Ensinagem: Revista Periódica da Faculdade de Belém
Joselle
MariaFaculty
de Alencar
Araripe
Bastos
CaioJulho/Dezembro
Rogério da Costa
Brandão
Ensinagem:
of Belém
Journal
V. 3,- n.2,
2014,
p. 64-86
ISSN 2238-4871
A INCONSTITUCIONALIDADE DA PENHORA
ADMINISTRATIVA NA EXECUÇÃO FISCAL
THE UNCONSTITUTIONALITY ADMINISTRATIVE ATTACHMENT
IN THE TAX ENFORCEMENT
LA INCONSTITUCIONALIDAD DE LA GARANTÍA
ADMINISTRATIVA EN LA EJECUCIÓN FISCAL
Joselle Maria de Alencar Araripe Bastos 1
Caio Rogério da Costa Brandão2
RESUMO
Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei
n. 5080/2009, que sugere a criação da penhora
administrativa na execução fiscal, com a constrição de
bens do contribuinte feita livremente pela Fazenda
Pública. Seu objetivo é alcançar a satisfação rápida
do crédito público e a diminuição de demandas
fiscais no Judiciário, garantindo-se o pagamento da
dívida com bens do contribuinte. Para tanto, propõe
mudanças substanciais na Lei de Execução Fiscal –
6.830/80, a norma legal em vigor autorizada para a
cobrança judicial da dívida em questão. O aspecto
mais polêmico do projeto é exatamente o que trata
da restrição a bens e direitos dos contribuintes,
efetivada indiscriminada e amplamente pela Fazenda
1 Manuscript first received /Recebido em: 01/03/2014
12/07/2014
Manuscript accepted/Aprovado em:
Técnica Judiciária da Justiça Federal do Pará. Licenciada Plena em Filosofia (Universidade
Estadual do Ceará). Bacharel em Direito (FABEL-Belém/PA). Especialização em Direito
Processual Civil (em andamento - Damásio de Jesus, em Belém/PA). E-mail: <joselleararipe@
hotmail.com>..
2 Advogado militante no Estado de São Paulo e do Pará. Especialista em Direito Tributário e
Direito Processual Civil (CEU-SP) e, em Direito do Consumidor (UNIFMU-SP). Doutorando
em Direito Civil (UBA-Argentina). Vice-Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da
OAB/PA. E-mail: <[email protected]>.
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Pública, sem interferência, a priori, do Judiciário.
Com esse poder em mãos, a Fazenda Pública nomeiase dona de direitos fundamentais, causando prejuízos
de ordem moral, atingindo bens de valor inestimável
importantes para manter a dignidade da pessoa
humana. Como versa sobre os direitos fundamentais,
previstos nos artigos 1º, III e 5º da Constituição
Federal, a alegação de inconstitucionalidade se
torna pertinente e urgente haja vista o abalo que
pode causar aos alicerces do Estado Democrático de
Direito erigidos na Carta Maior.
Palavras chave: Penhora Administrativa. Direitos Fundamentais.
Estado Democrático de Direito. Inconstitucionalidade.
ABSTRACT
It has been pending in Brazilian court the bill n. 5080/2009,
which suggests the creation of administrative attachment seizure in
the tax enforcement, with the constriction of the taxpayer’s property,
it made by the Treasury voluntarily. Its goal is due to achieve prompt
satisfaction of public credit, and the reduction of fiscal demands on
judiciary field, guaranteeing payment of the debt with the assets of
the taxpayer. Therefore, it is proposed substantial changes in the Law
of Tax Enforcement - 6.830/80, the legal rule in force authorized the
judicial recovery of debt in question. The most controversial aspect
of the project is exactly what is the restriction of goods and taxpayers
rights and largely indiscriminate effected by the Public Treasury,
without interference, primarily, the judiciary. With this power in
hands, the Treasury points itself as “the owner of rights”, causing
moral damage, reaching invaluable assets that maintains human dignity. As concerns fundamental rights provided in arts. 1, 5 and III of
the Brazilian Federal Constitution, the claim of unconstitutionality
is pertinent and urgent under the view of the concussion it may cause to democratic foundations State erected in Greater Charter.
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Keywords: Administrative Attachment. Fundamental Rights. Democratic State of Law. Unconstitutionality.
RESUMEN
Tramita en el Congreso Nacional el Proyecto de Ley n.
5080/2009, que sugiere la creación de la garantía administrativa en
la ejecución fiscal, con la compresión de bienes del contribuyente
hecha libremente por la Hacienda Pública. Su objetivo es alcanzar la
satisfacción rápida del crédito público y la diminución de demandas
fiscales en el Judiciario, garantiéndose el pagamento de la divida con
bienes del contribuyente. Para tanto, propone cambios substanciales
en la Ley de Ejecución Fiscal – 6.830/80, la norma legal en vigor autorizada para la cobranza judicial de la divida en cuestión. El aspecto
más polémico del proyecto es exactamente lo que trata de la restricción a bienes y derechos de los contribuyentes efectiva indiscriminada y ampliamente por la Hacienda Pública, sin interferencia, la
priori, del Judiciario. Con ese poder en manos, la Hacienda Pública
se nombra dueña de derechos fundamentales, causando perjuicios de
orden moral, atingiendo bienes de valor inestimable y 5º de la Constitución Federal, la alegación inconstitucionalidad se vuelve pertinente y urgente, es decir, el abalo que puede causar a los cimientos
del Estado Democrático de Derecho erigidos en la Carta Mayor.
Palabras-clave: Garantía Administrativa. Derechos Fundamentales. Estado Democrático de Derecho. Inconstitucionalidad.
1 INTRODUÇÃO
O tema investigado neste trabalho originou-se em um ambiente onde começa a se desenhar um estado de conflito entre o Poder
Judiciário e a Administração Pública, a saber, a demora na prestação
jurisdicional frente aos incontáveis processos de execução fiscal que
estão em curso há anos nas Varas e Tribunais de todo o país, sem so66
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A INCONSTITUCIONALIDADE DA PENHORA ADMINISTRATIVA NA EXECUÇÃO FISCAL
lução, e os que estão em via de ser formalizados. Por ação de execução
fiscal entende-se a que tem por escopo a cobrança judicial da dívida
pública.
Com relação à cobrança judicial dos créditos da Fazenda Pública oriundos da dívida ativa, que é o objeto da ação executiva, e esta o
motivo do conflito Judiciário-Estado, a solução dos problemas estaria
na chamada “penhora administrativa”, e é, a constrição de bens do
contribuinte realizada livremente pela Administração Pública, objetivando a celeridade processual e, por conseguinte, o desfecho do litígio com a satisfação do crédito. Assim argumentam os representantes
da Fazenda Pública.
O projeto de lei em curso no Congresso Nacional sob o nº
5080/2009, de autoria da Fazenda Nacional propõe a alteração da
Lei de Execução Fiscal nº 6.830/80, instituída para a cobrança judicial de dívida ativa da Fazenda Pública. Para a cobrança mais célere
e eficaz da dívida pública, o projeto de lei pretende conceder poderes
amplos às Fazendas Públicas federal, estaduais, municipais e do Distrito Federal para bloquear valores em contas bancárias e investimentos financeiros, restringir direitos, penhorar bens móveis e imóveis
de pessoas físicas e jurídicas e, também, o faturamento de empresas
cujos débitos estejam inscritos em dívida ativa. É a expropriação administrativa de bens!
2 O DIREITO E O ESTADO EM UMA ABORDAGEM
HISTÓRICA
O direito vem se transformando ao longo das gerações e em
cada momento histórico, se consagrando como uma ciência capaz de
modificar o mundo e percebê-lo sob um novo prisma: o do respeito
ao homem, à sua dignidade e à sua cidadania dentro de uma perspectiva de proteção a seus direitos fundamentais (estes firmados em
um momento mais avançado da História), sistematizado por regras
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positivadas de garantia desses direitos. Portanto, importante abordar
a evolução do direito e do Estado, para que se alcance o ápice de sua
evolução: o Estado Democrático de Direito. Voltar ao túnel do tempo
e passear pelas civilizações antigas até atingir as contemporâneas é
importante para a compreensão de seu desenvolvimento, crescimento
e aperfeiçoamento no tempo e no espaço.
Antes da existência do direito positivado por normas, o direito
era apenas um conceito que provinha de uma ideia naturalista, na
qual as pessoas justificavam sua existência como inerente à própria
natureza humana, era uma consequência lógica, oriundo da condição
de “ser humano”. Com a evolução da humanidade, do Direito e do
Estado, o Direito Positivo se consagrou como a base de todo ordenamento jurídico para obrigar o respeito ao Estado, suas normas e
aos direitos fundamentais. “Direito positivo [...] é o direito escrito,
consubstanciado em leis, decretos, regulamentos, decisões judiciárias, tratados internacionais, etc., variando no espaço e no tempo”
(MALUF, 2010, p.7).
Passando pela História antiga com as polis no Estado Grego
e a República no Estado Romano, já se constatava a participação do
povo (cidadãos livres), nas decisões políticas do Estado. A democracia
já era presente na ordem jurídica estatal.
Infelizmente, após a longínqua democracia estreada pelos Estados Grego e Romano, fases negras da História, como o Estado Medieval e o Absolutismo, se apresentam como carrascos da democracia,
tendo em vista que o direito emanava apenas do Estado. “A lei sou
eu”, preconizava Luís XIV, então rei da França. Contudo, novas ideias
foram pregadas por filósofos da época, entre eles o inglês John Locke, fazendo nascer o sentimento de revolta dando início à Revolução
Francesa (Sec. XVIII), a batalha de maior significado, que se firma
como o marco da queda do absolutismo. Esse momento histórico
marca o início da Idade Contemporânea.
Do liberalismo onde foi instituído o Estado de Direito, que
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preleciona a intervenção mínima do Estado na vida privada, e o contrato social como fundamento para uma ordem social de paz e harmonia, ao socialismo e comunismo no século XIX, desencadeou-se
neste, uma total interferência do Estado na vida do cidadão. Foi eliminada a propriedade privada e a burguesia. Com o Fascismo italiano
e o Nazismo alemão dá-se o auge da supressão das ideias liberais, e
institui-se a ditadura do poder estatal, ou totalitarismo, com uma
nova organização político-social que desrespeita todos os direitos e
garantias do povo. No Brasil, sua expressão acontece com o Getulismo, e a institucionalização do Estado Novo, submetendo o Legislativo, o Judiciário e seus cidadãos à sua autoridade.
Com o fim do Nazismo e suas atrocidades após o fim da Segunda Guerra Mundial, resgata-se a democracia longinquamente
estreada pelas antigas repúblicas grega e romana. A Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão (França-1789) se assenta como o
primeiro documento a prever os direitos fundamentais do homem
após a Revolução Francesa. Serviu como modelo e fonte de inspiração
para a elaboração de outros documentos, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, produzida pela Assembleia Geral das
Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, em total oposição aos
aterrorizantes atos de violência cometidos pelo Nazismo de Hitler.
Uma nova consciência política emerge fundada nos direitos da
pessoa humana como princípio a ser seguido pelos regimentos políticos dos países cuja democracia está consolidada. Ergue-se, sob essa
nova ótica, o Estado Democrático de Direito, cujas bases têm como
alicerce o respeito aos direitos fundamentais do homem, à justiça
social e à igualdade. Veja-se o que estabelece a Constituição Federal
do Estado Brasileiro de 1988: “Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza”. É a constatação da democracia e
cidadania plenas!
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3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
3.1 CONCEITO
Princípios, segundo o Dicionário Aurélio são: “Conjunto dos
preceitos morais e éticos que regem ou deveriam reger a conduta e
o comportamento do ser humano em relação ao seu semelhante, ou
em relação à sociedade, ou em relação ao mundo e aos outros seres
da natureza” (BRASIL, 2010, p. 1710). Para Silva (2009, p. 92),
“os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas
de normas, são [como observam Gomes Canotilho e Vital Moreira]
‘núcleos de condensações’ nos quais confluem valores e bens constitucionais”.
Nesse mesmo sentido, a lição de Carraza (2009, p. 46): “Os
princípios constitucionais têm caráter normativo”. No campo jurídico, os princípios constitucionais são normas hierarquicamente superiores, dotadas de valores éticos que servem como base para direcionar as demais normas que compõem o ordenamento jurídico. Os
princípios constitucionais têm caráter fundamental e de supremacia,
tendo em vista seu grau de abstração ser maior que o das demais normas, não se direcionando especificamente a um caso, fato ou pessoa
determinada, mas a todos; na prática, são alicerces onde se funda todo
o sistema jurídico.
3.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Princípio fundamental consagrado na Constituição da República Federativa do Brasil (art. 1º, III) e direito fundamental (art. 5º)
a que todos fazem jus; sua acepção é ampla e transcende à ideia de
mera condição física e espiritual do homem, estendendo-se para uma
complexa estrutura de valores morais e éticos que são inatos a todos.
Buscando uma definição mais abrangente, Sarletse (2010, p.
70) arrisca a formular:
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A dignidade da pessoa humana é a qualidade
intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser
humano que o faz merecedor do mesmo respeito e
consideração por parte do Estado e da comunidade,
implicando, neste sentido, um complexo de direitos
e deveres fundamentais que assegurem à pessoa tanto
quanto todo e qualquer ato de cunho degradante e
desumano, como venham a lhe garantir as condições
existenciais mínimas para uma vida saudável, além
de propiciar e promover sua participação ativa e
corresponsável nos destinos da própria existência e
da vida em comunhão com os demais seres humanos,
mediante o devido respeito aos demais seres que
integram a rede da vida.
Nesse âmbito, como norma jurídico-positiva, constata-se que
o Estado assume o status de garantidor da dignidade da pessoa humana.
Na área tributária, a Constituição Federal também impõe limites à ação do Estado, que se submete às prescrições da lei (art.
146/II) devendo instituir tributo na medida em que o contribuinte
possa suportá-lo (princípio da capacidade contributiva). Vê-se que
esse princípio tem guarida em outro princípio: o da igualdade (art.
5º/CF), que é um dos princípios fundamentais explícitos na Carta
Magna.
Nessa sintonia, Carraza (2009, p. 435) ensina os direitos fundamentais, evidentemente, também amparam o contribuinte contra
os poderes do Estado, inclusive o Legislativo, nos termos:
Deveras, todo o Capítulo I do Título II da Constituição
Brasileira delimita o exercício das competências
tributárias das pessoas políticas, impedindo-as de
ingressarem nas áreas reservadas aos direitos à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
Daí serem inconstitucionais as normas jurídicas que,
a pretexto de exercitarem competências tributárias,
impedirem ou tolherem o pleno desfrute dos direitos
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públicos subjetivos dos contribuintes.
A linha de pensamento de Carraza se coaduna com os ditames da Constituição, que estabelece que os direitos fundamentais
são normas cogentes, de grau superior no ordenamento jurídico, que
não podem ser violadas, e que suas garantias traduzem a preocupação
do legislador em efetivar esses direitos. São normas tão importantes,
que têm aplicabilidade imediata (art. 5º, § 1 º) e são irrevogáveis (art.
60, § 4º, IV).
4 PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal (BRASIL, 2012,
s/p).
Assim preleciona a Constituição Federal, em seu artigo 5º, com
o fim de garantir a toda pessoa o direito de se defender de qualquer
ofensa ou arbitrariedade que possa privá-lo de sua liberdade e de seus
bens, ou de acusação de delito praticado: “[...] todo homem acusado
de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que
sua culpabilidade tenha sido provada, de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenha sido assegurado todas as garantias
necessárias à sua defesa” (MORAES, 2010, p. 107).
Esse princípio tem como fundamento a ampla defesa e o contraditório. A ampla defesa é o direito que tem o acusado de usar de
todas as provas legais para a sua defesa, trazendo-as ao processo, de
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modo que possam esclarecer os fatos alegados. O contraditório é o
meio de defesa que implica na oposição aos fatos narrados pela parte
acusadora.
Necessária à abordagem em razão de que sua previsão legal enseja a aplicação de outro princípio constitucional: o de igualdade de
condição para as partes durante todo o curso do processo. Em sendo
atendido o “devido processo legal”, inexiste a possibilidade de anulação de qualquer ato jurídico-processual; eis, aí, sua importância.
5 O PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE
PÚBLICO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A Administração Publica como gestora de bens coletivos pertencentes à sociedade, baseia suas atividades no princípio da Supremacia do Interesse Público, tendo em vista o bem comum. Seu alcance é de caráter geral, porém, não absoluto, como se manifestam
Alexandrino e Vicente (2009, p.190): “existindo conflito entre o interesse público e o interesse particular, deverá prevalecer o primeiro,
tutelado pelo Estado, respeitados, entretanto, os direitos e garantias
individuais expressos na Constituição, ou dela decorrentes”.
Convém ressaltar que o Projeto de Lei n. 5.080/2009 está pautado nesse princípio o qual exerce função de essencialidade para a
execução dos atos administrativos. Outros princípios regulam a atividade administrativa, entre os quais o da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Importante lembrar o princípio da legalidade. Mello (2009, p.
99), instrui: “fruto da submissão do Estado à lei”, pois o projeto de
lei nada mais é do que a tentativa de legalização da penhora administrativa, sem a qual a Administração Pública não poderá executá-la.
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6 A TEORIA GERAL DA RESPONSABILIDADE
CIVIL E O PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE
PATRIMONIAL
A teoria geral da responsabilidade civil, de onde se origina a
teoria da responsabilidade patrimonial, conclui que toda pessoa deve
ser responsabilizada por ato lesivo, cometido a outrem, por culpa,
erro ou dolo, que lhe cause dano moral ou patrimonial, tendo o autor
do fato a obrigação de reparar o dano causado (art . 927/CC). Segundo Diniz (2007, p. 34), responsabilidade civil “é a aplicação de
medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial
causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado”. Assim, a
execução da dívida recai exclusivamente sobre o patrimônio do devedor, ficando caracterizada a teoria da responsabilidade patrimonial.
Previsto no artigo 591 do Código de Processo Civil, o princípio da responsabilidade patrimonial assim dispõe: “o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus
bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”
(BRASIL, 2012, s/p). Isso quer dizer que nem todos os bens respondem pela dívida, como se percebe pela clara determinação do art. 649
do CPC. O próprio Estado protege alguns bens, sendo taxativo no
seu rol dos absolutamente impenhoráveis, não se impondo, portanto,
ao devedor, o dever de cumprir a obrigação com esses bens, sendo
expressamente proibida sua expropriação judicial. Ainda assim, os
§§ 1º e 2º guardam duas exceções, conforme se verifica da transcrição
do referido artigo:
Art. 649 - São absolutamente impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato
voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, pertences e utilidades domésticas
que guarnecem a residência do executado, salvo os
de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades
comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
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A INCONSTITUCIONALIDADE DA PENHORA ADMINISTRATIVA NA EXECUÇÃO FISCAL
III - os vestuários, bem como os pertences de uso
pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários,
remunerações, proventos de aposentadoria, pensões,
pecúlios e montepios; as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento
do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador
autônomo e os honorários de profissional liberal,
observado o disposto no § 3º deste artigo;
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os
utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis
necessários ou úteis ao exercício de qualquer
profissão;
VI - o seguro de vida;
VII - os materiais necessários para obras em
andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida
em lei, desde que trabalhada pela família;
IX - os recursos públicos recebidos por instituições
privadas para aplicação compulsória em educação,
saúde ou assistência social;
X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a
quantia depositada em caderneta de poupança.
XI - os recursos públicos do fundo partidário
recebidos, nos termos da lei, por partido político.
§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança
do crédito concedido para a aquisição do próprio
bem.
§ 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo
não se aplica no caso de penhora para pagamento de
prestação alimentícia (BRASIL, 2012, s/p).
Esses artigos resguardam, em suas essências, a proteção à dignidade da pessoa humana, para que se garanta o mínimo para a sua
sobrevivência.
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Com relação à responsabilidade patrimonial, Câmara (apud DINAMARCO, 2010, p. 201): “situação meramente potencial, caracterizada pela sujeitabilidade do patrimônio de alguém às medidas
executivas destinadas à atuação concreta do direito material”.
Isso quer dizer que o patrimônio do devedor responde pelas
suas dívidas com todos os seus bens presentes e futuros (art.591/
CPC), até onde suportar. Portanto, não cumprindo o devedor espontaneamente uma obrigação, seu patrimônio poderá sofrer medidas
de expropriação, aplicadas pelo Estado, para a satisfação do crédito.
Trata-se da execução forçada.
7 PENHORA
7.1 CONCEITO
Segundo Assis (2010, p. 695) penhora configura em ser o “ato
executivo que afeta determinado bem à execução, permitindo sua
ulterior expropriação e torna os atos de disposição do seu proprietário
ineficazes em face do processo”. Dispõe, ainda: “A penhora não outorga ao credor um poder direto imediato sobre o bem, como acontece
no penhor” (p. 692).
A penhora é instituto do Direito Processual, no que diz respeito à execução, cuja efetivação só se verifica por ordem judicial, tendo
em vista que o devedor, no prazo estabelecido por lei, não pagou a dívida e tampouco ofereceu bens que a garantissem. Não há, nesse caso,
a manifestação da vontade do devedor, que fica impotente quanto à
constrição de seu bem. Para Câmara (2012, p. 277): “A penhora é
procedimento de segregação dos bens que efetivamente se sujeitarão
à execução, respondendo pela dívida inadimplida”.
Desse modo, a penhora é ato processual que assegura que bens
do patrimônio do devedor garantam o crédito exequendo. A penhora
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é ato autorizado que se processa em favor da Fazenda Pública para
garantir o pagamento da dívida, só ocorrendo quando o devedor, convocado a pagar o débito, não o faz nem oferece bens, móveis, imóveis,
ou semoventes, entre outros previstos no artigo 11/LEF, que sejam
suficientes para pagar sua dívida.
7.2 PENHORA JUDICIAL X PENHORA ADMINISTRATIVA
Assim, a penhora Judicial é atribuição do Oficial de Justiça
que a efetiva por ordem do Juiz, atendendo ao pedido do exequente.
O Juiz determina a penhora de bens do executado, tantos quantos
sejam suficientes para garantia da dívida tributária/fiscal contraída
pelo contribuinte em razão de descumprimento de obrigação perante
o fisco.
Primeiramente, chama-se o executado a tomar conhecimento
do feito (citação) para pagar a dívida ou garantir a execução, no prazo
de 5 cinco dias (arts. 7º, 8º, 9º e 10/LEF). Se o executado não pagar
a dívida ou não oferecer bens para sua garantia, aí sim, a penhora
judicial será efetivada. De acordo com o art. 11, in verbis, poderá a
penhora recair:
Art. 11: A penhora ou arresto de bens obedecerá à
seguinte ordem:
I - dinheiro;
II - título da Dívida Pública, bem como título de
crédito, que tenham cotação em Bolsa;
III - pedras e metais preciosos;
IV - imóveis;
V - navios e aeronaves;
VI - veículos;
VII - móveis ou semoventes, e
VIII - direitos e ações. §1º Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre
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estabelecimento comercial industrial ou agrícola,
bem como em plantações ou edifícios em construção.
§ 2º A penhora efetuada em dinheiro será convertida
no depósito de que trata o inciso I do artigo 9º.
§ 3º O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado
para depósito judicial, particular ou da Fazenda
Pública exequente, sempre que esta o requerer, em
qualquer fase do processo (BRASIL,2012, s/p).
Por sua vez, implica a penhora administrativa em tirar do
Judiciário a atribuição de penhorar bens e entregar esse encargo à
Administração Pública que com a averiguação da vida patrimonial
do contribuinte, encontrando bens que possam adimplir a dívida,
executa a constrição, e só após ajuíza a ação. Nesse instante, será garantido o contraditório e a ampla defesa ao contribuinte.
A ideia da penhora administrativa surgiu com os números:
correm na Justiça milhares de ações, como um todo, as quais o Judiciário tem que apreciar, tornando-se impotente para tal, considerando o volume de ações acumulado nas Varas. Essas incontáveis ações
acabam por gerar um desconforto entre a Administração Pública e
o Poder Judiciário, que, por intermédio de seus Juízes, reclama do
excesso de processos executivos e da falta de condições de mantê-los
em andamento, pelo menos dentro de um prazo razoável. A Administração pública, de outro lado, se queixa da lentidão dos Juízes e
da ineficácia na cobrança da dívida pela via judicial. Nasce aí um
impasse: quem tem razão? Os administradores ou os Juízes? Existiria
aí um conflito que, em sua essência, gira em torno do mesmo tema,
a celeridade processual?
Esse quadro só revela o que já é de conhecimento comum: impossível a quantidade de juízes suprir a demanda de processos, pois o
desequilíbrio é notório, tornando a cobrança da dívida lenta e ineficaz. Assim indicam os dados:
Consoante o relatório “Justiça em Números”,
divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça, no
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ano de 2005, a taxa média de encerramento de
controvérsias em relação com novas execuções fiscais
ajuizadas é inferior a 50% e aponta um crescimento
de 15% do estoque de ações em tramitação na 1ª
instância da Justiça Federal. O valor final aponta
para uma taxa de congestionamento médio de 80%
nos julgamentos em 1ª instância (PL, 2009, s/p).
Note-se, que os dados apontados revelam um índice altíssimo
de ações em curso no Judiciário, constatando-se o desequilíbrio alegado pelos Juízes.
7.3 OS PONTOS NEVRÁLGICOS DA PENHORA
ADMINISTRATIVA
As inovações pretendidas pela Fazenda Pública, com a criação da penhora Administrativa, suscitam discussões de grande valia
para o ordenamento jurídico, haja vista a implantação de medidas,
por certo, contrárias ao ordenamento jurídico vigente, por atingirem
direitos fundamentais consagrados e agasalhados pela Carta Magna.
Entre esses direitos estão os previstos no art. 5º, X, e XXII que
versam sobre a intimidade, a vida privada e o direito à propriedade.
Apesar de serem cláusulas pétreas, esses direitos não são absolutos,
encontrando limitações na própria Constituição Federal de 1988, nos
incisos XXIII e XXV, do mesmo artigo, quanto ao direito de propriedade.
Sob a ótica da proteção dos direitos fundamentais, a OAB de
São Paulo tendo como signatários juristas de renome como Ives Gandra da Silva Martins, os professores da PUC André Ramos Tavares,
Luís Eduardo Schoueri e Roque Antônio Carraza, expediu parecer,
protocolizado na Câmara dos Deputados Federais, que repudia o PL
5080/2009. A seguir a transcrição de parte do documento:
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A constatação de que o PL 5080/2009, ao afastar da
jurisdição e do processo legal a transferência forçada
de patrimônio dos contribuintes/administrados,
colide com disposições constitucionais, em especial
as contidas nos artigos 1º, 2º e 5º, incisos XXII,
XXXV, LIV e LV, é indiscutível. Disposições essas tão
robustas que sequer podem ter sua eficácia mitigada
por constituírem cláusulas pétreas indisponíveis ao
legislador e à Administração Pública.
[...]
As proposições destacadas, por serem ofensivas
ao que, historicamente, se conhece como
Estado Democrático de Direito, no qual tanto a
Administração Pública quanto os Administrados
se submetem, igualmente, a um imparcial Poder
Judiciário, e por colidirem com a presunção
constitucional de boa-fé dos atos praticados pelos
cidadãos/administrados/contribuintes,
devem
ser imediatamente excluídas de seus pertinentes
procedimentos legislativos (BRASIL, s/d, s/p).
Seguem alguns pontos polêmicos do Projeto de Lei, quanto aos
aspectos constitucionais:
O artigo 4º, §§ 1º, 2º e 4º, constitui absoluta invasão de privacidade da vida patrimonial do contribuinte, configurando-se o abuso
de poder e ilegalidade do Estado, que será privilegiado com o acesso
a informações por meio de um sistema nacional de informações patrimoniais dos contribuintes - SNIPC que devassa a vida íntima do
executado.
O art. 5º, §§ 4º e 5º, obriga o executado a prestar informações
acerca de seu patrimônio. Nesse caso, há exagerada imposição de dever ao contribuinte/executado no texto dos parágrafos em comento,
no caso de não adimplemento da dívida. A Fazenda Pública obriga
o executado a informar, sem exceção, todos os bens que constituem
seu patrimônio, devendo apontar, “fundamentadamente”, aqueles
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que considera impenhoráveis. Já que a Administração Pública tem
tanto poder para conseguir informações, a qualquer tempo, acerca da
existência de bens do executado, incabível a imposição desse ônus ao
devedor. Dispensável, portanto, esse artigo.
O art. 7º corresponde à exceção de préexecutividade arguida
na ação judicial, preservando a essência de sua estrutura. Contudo, as
arguições são cabíveis apenas no processo administrativo.
O art. 9º trata da penhora administrativa propriamente dita. É
a constrição de bens do executado em sede administrativa. Traduz o
poder do Estado de expropriar bens do executado, sem que antes este
seja ouvido na via judicial acerca da legalidade ou não do título executivo antes da efetivação da penhora. Acrescentando-se a isso, mais
um encargo para o devedor está previsto no artigo: o pagamento das
custas com relação ao registro da penhora no Órgão competente, caso
a execução seja julgada procedente para o credor.
Ora, já que a Administração Pública é detentora de uma sorte
de privilégios capazes de captar as informações que pretende acerca
da vida do executado, nada mais justo que ela mesma arque com as
despesas decorrentes de registro de constrição, deferido ou não seu
pleito na esfera judicial. O executado já é onerado com a custa de lei.
Nesse contexto, esqueceu-se a Fazenda Pública de prever cláusula de
ressarcimento ou compensação financeira ao executado pela inconveniência de ter tido seus bens constritos, e, em seguida, por ausência
de confirmação do Judiciário, liberados. Não caberia, no caso, algum
tipo de indenização administrativa ao devedor?
O art. 10 traz mais uma sanção para o devedor: em caso de sua
recusa para o encargo de fiel depositário do bem será obrigado a pagar
antecipadamente as despesas pela sua guarda. Mas o maior interesse
é da Fazenda Pública, então, por que ela mesma não o guarda? Talvez
se assim fizer, colocando o bem em depósito a sua administração, com
certeza estaria mais resguardado de danos. Absurdo esse artigo.
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O art. 11 deixa a critério da Administração Pública a avaliação
dos bens agravados, cabendo impugnação administrativa pelo devedor, no prazo estabelecido. Indeferida a impugnação, esta poderá ser
oposta na via judicial. Dispensável essa previsão eis que a CF, em seu
art. 5º, XXXV, estabelece: “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
O artigo 13, um dos mais importantes do projeto, prevê o ajuizamento da ação de execução fiscal. Contudo, somente poderá ser
proposta se acompanhada da documentação de investigação patrimonial do devedor. Essa fase representa maior segurança ao contribuinte-devedor porque ele estará legalmente abraçado pelo direito
de arrazoar sua defesa por quem realmente tem a legitimidade para
resolver o conflito, declarando o direito. Trata-se do princípio da segurança jurídica, importantíssimo para a mantença do equilíbrio entre as partes litigantes.
O parágrafo único do art. 16 prevê sanção para quem dolosamente omitir, retardar ou prestar falsas informações ficando responsável, subsidiariamente, pela dívida ativa em cobrança. É ilegal
a responsabilização dos agentes infratores na mesma proporção da
dívida, visto que alheios a ela. O fato gerador é outro. A aplicação de
multa, após a apuração da culpa, em processo administrativo, seria a
medida mais adequada.
Cuida o art. 17 da penhora “online”, atualmente praticada indiscriminadamente por ordem judicial. Essa talvez seja a mais grave
das modalidades de penhora, pois incide sobre todo e qualquer valor
depositado em conta bancária, não distinguindo as parcelas impenhoráveis determinadas pelo CPC, das demais. O prejuízo causado ao
devedor é irreparável, visto entrar na esfera íntima do executado, por
se tratar de impedimento do uso de um bem de natureza alimentar,
imprescindível ao sustento do devedor e de sua família. Embora posteriormente o devedor possa comprovar a impenhorabilidade desses
valores, resultando em sua liberação, o dano já foi causado. Some-se
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a isso o abalo emocional que a constrição acarreta. Além disso, maior
risco corre o contribuinte caso não seja ajuizada a ação no prazo de
3 dias previsto no §1º, ficando o dinheiro indisponível a vontade da
Fazenda Pública.
8 CONCLUSÃO
A invasão à privacidade, com a devassa da vida íntima patrimonial do executado através de sistema integrado de informações
cujo acesso da Administração Pública é irrestrito, constitui em violação irreparável ao princípio da dignidade humana e abuso de poder.
O Estado se legitima para praticar o cerceamento de direitos básicos,
fundamentais, característicos de um Estado Democrático de Direito, ofendendo, ferindo, violando diretamente a Constituição Federal.
Em um Estado Democrático de Direito até mesmo o Estado se submete a limitações ao direito de intervenção na vida privada de seu
cidadão; trata-se da defesa a bens e direitos, tanto materiais quanto imateriais, capazes de proteger o mínimo da dignidade humana.
Como exemplo, o artigo 649 do CPC. A intenção do legislador foi
resguardar bens capazes de garantir direitos fundamentais da pessoa,
como o de moradia e alimentos.
De todo esse enredo, importante, mesmo, seria restringir a
atuação da administração quanto à penhora “online”, efetivada judicialmente a pedido da Fazenda Pública. Apesar de a lei autorizar
a invasão na conta corrente dos usuários, essa medida constitui, sob
o manto do exercício nas próprias mãos, grave lesão ao patrimônio
pessoal do devedor, tendo em vista o gravame de bloqueio não poder
selecionar os depósitos gerais dos depósitos de natureza alimentar,
tais como os salários, vencimentos, proventos de aposentadoria, que
são impenhoráveis por determinação expressa do art. 649 do CPC.
Sabe-se, é certo, que após o bloqueio o executado poderá apresentar
comprovantes (contra cheques e extratos bancários) que indiquem os
depósitos de natureza alimentar, para que também, por ordem judiEnsinagem, Belém/PA-Brasil, v. 3, n. 2, jul./dez. 2014, p. 64-86
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cial, seja liberado o dinheiro anteriormente impedido de uso.
Mas, até lá, os danos causados e os estragos já foram feitos.
Como solução, o Juiz poderia salvar esses valores da constrição “online” mediante a estipulação de cláusula que proíba seu bloqueio.
Dessa maneira, o banco só poderia restringir os valores que excetuassem essa situação. É claro que a instituição bancária tem condições
de apontar os depósitos porquanto sua origem é identificável. Nessa
situação, a penhora “online” é, irremediavelmente, a pior forma de
expropriação de bens atualmente praticada pelo Estado.
Nessa conjuntura de turbulência, em meio a críticas e teorias
antagônicas, percebe-se que, ao selecionar os créditos possíveis de
ações de cobrança, com intuito de trazer maior efetividade à satisfação do crédito exequendo, a ação de execução fiscal poderia ser mais
célere, menos cara e mais eficiente.
Mas, quem pode assegurar que a Fazenda Pública está preparada estruturalmente para implantar e executar os atos inerentes à
penhora? A Fazenda Pública, em especial a Fazenda Nacional já está
apta para proceder à penhora? Ou trata-se apenas de uma hipótese cuja possibilidade de efetivação é remota? Esses questionamentos
são de respostas incertas, pois talvez nem mesmo a Fazenda Pública
tenha elementos suficientes que sejam capazes de dirimir as dúvidas
apontadas, visto não se ter conhecimento de estudo de levantamento de dados elaborados pela Fazenda Nacional, autora do projeto.
E, segundo o relatório “Números da PGFN – SINPROFAZ” citado
no texto de José Roberto Marques Couto, a Procuradoria da Fazenda Nacional encontra-se com número excessivo de processo pra cada
Procurador.
De tudo isso, infelizmente o modo como a Fazenda Pública
elaborou o projeto de lei, com o desrespeito a princípios constitucionais basilares, constata-se, é totalmente contrário aos preceitos legais.
A abolição de direitos e garantias fundamentais, com certeza, será o
maior empecilho para a aprovação do projeto; talvez se este receber
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alterações substanciais que encontrem outras soluções para aliviar a
carga demasiada de processos no Judiciário- constatado no relatório
“Justiça em números” citado na exposição de motivos do projeto de
lei-, ou apresente estudo que comprove sua capacidade para diminuir
o prazo de tramitação dos processos, sem que implique em ferir a
Carta Maior, seja possível seu julgamento favorável.
Finalmente, tecnicamente, o projeto de lei é inviável. Percebe-se que a penhora administrativa já nasce inconstitucional, em
virtude de estar diretamente atrelada as cláusulas pétreas (direito à
intimidade, à igualdade, à propriedade, de defesa, do devido processo
legal), aquelas cláusulas que não podem ser abolidas, e alteradas ou
modificadas (por um procedimento legislativo simples) levando-se
em conta sua rigidez.
Logo, o projeto deveria ser rejeitado de plano, sem que fosse
necessário passar por todo o desgastante e trabalhoso processo legislativo, justamente por referir-se, em sua essência, a cláusulas pétreas.
De qualquer forma, essa teoria tecnicista ao que parece, está subentendida (ou é um entendimento pessoal), embora pouco se tenha encontrado alusão na doutrina pesquisada, salvo unicamente sugerida
pela OAB em seu parecer.
Então, afirma-se: as possibilidades de aprovação do projeto são
mínimas, visto em seu bojo observar-se o desrespeito a garantias e
princípios constitucionais que são intangíveis, por versarem sobre
bens inalienáveis, indispensáveis e indisponíveis da pessoa humana.
A Comissão de Constituição e Justiça das Casas Legislativas do Congresso Nacional espera-se, estará alerta quanto aos dispositivos que
violam nossa Constituição. E, se assim for, o projeto de lei está fadado
ao insucesso. Vitória da democracia!
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