16/09/2013
Mudança aproxima Ibovespa da economia
brasileira e melhora eficiência
Por Alessandra Bellotto e Beatriz Cutait
Vieira, sócio da Fides, critica as distorções causadas nos aluguéis de ações
Ganho de eficiência e maior representatividade da economia brasileira. Essas são as
principais vantagens para o mercado e, em última instância, para o investidor final
apontadas por gestores acerca das mudanças no cálculo do principal índice da bolsa de
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valores brasileira, o Ibovespa. A nova metodologia levará em conta o valor de mercado
do free float, embora com um limite, para que uma empresa muito grande, mas com
menor liquidez, não fique com peso desproporcional e dificulte a replicação do
indicador. Hoje, predomina o critério de liquidez.
O grande problema hoje de ter a negociação das ações como fator preponderante para a
construção do índice são as distorções que isso pode causar, segundo os especialistas.
Essa questão não é nova, destaca Eduardo Roche, chefe de renda variável da Modal
Asset, mas o caso OGX amplificou o problema e mostrou o quão defasada estava a
metodologia do Ibovespa.
Como a Ambev, que é hoje a maior empresa em valor de mercado, não está nem entre
os dez maiores pesos do índice, questiona. A participação de Ambev hoje no Ibovespa é
de 1,59%, enquanto companhias com valor de mercado bem abaixo têm
representatividade duas, três vezes maior, afirma Roche. Ele cita OGX, com cerca de
5% de participação, e também PDG, com quase 2%. Pelo novo critério, e levando em
conta a situação atual, Roche calcula que o peso de Ambev poderia chegar a 6%,
enquanto a participação de PDG poderia cair para menos de 0,5%.
Para Marcelo de Jesus, superintendente de gestão de ativos de terceiros da Caixa
Econômica Federal, a mudança é positiva tanto por procurar deixar o Ibovespa mais
representativo da economia como por torná-lo potencialmente menos volátil, já que
exclui ações que valem menos de R$ 1,00.
Roche lembra que o mercado, principalmente após a crise, já vinha tentando driblar as
distorções, buscando outros índices de referência, no caso principalmente de
investidores institucionais, ou fazendo ajustes nos cálculos dos múltiplos, a fim de
torná-los mais comparáveis a indicadores internacionais. "O caso OGX foi a gota d'água
e trouxe pressão para a mudança", diz. Isso por conta também de distorções geradas em
mercados como o futuro e o de aluguéis.
"O mercado hoje não está operando na sua normalidade. Os fundamentos foram
deixados de lado e está muito técnico", afirma Roche. Um exemplo é o deságio com que
o Ibovespa futuro está operando em relação ao mercado à vista. "Isso é um absurdo. O
mercado futuro deveria operar com prêmio, já que ele é resultado do mercado à vista
mais o juro do período."
Otávio Vieira, sócio da Fides Asset Management, destaca o forte aumento das taxas de
aluguel, como resultado das distorções causadas por OGX. Com o Ibovespa futuro
abaixo do mercado à vista, abriu-se uma oportunidade de arbitragem com a compra do
índice futuro e venda do mercado à vista. Só que para vender o Ibovespa, os
investidores alugam os papéis do índice. A demanda saltou, principalmente de OGX,
faltou ação e as taxas subiram. Ele cita o caso de Copel, cuja taxa alcançou 25%, apesar
de não sofrer risco de solvência nem de fluxo de caixa. Para gestores de fundos
long/short, isso causa problema, destaca Vieira, já que o hedge é feito com venda de
índice futuro ou ação alugada.
Na visão de Walter Mendes, sócio e gestor da Cultinvest, o Ibovespa só não se tornou
completamente irrelevante para os investidores por conta do mercado futuro. Segundo
ele, quem olha para o Ibovespa hoje é em sua grande maioria a pessoa física. E a
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mudança na metodologia não deve mudar esse perfil, acredita. Ele destaca, contudo, que
o estrangeiro, que hoje presta mais atenção ao índice MSCI Brazil, pode ser estimulado
a aumentar as operações com o Ibovespa futuro, após as mudanças.
Mendes lembra, ainda, que muitas gestoras deixaram, ao longo do tempo, de ter um
índice como referencial dos fundos. Vieira, da Fides, pondera que o Ibovespa ainda tem
uma relevância muito grande para toda a indústria de gestão de recursos em bolsa, e não
só para a parcela pequena de fundos indexados. "O Ibovespa é usado como referência de
performance para fundos de ações ativos, livre, de previdência e até fundações."
Esses gestores não são obrigados a replicar a carteira, explica Vieira, mas evitam ficar
descolados do Ibovespa, já que se propõem a entregar um retorno acima do índice.
Quando a ação da OGX caiu para alguns reais ou centavos, a preocupação cresceu, diz o
sócio da Fides. Qualquer transação hoje envolvendo OGX gera uma variação grande
para o papel e, consequentemente, para o índice. E aí surge o dilema: comprar um papel
com baixo fundamento ou correr o risco de descolar do índice, para o lado negativo?
"Para os gestores, o mercado funciona melhor sem distorções. Quanto mais eficiente,
melhor", diz Vieira. Além disso, destaca, é importante ter um índice que reflita melhor o
PIB. E ainda que a bolsa já conte com índices que considerem o valor de mercado,
como o IBrX, por ser a principal referência, especialistas defendem que o Ibovespa
precisava passar por mudanças. Roche, da Modal, lembra que o Ibovespa é o único
ativo com liquidez no mercado futuro e de ETF.
Há quem critique a mudança. É o caso de Marcelo Sá Earp, sócio da gestora First Value
Capital. Uma das poucas vantagens do Ibovespa, destaca, era o fato de ele nunca ter
passado por mudanças, apesar de carregar distorções desde sua criação. Mas isso,
segundo ele, não significa que ele deveria continuar sendo o índice mais relevante da
bolsa brasileira. "A BM&FBovespa está perdendo uma grande oportunidade de
promover mudanças mais profundas na estrutura de índices de bolsa no Brasil."
A melhor saída, segundo Earp, era estimular a migração do índice de referência de
mercado para o IBrX, criado em 1994 com uma metodologia mais consistente, por meio
de mecanismos como incentivo de corretagem para formadores de mercado de futuros e
facilidades na criação de ETFs. "Entendo que a bolsa possui interesses em manter o
Ibovespa como principal índice hoje. Mas a incongruência no mercado brasileiro, na
qual a BM&FBovespa define a metodologia e ao mesmo tempo é a empresa privada que
se beneficia do seu uso, pode gerar um viés para a metodologia. Muitos veem isso no
peso dado ao número de negócios."
Earp chama atenção ainda para a possibilidade de novas mudanças aconteceram por
quaisquer circunstâncias de mercado, ainda que admita que a nova metodologia melhora
de fato o índice.
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