Artigo de Atualidades Update Article Artículo de Actualidades Autonomia no cuidado com feridas Atualidades O CUIDADO DE PACIENTES COM FERIDAS E A CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA DO ENFERMEIRO CARING FOR PATIENTS WITH WOUNDS AND BUILDING NURSES’ AUTONOMY EL CUIDADO DE PACIENTES CON HERIDAS Y LA CONSTRUCCIÓN DE LA AUTONOMÍA DEL ENFERMERO Adriano Menis FerreiraI Mariluci Camargo Ferreira da Silva CandidoII Marco Antonio CandidoIII RESUMO: Trata-se de um estudo de reflexão que pretende analisar a legislação no que se refere ao exercício profissional de enfermagem no Brasil e discutir sobre a autonomia do enfermeiro no cuidar de pacientes com feridas. Para a compreensão adequada sobre o tema, discorreu-se sobre algumas definições de autonomia, os subsídios para a sua construção e a necessidade de uma atenção holística aos clientes com feridas. Constata-se a necessidade de atuação dos enfermeiros e de seus órgãos representativos a fim de criar uma legislação que defina sua abrangência e atribuições no que tange à sua autonomia no cuidado de feridas. Para isso, é necessária a fundamentação da assistência na vertente técnico-científica e ético-legal, além do estímulo e valorização da autonomia do cliente em relação ao seu tratamento. Palavras-Chave: Cicatrização de feridas; autonomia profissional; legislação de enfermagem; cuidados de enfermagem. ABSTRACT: This study reflected on the body of laws regarding the nursing profession in Brazil and discussed nurses’ autonomy in caring for patients with wounds. In the endeavor to understand the subject properly, it discusses definitions of autonomy, how to support efforts to build it, and the need for holistic care for clients with wounds. It was found that nurses and their representative bodies should work actively for legislation that defines their scope and attributions as regards their autonomy in caring for patients with wounds. For that purpose, it is necessary for care to be grounded on technical-scientific and ethical-legal bases, in addition to encouraging and valuing clients’ autonomy over their treatment. Keywords: Wound healing; professional autonomy; legislation, nursing; nursing care. RESUMEN: Este estudio de reflexión tuvo como objetivo analizar la legislación referente al ejercicio profesional de enfermería en Brasil y discutir sobre la autonomía del enfermero en el cuidar de pacientes con heridas. Para proveer una adecuada comprensión sobre el tema, fueron incluidas definiciones de autonomía, consideraciones sobre los soportes para su construcción y la necesidad de una atención holística a los clientes con heridas. Fue constatada la necesidad de actuación de los enfermeros y de sus órganos representativos para crear una legislación que defina su alcance y atribuciones, en lo que se refiere a su autonomía en el cuidado de heridas. Para eso, es necesaria la fundamentación de la atención en la vertiente técnico-científica y ético-legal, además del estímulo y valoración de la autonomía del cliente en relación a su tratamiento. Palabras Clave: Cicatrización de heridas; autonomía profesional; legislación de enfermería; cuidados de enfermería. INTRODUÇÃO A enfermagem, no decorrer dos anos, vem conquistando muitos espaços na área de saúde, cada vez mais trazendo para si novas atividades, assumindo novos cargos, enfim, muito mais responsabilidade do que nos seus primórdios. Contudo, ao mesmo tempo em que isso traz orgulho para os profissionais, também os expõem a maiores riscos e responsabilidades no âmbito jurídico1. O trabalho de enfermagem tornou-se mais técnico e mais especializado e o enfermeiro passou a ter maior destaque como membro da equipe multidisciplinar, com seu próprio corpo de conhecimentos para a prestação de cuidados ao cliente2. I Pós-Doutor em Enfermagem. Professor do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, Campus Três Lagoas. Mato Grosso do Sul, Brasil. E-mail: [email protected]. II Doutora em Enfermagem Psiquiátrica pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Professora do Departamento de Enfermagem e acadêmica do Curso de Direito da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, Campus Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, Brasil. E-mail: [email protected]. III Advogado. Especialista em Direito Processual. p.656 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2010 out/dez; 18(4):656-60. Recebido em: 01/07/09 – Aprovado em: 23/06/10 Artigo de Atualidades Update Article Artículo de Actualidades Na história do tratamento de feridas, desde os tempos antigos, observa-se grande preocupação do homem em manter sua saúde, sua integridade física. Com os avanços tecnológicos, na área do cuidado aos portadores de feridas, obteve-se uma ascensão quanto aos produtos e métodos utilizados. Quanto à enfermagem, surgiu a necessidade da busca por um melhor preparo técnico-científico condizente com as novas tendências e perspectivas3. A autonomia profissional em enfermagem nunca foi tão valorizada como atualmente, em parte decorrente da ascensão das funções do enfermeiro e a atuação especializada desse profissional, particularmente no tratamento de feridas. Os enfermeiros não estão apenas se responsabilizando por atividades antes realizadas pela equipe médica, mas também negociando e redefinindo o que de fato é de sua competência e assim tomando decisões independentes4. A autonomia é um termo derivado do grego autos (próprio) e nómos (lei, regra, norma) e se refere ao poder da pessoa de tomar decisões que afetem sua vida, sua saúde e seu bem-estar, mediante valores, crenças, expectativas e prioridades de forma livre e esclarecida entre as alternativas apresentadas. É compreendida como liberdade, independência e bom senso que permite ao profissional tomar decisões e cumprir tarefas a fim de alcançar melhores resultados no trabalho5,6. Autonomia também pode ser definida como a faculdade que tem o enfermeiro de autodeterminarse dentro da equipe de saúde, no exercício legal de suas atribuições profissionais de acordo com o sistema de saúde vigente de um país, uma região ou comunidade 7. Possuir autonomia profissional significa conquistar seu espaço pelo conhecimento e desenvolvimento profissional, ter segurança em si mesmo. A autonomia é vista como uma condição motivadora que torna o profissional mais satisfeito e com maior rendimento em suas atividades, embora ela possa ser entendida como um processo não completamente estabelecido7. A violação desse princípio pode afetar negativamente e comprometer um trabalho de qualidade entre usuários, profissionais e instituições de saúde6. Entretanto, é necessário compreender que cuidar de pacientes com feridas não depende apenas de uma categoria profissional, e dessa forma, para prestar um excelente cuidado a clientes portadores de feridas, é necessária uma assistência interdisciplinar, mas, sem dúvida, essa é uma atribuição desenvolvida pela enfermagem em sua prática diária, sem, contudo, desconsiderar a isonomia dos outros profissionais de saúde. Pelos motivos expostos, este estudo tem por objetivo analisar a legislação no que se refere ao exercício profissional de enfermagem no Brasil e discutir sobre a autonomia do enfermeiro no cuidar de pacientes com feridas. Recebido em: 01/07/09 – Aprovado em: 23/06/10 Ferreira AM, Candido MCFS, Candido MA A LEGISLAÇÃO E O EXERCÍCIO PROFISSIONAL Entre as grandes evoluções da legislação destaca-se o crescimento da consciência sobre os direitos dos profissionais no que diz respeito, em especial, para fins de estudo neste artigo, a autonomia profissional. O exercício do profissional deve sujeitar-se a regras preestabelecidas, voltadas à promoção, à proteção e à garantia dos direitos dos usuários dos serviços de saúde. A Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade de exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer8. Tal dispositivo, que consagra liberdade de profissão, tem previsão no Art. 5o, inciso XIII, o qual contém uma norma de eficácia contida, onde a liberdade do exercício de qualquer profissão é integral, até que sobrevenha legislação regulamentadora9. Para iniciar a análise sobre a autonomia do profissional de enfermagem que permeia diversos termos da área jurídica, faz-se importante a conceituação de alguns desses principais termos. Entende-se por legislação a totalidade das leis que vigoram em um país, ou seja, um conjunto de normas jurídicas sobre uma matéria10,11. Cabe ressaltar que Deliberação são atos originados de órgãos colegiados, tais como comissões, tribunais administrativos, conselhos, entre outros, representando a vontade majoritária de seus componentes, significa resolução ou decisão e, embora não seja lei, tem valor de tal. Já Parecer é a opinião técnica sobre determinado assunto, o ato pelo qual os órgãos consultivos emitem opinião que podem ser obrigatória, facultativa e vinculante, sendo assuntos técnicos ou jurídicos dentro de sua órbita de competência10. Na prática profissional, o enfermeiro comumente se depara com questões referentes ao tratamento de pacientes com feridas, tais como: Como agir com autonomia na escolha do melhor método terapêutico quando não há protocolos e normas que dão suporte à atuação do enfermeiro? Como ser autônomo respeitando os princípios éticos e legais no cuidar do cliente com feridas? O enfermeiro detém os requisitos para consolidar sua autonomia profissional: responsabilidade, conhecimento e conquista? A AUTONOMIA E O CUIDADO DE FERIDAS O enfermeiro deve ter em mente que, ao se discutir autonomia no cuidado a pacientes com feridas, não estamos apenas nos referindo a sua capacidade e direito de escolher uma terapêutica tópica, mas depreender esforços e o compromisso de atender suas necessidades na perspectiva global do cuidado desde sua avaliação ao acompanhamento da ferida. Ter o direito de selecionar um curativo/cobertura seria visto como um aspecto da autonomia, ou liberdade Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2010 out/dez; 18(4):656-60. • p.657 Autonomia no cuidado com feridas de ação profissional pelo enfermeiro. No entanto, não se pode esquecer que autonomia não é liberdade total, mas sim liberdade de agir dentro de limites da competência, os quais, por sua vez, estão confinados pelas fronteiras do conhecimento. Assim, os enfermeiros não deveriam buscar tal autonomia, a menos que tenham conhecimento e competência suficiente para a atividade em questão. A autonomia profissional deve ser encorajada somente se o enfermeiro for tecnicamente competente e com habilidades de alto padrão ao que se propõe a realizar. Dessa maneira, autonomia e independência nas atividades práticas estão diretamente ligadas ao conhecimento que possui e reconhecimento de suas limitações e consequentemente na sua competência clínica. Destaca-se que competência não se restringe à demonstração de habilidades. Competência é a aplicação de habilidades em um contexto situacional que inclui avaliação, diagnóstico diferencial, desenvolvimento e aplicação de um plano de cuidados e sua consequente avaliação e evolução4. Em outras palavras, a competência profissional, no cuidado com feridas, será plena com a aplicação da Sistematização da Assistência de Enfermagem. A experiência do cotidiano assistencial serve para construir a profissão e a autonomia do enfermeiro no cuidado de feridas, pois cuidar de pacientes com feridas não se caracteriza como uma ciência adquirida apenas com conhecimentos teóricos assimilados em cursos, leituras ou aprimoramentos em nível de pós-graduação. O enfermeiro trabalha com outros profissionais e organizações num espírito de cooperação e colaboração. No entanto, quando se trata de tomar decisões especificamente no tratamento de feridas, são inevitáveis os conflitos. O que se deve ter em mente é que as profissões se complementam e que uma disciplina respeite a outra a fim de objetivar um bem maior, qual seja, a recuperação do indivíduo. Reconhecemos que todos nós temos valores e pontos de vista pessoais que necessitam ser clarificados para não criar situação de impasse que gera ressentimentos e desrespeito, dificultando a confiança entre os profissionais e a expressão de suas autonomias. Estabelecer a negociação dentro da assistência no hospital requer conhecimentos, habilidades de comunicação, escuta ativa, mapeamento de situação, análise de diretivas, espaço para compartilhar, confiança, liberdade de expressão, autoconfiança, trabalho cooperativo e abertura para acordos12. A liberdade de autonomia tem dependência entre a estrutura organizacional e o profissional, sendo que a organização permitirá o exercício da autonomia, estabelecendo limites; em relação ao profissional, dependerá exclusivamente deste querer tomar decisões desde que sejam apropriadas. Para que a autonomia do profissional seja legitimada, é necessário que esta garanta uma prestação de contas àquele para quem uma determinada ação foi realizada13. p.658 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2010 out/dez; 18(4):656-60. Artigo de Atualidades Update Article Artículo de Actualidades O trabalho da enfermagem guarda certo condicionamento à prescrição de outra categoria profissional, trazendo uma crise de identidade profissional, tornando urgente a construção de novos conhecimentos que configurem independência e autonomia12. Especificamente no ambiente hospitalar, a hegemonia do trabalho médico faz-se ainda presente. Porém, devemos assumir o processo de cuidar e do cuidado com autonomia, pois, apesar do fato de que em alguns aspectos mantém-se uma relação de interdependência com o trabalho médico, em muitos outros aspectos as ações são independentes. Não se discute aqui a autonomia de outros profissionais quanto ao ato de tratar paciente com feridas, nem tampouco a defesa de intervir na prescrição desses, mas sim, a busca de respaldo legal quanto à autonomia do enfermeiro no tratamento de feridas e a recusa de executar atividades prescritas por outros profissionais da equipe de saúde que julgue trazer algum prejuízo ao paciente portador de feridas. Ademais, o profissional de saúde, responsável pela prescrição, assume toda a responsabilidade pela avaliação do cliente, usualmente fazendo um diagnóstico diferencial dentro de uma série de possibilidades sugeridas pelos sinais e sintomas, e indica o produto tópico e tratamento adequados, efetuando a prescrição1. Diante do supracitado, podemos citar uma situação que ocorre frequentemente na prática clínica. Em certas ocasiões não é incomum o profissional de enfermagem constatar em uma prescrição médica que realize determinado curativo com determinado produto, que à luz dos conhecimentos atuais não se justifica para o bom curso da cicatrização de uma ferida. Nesse caso, o enfermeiro, respaldado em sua Lei do Exercício Profissional, deve estabelecer um relacionamento com esse profissional médico e discutir a possibilidade de mudança de conduta para atender às reais necessidades do paciente. Caso esse profissional não queira mudar a conduta, cabe ao enfermeiro esclarecer que sua equipe não realizará o curativo e que o fato será registrado no prontuário argumentando tal decisão. Outra situação comumente encontrada na prescrição médica é apenas a indicação para realização de curativo, sem qualquer referência à forma de limpeza, terapia tópica e cuidados gerais com a ferida e o paciente. Neste caso fica a critério do enfermeiro avaliar e selecionar as melhores condutas para realização do curativo. É fato que em vários países enfermeiros executam a prescrição de medicamentos de uma forma geral, sendo esta atividade avaliada por órgãos governamentais como positiva, comprovando que houve melhora do nível da assistência, da comunicação e do acesso a clientes, a partir da assunção dessa prática profissional pelo enfermeiro14. Diante da busca de autonomia profissional podemos nos respaldar na Lei do Exercício Profissional, pois é Recebido em: 01/07/09 – Aprovado em: 23/06/10 Artigo de Atualidades Update Article Artículo de Actualidades um instrumento determinante na busca de maior espaço para as tomadas de decisão por parte do enfermeiro. Ela regula em seus artigos as atividades a serem exercidas de forma privativa por esse profissional. Com esse instrumento de poder, as ações tomadas pelo enfermeiro são seguramente validadas e apoiam sua autonomia. Certamente que a regulamentação do exercício profissional traz ao enfermeiro a possibilidade de uma autonomia profissional já que especifica suas atividades privativas12. Conforme a Resolução COFEn no 311/2007, que versa sobre o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, no capítulo 1, Art. 1o, o enfermeiro deve exercer a profissão com liberdade, autonomia e ser tratado segundo os pressupostos e princípios legais, éticos e dos direitos humanos. Já o Art. 6o da mesma diz que o enfermeiro deve “fundamentar suas relações no direito, na prudência, no respeito, na solidariedade e na diversidade de opinião e posição ideológica”. É dessa maneira que sua prática deve ser consolidada15. O capítulo II do Código de Ética15 preceitua que “a assistência de enfermagem deve ser realizada livre de danos decorrentes da imperícia, negligência ou imprudência”(Art.16); o profissional deve manter-se atualizado (Art.18) e principalmente responsabilizarse pela falta cometida em suas atividades, seja individual ou em equipe (Art.20). E cabe ao enfermeiro supervisionar a equipe a fim de manter a integridade física do cliente, atuando como defensor de seus direitos. É competência do enfermeiro, conforme a Lei do Exercício Profissional no Artigo II, inciso I, letra c: “Planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços de assistência de Enfermagem”. Assim, a inobservância do dever de cuidar acontece pela negligência, imperícia e imprudência, que não são consideradas elementos da culpa, mas sim a exteriorização da conduta culposa16. De acordo com o Código de Ética15, capítulo I, Art. 10, é direito do enfermeiro: “recusar-se a executar atividades que não sejam de sua competência técnica, científica, ética e legal ou que não ofereçam segurança ao profissional, à pessoa, família e coletividade” e Art.36 “participar da prática multiprofissional e interdisciplinar com responsabilidade, autonomia e liberdade”. Podemos citar como responsabilidades e deveres os Artigos 5o, 13 e 15, respectivamente: Exercer a profissão com justiça, compromisso, equidade, resolutividade, dignidade, competência, responsabilidade, honestidade e lealdade; Avaliar criteriosamente sua competência técnica, científica, ética e legal e somente aceitar encargos ou atribuições, quando capaz de desempenho seguro para si e para outrem; Prestar assistência de enfermagem sem discriminação de qualquer natureza. Entre as atribuições do enfermeiro, observa-se que, em relação ao tratamento de lesões de pele, o profissio- Recebido em: 01/07/09 – Aprovado em: 23/06/10 Ferreira AM, Candido MCFS, Candido MA nal como executor ou supervisor dos cuidados baseia-se em conhecimentos obtidos no decorrer de sua formação e durante sua incessante busca por atualização. Entretanto, nem sempre este fato assegura ao profissional a tomada de decisão, e, neste sentido, um instrumento de apoio a que o profissional pode recorrer é a legislação da classe. No entanto, estudo demonstra a escassez de legislação sobre o tema17. Na busca de preencher esta lacuna, algumas instituições oferecem ao profissional o suporte para a atuação através de protocolos, normas e rotinas, mas ainda não é o suficiente para objetivar, otimizar e padronizar esse procedimento. A ação de avaliar e tratar feridas é um papel fundamental para a maioria dos enfermeiros. Não se restringe apenas à execução da técnica de curativos, caracterizando-se somente como uma tarefa mecânica a ser executada em complacência rígida com a prescrição médica. Dessa maneira, o cuidado com feridas exige que o profissional de enfermagem detenha conhecimentos técnico-científicos, além de discernimento para o exercício de juízo profissional. Diante disto, a autonomia se estende ou se limita em tamanho variável de acordo com a competência do profissional e que este só dispõe de autonomia quando possui o poder de controlar o seu próprio trabalho, e decorrente deste controle é que se pode ser responsável pelas ações que desencadeia18-19. Constata-se que as legislações (leis, pareceres, deliberações, resoluções e decretos) são ferramentas primordiais e essenciais para o profissional enfermeiro implementar sua autonomia e buscar subsídios para a sua prática com todo respaldo ético-legal, dispondo ao cliente portador de feridas qualidade e segurança. Cabe aos órgãos de classe legislar sobre temas pertinentes à prática profissional que permeiam diariamente as atividades dos profissionais. A esse respeito urge a necessidade de legislação específica que verse sobre a autonomia do enfermeiro no tratamento de feridas. CONSIDERAÇÕES FINAIS O profissional enfermeiro deve atentar não apenas para a lesão em si, mas ter a sensibilidade para planejar holisticamente o cuidado de modo a contemplar o ser humano em sua plenitude. É possível concluir que, para o enfermeiro prestar uma assistência autônoma, é preciso objetivar, otimizar e padronizar os procedimentos de prevenção e tratamento de feridas. Isso deve ser feito perante protocolos técnicos que garantam respaldo legal, técnico e científico ao profissional, a fim de melhorar a assistência ao portador de feridas. O enfermeiro, como profissional integrante da equipe de saúde, possui respaldo ético-legal para intervir, junto ao paciente/cliente, com feridas, da avaliação até a prescrição de terapêuticas tópicas, porém dentro dos limites que a própria Lei do Exercício Profissional de Enferma- Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2010 out/dez; 18(4):656-60. • p.659 Autonomia no cuidado com feridas gem (Lei no 7.498/1986) impõe, bem como as normalizações do Ministério da Saúde e as Resoluções do COFEn e os Pareceres dos Conselhos Regionais de Enfermagem (COREns) que orientam em relação a essa atividade. REFERÊNCIAS 1.Sobrinho VG, Carvalho EC. Uma visão jurídica do exercício profissional da equipe de enfermagem. Rev enferm UERJ. 2004; 12:102-8. 2.Oguisso T, Freitas GF. Enfermeiros prescrevendo medicamentos: possibilidades e perspectivas. Rev Bras Enferm. 2007; 60(2):141-4. 3.Declair VPS. Novas considerações no tratamento de feridas. Rev Paul Enfermagem.1998; 17(1/3):25-38. 4.Benbow M. 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