Ciclos de Born Haber Um CicIo de Born-Haber é um ciclo que estabelece relações entre várias grandezas termodinâmicas e que se baseia na lei de Hess – a variação de entalpia de uma dada reacção é independente do “percurso” seguido entre o estado inicial e o estado final, isto é, a entalpia é uma função de estado. As funções de estado são propriedades termodinâmicas que são univocamente definidas pelo estado do sistema. A lei de Hess é consequência do 1º Princípio da Termodinâmica. Assim, é possível calcular a variação de entalpia associada a uma reacção química pela soma algébrica das variações de entalpia de outras reacções químicas cujas equações, depois de somadas, dão a equação inicial. Considerem-se esquematicamente dois estados, um final e um inicial, que é possível relacionar de forma directa através da variação de entalpia ∆H1 ou então por uma qualquer sucessão de estados intermédios separados pelas variações de entalpia ∆H2, ∆H3, ∆H4, …. ∆Hn. Representa-se de forma abstracta um ciclo para n = 5. ∆H3 ∆H4 ∆H2 ESTADO INICIAL ∆H5 ∆H1 ESTADO FINAL Segundo a Lei de Hess, o percurso entre os estados inicial e final tanto pode ser "directamente" através de ∆H1, como se pode procurar um "caminho alternativo", que parta do mesmo estado inicial e chegue ao mesmo final. Assim, ∆H1 = ∆H2 + ∆H3 + ∆H4 + ∆H5. Se, como no exemplo abaixo, o sentido do percurso é contrário ao sentido das setas, quer dizer, quando nos estamos a referir à reacção inversa daquela que está indicada no ciclo, então, aplicando a lei de Hess: ∆H1 = ∆H2 − ∆H3 − ∆H4 + ∆H5. ∆H3 ∆H4 ∆H2 ESTADO INICIAL ∆H5 ∆H1 ESTADO FINAL 1 Uma das utilidades destes ciclos termodinâmicos é que, se apenas uma das variações de entalpia for desconhecida, é possível calculá-la usando equações como as anteriores. Assim, os ciclos de BornHaber têm sido usados, por exemplo, para calcular energias reticulares ou electroafinidades (grandezas de determinação experimental difícil), entalpias de dissolução ou na previsão da estabilidade termodinâmica de um dado composto, através da sua entalpia de formação. Resumo de alguns conceitos, definições e convenções utilizados em ciclos de Born-Haber 1. Grandezas relativas ao estado gasoso Energia de dissociação ou de Iigação ∆dissH, entalpia de dissociação (é definida no sentido da quebra das ligações): variação de entalpia associada ao processo de quebra homolítica (i.e., cada átomo fica com um dos dois electrões que estabeleciam a ligação) de uma mole de ligações, com reagentes e produtos no estado gasoso ideal, à pressão de 1 bar e à temperatura de 298,15 K. O processo de quebra de ligações é sempre endotérmico (∆dissH >0). ∆ dissH AB (g) A (g) + B (g) Energia de ionização EI : energia que é necessário fornecer para arrancar uma mole de electrões a uma mole de átomos neutros (1ª energia de ionização), ou de iões (2ª, 3ª nª, energia de ionização), no estado gasoso ideal e fundamental, ficando os electrões arrancados com uma energia cinética nula. A (g) ∆H = EI A+ (g) + e− (g) EIectroafinidade EA : energia libertada quando se adiciona uma mole de electrões a uma mole de átomos no estado gasoso ideal, para formar uma mole de iões mononegativos no estado fundamental e também no estado gasoso ideal. Por tradição, esta energia libertada é dada como positiva, i.e. os valores tabelados são positivos, o que é contra a convenção termodinâmica; daí o sinal menos no processo correspondente: A (g) + e− (g) ∆H = − EA A− (g) O processo inverso, +EA, corresponde à energia de ionização do ião A− 2 A− (g) EI(A− ) = EA A (g) + e− (g) 2. Grandezas que envolvem (ou não) mudança de estado Entalpia molar de formação padrão ∆fH0: variação de entalpia envolvida na formação de 1 mole de uma substância directamente a partir dos seus elementos constituintes nos respectivos estados padrão a 298,15 K. Estado padrão define-se como a forma mais estável de um elemento ou composto no estado físico a que existe à pressão de 1 bar. Embora a temperatura não faça parte desta definição os valores tabelados costumam referir-se a 298,15 K (25 °C). Exemplo: Na (c) + 1/2 Cl2 (g) ∆fH0 (NaCl) NaCl (c) Por convenção, ∆fH0 (elemento no estado padrão) = 0 Por exemplo, ∆fH0 (Cl2, g) = 0, mas ∆fH0 (Cl, g) ≠ 0, porque o estado padrão do cloro (tal como o hidrogénio, azoto, oxigénio, e os restantes halogéneos, fluor, bromo e iodo), corresponde à molécula diatómica. Entalpia de reacção A variação de entalpia de uma reacção em condições padrão, ∆rH0, pode calcular-se a partir das entalpias de formação padrão dos seus produtos e reagentes. : ∆rH0 = Σ n ∆fH0 (produtos) - Σ n ∆fH0 (reagentes) n – coeficiente estequiométrico da espécie na equação química. Esta relação é uma consequência directa da lei de Hess. Por exemplo, consideremos a reacção: CH4 (g) + 2O2 (g) ∆rH0 CO2(g) + 2H2O (g) ∆rH0 = 2 x ∆fH0(H2O,l) + ∆fH0(CO2,g) – [2 x ∆fH0(O2,g) + ∆fH0(CH4,g)] = 2 x ∆fH0(H2O,l) + ∆fH0(CO2,g) – ∆fH0(CH4,g) Entalpia de atomização ∆atomH0: variação de entalpia associada ao processo de cisão de todas as ligações de uma mole de 3 moléculas, ficando os átomos resultantes no estado gasoso ideal e com energia cinética nula. AB...C (c, l ou g) ∆ atmH A (g) + B (g) + C (g) Entalpia de sublimação ∆subH: variação de entalpia associada à conversão de uma mole de composto ou elemento cristalino em uma mole de composto ou elemento no estado gasoso, a temperatura constante. A (c) ∆ subH A (g) Entalpia de vaporização ∆vapH: variação de entalpia associada ao processo de conversão de uma mole de um composto ou elemento no estado liquido numa mole de composto ou elemento no estado gasoso a temperatura constante. A (l) ∆ vapH A (g) Entalpia de dissolução ∆dissolH: variação de entalpia associada ao processo de dissolução de uma mole de um composto iónico, ficando os seus iões solvatados em solução. ∆ dissolH AB (c) A+ (soln) + B− (soln) Entalpia de solvatação ∆solvH: variação de entalpia associada ao processo da passagem de uma mole de iões no estado gasoso à solução. Se for em solução aquosa denomina-se entalpia de hidratação, ∆hidH. A+(g) ∆ solvH A+ (soln) A+(g) ∆ hidH A+ (aq) Energia reticular Uret ≡ - U (para um processo a pressão constante Uret ≈ ∆retH). Define-se energia reticular de um cristal como a energia que é necessário fornecer a uma mole desse cristal para o separar nos respectivos iões constituintes, considerando-se estes transportados desde as suas posições de equilíbrio na rede cristalina até uma distância “infinita” (o que corresponde o estado gasoso perfeito) e a 0 K. 4 U é a energia das interacções electrostáticas e da repulsão das nuvens electrónicas numa mole do cristal. Para separar uma cristal nos seus iões é sempre necessário fornecer energia, isto é, o processo é endotérmico. O sinal da energia reticular ou entalpia reticular é positivo. AB (c) Uret A+ (g) + B− (g) 5