente sustentáveis, e a proteção da cultura alimentar. Entre todas as funções e aplicações da agricultura urbana, o combate a insegurança alimentar e nutricional é a mais discutida e sistematizada. Drescher; Jacobi; Amend (2000) discutiram acerca da aplicabilidade da prática da AU na busca da segurança alimentar, destacando três fatores condicionantes, sendo eles Disponibilidade de alimentos (que depende da produção de alimentos nos setores rural e urbano, importações, comercialização e distribuição de alimentos, infraestrutura, disponibilidade de energia, combustível, etc.). Acesso a alimentos (que depende do poder aquisitivo dos habitantes urbanos, produção de subsistência, vínculos campo-cidade, redes domésticas, familiares, de vizinhança etc.). Qualidade do alimento (que depende dos cuidados higiênicos e de conservação da comida vendida nas ruas, da qualidade da produção, do abuso de pesticidas, da qualidade da água usada na produção, das condições sanitárias nos mercados, da qualidade do ar, etc.) (DRESCHER; JACOBI,AMEND, 2000, p.01). Para os autores supracitados o desenvolvimento das práticas agrícolas no espaço urbano nada mais é do que a resposta dos pobres urbanos ao acesso inadequado ao alimento, que se restringe a fatores de disponibilidade. As crises econômicas ou alimentares não são, certamente, o único fator a impulsionar o ressurgimento da AU. Existem numerosas cidades onde a agricultura urbana se desenvolveu sem que fosse necessário passar por um período de crise (ou mesmo onde a crise – para certas categorias da população - já é parte intrínseca do sistema urbano) (DRESCHER; JACOBI; AMEND 2000, p. 02). Além das analises realizadas no trabalho de Drescher; Jacobi; Amend (2000), ao discutirmos a implantação e desenvolvimento da AU, não podemos deixar de referenciar o “ecossistema urbano” proposto por Mougeot (2000), para este autor a agricultura urbana é produto da interação de práticas 8 de manejo de solo, de abastecimento alimentar e desenvolvimento local, como é demonstrado no organograma 02. Organograma 02: Integração da Agricultura Urbana com o ecossistema Urbano. Fonte: Mougeot (2000) Levando em consideração a alta tecnologia de recursos e pesquisas que são destinados a agricultura, e, sendo um Brasil um país de referencia no campo da agropecuária o trabalho de Zeeuw; Gündel; Waibel (2000) se enquadra claramente em nossa realidade. Segundo suas analises para se atingir a segurança alimentar os pobres urbanos não podem contar apenas com os alimentos produzidos nas áreas rurais. Nesta perspectiva retornemos aos três fatores condicionantes ao desenvolvimento da AU proposto por Drescher; Jacobi; Amend (2000): DISPONIBILIDADE, ACESSO e QUALIDADE. Uma vez que se produzido próximo aos consumidores facilitará e reduzirá custos de transporte e armazenamento, reduzindo custo, facilitando ao acesso de uma maior parcela de consumidores, sem mencionar que, a agricultura urbana em sua grande maioria se desenvolve em pequenas escala, através de cultivos orgânicos, como em hortas, jardins urbanos, lotes vagos e em quintais de casas (como forma de aproveitamento de espaços). Ou seja, a agricultura urbana não tem a função de substituir a agricultura rural, essa agirá como complemento da produção rural, uma vez que aumentará a eficiência na provisão de alimentos, haja vista que essa pode fornecer alimentos frescos, de boa 9 qualidade nutricional sem, contudo, requerer grandes gastos com produção (OLIVEIRA, 2011). Por fim nesta última sessão do trabalho analisaremos sucintamente a inserção da Agricultura Urbana nas políticas publicas, ressaltando as vantagens e benéficos dessa na busca da Segurança Alimentar. O Brasil, por exemplo, a AU vem gradativamente integrando as pautas das discussões dos projetos governamentais, sobretudo com a Criação do Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate a Fome- MESA, que logo depois foi substituído pelo Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome- MDS bem como de seu expoente máximo: O programa Fome Zero que tem como objetivo promover a segurança alimentar e nutricional a todos os brasileiros. Suas políticas estruturais são voltadas para combater a fome e a pobreza, buscando o desenvolvimento local, bem como garantir fontes de renda e emprego. O MDS teve como prioridade universalizar os direitos humanos, contando com o apoio de outros ministérios, as três esferas do governo (federal, estadual e municipal), iniciativa privada, sociedade civil organizada e eclesiástica (BRASIL, 2004). O Programa Fome Zero desenvolveu seus trabalhos nos últimos dez anos através de ações e projetos assistencialistas, como a criação de restaurantes populares, cozinhas comunitárias, melhoria da merenda escolar, aquisição de alimentos da agricultura familiar, Bolsa Família e, de não menos importância, a implantação da Agricultura Urbana, através do desenvolvimento de hortas comunitárias (BRASIL, 2004). Experiências exitosas de produção de alimentos em espaços urbanos já são conhecidas e são referências de atuação tanto no âmbito nacional como internacional. Neste contexto destacam ações desenvolvidas tanto pelo poder público ao nível municipal e estadual como pela sociedade civil, muitas das quais tem marcos legais e institucionais que reforçam e contribuem para garantir a continuidade das ações. Por isso, a agricultura urbana no Brasil é uma realidade que se potencia a partir da política nacional de AUP promovida pelo MDS (LOVO; NUÑES, 2011). O Trabalho de Lovo e Nuñes (2011) contribui fortemente para as pesquisas da Agricultura Urbana, nesse os autores sistematizam a AU, e analisam os projetivos desenvolvidos nas áreas metropolitanas do Brasil através da política Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana promovida pelo MDS, sendo as principais ações: 2003: Criação do Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate a Fome- MESA, implantação de hortas comunitárias, 10 pomares, canteiros, criação de pequenos animais e implantação de unidades de processamentos de alimentos. 2004: Extinção do MESA e Criação do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome- MDS. 2005: houve a descentralização das práticas de desenvolvimento da AU, assim Estados, prefeituras e Organizações não Governamentais (ONGs) aderiram às parcerias de criação de estruturas e disponibilização de mão de obra capacitada para a construção de planos de trabalho para o desenvolvimento da AU. 2006: Mapeamento realizado no Brasil pela FAO, IPES e pela REDE identificaram mais de 600 iniciativas de AU desenvolvida em parceria com os governos locais e com a sociedade civil organizada. 2007: Neste ano houve o lançamento do Edital SESAN/MDS 01/2007 com o objetivo de apoiar os municípios nos projetos de desenvolvimento/ implantação e expansão das práticas da AU com o investimento de R$ 18.086.641,05. Ainda ente ano, o MDS promove o 1º Seminário Nacional de Agricultura Urbana, realizado em Brasília, apresentando os resultados das pesquisas de implantação e desenvolvimento da AU. 2008: Consolidado o trabalho da AU nas regiões metropolitanas. Nesse ano houve o lançamento de três editais destinados ao desenvolvimento da AU. 2009: Lançamento do Edital MDS/SESAN 12/2009. Este tinha como objetivo viabilizar a implantação de Feiras Populares em Regiões Metropolitanas (áreas já atendidas em outros editais, para a criação da AU). Tal iniciativa materializava os projetos de comercialização direta da Agricultura Familiar e Urbana, no âmbito do Programa Acesso à Alimentação (LOVO, NUÑES, 2011). Diante de tudo isso, é comum associarmos a prática da Agricultura Urbana à população carente que vive, sobretudo, nas áreas periféricas das cidades. No entanto, é comum encontrar no interior das cidades, e Regiões Metropolitanas áreas destinadas às práticas Agrícolas, cuja grande maioria é desenvolvida por grupos de pessoas vulneráveis como idosos, mulheres, jovens, deficientes físicos, dentre outros. Esses grupos encontram na Agricultura Urbana uma fonte de sustento e renda, mas, sobretudo, uma alternativa de inclusão social. Portanto, bem mais que fonte de renda e de alimentos, a AU gera qualidade de vida para a população envolvida, bem como independência de seu praticando, além de criar um ambiente urbano mais agradável. 11 Considerações Finais: As cidades nas últimas décadas estão passando por um profundo processo de mudança. As mudanças do campo (modernização da agricultura, inserção das influencias capitalistas, utilização de maquinários e técnicas de cultivos) contribuíram para o grande fluxo migratório campo-cidade, que resultou no aumento dos pobres urbanos. População esta que vivem as margens do sistema produtivo urbano, abaixo da linha da pobreza e da segurança alimentar. Para minimizar estes problemas inúmeras experiências com a Agricultura Urbana vêm sendo desenvolvida em diversos países. Geração de emprego e renda, fortalecimento da alimentação, preservação cultural, terapia ocupacional, aproveitamento de espaços, criação de ecossistema urbano, são algumas dos benéficos da implantação da AU. A declaração de Quito de 2000 foi de fundamental importância para a sistematização dos projetos e ações de acompanhamento. No Brasil as políticas de incentivo a AU surgem com o governo do ex Presidente Luis Inácio Lula da Silva através do Ministério de Desenvolvimento Social (não foi o intuito do trabalho discutir as políticas e aceitação do referido governo, mas ressaltar a evolução das políticas de incentivo ao desenvolvimento da AU). REFERÊNCIAS: AQUINO, Adriana Maria de.; ASSIS, Renato Linhares de. 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