“A qualidade de vida das famílias com crianças e jovens com perturbações do espectro do autismo em Portugal: diagnóstico e impactos sociais e económicos” Contexto e objetivos estratégicos A evidência científica confirma atualmente que as perturbações do espectro do autismo (PEA) são perturbações globais e para toda a vida, que afetam o desenvolvimento do cérebro e são visíveis a partir da infância. A PEA é caracterizada por uma tríade de sintomas: dificuldades em interações sociais, dificuldades na comunicação, interesses restritos e comportamento repetitivo. As manifestações de PEA cobrem um largo espectro e a condição pode afetar indivíduos com graves dificuldades intelectuais assim como os de QI médio ou acima da média (Documento de posição de Autism-Europe, AISBL, da International Association of Child and Adolescent Psychiatry and Allied Profession (IACAPAP) e da European Society for Child and Adolescent Psychiatry (ESCAP), Oslo, 2007). Em Portugal, é atualmente consensual que existe um défice de conhecimento científico na área da deficiência, facto que também poderá ser explicado pela inexistência de centros de investigação especializados nesta área, existindo apenas iniciativas pontuais. Por seu turno, este contexto tem gerado fraco reconhecimento, pelas diferentes instâncias oficiais e outras, da necessidade de construir ou desenhar respostas específicas para o autismo1, ainda que estas possam ser inseridas num leque de respostas mais abrangente, no qual as respostas para a deficiência sejam tratadas com base no princípio da discriminação positiva, numa política de mainstreaming. A aplicação do conceito multidimensional de qualidade de vida e os resultados decorrentes do inquérito aplicado às famílias no âmbito do presente Estudo, permitirão aferir um conjunto de dados que refletem, pela primeira vez e de forma sistematizada, as necessidades e percepções 1 De facto, não existem dados concretos sobre as necessidades das pessoas com autismo e de suas famílias em Portugal, embora existam evidências empíricas que estas não estão atendidas, dadas as diversas situações detetadas nas associadas da FPDA (APPDA’s), resultantes das escassas respostas sociais e educativas para várias faixas etárias da população (ver longas listas de espera em situações residenciais, centros de atividades ocupacionais e outros). Por outro lado, não existem estudos epidemiológicos a nível nacional. Segundo o estudo de Guiomar Oliveira (Universidade de Coimbra), realizado em 2007, a prevalência das PEA em Portugal era de cerca de 1/1000, mais concretamente de 9.2/10.000, sendo a prevalência na Região de Lisboa e Vale do Tejo um pouco superior (12.3/10.000) à média nacional. Pode assim concluir-se que o fenómeno assume uma grande relevância social, não só pela intensidade dos problemas sentidos pelas pessoas e suas famílias, como também pela dimensão desta deficiência no quadro nacional. das famílias relativamente a um conjunto extenso de dimensões de análise de ordem objectiva e subjectiva, tais como: custos económicos e sociais acrescidos para as famílias, quantificando os primeiros e estimando o impacto dos segundos ao nível profissional; participação nos diversos domínios da vida social; saúde física e psicológica dos membros do agregado; qualidade das relações sociais e conjugais; realização pessoal, entre outros factores de bem-estar inerentes a esse mesmo conceito. Para além de uma análise dos impactos, este Estudo compreende também uma análise complementar sobre a trajectória das crianças/jovens com PEA através das respostas e dos recursos existentes no território nacional, em paralelo com avaliações subjectivas dos familiares sobre essas mesmas respostas do ponto de vista da sua qualidade. Este conjunto de resultados quantitativos permitirá, por outro lado, validar os principais indicadores a ser utilizados para se medir a qualidade de vida de famílias com crianças e jovens com PEA. A conceção desse quadro objectivo de indicadores tem como principais destinatários diferentes actores das políticas públicas e dos serviços responsáveis pelas pessoas com deficiência, no sentido destes poderem ter instrumentos de suporte objectivo para que possam de forma mais eficaz ajustar as respostas e os recursos às reais necessidades das pessoas, em função daquilo que são as coordenadas de vários conceitos conjugados neste tipo de políticas, igualdade de oportunidades e qualidade de vida. Objetivos operacionais Tendo presente os elementos de fundamentação enunciados, o seu objetivo geral e o enquadramento lógico, formula-se o seguinte conjunto de objetivos específicos para o Estudo: Aferir o impacto das PEA na qualidade de vida das famílias das crianças/jovens com PEA, numa perspectiva multidimensional; Conhecer o “estado da arte” do apoio público e privado (solidário e lucrativo), identificando os pontos fortes e os aspectos a melhorar sector a sector; Avaliar os custos económicos e sociais das PEA para as criança/jovens e suas famílias, através de indicadores de qualidade de vida a construir para o efeito; Identificar as principais necessidades das crianças/jovens e suas famílias e as possíveis soluções e caminhos que permitam rentabilizar as sinergias e as dinâmicas das instituições e das políticas sociais; Conceber um Dispositivo de avaliação da Qualidade de Vida das Famílias com Crianças/Jovens com Perturbações do Espectro do Autismo com dimensão nacional; Consolidar cientificamente a metodologia, Dispositivo e respectivos instrumentos de recolha e análise de informação, potenciando a sua utilização em âmbitos territoriais e em contextos de intervenção distintos; Conceber recomendações/propostas que potenciem o desenvolvimento humano e social (qualidade de vida) das crianças e jovens com PEA e das suas famílias e envolver proactivamente todos os agentes institucionais e particulares que possam contribuir para potenciar essa mudança. Estratégia metodológica O Estudo é desenvolvido em coordenação científica e técnica partilhada entre o IESE e a FPDA e contempla uma abordagem metodológica integrada (multi-etápica e multi-método). Esta abordagem contempla um conjunto de elementos entre os quais se destacam componentes cruzadas de metodologias quantitativas e qualitativas com inspiração nas metodologias participativas (privilegiando o recurso a diferentes fontes de informação e o envolvimento de técnicos diversos e familiares com crianças e jovens com PEA no desenvolvimento do Estudo).