SOCIEDADE BRASILEIRA DE ESTUDOS INTERDISCIPLINARES DA
COMUNICAÇÃO
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
X Simpósio de Pesquisa em Comunicação da Região Sudeste - SIPEC
Rio de janeiro, 7 e 8 de dezembro de 2004
Novas tecnologias e interatividade
Uma análise da participação do espectador com a convergência da TV e Internet
Larriza Thurler
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Resumo
A atual relação que temos com a informação e a crescente participação da Internet no nosso dia-adia contribuíram para o fenômeno da convergência das mídias. Isto não significa o fim dos meios de
comunicação tradicionais, pois estamos observando, entre outros, um processo de reorganização do modo
de produção e distribuição da informação para tornar o conteúdo das antigas mídias mais atraente e
interativo.
O presente trabalho pretende investigar este fenômeno da convergência das mídias, analisando, em
especial, se a convergência da televisão com a Internet contribui para o aumento da interatividade. Para
tal, pretende-se inicialmente definir os conceitos de interatividade – termo que vem sendo usado
indiscriminadamente como estratégia de marketing.
A partir da análise de casos específicos – um telejornal de uma TV on-line (Jornal Interativo, da
AllTV) e um telejornal de uma TV aberta (Jornal da Globo, da Rede Globo), o objetivo deste artigo é
discutir em que medida a convergência gera mais atividade dos espectadores.
Palavras-chave : Interatividade, convergência, TV e Internet.
Introdução
O interesse pela interatividade não é recente e tampouco é exclusivo das novas tecnologias
digitais. Antes mesmo do e-mail, os leitores podiam expressar suas opiniões e dar sugestões através da
sessão de cartas de jornais e revistas. O rádio associou a participação do público com o imediatismo e,
através do telefone, o ouvinte poderia participar ao vivo das transmissões radiofônicas, pedindo músicas,
dando sugestões de pautas, opinando em pesquisas, concorrendo a prêmios e questionando em debates.
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Em alguns programas de televisão, era possível a participação dos próprios telespectadores no estúdio ou
o contato podia se dar através de telefone ou cartas.
No entanto, o que observamos atualmente é que a interatividade é vista como algo novo e tudo
passa a ser vendido como interativo: TV, jogos, rádio, entre outros. Alex Primo, em seus estudos sobre
interatividade, já alertava para o fato de que as palavras interatividade e interativo vêm sendo usadas de
forma muito imprecisa, servindo algumas vezes como slogan de venda para os mais diversos produtos
industrializados. (2001:117)
Não podemos negar que com o advento da Internet a interatividade se potencializou – o que
explica o excesso de otimismo em relação ao tema. O imediatismo e a comunicação em rede permitem
que esta troca de informações seja feita com um número maior de pessoas e de maneira mais rápida.
Desta forma, os leitores passaram a se comunicar com os jornalistas através de e-mails e podem
também conversar com os colunistas de jornais e revistas através dos seus blogs disponíveis na Internet.
O rádio ultrapassou seus limites de alcance ao migrar para a rede e, em qualquer lugar do mundo, o
ouvinte com acesso à Internet pode participar da programação de uma rádio on-line através de e-mails. A
maioria das emissoras de TV tem sites, sendo que algumas disponibilizam vídeos on demand da
programação como uma nova alternativa de distribuição de seu conteúdo, que podem ser assistidos no
horário que o internauta quiser, além de links com informações adicionais e chats com alguém
relacionado ao tema exposto na TV.
Para entendermos melhor este fenômeno da interatividade e traçar perspectivas quanto ao seu uso –
especificamente no caso da convergência da TV com a Internet – é necessário fazer uma revisão do
conceito de interatividade a partir de estudos de alguns teóricos da comunicação já realizados sobre o
tema. Baseados nestes conceitos, serão analisados dois programas de televisão – um de uma TV aberta e
outro de uma TV on-line.
Conforme analisa Lorenzo Vilches, a entidade-chave na migração digital é a interatividade.
(2003:23) Assim, pretende-se analisar como estes casos usaram maneiras de convergir a televisão e a
Internet e discutir em que medida a convergência é capaz de contribuir para uma interatividade real, com
a participação efetiva dos espectadores.
Interatividade na era digital
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André Lemos, em seu artigo “Anjos interativos e retribalização do mundo”1, mostra a evolução
das interfaces e das formas de interatividade com a entrada em jogo da tecnologia digital. Segundo o
autor, a interação homem-técnica é uma atividade tecno-social presente em todas as etapas da civilização,
seja esta interatividade social (homem-homem) ou interatividade técnica do tipo "analógico-eletromecânica", que experimentamos ao dirigir um automóvel. No entanto, o que vem se chamando de
interatividade (“eletrônico-digital”) está diretamente ligado aos novos media digitais, podendo ser
compreendida como um “diálogo entre homens e máquinas (baseadas no princípio da micro-eletrônica),
através de uma ‘zona de contato’ chamada de ‘interfaces gráficas’, em tempo real”. (on-line)
Como o foco deste trabalho é a questão da interatividade associada ao fenômeno da convergência
de mídias, nos deteremos aos conceitos de interatividade relacionados aos novos media digitais. Além de
possibilitar o sistema de comunicação ponto a ponto (“um-um”), com o email, e o “um-muitos”, com a
leitura de jornais on-line (Johnson, 2001:81), a Internet instaurou um novo ambiente comunicacional
(“muitos-muitos”). Neste último, todos podem ser receptores e emissores, já que a audiência tem a
possibilidade de não só consumir passivamente a notícia como também participar ativamente e produzir
suas próprias informações nas redes de comunicação.
Neste sentido, analisaremos como alguns autores vêem positivamente as mudanças proporcionadas
pelas tecnologias eletrônico-digitais no status de quem recebe e emite as mensagens dos meios de
comunicação, para assim avaliarmos como a interatividade contribui para mudar de forma fundamental o
caráter da comunicação.
Marie Marchand (citada em Marco Silva, on-line) acredita que com a interatividade, o emissor, a
mensagem e o receptor mudam respectivamente de papel, de natureza e de status, visto que a mensagem
só toma significado sob a intervenção do receptor, podendo ter seu conteúdo manipulado.
Arlindo Machado compreende a interatividade como um processo bidirecional, onde emissor e
receptor são intercambiáveis e dialogam entre si durante a construção da mensagem, implicando em
posições relativas de um "autor" e de um "usuário". (1990:208)
Em seu livro “Migração digital”, Lorenzo Vilches estuda a interatividade como passagem da
mediação para a criação. De acordo com o autor, os usuários convertem-se de objetos de manipulação
para sujeitos que manipulam. (2003:234)
Manuel Castells vê os consumidores da Internet como produtores, que fornecem conteúdo e dão
forma à teia. (1999:439) Para Pierre Lévy, cada pessoa pode se tornar emissora no espaço cibernético, que
é a emergência de uma inteligência coletiva, e propõe que o termo consumidor seja substituído por outros
1
Disponível em http://www.facom.ufba.br/pesq/cyber/lemos/interac.html . Acesso em 25/08/2004.
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que se enquadrem melhor a esta situação de interatividade, como co-produtor do produto e/ou serviço
interativo. (1996:63) Segundo ele, o ciberespaço passa a ser considerado como
“prática de comunicação interativa, recíproca, comunitária e intercomunitária, (...)
horizonte de mundo virtual vivo, heterogêneo e intotalizável no qual cada ser humano pode
participar e contribuir. Qualquer tentativa para reduzir o novo dispositivo de comunicação
às formas midiáticas anteriores (esquema de difusão “um-todos” de um centro emissor em
direção a uma periferia receptora) só pode empobrecer o alcance do ciberespaço para a
evolução da civilização (...)” (1999:126)
Outro autor que explora a questão da interatividade é Alex Primo, mas ele recusa a valorização do
chamado “emissor” ou “receptor”. Sua proposta de estudo tem como foco principal o interagente humano
e, por considerar o termo “interatividade” muito difuso, traz as definições de interação reativa ou mútua.
De acordo com seus estudos, a interação mútua seria caracterizada por “relações interdependentes e
processos de negociação, na qual cada interagente participa da construção inventiva da interação,
afetando-se mutuamente. Já a interação reativa é linear, limitada por relações determinísticas de estímulo
e resposta”. (2001:118)
Segundo suas definições, a interação mútua forma um todo global, sendo composto por
componentes interdependentes. O sistema é aberto, não-linear e quando um componente é afetado, o
sistema total se modifica. Um exemplo deste tipo de interação é a interação mantida por diversas pessoas
nos chats ou salas de bate-papo de uma TV na Internet, de maneira que as interações que ocorrem não são
rigidamente predeterminadas e apresentam um alto grau de flexibilidade e indeterminação. (2001:138)
A interação reativa está inserida em um sistema fechado, com relações unilaterais e lineares
previamente estabelecidas (algumas permitidas, outras limitadas ou impossibilitadas). Quando um
internauta escolhe sua programação dentro das opções oferecidas por uma grade de programas, “a
interação [se] estabelece como reativa, pois deve ocorrer nas cadeias seqüenciais de causa e efeito para as
quais tal máquina foi preparada”. (2001:139)
Outros autores também vão determinar graus de interatividade. Luciana Mielniczuk distingue
reatividade de interatividade (2001:175). Para ela, a reatividade estaria ligada à idéia de registrar a
audiência através de um menu de opções, enquanto a interatividade implicaria uma resposta genuína dos
membros da audiência.
Maira Moraes sugere a existência de três níveis de interação. No nível um, os produtos
“interativos” oferecem apenas a possibilidade de entrar em contato com o fabricante ou responsável por
meio de e-mails, telefone ou fax, ou seja, apresenta níveis baixíssimos de interatividade e de utilização
dos recursos de multimídia. No segundo nível, é possível que haja a personalização do produto e/ou a
utilização de recursos multimídia, no caso da Web ou de produtos eletrônico-digitais. Já o nível três
possibilita a inserção de informação e interferência em seu conteúdo, com a participação ativa na
construção do produto final. Os níveis um e dois se enquadrariam no conceito de reatividade, enquanto o
nível três constituiria a interatividade mútua.
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Sobre a evolução da interação técnica da televisão, André Lemos classifica a interatividade deste
aparelho em níveis. Num primeiro momento, o qual o autor chama de interação “nível 0”, a TV é em
preto e branco, com um ou dois canais, sendo o telespectador limitado a ligar ou desligar o aparelho,
mudar de canal ou regular o volume.
O “nível 1” surge com a TV em cores e outras opções de emissoras. Assim, o telespectador pode
navegar pelos canais e “zappear” com o controle remoto – sendo o “zapping um antecessor da navegação
contemporânea na rede”.
No “nível 2” há o acoplamento de equipamentos à TV, como vídeo, videogames ou câmeras,
“fazendo com que o telespectador se aproprie do objeto TV (para outros fins, como ver vídeos ou jogar) e
das emissões (gravar e assistir ao programa na hora que quiser), instituindo uma temporalidade própria e
independente do fluxo das mesmas.”
A interatividade de cunho digital começa a surgir no “nível 3”, podendo o usuário interferir no
conteúdo das emissões através do telefone, e-mail ou fax. A participação do conteúdo informativo das
emissões em tempo real surge com a televisão interativa, no “nível 4”.
Os conceitos de interatividade e seus graus serão aplicados a seguir a dois programas de televisão:
Jornal Interativo, do site AllTV, e Jornal da Globo, da Rede Globo, para que seja avaliado como a
convergência contribui para uma maior participação do telespectador/internauta. A escolha destes
programas obedeceu aos seguintes critérios de relevância:
•A AllTV (www.alltv.com.br) foi o primeiro canal brasileiro 24 horas ao vivo na Internet. Inaugurado
em 12 de maio de 2002, o canal fez o caminho inverso da maioria das emissoras de TV, começando
na Internet e migrando posteriormente para a TV a cabo. Os seus programas foram concebidos com
uma linguagem web, em um formato de interatividade permanente. Os telenautas2 (mistura de
telespectadores com internautas) podem participar ao vivo com comentários e opiniões e interagir
também com pessoas que estejam conectadas ao site assistindo ao mesmo programa, através de uma
tela de chat. O programa Jornal Interativo aborda e discute temas atuais, desde política nacional,
internacional, economia, passando por esporte, curiosidades e cultura. Ele vai ao ar de segunda a
sexta, ao vivo das 18 às 20 horas, estando disponível também on-demand, para que o telenauta possa
assistir no horário que escolher.
•A Rede Globo desenvolveu o Globo Media Center (www.globo.com), com o slogan “A sua TV
interativa na Internet”, disponibilizando para seus assinantes o canal Globo News ao vivo e vídeos ondemand com a programação da Rede Globo e da Globosat. Na Internet, o telenauta pode montar a
“TV com a sua cara”, escolhendo a seqüência de vídeos que quiser dentre os 300 vídeos cadastrados
diariamente na sua playlist. Além disto, estão disponíveis os sites dos programas e chats. A influência
da Internet pode ser percebida também nos programas da televisão. No Jornal da Globo, o próprio
cenário se modernizou, com a presença de computadores e câmeras. O jornal vai além do “Boa Noite”
do apresentador, continuando no ciberespaço com bate-papo com alguém relacionado ao tema de uma
matéria e com links com informações adicionais.
2
Termo retirado de RIBEIRO, Eduardo. TV na Internet. Disponível em
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/asp17042002991.htm. Acesso em 15/10/04.
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Jornal Interativo
O Jornal Interativo, conforme definição da AllTV, é um programa de conteúdo jornalístico que
aborda e discute temas atuais em um bate-papo descontraído, sendo além de interativo, alternativo.
Apresentado por Vinícius Costa e Amanda Klein, o programa acontece ao vivo de segunda a sexta, das 18
às 20 horas, e fica disponível para acesso on-demand em uma galeria de vídeos.
São utilizadas câmeras digitais mini-dv e o sinal chega pela Internet, e não por satélite ou antenas.
Como o monitor de vídeo é pequeno - e o internauta fica a trinta centímetros dela e não a três metros de
distância, como ocorre com a televisão tradicional - ela foi feita para ser assistida de forma individual, e
não por várias pessoas ao mesmo tempo.
Uma das possibilidades da rede é o espaço para todos os tipos de programas. Neste caso, optou-se
por fazer um jornal mais descontraído e aberto a opiniões dos internautas, o que acontece em
determinados programas de rádio, mas talvez não teria espaço na TV aberta.
A sua linguagem também segue um conceito diferente, lembrando o estilo de uma rádio, sem
roteiros rígidos ou pré-determinados. O tele-prompter (no qual o apresentador lê o script) não é utilizado,
o que permite que o apresentador improvise mais. O programa conta com a participação dos webrepórteres, que são repórteres que aparecem em flashes trazendo informações para serem debatidas. O
estilo do programa lembra mais um programa radiofônico, já que não há matérias jornalísticas, mas
apenas dois apresentadores que comentam as notícias do dia com os internautas.
Trata-se da apropriação da linguagem e do estilo do rádio por uma televisão da Internet. Em 1964,
Marshall McLuhan já atentava para isso quando dizia que o conteúdo de um meio é sempre outro meio.
(1979:22) Jay David Bolter e Richard Gruisin chamam a representação de um meio em outro de
remediação, considerando-a uma característica da nova mídia digital. (1998:45)
Os internautas e os jornalistas emitem suas próprias opiniões – diferentemente das normas
tradicionais de jornalismo. Para participar de todos os programas, basta preencher um pequeno cadastro,
escolher um nick e mandar perguntas ou comentários. Há a possibilidade de mudar a cor e o tamanho da
fonte utilizada - o que facilita a identificação dos participantes do chat quando há muitas pessoas teclando
ao mesmo tempo – e são disponibilizados smiles para auxiliar no processo de comunicação.
Os comentários dos internautas são lidos pelos apresentadores e eles norteiam o ritmo do
programa e até trazem assuntos diferentes da pauta inicial do jornal. Há um determinado grupo de pessoas
que freqüentam assiduamente o chat do programa, que se sentem conectados como uma comunidade
virtual. Assim que uma pessoa entra no chat, é saudada pelos apresentadores e outros jornalistas, que se
apresentam (já que Vinícius tem o nick de “peruquinha” e Amanda de “mandy”).
Percebe-se que neste caso, tanto os jornalistas quanto os que assistem ao programa produzem
informações numa troca mútua e simultânea. Todos manipulam o conteúdo do programa, sendo autores e
co-produtores (segundo conceitos de autores citados anteriormente).
Conforme as definições de graus de interatividade de Alex Primo, Luciana Mielniczuk e Maira
Moraes, o programa se enquadraria no caso de interação mútua já que a interação entre os participantes
não é pré-determinada e, assim como em uma conversa, há um alto grau de flexibilidade e
imprevisibilidade, com todos construindo juntos o produto final.
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Partindo das classificações de André Lemos quanto ao nível de interação técnica da televisão, o
programa se encaixaria no “nível 4” com o usuário podendo participar do conteúdo informativo das
emissões em tempo real .
As previsões de Janet H. Murray sobre a fusão televisão-Internet diante de mudanças na
participação digital do espectador apontam para um novo meio no qual será possível interagir apenas com
um clique com a mesma facilidade com que mudamos de canal com o controle remoto. Segundo ela,
estamos passando pela fase de assistir e então interagir (atividades seqüenciais), para interagir enquanto
se assiste (atividades simultâneas e separadas), até chegar a assistir e interagir em um mesmo ambiente
(experiência combinada). (2003:237)
O diretor geral da AllTV, Alberto Luchetti Neto3, confirma estas previsões, afirmando que os
internautas estão dispostos a participar ao vivo dos programas da AllTV. O site chegou a ter doze
milhões de pageviews quando tinha apenas três meses no ar e contava com três mil usuários únicos. Os
usuários se dispunham a ficar, em média, de uma hora até uma hora e meia ligados na programação,
sendo que há alguns que ficam de três a quatro horas conectados no site. Ele acrescenta que durante a
Copa do Mundo, os brasileiros no Japão, usando computador e micro-câmera, entravam ao vivo na
programação e faziam um "boletim independente" sobre a Copa. Durante informações sobre os jogos, os
internautas daqui e de lá complementavam informações e acrescentavam dados ao texto dos
apresentadores.
Jornal da Globo
O Jornal da Globo começou a ser apresentado em abril de 1979 como um noticiário de fim de
noite com cobertura dos eventos do dia, análises, comentários, séries de reportagens, participação de
correspondentes e colunistas. Desde então, passou por várias reformulações.
Hoje, assim como outros telejornais da emissora, o Jornal da Globo possui um site no qual
disponibiliza os últimos programas e informações complementares. Em seu menu há as seguintes sessões:
Último Programa, Reportagens Especiais, Colunas, Opinião, Atrás das Câmeras, Passeio Virtual, Sua
Carreira, Bonûs do JG, História do Programa, Equipe, Serviços, Fale Conosco e Vídeo.
Desta maneira, há a possibilidade de se conhecer os bastidores do programa em um passeio virtual
pelo estúdio (no qual você determina para onde se vai) e em um vídeo que mostra como funciona o
telejornal atrás das câmeras. As matérias ficam disponíveis em vídeo - através do Globo Media Center,
onde é possível assistir a algumas matérias com passe livre, sendo outras restritas a assinantes – e em
texto. Há um arquivo completo com as matérias antigas e um sistema de busca para localizá-las.
Neste caso, a única opção que permite que os telespectadores interfiram no conteúdo do programa
é através de sugestões por e-mail ou através dos eventuais chats com os jornalistas. Caso contrário, a
troca de informações entre jornalistas e telespectadores não é simultânea e, conforme as definições de
graus de interatividade de Alex Primo, Luciana Mielniczuk e Maira Moraes, o programa se enquadraria
no caso de interação reativa.
3
Em entrevista concedida a Sérgio Kulpas, no site Webinsider. Disponível em
http://webinsider.uol.com.br/vernoticia.php/id/1332 . Acesso em 20/11/04.
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As relações lineares disponibilizadas aos internautas são previamente estabelecidas. Os usuários
podem escolher quando e como assistirem aos vídeos dos programas, mas há uma lista selecionada de
matérias. O passeio virtual é comandado pelo mouse, porém há um determinado leque de escolhas de
direções a serem tomadas para o qual a máquina está preparada.
Partindo das classificações de André Lemos quanto ao nível de interação técnica da televisão, o
programa se encaixaria no “nível 3” com o usuário podendo participar do conteúdo informativo das
emissões através do telefone, e-mail ou fax.
Em um dos chats promovidos na inauguração do novo site (em 2003), a editora-executiva Ana
Paula Padrão disse que uma das prioridades do Jornal da Globo é que a Internet se transforme em um
veículo adicional importante de transmissão de informação do conteúdo do telejornal e espera que a
produção receba, através de e-mails, sugestões de pautas, críticas e comentários sobre o programa.
Os colunistas e jornalistas escrevem suas opiniões sobre variados assuntos e a Internet é mais um
canal de comunicação que eles têm com o telespectador. Na rede, eles se permitem ser menos neutros do
que na televisão e relatam suas experiências em um tom mais pessoal, tornando-se mais íntimo do
telespectador.
Uma das colunas escritas pelo jornalista Tonico Ferreira tem como título: “Confesso: não estava
preparado para ir ao Haiti”, na qual o repórter conta sua experiência no país e relata que não estava
preparado emocionalmente para conviver com a miséria e o sofrimento humano do local. Ele conclui o
depoimento dizendo que queria terminar com uma frase otimista, no entanto só era capaz de sentir
angústia, concluindo: “Desculpem-me. Eu não estava preparado para o que vi”.
Em “Sua Carreira” há links úteis para ajudar a conseguir um emprego. Algumas informações
adicionais são disponibilizadas no “Bônus do JG”. Em “Serviços”, o usuário pode conferir reportagens de
serviços com mais informações úteis, como o que se pode ser feito para evitar cair nas farsas de golpistas.
Conforme Wilson Dizard Jr. analisou em seu livro “A Nova Mídia”, a televisão e, em geral, os
meios de comunicação tradicionais, estão sendo desafiados pelas tecnologias digitais que oferecem
opções mais amplas de serviços e entretenimento. (2000:19) No caso do Jornal da Globo, seu site
funciona como uma alternativa a mais de distribuição do conteúdo do telejornal e de informações
adicionais que podem ser úteis para o espectador, mas que não teriam espaço nem tempo no programa na
televisão.
Comparada a outras experiências, como a AllTV, o usuário do site do Jornal da Globo ainda não
tem total autonomia para interferir no conteúdo do jornal, sendo a hierarquia entre jornalistas e
telespectadores ainda bem determinada e não tão flexível.
Considerações finais
Existem diversos autores que possuem uma visão pessimista sobre a interatividade, analisando que
o espectador ainda está relegado à condição de mero consumidor. No entanto, não podemos deixar de
observar que as tecnologias digitais, a convergência de mídias e a interatividade trazem mudanças às
maneiras de se relacionar com os meios de comunicação tradicionais.
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Uma delas seria a mudança do status da audiência de objeto passivo para sujeito interativo - como
foi observado nas definições sobre interatividade mencionadas anteriormente. Tal transformação
ocasionaria também a diferenciação e transformação da mídia – que passa a ser mais segmentada e
individualizada a um determinado público ou indivíduo. (Castells,1999:422)
O suporte necessário para acompanhar tais mudanças é o computador, visto que a Internet oferece
ao usuário uma interatividade sobre o conteúdo que não está disponível com o telejornalismo
convencional e dispõe uma experiência ainda mais particular do que a televisão, já que o usuário está
geralmente sozinho com seu computador e só uma pessoa pode conduzir a interação.
Jay Bolter e Richard Gruisin relembram com o conceito de remediação que introduzir uma nova
mídia não significa apenas inventar novo hardware e software, mas sim se apropriar das outras mídias
existentes. (1998:19) Por isso, estamos passando por um fenômeno chamado pelos editores da revista
Wired (citado em Bolter & Gruisin) de big bang do ciberespaço, onde, em vez de explodir, as diversas
mídias estão se convergindo. (1998:222)
Diante das possibilidades de interação que surgiram com as novas tecnologias, as mídias
tradicionais se apropriam das linguagens das novas mídias - e vice-versa - em uma reformulação de seus
conteúdos e das maneiras como as informações são produzidas e consumidas.
Ainda que a participação da audiência não seja de maneira igualitária, nota-se uma tendência de
permitir que o público interaja, ou que, pelo menos tenha a sensação de estar interagindo no conteúdo dos
programas. Esta situação já representa uma vontade de um novo público, disposto a participar mais
ativamente neste quadro de convergências.
Embora seja válido ressaltar, como fez José Luiz Braga em seu artigo “Mais que interativo:
agonístico”, que a interatividade e os sistemas de retorno, por si só, não asseguram a existência de
processos críticos, a interatividade proporcionada pelas novas tecnologias constitui um primeiro passo em
direção a este sistema crítico de mídia.
Estamos assistindo a diversas experiências que demonstram a tentativa de se desenvolver novas
formas de se produzir e distribuir informações, possibilitando um maior debate e diversidade de opiniões
na mídia e multiplicando a potencialidade de cada um se tornar um emissor. Com o desenvolvimento de
tecnologias digitais mais avançadas para distribuição de vídeo na rede e maior participação do público,
assim como um aprimoramento e uma maior disseminação do uso de sistemas interativos por parte dos
espectadores e dos jornalistas, surgirão novas possibilidades de se usar as mídias tradicionais e de
aproveitar de uma maneira mais crítica as potencialidades da interatividade e das tecnologias digitais.
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