UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE MEDICINA E FISIOTERAPIA DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA E FARMACOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FARMACOLOGIA ROSA ELAYNE MARQUES DE FREITAS AVALIAÇÃO BIOLÓGICA E DE FATORES GÊNICOS MODULADOS PELOS RETINOIDES NO CICLO CELULAR, PROLIFERAÇÃO, DIFERENCIAÇÃO, APOPTOSE E NECROSE EM CÉLULAS DE CRIPTA INTESTINAL DE RATO FORTALEZA 2014 ROSA ELAYNE MARQUES DE FREITAS AVALIAÇÃO BIOLÓGICA E DE FATORES GÊNICOS MODULADOS PELOS RETINOIDES NO CICLO CELULAR, PROLIFERAÇÃO, DIFERENCIAÇÃO, APOPTOSE E NECROSE EM CÉLULAS DE CRIPTA INTESTINAL DE RATO Dissertação apresentada à coordenação do Curso de Pós-Graduação em Farmacologia da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Farmacologia. Área de Concentração: Farmacologia Orientador: Prof. Dr. Alexandre Havt Bindá FORTALEZA 2014 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca de Ciências da Saúde F938e Freitas, Rosa Elayne Marques de. Avaliação biológica e de fatores gênicos modulados pelos retinoides no ciclo celular, proliferação, diferenciação, apoptose e necrose em células de cripta intestinal de rato. / Rosa Elayne Marques de Freitas. – 2014. 90 f.: il. color., enc.; 30 cm. Dissertação (mestrado). – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Medicina, Departamento de Fisiologia e Farmacologia, Programa de Pós-Graduação em Farmacologia, Mestrado em Farmacologia, Fortaleza, 2014. Área de Concentração: Farmacologia. Orientação: Prof. Dr. Alexandre Havt Bindá. 1. Desnutrição. 2. Células Epiteliais. 3. Vitamina A. I. Título. CDD 615.73 ROSA ELAYNE MARQUES DE FREITAS AVALIAÇÃO BIOLÓGICA E DE FATORES GÊNICOS MODULADOS PELOS RETINOIDES NO CICLO CELULAR, PROLIFERAÇÃO, DIFERENCIAÇÃO, APOPTOSE E NECROSE EM CÉLULAS DE CRIPTA INTESTINAL DE RATO Defesa de Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Farmacologia, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Farmacologia. Aprovada em: ____ / _____ / _____. BANCA EXAMINADORA ___________________________________________ Prof. Dr. Alexandre Havt Bindá (Orientador) ___________________________________________ Prof. Dr. Aldo Ângelo Moreira Lima _______________________________________ Prof. Dr. Marcos Fábio Gadelha Rocha A Deus. Aos meus amados pais. AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço à Deus, pelo dom da vida, da inteligência e da sabedoria tão necessários nesta caminhada e pela coragem de enfrentar todas as dificuldades. À minha família pelo amor, compreensão e o apoio em todos os momentos À Universidade Federal do Ceará, e a todos os que fazem parte do Programa de Pós-Graduação em Farmacologia. Ao meu orientador, professor Dr. Alexandre Havt Bindá, pela orientação, confiança e apoio durante todas as etapas do mestrado. Ao professor Aldo Ângelo Moreira Lima, agradeço pela oportunidade de trabalhar no seu grupo de pesquisa e realizar esse trabalho no Laboratório de Doenças Infecciosas (LDI). Aos queridos colegas Mara Prata, Vinícius Alves, Paloma Cavalcante por todos os ensinamentos e boa vontade em ajudar. Sem vocês não seria possível a realização desse trabalho. Aos colegas de laboratório, Pedro Quintela e Marco Clementino, pela grande ajuda e apoio. E todos os outros bolsistas do laboratório por toda presteza e incentivo. Ao professor Diego Wilke e as pesquisadora Josiane Quetz e Alba Fabíola por toda assistência e pela contribuição com seus conhecimentos. Meu imenso agradecimento a doutoranda em Farmacologia Camila Fernandes, quem me ajudou, apoiou e incentivou nos momentos de maior necessidade. Sua presença foi de grande importância para a realização deste trabalho. Meu grande agradecimento ao doutorando em Farmacologia, Adelvane Rodrigues, pela participação na revisão da dissertação, pelas relevantes contribuições, pelo incentivo e amizade. Ao meu namorado, César Vieira, pela imensa paciência, apoio e companheirismo. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão da bolsa de pesquisa. E ao INCT-IBISAB pelo financiamento da pesquisa. RESUMO A mortalidade infantil afeta milhões de crianças em todo mundo e a desnutrição contribui com cerca de um terço dessa mortalidade. A vitamina A já é utilizada no tratamento da desnutrição infantil. Contudo, poucos ou nenhum estudo fora realizado, ao nível celular, para avaliar o impacto da suplementação com a vitamina A em células epiteliais intestinais com desnutrição proteica in vitro. Desse modo, objetivamos demonstrar os efeitos da desnutrição e do tratamento com retinoides nos processos de proliferação, apoptose/necrose, ciclo celular e diferenciação celular, assim como na ativação das vias de sinalização em células IEC6 de rato com desnutrição proteica. Demonstramos que a desnutrição diminuiu a proliferação celular nos tempos de 6, 12, 24 e 48 horas. Em adição, nos tempos de 24 e 48 horas a suplementação com palmitato de retinol intensificou esta redução em comparação ao grupo desnutrido. Contudo, a diminuição da proliferação não estava relacionada à morte celular. Na verdade, o palmitato de retinol reduziu apoptose no tempo de 48 horas após a indução de desnutrição. Adicionalmente, a desnutrição estimulou a quiescência celular e a mesma foi intensificada pelo retinol identificada pelo aumento do percentual de células na fase G0/G1 e diminuição dos percentuais de células nas fases S e G2/M, principalmente nos tempos entre 24 e 48 horas. Para verificar se a desnutrição, associada ou não à suplementação dos retinoides, estimulava a diferenciação celular foi realizada a análise da transcrição gênica dos marcadores específicos FABP e IAP no período de 42 horas. Os dois retinoides testados aumentaram em aproximadamente cinco vezes a expressão dos mRNAs de FABP e IAP. Visto que a diferenciação fora estimulada, foram verificadas quais as vias de sinalização intracelular, acopladas à ativação da proteína G, estavam ativadas. Os resultados deste trabalho demonstraram que a desnutrição proteica diminuiu a transcrição gênica de c-Jun, STAT3, MEF2C, e ATF2, mas aumentou a expressão dos mRNAs de GLI-3 e c-Fos em relação ao grupo nutrido. Entretanto, os retinoides aumentaram a transcrição dos mRNAs de ELK-1, SRF, c-Jun, FOXO, STAT3, ATF2, GLI-3 e NF-κB em relação com o grupo desnutrido. Deste modo, este trabalho mostrou que a desnutrição interferiu na proliferação estimulando a quiescência celular. Porém, o tratamento com os retinoides intensificou a quiescência diminuindo a apoptose com estimulação da diferenciação celular associado com a ativação das vias moleculares do ATF2, MAPK/ERK/JNK, IL-6, Hedgehog, PI3K/AKT e NF-κB. Palavras-chave: Desnutrição, Células epiteliais intestinais, e Vitamina A, ABSTRACT Infant mortality affects millions of children around the world and malnutrition contributes about one third of this mortality. Vitamin A is already used in the treatment of childhood malnutrition. However, few or no study has been done, carried out at the cellular level, to assess the impact of vitamin A supplementation in intestinal epithelial cells under in vitro protein malnutrition. Thus, we aimed to demonstrate the effects of malnutrition and treatment with retinoids in the processes of proliferation, apoptosis/necrosis, cell cycle and cell differentiation as well as activation of signaling pathways in IEC-6 rat cells under protein malnutrition. We demonstrated that malnutrition decreased cell proliferation in periods of 6, 12, 24 and 48 hours. In addition, retinyl palmitate treatment intensified the decrease of cell proliferation when compared to the malnourished group in the periods of 24 and 48 hours after supplementation. However, the reduction in proliferation was not related to cell death. Indeed, retinyl palmitate reduced apoptosis in the period of 48 hours after induction of malnutrition. Additionally, malnutrition stimulated cell quiescence, and the same was enhanced by retinol, which was identified by the increase in the percentage of cells in G0/G1 phase and the reduction of the percentage of cells in S phase and G2/M, especially in periods of 24 and 48 hours. To check if malnutrition, with or without supplementation of retinoids, was stimulating cell differentiation, we evaluated the gene transcription of the specific markers FABP and IAP within 42 hours. Both retinoids tested increased approximately 5-fold the expression of FABP and IAP mRNAs. Knowing that differentiation had been stimulated, we decided to check which intracellular signaling pathways, coupled to the activation of G proteins, were activated. Our results demonstrated that protein malnutrition decreased gene transcription of c-Jun, STAT3, MEF2C and ATF2, but increased the expression of the GLI-3 and c-Fos mRNAs in relation to the nourish group. However, retinoids increased the transcription of ELK-1, SRF, c-Jun, FOXO, STAT3, ATF2, GLI-3, NFkB in relation to the malnourished group. Thus, this study showed that cell malnutrition interfered with cell proliferation stimulating cell quiescence. However, retinoids treatment intensified cell quiescence, decreased IEC-6 apoptosis and stimulated cell differentiation associated with the activation of the molecular pathways of ATF2, MAPK/ERK/JNK, IL-6, Hedgehog, PI3K/AKT and NF-kB. Key words: malnourish, intestine epithelial cells and Vitamin A. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 13 1.1 DESNUTRIÇÃO ...................................................................................................................................... 13 1.1.1 Epidemiologia ............................................................................................................................. 13 1.1.2 Classificação da desnutrição ................................................................................................ 14 1.1.3 Fatores que influenciam na desnutrição ......................................................................... 15 1.1.4 Consequências da desnutrição ............................................................................................. 16 1.2 ESTRUTURA INTESTINAL .................................................................................................................... 16 1.2.1 Intestino delgado: estrutura anatomofuncional e principias vias de sinalizações .................................................................................................................................................. 16 1.2.2 Consequências da desnutrição na função intestinal .................................................. 21 1.3 VITAMINA A .......................................................................................................................................... 22 1.3.1 Funções .......................................................................................................................................... 22 1.3.2 Suplementação com vitamina A .......................................................................................... 23 1.3.3 Aspectos farmacológicos do retinol ................................................................................... 24 1.3.4 Mecanismos de ativação celular pelos retinoides ....................................................... 26 1.4 VIAS DE SINALIZAÇÃO ......................................................................................................................... 27 1.4.1 Ativação de MAPK por proteínas G .................................................................................... 29 1.4.2 Envolvimento da MAPK no ciclo celular, proliferação e apoptose de células intestinais. .................................................................................................................................................... 30 2 RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA .......................................................................................... 33 3 OBJETIVOS ................................................................................................................................ 34 3.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................................................. 34 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..................................................................................................................... 34 4 MATERIAIS E MÉTODOS ....................................................................................................... 35 4.1 LINHAGEM CELULAR ........................................................................................................................... 35 4.2 CULTIVO CELULAR E REAGENTES ..................................................................................................... 35 4.3 PLAQUEAMENTO CELULAR E TRATAMENTO COM VITAMINA A EM CÉLULAS DESNUTRIDAS . 36 4.4 ENSAIO DE PROLIFERAÇÃO CELULAR .............................................................................................. 37 4.5 ANÁLISE DE APOPTOSE E NECROSE POR CITÔMETRIA DE FLUXO ................................................ 38 4.6 ANALISE DO PERFIL DO CICLO CELULAR POR CITOMETRIA DE FLUXO ...................................... 40 4.7 ANÁLISE DA TRANSCRIÇÃO GÊNICA RELACIONADA AOS GENES MARCADORES DE DIFERENCIAÇÃO CELULAR E VIAS DE ATIVAÇÃO INTRACELULAR ............................................................ 42 4.8 ANÁLISE ESTATÍSTICA ........................................................................................................................ 44 5 RESULTADOS ........................................................................................................................... 45 5.1 EFEITO DA DESNUTRIÇÃO E TRATAMENTO COM RETINOL E PALMITATO DE RETINOL NA PROLIFERAÇÃO CELULAR. .............................................................................................................................. 45 5.2 EFEITO DO TRATAMENTO COM RETINOL E PALMITATO DE RETINOL NA APOPTOSE E NECROSE EM CÉLULAS DESNUTRIDAS. .......................................................................................................................... 46 5.3 EFEITO DA DESNUTRIÇÃO E DO TRATAMENTO COM RETINOL E PALMITATO DE RETINOL NO CICLO CELULAR. ............................................................................................................................................... 48 5.4 ANÁLISE DA DIFERENCIAÇÃO CELULAR ESTIMULADA PELO TRATAMENTO COM RETINOL E PALMITATO DE RETINOL EM CÉLULAS DESNUTRIDAS. .............................................................................. 50 5.5 ANÁLISE DAS VIAS DE SINALIZAÇÃO DESENCADEADAS PELOS TRATAMENTOS COM RETINOL E PALMITATO DE RETINOL EM CÉLULAS DESNUTRIDAS. .............................................................................. 52 6 DISCUSSÃO ............................................................................................................................... 55 7 CONCLUSÃO ............................................................................................................................. 67 8 PERSPECTIVAS ........................................................................................................................ 68 9 BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 69 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Anatomia do epitélio do intestino delgado e esquema da diferenciação celular a partir das células indiferenciadas. ................................................................. 18 Figura 2 - Ilustração de algumas vias de sinalização envolvidas na modelagem do epitélio intestinal. ......................................................................................................... 20 Figura 3 - Mecanismo de ação da via Hedgehog na estrutura intestinal...................... 21 Figura 4 - Principais formas de Vitamina A. ............................................................... 24 Figura 5 - Metabolismo intracelular do retinol e ação nuclear. ................................... 27 Figura 6 - As cascatas convencionais da MAPK e seus efeitos. ................................. 29 Figura 7 - Estrutura química das duas formas de Vitamina A utilizada nos experimentos. ............................................................................................................... 36 Figura 8 - Esquema do tratamento das células IEC-6. ................................................. 37 Figura 9 – Figura representativa da análise da frequência de células em apoptose e necrose. ........................................................................................................................ 40 Figura 10 – Figura ilustrativa do dot plot de exclusão das células agregadas. ............ 41 Figura 11 – Figura representativa da análise do ciclo celular no modelo de Watson. . 42 Figura 12 - Tempo-efeito do tratamento com retinol ou palmitato de retinol sobre a proliferação celular em células desnutridas. ................................................................ 46 Figura 13 - Cinética da análise de apoptose e necrose dos grupos nutridos, desnutridos e tratados com vitamina A. .......................................................................................... 47 Figura 14 - Cinética da distribuição nas fases do ciclo celular das células desnutridas e tratadas com retinol e palmitato de retinol. .................................................................. 49 Figura 15 – Expressão dos principais genes relacionados com a diferenciação celular nas células desnutridas tratadas com retinol e palmitato de retinol. ............................ 51 Figura 16 - Efeito do retinol e do palmitato de retinol sobre a transcrição genica de mediadores das vias de sinalização celular em células IEC-6 desnutridas. ................. 53 Figura 17 - Efeito do retinol e do palmitato de retinol sobre a transcrição genica de mediadores das vias de sinalização celular em células IEC-6 desnutridas. ................. 54 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Distribuição em regiões da prevalência (%) da desnutrição no Brasil em 2013. ............................................................................................................................. 14 Tabela 2 – Funções de algumas vias de sinalização importantes para o trato gastrointestinal. ............................................................................................................ 32 Tabela 3 - Sequência dos iniciadores utilizados. ......................................................... 44 Tabela 4 – Valores das médias ± E.P.M das análises da transcrição dos genes relacionados à diferenciação em células desnutridas tratadas com retinol ou Palmitato de retinol. ..................................................................................................................... 50 Tabela 5: Resumo dos resultados da transcrição gênica para as vias analisadas em comparação ao grupo desnutrido. ................................................................................ 66 1 INTRODUÇÃO 1.1 1.1.1 Desnutrição Epidemiologia A mortalidade de crianças menores de cinco anos vem diminuindo no mundo, passando de 12,6 milhões em 1990 para 6,6 milhões em 2012. Isto significou uma redução de cerca de 17.000 mortes a cada dia. Desde 1990, a taxa global de mortalidade diminuiu 47% até 2012. Todas as regiões, exceto a África Subsaariana e a Oceania reduziram sua taxa de mortalidade infantil em 50% ou mais (UNICEF et al., 2013). As principais causas de mortalidade entre as crianças menores de cinco anos incluem: pneumonia (17%), complicações de parto prematuro (15%), as complicações durante o parto (10%), diarreia (9%) e malária (7%). Globalmente, mais de 40% das mortes de crianças menores de cinco anos são atribuídas à desnutrição (UNICEF et al., 2013). Os três principais tipos de desnutrição são classificados a partir de dados antropométricos: baixo peso para idade (P/I - “underweight” ou desnutrição ponderal - o indicador de desnutrição mais utilizado no brasil), baixa estatura para idade (E/I “stunting” ou desnutrição crônica) ou baixo peso para estatura (P/E - “wasting” ou desnutrição aguda) (COUTINHO; GENTIL; TORAL, 2008; GOULART, 1997; UNICEF_BRASIL, 2006). De acordo com estimativas das Nações Unidas, em 2011, cerca de 100 milhões (16%) de crianças menores de 5 anos em todo mundo, apresentavam desnutrição ponderal, outras 160 milhões (26%) apresentavam desnutrição crônica e, em menor grau a desnutrição aguda, afetando aproximadamente 51 milhões de crianças (8%) (UNICEF; WHO; WORLD BANK, 2012; UNICEF; WHO, 2013). Em 2010, a Organização Mundial de Saúde atribuiu mais de um terço de todas as mortes infantis em todo o mundo à desnutrição, principalmente ao déficit ponderal. Apesar das prevalências de desnutrição infantil ponderal e crônica estarem diminuindo ao longo dos anos, o progresso geral é insuficiente e milhões de crianças ainda continuam em risco (WHO et al., 2010). 13 No Brasil, a análise no Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional do Ministério da Saúde revela que, em 2013, a taxa de desnutrição ponderal, crônica e aguda estavam estimadas em 4.28% 10.18% e 4.71%, respectivamente. No entanto, a distribuição da desnutrição apresenta diferenças regionais, onde o Norte apresenta as maiores prevalências (TABELA 1). Tabela 1 – Distribuição em regiões da prevalência (%) da desnutrição no Brasil em 2013. Fonte: SISVAN – Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional – Ministério da Saúde (BRASIL, 2014). 1.1.2 Classificação da desnutrição A dieta necessária para um indivíduo se manter nutrido deve conter uma quantidade adequada de energia (calorias), água, proteína, carboidrato, lipídios, vitaminas e sais minerais de acordo com as necessidades de cada indivíduo. O estado patológico da desnutrição ocorre quando órgãos e tecidos não se encontram em bom funcionamento e saudáveis devido à carência de nutrientes em quantidade adequada para o mantimento das suas funções vitais (WHO et al., 2010). O desenvolvimento de um estado de desnutrição implica na sequência das seguintes situações: ingestão insuficiente dos elementos dietéticos, redução nas reservas corporais, deterioração de funções e lesões morfológicas (MOLINA; PELISSARI; FEIRHMANN, 2009). A falta de proteínas e/ou energia numa dieta ocasiona a Desnutrição Proteico-Energética (DPE). Existem três doenças associadas a DPE, são elas o marasmo, o kwashiokor e o kwashiorkor marasmático (MOLINA; PELISSARI; FEIRHMANN, 2009). O marasmo é a mais comum das síndromes e caracteriza-se clinicamente 14 pela depleção dos estoques de gordura subcutânea, perda de massa muscular e ausência de edema. Provém de uma adaptação fisiológica do corpo em resposta à privação severa de calorias e nutrientes. (GROVER; EE, 2009). O kwashiorkor é uma síndrome de difícil identificação comparada ao marasmo, pois o indivíduo tem um peso quase normal para a idade. Resulta de uma dieta que consiste de uma ingestão calórica razoavelmente normal porém deficiente de proteína (SIDRANSKY, 1976). É caracterizado pela presença de edema, abdômen distendido e hepatomegalia. (AHMED; RAHMAN; CRAVIOTO, 2009; JAHOOR et al., 2008). Já o kwashiorkor marásmico apresenta um quadro misto, com características de raquitismo e edema (GROVER; EE, 2009). 1.1.3 Fatores que influenciam na desnutrição De acordo com o manual de atendimento da criança com desnutrição grave em hospitais públicos, a desnutrição apresenta-se como uma doença de natureza sócio-político, ambiental, econômica e, sobretudo derivada da pobreza. A desnutrição grave acomete todos os órgãos da criança, tornando-se crônica e levando a óbito caso não seja tratada adequadamente (BRASIL, 2005). Ressalta-se que o estado nutricional da mãe no momento da concepção e durante a gravidez é outro fator importante para o crescimento e desenvolvimento fetal. (BLACK et al., 2008). A falta de aleitamento materno até seis meses, introdução tardia de alimentos complementares em quantidade e qualidade inadequadas, a absorção prejudicada de nutrientes por infecções e parasitoses intestinais também são tidos como agentes propiciadores da desnutrição (SAWAYA, 2006). Repetidos episódios de doenças infecciosas graves na primeira infância, tais como, diarreia, pneumonia e malária causam uma acentuada perda de peso, levando então à desnutrição. A diarreia infecciosa, no entanto, revela-se como o mais importante sintoma determinante da desnutrição a qual, por sua vez, aumenta a incidência de duração de novas infecções intestinais, ocasionando um ciclo vicioso de diarreia-desnutrição (CHECKLEY et al., 2008; FAGUNDES-NETO, 2013; GUERRANT et al., 2008). Todas essas doenças, associadas com a desnutrição aumentam o risco de mortalidade infantil (CAULFIELD et al., 2004; WHO et al., 2010). 15 Ressalta-se que o ciclo vicioso da diarreia-desnutrição é caracterizado pelo consumo inadequado de alimentos, aumento de doenças, perda de peso, baixa imunidade, danos na mucosa gastrointestinal, perda de apetite, má absorção do alimento e alterações importantes no metabolismo (SAWAYA, 2006). 1.1.4 Consequências da desnutrição A nutrição adequada é essencial na infância para garantir o crescimento saudável, a formação dos órgãos e realização das suas funções adequadas, um forte sistema imunológico e o desenvolvimento neurológico e cognitivo (UNICEF; WHO; WORLD BANK, 2012). A exposição à desnutrição durante períodos críticos do início da vida pode ter consequências a longo prazo e danos irreversíveis para o desenvolvimento futuro (HORTON, 2008). A privação nutricional precoce está associada com o retardo no crescimento, desenvolvimento físico e mental e baixo desempenho escolar. Estudos feitos com animais também comprovam a deficiência cognitiva devido a uma prolongada desnutrição proteico-energética (CHAUDHARY et al., 2013; RICHARD et al., 2012; WHO et al., 2010) O sistema imunológico também se apresenta comprometido em crianças desnutridas, com atrofia dos órgãos linfoides (no timo em particular) e a capacidade diminuída da proliferação dos linfócitos T (CALDER, 2013; PRENTICE, 1999). Contraditoriamente, estudos recentes têm reportado que a obesidade e algumas doenças crônicas, tais como diabetes e outras, se manifestam na vida adulta estando associadas a uma prévia desnutrição infantil (BLACK et al., 2013; UAUY et al., 2008) (SAWAYA, 2006). 1.2 1.2.1 Estrutura intestinal Intestino delgado: estrutura anatomofuncional e principias vias de sinalizações O epitélio gastrointestinal forma uma barreira seletiva que separa os eventos homeostáticos do interstício do lúmen intestinal. A membrana plasmática da célula epitelial intestinal serve como uma barreira efetiva para a maior parte dos 16 solutos hidrofílicos. Esta barreira deve ser seletivamente permeável para permitir a absorção de nutrientes, íons e líquidos através do epitélio intestinal ao mesmo tempo que deve estar equipada com mecanismos de defesa contra ameaças ambientais locais como, por exemplo, agentes patogênicos invasores (CLAYBURGH; SHEN; TURNER, 2004; SCHENK; MUELLER, 2008). A barreira intestinal compreende uma monocamada de células epiteliais que apresenta um número de adaptações especializadas para a proteção, tais como a formação de junções celulares que vedam os espaços paracelulares e revestem a superfície apical em conjunto com a secreção de mucinas e agentes antimicrobianos, que impedem o acesso direto dos microrganismos pela mucosa intestinal (CLAYBURGH; SHEN; TURNER, 2004; SCHENK; MUELLER, 2008). A arquitetura do intestino delgado é composta de vilosidades contíguas e de criptas. As vilosidades, que se estendem para o lúmen intestinal, são revestidas por uma única camada de epitélio colunar que contém células terminalmente diferenciadas. As criptas são invaginações epiteliais na mucosa do intestino responsáveis pelo potencial proliferativo deste tecido (SCOVILLE et al., 2008). Nas criptas residem as células-tronco intestinais (CTI), que possuem duas propriedades funcionais: a capacidade de perpetuar-se ao longo de um período prolongado de tempo (auto-renovação) e dispor da capacidade de gerar todas as células diferenciadas do tecido de origem (multipotência) (Figura 1). Ou seja, são responsáveis por promover a constante renovação da população celular do epitélio intestinal, além de não ascender em direção à luz intestinal (RICCI-VITIANI et al., 2009). Ademais, as CTIs se auto renovam ao longo da vida e produzem um tipo especial de células denominadas como progenitoras ou transitórias, as quais preenchem o restante das criptas. As células transitórias tem uma capacidade de autorenovação muito limitada, após três a quatro divisões celulares a sua prole inevitavelmente se diferencia a uma das linhagens de células maduras (Figura 1) (RADTKE; CLEVERS, 2005; SOUZA, 2003). Conforme as células saem das criptas, movendo-se na direção apical, se diferenciam em enterócitos absortivos ou qualquer um dos três tipos de células 17 secretórias: células caliciformes, células de paneth ou enteroendócrinas. Este processo é acompanhado por uma redução do ritmo proliferativo e apoptose no ápice da vilosidade (FIGURA 1) (JIANG; EDGAR, 2012; PINHO, 2009; UMAR, 2010). Figura 1 - Anatomia do epitélio do intestino delgado e esquema da diferenciação celular a partir das células indiferenciadas. Fonte: Radtke e Clevers (2005). Os enterócitos ou células absortivas, conhecidos ainda como células colunares, são as mais abundantes entre os tipos celulares. Essas células apresentam borda em escova, caracterizada por um densa matriz de vilosidades em sua superfície apical (JIANG; EDGAR, 2012). As células caliciformes assumem a morfologia permanente de um cálice, pela contínua produção e acúmulo temporário de vesículas de secreção glicoproteica, composta principalmente de mucina na região apical, e se localizam distribuídas entre as células absortivas (enterócitos). Por produzirem grande quantidade de muco, têm como função lubrificar e proteger o epitélio intestinal. As mucinas adicionam uma barreira física ao epitélio intestinal, ajudando a conter bactérias comensais no lúmen do intestino e impedindo a sua adesão nas células epiteliais (RICCI-VITIANI et al., 2009; SCHENK; MUELLER, 2008). 18 As células de Paneth diferem dos outros tipos de células diferenciadas uma vez que se encontram dispersas na parte inferior da cripta e não seguem o percurso migratório ascendente. Elas são responsáveis por secretar proteínas antibacterianas (lisozima e criptidinas ou defensinas) que impedem ainda mais o acesso direto dos microrganismos à mucosa intestinal, agindo assim como reguladores da densidade microbiana e protetores de células-tronco próximas (RICCI-VITIANI et al., 2009; SCHENK; MUELLER, 2008). Por último, encontra-se ainda as células enteroendócrinas (dos quais existem muitos subtipos), menos abundantes, menores e que secretam vários hormônios intestinais como gastrina, motilina, grelina e peptídeo intestinal vasoativo (PIV), além de catecolaminas (PINHO, 2009). Sabe-se que a modelagem do epitélio intestinal depende da interação entre epitélio e mesênquima, que é controlada por várias vias de sinalização intracelular, tais como a via de sinalização Hedgehog (Hh), da proteína morfogenética óssea (BMP), das vias, WNT e Notch, e ainda do fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), que são responsáveis por esta comunicação (FIGURA 2). A via PDGF ajuda a controlar o comportamento do mesênquima e a forma da vilosidade, porém não influencia na proliferação e diferenciação do epitélio (CROSNIER; STAMATAKI; LEWIS, 2006). A via WNT controla o sistema das CTIs, mantendo-as em um estado contínuo de proliferação. Quando essa via está bloqueada as criptas tendem a desaparecer. Porém, quando está ativada elas proliferam. A via BMP, por sua vez, é expressa no mesênquima e é o principal fator que medeia a ação da via Hh, ao bloquear a formação de criptas ectópicas, a via WNT e a proliferação celular na junção cripta/vilo. Desta forma, permite que haja a diferenciação celular (FIGURA 3a). A via Notch parece ter uma dupla função. Age juntamente com a via WNT para manter a taxa proliferativa além de agir nas células progenitoras determinando a decisão da linhagem de células diferenciadas entre enterócitos ou células secretórias (MEDEMA; VERMEULEN, 2011). A via Hh é importante na regulação do desenvolvimento e homeostase do intestino, participando da formação das vilosidades, garantindo a altura e localização adequada do vilo e regulando a migração celular (TANG et al., 2006a; ZACHARIAS et al., 2011). 19 Figura 2 - Ilustração de algumas vias de sinalização envolvidas na modelagem do epitélio intestinal. Fonte: Medema e Vermeulen (2011). A sinalização Hh, que tem atividade tanto autócrina quanto parácrina, depende da interação entre as proteínas PTCH (Patched) e SMO (Smoothened). A ativação desta via, no intestino, ocorre através de 2 proteínas homólogas: Sonic Hedgehog (SHH) ou Indian Hedgehog (IHH). Na ausência de um sinal de SHH ou IHH, PTCH mantém SMO inativa. Porém, quando se liga a SHH ou IHH essa inibição é removida. A SMO liberada ativa os fatores de transcrição GLI (1, 2 e 3), os quais migram diretamente para o núcleo para realizar a transcrição de genes alvo da via Hh (FIGURA 3b) (HUANG et al., 2013; KATOH; KATOH, 2006). Os fatores de transcrição GLI podem ativar diversos genes (CyclinD1, N-Myc, Bcl2, Bmi1 e Snail) envolvidos na regulação do ciclo celular, proliferação, sobrevivência, auto-renovação e interação mesênquima-epitélio (RUIZ I ALTABA; MAS; STECCA, 2007). A inibição da via Hh tem efeitos no desenvolvimento intestinal, levando a uma ausência completa das vilosidades, a persistência de um epitélio bastante 20 proliferativo, com ativação aumentada da via WNT, e deficiência de células propriamente diferenciadas, indicando assim seu envolvimento da formação das vilosidades intestinais (CROSNIER; STAMATAKI; LEWIS, 2006; KOSINSKI et al., 2010; MADISON et al., 2005). Figura 3 - Mecanismo de ação da via Hedgehog na estrutura intestinal Fonte: Medema e Vermeulen (2011). 1.2.2 Consequências da desnutrição na função intestinal A desnutrição desencadeia ao nível intestinal uma diminuição da maturação dos enterócitos, além de ocasionar um retardo no crescimento e redução da proliferação celular (GEYRA et al., 2002). Estudos relatam que a privação de nucleotídeos dietéticos leva a uma diminuição no conteúdo de enzimas marcadoras da maturação intestinal (fosfatase alcalina, a leucina-aminopeptidase, maltase, sucrase e lactase). Esses efeitos aumentam progressivamente no sentido do ápice da vilosidade enquanto há pouco efeito sobre a zona da cripta. Com base nisto, apoia-se a ideia de que nucleotídeos dietéticos afetam o estado de maturação do epitélio do intestino delgado (ORTEGA, M. A., GIL, A., SÁNCHEZ-POZO, 1995). Estudos in vivo e in vitro reportam que a desnutrição também afeta a morfologia intestinal, diminuindo a quantidade e altura das vilosidades, a 21 profundidade das criptas, a resistência transmucosa e a proliferação celular, além de aumentar a apoptose epitelial (UENO et al., 2011). Além disso, também leva a uma atrofia do intestino delgado e diminui a atividade das enzimas lactase e aminopeptidase A (LYKKE et al., 2013). Sobretudo, sabe-se que as alterações intestinais da desnutrição não são irreversíveis, pois uma única célula de cripta é suficiente para possibilitar a regeneração da cripta e consequentemente da vilosidade. Desta forma, se ocorrer alguma lesão que afete algumas criptas/vilos, as células sobreviventes podem regenerar um número suficiente de criptas, a fim de manter a homeostase epitelial (UMAR, 2010). 1.3 1.3.1 Vitamina A Funções A vitamina A (VA) foi descoberta por volta de 1906, sendo utilizada pela primeira vez em 1947. A vitamina A é uma vitamina solúvel em lipídios que é necessária para o bom funcionamento de um conjunto diversificado de atividades metabólicas e fisiológicas: visão, hematopoiese, desenvolvimento embrionário, diferenciação celular epitelial e função do sistema imune. O seguimento estrutural em comum dos retinoides são o anel de cicloexenil (anel β-ionona) e a cadeia lateral isoprenoide. Todas as atividades da VA estão ligadas a essas duas características estruturais (CHAPMAN, 2012). Dentre suas principais funções, a VA modula a visão noturna por meio da conversão do retinol à 11-cis-retinal na retina e, combinado à proteína opsina forma as rodopsinas, que são o pigmento visual dos bastonetes que, por sua vez, são os principais elementos para a visão em baixa luminosidade (LINTIG, 2012). Dados clínicos demonstram que VA também está envolvida na proliferação e diferenciação celular, agindo tanto topicamente quanto sistemicamente, além de normalizar o epitélio hiperproliferativo (CHELI et al., 2003; LAMPEN et al., 2000; ORFANOS et al., 1997). Ao nível celular não há um consenso sobre o efeito da VA na produção de espécies reativas de oxigênio (EROS). Assim, sua ação parece depender do tipo celular e da dose. Portanto, a VA tem sido descrita tanto como anti- ou pró-oxidante. Embora a ação oxidante causada pelas EROS esteja relacionada à doenças, a ativação 22 dessa via ocasionada pela VA também foi relacionada com a sobrevivência e proliferação celular (LINTIG, 2012; ZANOTTO-FILHO; SCHRÖDER; MOREIRA, 2008). Outros estudos ainda apontam para a participação da VA tanto na resposta imune, com a produção de citocinas específicas e combate à infecções (BERNARD et al., 2002), quanto na melhoria da absorção de ferro (CITELLI et al., 2012). 1.3.2 Suplementação com vitamina A A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que seja dada uma dose elevada de vitamina A (50 000 a 200 000 UI , conforme a idade) para todas as crianças com desnutrição aguda grave no momento da admissão hospitalar, mesmo que elas não tenham sinais de deficiência de vitamina A. As crianças com sinais oculares de deficiência de vitamina A ou sarampo recebem até 3 doses altas em 2 semanas (WHO, 2013a). A Organização Mundial da Saúde, através do Grupo Consultivo Internacional da vitamina A (IVACG), define altas doses de vitamina A como uma dose igual ou maior do que 25 000 UI (WHO, 2013b). Alguns estudos comprovam que a suplementação da vitamina A gera impacto na redução da mortalidade infantil de diversas causas, incluindo sarampo, diarreia e problemas na visão, como cegueira e xeroftalmia (BATES, 1995). A mortalidade infantil causada especificamente por diarreia, em crianças entre 6-59 meses foi reduzida em 30% quando suplementadas com vitamina A (IMDAD et al., 2011). A suplementação de vitamina A também mostrou efeitos benéficos no tratamento de infecções do trato respiratório. No tratamento do sarampo já se tornou prática padrão usá-la em doses altas como adjuvante no tratamento, pois diminui significativamente a morbidade e mortalidade associada à doença (BENOIST et al., 2000). Entretanto, também foi reportado um aumento do risco de vômitos nas primeiras 48h da suplementação como efeito adverso (MAYO-WILSON et al., 2011). Estudos de análise de eficácia da suplementação de vitamina A verificaram que crianças com desnutrição severa conseguiram um aumento de peso após a suplementação e que o melhor tratamento se dava com baixas doses de VA, visto que os resultados de melhora são similares aos de alta dose, porém sem os eventuais efeitos colaterais. No entanto, para casos de desnutrição juntamente com sarampo, diarreia severa (Shigelosis) ou deficiência de vitamina A, o uso de uma alta dose de VA seria mais eficaz (IANNOTTI; TREHAN; MANARY, 2013; MANARY; IANNOTTI, 2012) 23 A fortificação suplementacaode produtos alimentícios, tais como óleo vegetal e produtos à base de cereais com vitamina A também é reconhecidamente uma estratégia viável para o aumento da ingestão de vitamina A. Além do que, não há problemas de toxicidade devido ao alto consumo se os níveis de fortificação forem seguidos. (AKHTAR et al., 2013; AMBRÓSIO; CAMPOS; FARO, 2006). 1.3.3 Aspectos farmacológicos do retinol O termo vitamina A é utilizado para todos os retinoides que têm atividade biológica do retinol. Assim, a molécula básica de vitamina A é o retinol e, a partir do seu metabolismo são sintetizados os retinoides funcionais (FIGURA 4). O retinol está presente em alimentos e tecidos, principalmente na forma de ésteres combinados com ácidos graxos de cadeia longa. As principais fontes dietéticas de vitamina A são a próvitamina A (na forma de carotenoides obtidos de fontes vegetais) e a pré vitamina A (retinol, retinal, ácido retinoico e ésteres de retinil) obtida de fontes animais. A vitamina A pré-formada é a mais ativa em humanos, sendo normalmente utilizada em suplementos, sob a forma de ésteres de retinil (BATES, 1995; BLOMHOFF, 1990; MAYO-WILSON et al., 2011). Figura 4 - Principais formas de Vitamina A. Fonte: Modificado de Napoli (1999). Essencialmente, a vitamina A, na forma de retinoides, é emulsificada com sais biliares, hidrolisada por várias enzimas pancreáticas e hidrolases antes da sua absorção pelas células intestinais (enterócitos). Os ésteres de retinil são 24 enzimaticamente convertidos à retinol ainda no lúmen intestinal, antes da absorção. A absorção do retinol é um processo mediado por carreadores. Acredita-se que pelo menos 2 proteínas estejam envolvidas, a proteína de membrana estimulada por ácido retinoico 6 (STRA6) e o receptor da proteína de ligação ao retinol 2 (RBPR2) (ALAPATT et al., 2013; BATES, 1995; REBOUL, 2013). Após a absorção, e ainda no enterócito, o retinol é complexado à proteína celular de ligação ao retinol do tipo 2 (CRBP2). Esse complexo serve como substrato para a reesterificação do retinol pela enzima lecitina:retinol aciltransferase (LRAT). O retinol que não se liga a LRAT é esterificado pela acyl CoA:retinol aciltransferase (ARAT). Os ésteres de retinil formados são, então, incorporados e transportados através de quilomicrons (QM – lipoproteínas intestinais transportadores de lipídios), que são secretados no sistema linfático (HARRISON; HUSSAIN, 2002; QUICK; ONG, 1990; ZHONG et al., 2012). Uma vez no sistema linfático, os ésteres de retinil nos quilomícrons tornam-se biodisponíveis à todos os tecidos. No fígado, os hepatócitos são os responsáveis pela captação de aproximadamente 66-75% dos retinides esterificados contidos nos quilomícrons. Nos hepatócitos, são hidrolisados, transferidos para o retículo endoplasmático, ligados com a proteína ligante de retinoides (RBP) para, então, serem transferidos para as células estreladas. Cerca de 50-80% da VA total do corpo é armazenada nas células hepáticas estreladas. Há também uma captação extra hepática dos QM remanescentes. Ocorrem principalmente na medula óssea, baço e em menor quantidade nos tecidos adiposos, musculo esquelético, testículo, pulmão e rins. Desse modo, esses QM remanescentes podem ser importantes para a distribuição dos ésteres de retinil para tecidos de intensa proliferação e diferenciação celular, como é o caso do baço e medula óssea (BLOMHOFF, 1990; LINTIG, 2012). Quando necessário, o retinol é mobilizado das reservas das células estreladas para a corrente sanguínea na sua forma alcoólica não esterificada em combinação com a proteína RBP, a partir da qual é fornecido aos tecidos (KANAI; RAZ; GOODMAN, 1968; SMITH; GOODMAN, 1976; WHO, 1995). No plasma, o complexo RBP-retinol se combina com a transtirretina (ttr) (uma proteína plasmática que evita a filtração glomerular do retinol e a sua subsequente eliminação na urina) para formar o holo-RBP (FREY et al., 2009). A captação do retinol pelos tecidos específicos é mediada pela STRA6. A transferência do retinol do RBP para o citosol através de STRA6 é bidirecional (LINTIG, 2012; RASK; PETERSON, 1976). 25 1.3.4 Mecanismos de ativação celular pelos retinoides Intracelularmente, os retinoides interagem com proteínas citosólicas e receptores nucleares. Assim, eles induzem a expressão de genes específicos que reconhecem o complexo retinoide/receptor. São conhecidas duas classes de receptores nucleares que medeiam a atividade dos retinoides: o receptor de ácido retinoico (RAR) e o receptor retinoide X (RXR), ambos membros da superfamília dos hormônios esteroides/tireoideos/vitamina D. Os receptores RAR e RXR possuem 3 isoformas, alfa, beta e gama, sendo codificadas por diferentes genes, e podendo interagir na forma de homo e heterodímeros (KHILLAN, 2014). Entre os metabólitos do retinol, o ácido retinoico (RA) é o que detém a maior importância biológica, sendo conhecido como a “forma ativa da vitamina A”. O retinol e o retinal possuem baixa ligação aos receptores RAR e RXR, sendo assim funcionais como precursores para o ácido retinoico (FIGURA 5) (LAMPEN et al., 2000; WANG, 2005). Os receptores retinoides regulam a transcrição de genes ligando-se a regiões do DNA responsivas ao ácido retinoico denominadas RARE (retinoic acid response element) (BENOIST et al., 2000), modulando a expressão gênica. Muitos genes humanos são conhecidos por conter a região RARE (FIGURA 5), e essa regulação da expressão gênica pode explicar os efeitos da vitamina A na imunidade e outras funções biológicas. Esses efeitos dos retinoides mediados pelos receptores é conhecido como via “clássica” ou “genômica” (LAMPEN et al., 2000; ORFANOS et al., 1997). Alguns estudos evidenciam a importância dessa via na proliferação celular, como Grenier (2007), que verificou diminuição da proliferação com aumento da diferenciação celular através da ativação da p38 MAPK induzidos por ácido retinoico e mediado por RAR (GRENIER et al., 2007). De modo semelhante, Goodman (2012) verificou o envolvimento dos retinoides na proliferação celular do giro denteado do hipocampo através da ativação de RARbeta e RARgamma (GOODMAN et al., 2012). Embora os efeitos de RA sejam mediados principalmente pela formação dos heterodímeros RAR/RXR, o RXR também pode agir como homodímero ou heterodímero com vários outros receptores nucleares, como é o caso do receptor do hormônio da tireoide (TR), receptor ativado por proliferadores de peroxissoma (PPAR) e receptor da vitamina D nos seus específicos elementos de resposta, afetando assim diversas vias de sinalização (MARILL et al., 2003). 26 Figura 5 - Metabolismo intracelular do retinol e ação nuclear. Fonte - McGrane (2007). RA – ácido retinoico; ROH – retinol na forma alcóolica; RE – éster de retinol; RAR - receptor de ácido retinoico; RXR - receptor retinoide X, RARE - elemento de resposta ao ácido retinoico (retinoic acid response elemento) Além disso, os retinoides podem ainda produzir seus efeitos através da via “não-clássica” ou não “genômica”, onde independem da ação de RAR e RXR. Foi demonstrado que os retinoides ativam várias vias de sinalização, como por exemplo a proteína quinase ativada por mitógeno (MAPK), fosfatadil inositol 3 quinase (PI3K), proteína quinase dependente de AMP cíclico (PKA) e JAK/STAT mediante interação com receptores acoplados à proteína G (MCGRANE, 2007; MCKENNA, 2012). Outros trabalhos também apresentam a interação dos retinoides com produção de espécies reativas de oxigênio (EROS) e consequente ativação das vias de sinalização p38/MAPK, Akt, JNK e ERK1/2, independentes da ativação de RAR e RXR (DALMOLIN et al., 2007; GELAIN et al., 2012). 1.4 Vias de sinalização As MAPKs são uma família de proteínas quinases de serina/treonina que estão envolvidos na modulação de vários processos celulares, como proliferação celular, diferenciação, resposta ao estresse e apoptose (BALBI et al., 2009; YANG; SHARROCKS; WHITMARSH, 2013). A via de transdução das MAPKs é bastante conservada entre os membros desta família. Essa via é composta de três quinases: uma MAP quinase quinase quinase (MAPKKK), que fosforila e ativa uma MAP quinase quinase (MAPKK) que, 27 por sua vez ativa uma MAP quinase (MAPK). As ERKs (quinase regulada por sinal extracelular), por exemplo, iniciam com a ativação de uma proteína Ras, que ativa a Raf (MAPKKK), que ativa a MEK (MAPKK), e esta ativa a ERK (MAPK). Uma vez ativada a MAPK migra do citosol para o núcleo, onde regula a atividade de vários fatores de transcrição através de fosforilações (AVRUCH, 2007; MARSHALL, 1994; NISHIDA; GOTOH, 1993). As principais vias da MAPKs incluem a ERK1/2 (também chamadas de p44/42), JNK (c-jun N-terminal kinase), as isoformas de p38 (p38a, β, γ e δ) e ERK5 (ENGLISH et al., 1999). As MAPKs fosforilam e estimulam a atividade de vários fatores de transcrição nuclear regulando, assim, a transcrição gênica (TURJANSKI; VAQUÉ; GUTKIND, 2007). A figura 6 apresenta as principais cascatas da MAPK, os principais fatores de transcrição ativados e os efeitos desencadeados na célula. Adicionalmente, a via p38 também está associada à imunidade e às respostas inflamatórias, regulando vários mediadores de inflamação, dentre os quais o NF-kB (CARGNELLO; ROUX, 2011; HAYDEN; GHOSH, 2008). 28 Figura 6 - As cascatas convencionais da MAPK e seus efeitos. Es:mulo& MAPKs&Convencionais& Substratos& Efeitos&& celulares& MEF2A&& MEF2C&& c$Fos& Fra$1&& CREB&& Ets$1&& c$Myc&& Sap$1a&& ELK$1&& SMAD$1&& SMAD$2,& SMAD4&& MAF$A&& p53&& c$Myb&& SP1&& c$Myc&& c$Fos&& STAT$3& Proliferação& Sobrevivência& Diferenciação& & ATF$2&& c$Fos&& p53&& p73&& MEF2&A& MEF2&C&& STAT$4&& ELK$1&& Sap$1a&& CHOP&& c$Jun&& ATF$2&& ELK$1& JunD&& ELK$3&& p53&& c$Myc&& HSF$1&& NFAT4& FOS&& & Apoptose& Proliferação&& Diferenciação& Produção&de& citocinas& Apoptose& Fonte: Adaptado de Cargnello e Roux (2011); Turjanski, Vaqué e Gutkind (2007) e (Yang, Sharrocks e Whitmarsh (2003). 1.4.1 Ativação de MAPK por proteínas G As proteínas G são compostas por três unidades proteicas (α, β e γ) e são as responsáveis por transmitir a informação dos receptores metabotrópicos para 29 diversos componentes de vias de sinalização. A ativação do receptor faz com que a subunidade α da proteína G troque GDP por GTP, produzindo a dissociação de α, ligada à GTP do receptor das subunidade βγ, para desencadear diversas cascatas de sinalização. As subunidades α e βγ estimulam efetores distintos e regulam várias vias de sinalização, incluindo a MAPK. As proteínas G são classificadas de acordo com a estrutura e sequencia da subunidade α, e suas três principais isoformas são a Gs, Gq e Gi. A proteína Gs (estimulatória) ativa a adenilato ciclase (AC), que forma AMPc a partir do ATP (trifosfato de adenosina). O aumento intracelular de AMPc ativa a PKA (proteína quinase dependente de AMPc). PKA pode estimular ERK1/2 via Rap1–B-Raf quanto pode inibir via C-Raf (ENGLISH et al., 1999). Pode também estimular p38MAPK via Rap1 e inibir ERK5. A proteína Gq também pode regular MAPKs através da ativação de PLCβ (fosfolipase C) que, uma vez ativada, hidrolisa PIP2 (fosfatidil inositol 4,5 bifosfato) para produzir IP3 (1,4,5 trifosfato de inositol) e DAG (1,2 diacilglicerol), o que resulta na ativação da PKC (proteína quinase C) por via direta (PLC-DAG-PKC) ou indireta através de liberação de Ca2+ intracelular (PLC-IP3-Ca2+-PKC). Assim, as vias ERK, JNK, p38MAPK e ERK5 podem ser ativadas através de PLCβ-PKC, ativado pela subunidade α ou por PLC e PI3K ativados pela subunidade βγ. A proteína Gi (inibitória) exerce seus efeitos através da inibição de vias inibitórias por meio da subunidade α. Esta bloqueia as vias PKA-C-Raf e Rap1-GAP-Rap, inibindo seus efeitos inibitórios em ERK. A subunidade α também pode estimular a via JNK através da ativação de Rho e CDC42. Já a subunidade βγ também tem efeitos estimuladores da MAPK, ela ativa PLCβ e PI3K, que ativam Ras e, consequentemente, ERK e JNK (COBB, 1999; GOLDSMITH; DHANASEKARAN, 2007; MOURA; VIDAL, 2011). Desse modo, a proteína G pode regular diversos fatores de transcrição como, AP-1, NF-kB, ATF, STAT3, ELK1, MEF2, através das vias ERK-, JNK-, p38MAPKs ou ERK5 (GOLDSMITH; DHANASEKARAN, 2007). 1.4.2 Envolvimento da MAPK no ciclo celular, proliferação e apoptose de células intestinais. A proliferação, diferenciação e apoptose são eventos de fundamental importância para o epitélio gastrointestinal, pois em condições normais, as células de 30 cripta intestinais proliferam e, posteriormente, se diferenciam à medida que migram ao longo do vilos e substituem as células antigas que entram em apoptose e são eliminados na extremidade da vilosidade em um processo que dura, no máximo, 5 dias. Todo esse processo é de extrema relevância na regulação do número ideal de células no tecido (BHATTACHARYA et al., 2003; SHACKNEY; SHANKEY, 1999). A proliferação celular resulta da progressão do ciclo celular, o qual é um processo complexo que envolve várias proteínas reguladoras que direcionam a célula através de uma sequencia específica de eventos que culmina na mitose e na produção de células filhas. Numa população de células em proliferação pode ser reconhecido quatro fases distintas: fase quiescente (G1), fase de síntese de DNA (S), duplicação do DNA (G2) e a fase de mitose (M) (NUNEZ, 2001; SCHAFER, 1998). A ativação das MAPKs é essencial para a regulação do ciclo celular. ERK pode agir sinergicamente com JNK para ativar o complexo AP1. ERK ativa o fator de transcrição Elk1 que, juntamente com fator de resposta ao soro (SRF), está envolvido na expressão de c-Fos, a qual se associa com c-Jun (ativado por JNK) para formar o complexo AP-1. A atividade desse complexo é necessária para a expressão da ciclina D1, que está envolvida na progressão do ciclo celular, propiciando a transição G1/S. (CARGNELLO; ROUX, 2011; KATZ; AMIT; YARDEN, 2007; MARAIS; WYNNE; TREISMAN, 1993). Além disso, JNK também fosforila outras proteínas AP1, incluindo JunB, JunD e ATF2. Os membros da família dos fatores de transcrição Jun (c-Jun, JunB e JunD) formam homo- ou hererodímeros entre eles ou com os membros da família Fos (c-Fos, FosB, Fra1 e Fra2), para formar os complexos proteicos AP1 (TURJANSKI; VAQUÉ; GUTKIND, 2007). A via p38 também tem participação na modulação do ciclo celular, regulando negativamente, ou seja, atua na infraexpressão de algumas ciclinas, impedindo as transições do ciclo em G1/S e G2/M (CARGNELLO; ROUX, 2011). Com relação aos efeitos celulares desencadeados pelas MAPKs, eles parecem estar envolvidos não apenas com os fatores de transcrição ativados, mas também com o tempo de ativação da via. No caso de ERK e JNK, uma ativação prolongada dessas vias pode levar à diferenciação celular, enquanto que uma ativação transiente ocasionaria proliferação celular (DAVIS, 2000; MURPHY; BLENIS, 2006). 31 Além da participação da via JNK na regulação da proliferação e diferenciação celular, também já foi descrito seu papel na apoptose, juntamente com NF-κB. Alguns estudos sugerem que a via JNK desempenha um papel anti- ou próapoptótico dependendo do estímulo e da linhagem celular, em um processo dependente da ativação de c-Jun ou de caspases (DUNN et al., 2002; IP; DAVIS, 1998; RIESGO-ESCOVAR, 1997). E que o NF-κB poderia inibir a apoptose causada por JNK, contribuindo para o processo de sobrevivência celular (BHATTACHARYA et al., 2003). Desse modo podemos constatar que as MAPKs são potentes reguladores das vias intracelulares que levam à proliferação, diferenciação e apoptose de células epiteliais intestinais (ALIAGA et al., 1999) (TABELA 2). Tabela 2 – Funções de algumas vias de sinalização importantes para o trato gastrointestinal. Mecanismos envolvidos Marcadores de Diferenciação Celular ATF2 Gene FUNÇÃO FABP DIFERENCIAÇÃO CELULAR IAP DIFERENCIAÇÃO CELULAR ATF2 ELK1 MAPK/ERK SRF IL-6 STAT3 Hedgehog GLI3 MEF2 MEF2C PI3K/AKT FOXO3-4 Vias de sinalização FOS RESPOSTA AO ESTRESSE DIFERENCIAÇÃO CELULAR PROLIFERAÇÃO/DIFERENCIAÇÃO ANTI-APOPTÓTICO DESENVOLVIMENTO DO SNC DIFERENCIAÇÃO DIFERENCIAÇÃO E SOBREVIVÊNCIA CELULAR FORMAÇÃO EIXO CRIPTA-VILOS MIGRAÇÃO/DIFERENCIAÇÃO SOBREVIVÊNCIA CELULAR ANTI-APOPTÓTICO DIFERENCIAÇÃO CELULAR PROTEÇÃO AO ESTRESSE SOBREVIVÊNCIA E DIFERENCIAÇÃO MAPK/JNK CELULAR JUN 1.4.2.1.1 NFk-B NFk-B ANTI-APOPTÓTICO SOBREVIVÊNCIA CELULAR ANTI-APOPTÓTICO SNC- Sistema Nervoso Central 32 2 RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA A desnutrição afeta milhões de crianças em todo mundo e contribui com cerca de um terço de todas as mortes infantis no mundo. Suas consequências acometem todo o organismo, desde a estatura, desenvolvimento cognitivo, imunidade e também a absorção intestinal de nutrientes. Devido a alta prevalência da desnutrição no mundo todo, sua associação com várias outras doenças infecciosas e suas consequências no organismo, principalmente no trato gastrointestinal. A vitamina A já é utilizada no tratamento da desnutrição infantil em altas ou baixas doses, dependendo da gravidade e idade da criança. Isoladamente, apresenta benefícios na visão, sistema imunológico, hematopoiético e participa na proliferação e diferenciação das células epiteliais. Entretanto poucos estudos a nível celular é realizado associando a vitamina A com a desnutrição a nível intestinal. Portanto ainda não se sabe seus reais efeitos e como ocorrem. Nesse contexto, o presente trabalho originou-se na tentativa de demonstrar os efeitos da vitamina A no epitélio intestinal em condições de desnutrição proteica, avaliando seus possíveis benefícios na diferenciação celular e manutenção da barreira intestinal prejudicada pela desnutrição em células intestinais IEC-6. 33 3 3.1 OBJETIVOS Objetivo Geral Investigar as consequências da desnutrição proteica na monocamada de células intestinais, assim como os efeitos do tratamento com Vitamina A (retinol e palmitato de retinol) em células de cripta intestinal desnutridas. 3.2 Objetivos específicos Ø Investigar os efeitos da desnutrição de células intestinais na proliferação, ciclo celular e apoptose. Ø Avaliar os efeitos de diferentes concentrações do retinol e do palmitato de retinol no tratamento da desnutrição, utilizando como parâmetros a proliferação, ciclo celular e apoptose. Ø Verificar os possíveis efeitos do retinol e do palmitato de retinol na diferenciação celular. Ø Avaliar os mecanismos de ação pelo qual o retinol e o palmitato de retinol exercem seus efeitos no tratamento da desnutrição. 34 4 4.1 MATERIAIS E MÉTODOS Linhagem celular Para este estudo, foram utilizadas células derivadas de cripta intestinal de rato (IEC-6) em passagens de 30 – 40, obtidas da Colecçç̧ão Americana de Cultura (American Type Culture Collection-ATCC, Estados Unidos). As células IEC-6 são provenientes da cripta do jejuno de rato e constituem uma linhagem celular de cariótipo diploide e de crescimento normal in vitro. É caracterizada por serem células indiferenciadas, aderentes, com características epitelioides e formadoras de monocamada (QUARONI et al., 1979a). São amplamente utilizadas em modelos de recuperação intestinal (BAVARIA et al., 2014; BRAGA-NETO et al., 2008, 2012; GAO et al., 2013; MACIEL et al., 2007). 4.2 Cultivo celular e reagentes As células foram mantidas em cultivo em meio DMEM (Dulbecco’s Modified Eagle Medium – Gibco, Estados Unidos) acrescido de 5% de soro fetal bovino inativado (GIBCO, Estados Unidos), 10 mg de insulina bovina pancreática (Sigma Aldrich, Estados Unidos), 50U/mL de penicilina (GIBCO, Estados Unidos) 50 µg/mL de estreptomicina (GIBCO, Estados Unidos) e 1mM/mL de piruvato de sódio (Ginbco, Estados Unidos) e incubadas a 37°C em estufa com 5% de CO2 e 95% de umidade. Como substancias testes foram utilizados duas formas de Vitamina A (FIGURA 7): o Retinol All Trans (Sigma Aldrich, Estados Unidos) e Palmitato de retinol, utilizado comercialmente, entre outras funções, para tratamento de distúrbios da má absorção intestinal, sob nome comercial de AROVIT (BAYER). Uma vez que o Palmitato de Retinol têm peso molecular maior que o Retinol foi utilizado o equivalente de retinol (ER) para cada dose. Dado que ambas as formas de Vitamina A são lipossolúveis e fotossensíveis, o DMSO (0,5%) foi utilizado para a diluição e os experimentos foram conduzidos em ambiente com baixa luminosidade. 35 Figura 7 - Estrutura química das duas formas de Vitamina A utilizada nos experimentos. Fonte: Product Information Sheet - Sigma-Aldrich (2014) 4.3 Plaqueamento celular e tratamento com vitamina A em células desnutridas Para determinar o número de células e sua viabilidade para posterior plaqueamento e tratamento celular foi utilizado o método de exclusão por Azul de tripan, um composto azólico que penetra nas células inviáveis e se localiza nos núcleos, os quais se apresentam corados de azul. Para isso, foi retirado todo o meio das células confluentes em cultura nos fracos de 25 ou 75 cm2 e adicionada tripsinaEDTA (Sigma Aldrich, Estados Unidos) a fim de desagregar as células dos frascos e entre si. Posteriormente, foram resuspendidas em DMEM com 5% de SFB para a inativação da tripsina e misturado com azul de tripan 0,4%. Imediatamente após foram conduzidas para a contagem em câmara de Neubauer sob um microscópio óptico. As células viáveis foram contadas e as inviáveis foram distinguidas por apresentarem os núcleos corados de azul. Para as metodologias seguintes, 2,5 x105células/mL foram plaqueadas em placas de 96 ou 24 poços e incubadas por 24 horas a fim de propiciar a aderência à placa e atingir cerca de 80% de confluência. Após esse período, foram lavadas duas vezes com tampão fosfato salino (PBS - Gibco, Estados Unidos). O grupo nutrido foi tratado com Glutamina (Glu-), Soro Fetal Bovino 5%. O modelo de desnutrição celular foi realizado com Glutamina (Glu-), Soro Fetal Bovino 0% de acordo com o modelo de desnutrição descrito por UENO et al., (2011) e adicionado ou não concomitantemente das substancias testes – retinol ou palmitato de retinol - nas concentrações de 2, 3.55, 6.3, 11.25 ou 20 µM (para simplificar, no decorrer do texto essas doses são descritas apenas por 2, 3, 6, 11 e 20 uM) por 6, 12, 24 e 48h horas como exemplificado na Figura 8. 36 Essas doses foram idealizadas utilizando como base as doses fisiológicas de retinol (2uM) e concentrações consideradas tóxicas (20 uM) para certos tipos celulares (ZANOTTO-‐FILHO, 2009) e feita uma curva logarítmica para delinear as concentrações intermediárias. Figura 8 - Esquema do tratamento das células IEC-6. • Ensaio de Proliferação (6h 12h 24h 48h) • Ensaio de Apoptose/Necrose • Ciclo Celular (6h 12h 24h 48h) • Análise de Diferenciação Celular • Vias de Sinalização (42h) 4.4 Desnutrição + Tratamento Palmitato de Retinol ou Retinol Concentração: 2µM 3,55µM 6,3µM 11,25µM 20µM Controle Nutrido Glu- SFB 5% Controle Desnutrido Glu- SFB 0% Desnutrição + Tratamento Palmitato de Retinol ou Retinol Concentração: 3,55µM 6,3µM 11,25µM Controle Nutrido Glu- SFB 5% Controle Desnutrido Glu- SFB 0% Desnutrição + Tratamento Palmitato de Retinol ou Retinol Concentração: 11,25µM Controle Nutrido Glu- SFB 5% Controle Desnutrido Glu- SFB 0% Ensaio de Proliferação Celular A determinação da proliferação e a viabilidade celular foi realizada seguindo o protocolo modificado descrito por Brito et al. (2005). Além disso, este método foi utilizado como critério de escolha das melhores doses para as metodologias seguintes. Para avaliar a viabilidade e evolução da proliferação, foi utilizado o Kit de proliferação celular WST-1 (Roche, Alemanha) de acordo com as instruções do fabricante. Trata-se de um teste colorimétrico de medida indireta que utiliza o reagente WST-1 (2-(4-iodofenil)-3-(4-nitrofenil)-2H-5-tetrazolio), um sal de tetrazólio que uma vez reduzido à formazan torna-se alaranjado. Essa coloração surge em células metabolicamente ativas através da ação das desidrogenases mitocondriais. O aumento do número de células viáveis resulta em aumento da quantidade do 37 corante de formazan, o qual é detectável pelo leitor de placas (BERRIDGE et al., 1996). A cultura e tratamento das células pelas substâncias testes foi realizada em placas de 96 poços, nos tempos de 6h, 12h, 24h e 48h e nas concentrações de 2µM 3,55µM 6,3µM 11,25µM 20µM. Após o tempo determinado foi adicionado 10µl do reagente WST-1 em cada poço, homogeneizado por 1 minuto e incubado a 37ºC por 2h e 30m. Os resultados foram obtidos a partir de um n=12. A leitura da absorbância pra quantificação das amostras foi realizada no leitor de ELISA em comprimento de onda de 450nm com referencia em 620nm. Os experimentos de proliferação celular foram seguidos da análise da frequência da apoptose celular, com o intuito de verificar se a desnutrição ou o tratamento com os retinóides testados causavam alguma lesão celular e consequente apoptose. 4.5 Análise de apoptose e necrose por citômetria de fluxo Para o ensaio, 2,5 x 105 células/mL foram semeadas em placas de 24 poços e tratadas por 6, 12, 24 e 48h horas, com as substâncias testes, nas concentrações intermediárias de 3,55µM 6,3µM 11,25µM, uma vez que não foi possível estabelecer uma única dose a partir da EC50 no experimento de proliferação. Para a análise em citometria de fluxo foi utilizado o kit Annexin V-FITC Apoptosis Detection Kit I (BD Bioscience, San Diego, CA, Estados Unidos) e o experimento realizado de acordo com o protocolo do fabricante. A utilização da Anexina V conjugada possibilita a marcação de células apoptóticas uma vez que se liga ao fosfolipídio fosfatadilserina, externalizado da membrana da célula durante o processo de apoptose. Conjuntamente com o Iodeto de Propídio (PI), permite verificar a presença de células que perderam a integridade da membrana. Esta marcação dupla permite a identificação de células que se encontram em uma etapa inicial ou tardia da morte celular (NETO, 2000). O sobrenadante de cada grupo (n=3) foi reservado e as células tripsinizadas (50 µL de tripsina-EDTA e 100 µL de PBS) foram incubadas por 5 minutos a 37ºC. Em seguida foram ressuspendidas no sobrenadante reservado adicionado de meio DMEM com SFB 5% para neutralizar a ação da tripsina. Após a 38 centrifugação da suspensão celular (3000 rpm; 5min) seguiram-se três lavagens com tampão de ligação. Posteriormente foi adicionado 200 µL de tampão de ligação juntamente com 5 µL de anexina V conjugada com isotiocianato de fluoresceína (FITC) e 5 µL de PI (iodeto de propídio) e incubados por 15 minutos em ambiente protegido de luz. Por fim, a suspensão celular foi centrifugada, o sobrenadante removido para retirar o excesso de anexina e PI e as células ressuspendidas em 300 µL de tampão de ligação. As amostras foram imediatamente encaminhadas para análise no citômetro de fluxo FACS Calibur (Becton Dickison, Estados Unidos). Em cada ensaio foram adquiridos 10.000 eventos utilizando o software CellQuest®. Para a posterior análise da frequência de células em apoptose ou necrose foi utilizado o software FlowJo (FIGURA 9). Os valores foram apresentados em percentagem de células apoptóticas e/ou necróticas. 39 Figura 9 – Figura representativa da análise da frequência de células em apoptose e necrose. 4.6 Analise do perfil do Ciclo Celular por Citometria de Fluxo A análise do ciclo celular foi realizada de acordo com o protocolo modificado e descrito por Ray et al., (1999). O método avalia, por citometria de fluxo, a quantidade e integridade do DNA nas fases do ciclo celular pelo teor e quantidade de Iodeto de Propídeo (PI) incorporado ao DNA da célula. Desse modo, permite revelar a percentagem de células em cada uma das 3 fases G1(2n), S (entre 2n e 4n) e G2/M (4n), assim como o percentural de DNA fragmentado (POZAROWSKI; DARZYNKIEWICZ, 2004). Células IEC-6 foram plaqueadas em placas de 24 poços, na concentração de 105células/mL, foram desnutridas ou não e incubadas com as substâncias testes, nas concentrações de 3,55µM 6,3µM 11,25µM, por 6, 12 , 24 e 48h. Posteriormente as células foram tripsinizadas, lavadas com PBS gelado 4ºC, centrifugadas a 3000rpm 40 por 5 minutos, fixadas em etanol 80% gelado -20ºC e mantidas à 4ºC por no mínimo 30 min para a permeabilização celular. Posteriormente foram lavadas novamente com PBS gelado para remover o etanol, centrifugadas e coradas com 500µL da solução de PBS contendo de iodeto de propídeo (5µg/ml) e (RNAse 100 µg/ml). Após um período de 1h de incubação em temperatura ambiente e protegido de luz, a distribuição das fases do ciclo celular foi determinada através de citometria de fluxo quantitativa, utilizando o Citômetro de Fluxo FACS Callibur (Becton Dickison, Estados Unidos). Em cada ensaio foram contados 10.000 eventos; doublets e células agregadas foram excluídas de acordo com o protocolo descrito por Wesrto et al., (2001) (FIGURA 10). Os histogramas obtidos pelo programa de aquisição Cell-Quest no citometro foram submetidos a avaliação quanto as fases do ciclo celular utilizando o programa FlowJo 10_V (2011) e a análise do ciclo celular no modelo de Watson (FIGURA 11). Figura 10 – Figura ilustrativa do dot plot de exclusão das células agregadas. 41 Figura 11 – Figura representativa da análise do ciclo celular no modelo de Watson. 4.7 Análise da transcrição gênica relacionada aos genes marcadores de diferenciação celular e vias de ativação intracelular Células intestinais IEC-6 foram cultivadas em placas de 24 poços em condições de nutrição ou desnutrição e na presença das substancias testes na concentração de 11µM (a de melhor resultados nos experimentos de ciclo celular) por um período de incubação de 42h. Este tempo foi escolhido visto que o tempo de 48h foi o tempo onde foi encontrado os melhores resultados nos experimentos de apoptose/necrose e ciclo celular. Em adição, o período de 42h seria um tempo anterior à expressão proteica. As células foram encaminhadas para o isolamento de RNA pelo kit RNeasy mini Kit (Qiagen). A quantidade e qualidade do RNA isolado foram analisadas espectrofotometricamente através de leituras da absobância em 260 nm e da razão das absorbâncias de 260/280nm, respectivamente, com o auxilio do Nanodrop® (Thermo Fisher Scientific, Estados Unidos). Cerca de 1 ug de RNA total seguiu para a síntese de cDNA, utilizando o kit iScript cDNA Synthesis Kit (Bio-Rad). O cDNA sintetizado foi armazenado em freezer -20°C até a amplificação do mesmo pela Reação de Polimerase em Cadeia em 42 Tempo Real (qPCR). Utilizando o equipamento CFX96 touch TM (Bio-Rad), avaliou- se as expressões dos genes considerados marcadores de diferenciação de células de vilos - Proteína de ligação de ácidos graxos (FABP) e a Fosfatase alcalina intestinal (IAP) – e genes relacionados às vias de sinalização dependentes da ativação ou inibição dos receptores acoplados a proteína-G. (TABELA 3). Como gene de referência foi utilizado o YWHAZ – polipeptídeo zeta da proteína ativadora de tirozina 3-monooxigenase/triptofano 5-monooxigenase. Os iniciadores de DNA (primers) utilizados foram desenhados com base nas sequências de RNA mensageiro dos genes investigados, obtidas no sítio eletrônico do National Center for Biotechnology Information (NCBI). Para a qPCR foi utilizado 10µL da SYBR® Green PCR Master Mix (Applied Biosystems, Estados Unidos), 2 µL de cada iniciador (0,2 uM), 1 µL de cDNA das amostras e o volume completado para 20 µL com água MiliQ estéril. Ao final da reação foi analisada a curva de dissociação para verificar a especificidade dos iniciadores. Para tanto, os produtos foram submetidos ao aumento da temperatura a partir da temperatura de anelamento até que fosse alcançada a temperatura de desnaturação com acréscimos de 0,5 graus Celsius e permanência de 15 s. Com os valores de CT (Cycle threshold, ciclo limiar) determinados pela reação de qPCR, a análise da transcrição gênica relativa foi calculada utilizando o método do 2ΔΔCT descrito por Livak e Schmittgen (2001). O ΔΔCT foi calculado de acordo com a seguinte fórmula: ΔCT amostra (CT do gene alvo – CT do gene de referência) - ΔCT amostra normalizadora (Média do ΔCT do grupo controle). Uma vez determinado o ΔΔCT , aplicou- se a fórmula 2-ΔΔCT , que resultou no valor da transcrição gênica relativa. O resultado final revela quantas vezes o gene de interesse está alterado nas amostras em relação ao grupo controle, tendo como padrão o gene de referência YWHAZ. 43 Tabela 3 - Sequência dos iniciadores utilizados. SEQUENCIA DO INICIADOR (5’ - 3’) MECANISMOS ENVOLVIDOS GENE FABP MARCADORES DE DIFERENCIAÇÃO CELULAR ATF2 IAP ATF2 ELK1 MAPK/ERK SRF VIAS DE SINALIZAÇÃO IL-6 STAT3 HEDGEHOG GLI3 MEF2 MEF2C PI3K/AKT FOXO3-4 FOS MAPK/JNK JUN NFK-B NFK-B E FUNÇÕES DO GENE TAMANHO DO PRODUTO (PB) S: GGAAGCTTGGAGCTCATGACA 116 A:GACGCCGAGTTCAAACACAAC S: AACTACATCGCGCACGTCAT 98 A:GGGGTGGTTGGTCTGTTCTC S: CTGTAATCACCCAGGCACCAT 199 A:GGGATTCCTGGAACACTAGGC S: TCCCAGCCATCCTAACAGAGA 130 A:CCTAGCAGGCTTGGGCTAAGT S: CTTCTCTCAGGCACCATCCAC 160 A:CCCAGCTTGCTGTCCTATCAC S: AGTTCAAGCACCTGACCCTGA 180 A:TGTTGGAGATCACCACGACTG S: CCACCCTCCTCATCTTTTTCC 194 A:CTGAAGCTGCAGTGGGGTTAC S: AGGTCACAGCCCTGAGTCTGA 123 A:GGGATGGTAACTGGCATCTCA S:TGGAAGAACTCCATCCGYCACA 92 A:ATGATCCACCAAGAGCTCTTGCC S:GCCTTCACCCTGCCTCTTC 79 A:GCTCCATGTTGCTAATGTTCTTGA S:GCTGAGTGTCTGTATGCTGGG 119 A:GGACTTGTGGGTTGCTGGG S:ACGATCTGTTTCCCCTCATC 150 A:TGCTTCTCTCCCCAGGAATA S– Iniciador senso; A-Iniciador anti-senso. 4.8 Análise Estatística A análise estatística foi realizada no software GraphPad Prism. Com exceção da metodologia de biologia molecular, a qual foi aplicado o teste T seguido do pós-teste Mann-Whitney, para todas as variáveis foi aplicado o ANOVA na comparação dos controles com os tratamentos, seguido do pós-teste Bonferroni. O grau de significância utilizado foi de 95% (P<0,05). 44 5 5.1 RESULTADOS Efeito da desnutrição e tratamento com retinol e palmitato de retinol na proliferação celular. A proliferação celular é identificada pelos níveis de absorbância do teste. Conforme a figura 12, observa-se que a partir de 6h ocorreu uma diferença significativa entre os valores apresentados para as células dos grupo desnutrido quando comparado ao grupo nutrido. O grupo nutrido apresentou maior proliferação que o desnutrido em todos os tempos. Isso demonstra que a desnutrição afetou a proliferação celular. No entanto, os grupos tratados tanto com retinol quanto com palmitato de retinol, só apresentaram diferença em relação ao controle desnutrido a partir do período de 24h (Figura 12), no qual os grupos tratados com as doses de palmitato de retinol diminuíram a proliferação, enquanto o grupo tratado com retinol, na dose de 20µM, aumentou a proliferação. Entretanto, no período de 48h (Figura 12), todos as doses de palmitato de retinol diminuíram a proliferação celular quando comparado ao controle desnutrido. 45 Figura 12 - Tempo-efeito do tratamento com retinol ou palmitato de retinol sobre a proliferação celular em células desnutridas. Os valores da figura representam a média ± E.P.M da proliferação celular em células desnutridas tratadas com retinol ou Palmitato de retinol. Grupos: Nut - controle nutrido (Glu+, SFB 5%), Des – controle desnutrido (Glu-, SFB 0%), DMSO – controle DMSO (Glu-, SFB 0%, DMSO 0,5%), outros desnutrido + tratamento com retinol ou palmitato de retinol (doses: 2, 3.55, 6.3, 11.25 ou 20 µM). A análise estatística foi feito por ANOVA seguida do teste Bonferroni. Os valores significativos: *P<0,0001 vs Controle Desnutrido, ## p<0,05 vs Controle Nutrido, ### p<0,0001 vs Controle Nutrido. 5.2 Efeito do tratamento com retinol e palmitato de retinol na apoptose e necrose em células desnutridas. Foi realizado o ensaio de Apoptose/Necrose para verificar a relação entre a diminuição da proliferação /viabilidade e sua provável via, além de sua cinética. As principais diferenças na apoptose foram no tempo de 48h (Figura 13A). Conforme os resultados obtidos, o grupo nutrido (26,09±3,9%) apresentou maior percentagem de células apoptóticas comparado ao grupo desnutrido (18,5±3,3%). No entanto, os grupos tratados com palmitato de retinol em todas as doses estudadas apresentaram uma diminuição do percentual de células apoptóticas. 46 Os grupos tratados com retinol não apresentaram diferença com relação ao grupo desnutrido. Não houve diferenças estatísticas entre os tratamentos e tempos quando avaliada a cinética da Necrose (Figura 13B). Figura 13 - Cinética da análise de apoptose e necrose dos grupos nutridos, desnutridos e tratados com vitamina A. Os valores da figura representam a média ± E.P.M da apoptose ou necrose em células desnutridas tratadas com retinol ou palmitato de retinol. Grupos: Nutrido (Glu+, SFB 5%), Desnutrido (Glu-, SFB 0%). Tratamentos: desnutrido + tratamento com retinol (Des + Ret) ou palmitato de retinol (Des + P.Ret) (doses: 3.55, 6.3 ou 11.25µM). A análise estatística foi feito por ANOVA seguida do teste Bonferroni. Os valores significativos: *P<0,05 vs Controle Desnutrido, # p<0,05 vs Controle Nutrido. 47 5.3 Efeito da desnutrição e do tratamento com retinol e palmitato de retinol no ciclo celular. O ciclo celular pode ser dividido em 5 fases - G0, G1, S, G2, M - entretanto com a utilização do método de análise do ciclo por Iodeto de Propídio, pode-se definir apenas 3 fases: G0/G1 (quiescência ou síntese de proteínas – 2n), S (fase de síntese de DNA), G2/M (pré-mitose ou mitose – 4n). De acordo com a figura 14A, o grupo desnutrido apresentou um aumento do percentual de células IEC-6 na fase G0/G1 em 12h quando comparado ao grupo nutrido. Em 24 e 48h os níveis se equiparam ao do nutrido. O tratamento com retinol promoveu aumento na quantidade de células na fase G0/G1 quando comparado ao controle desnutrido, principalmente no tempo de 24h e 12h e 48h na dose de 11µM. Na fase S, ocorre uma diminuição do percentual de células do grupo desnutrido em 12h com relação ao controle nutrido (Figura 14B). Os grupos tratados com retinol nas doses 3, 6 e 11 µM apresentam uma diminuição na quantidade de células nesta mesma fase em 24h com relação ao controle desnutrido. Adicionalmente, a dose de retinol 11µM também diferiu do controle desnutrido em 12h. Em 48h não se observa diferença entre os grupos. Conforme mostrado da figura 14C, o grupo nutrido apresenta maior percentual de células na fase G2/M nos tempos de 6h, 12h e 24h quando comparado ao controle desnutrido. Entretanto, os grupos tratados com retinol e palmitato de retinol só diferiram do controle desnutrido no tempo de 48h, quando o percentual de células do controle desnutrido se equiparou ao do nutrido. O tratamento das células desnutridas com retinol e palmitato de retinol pareceu levar as células a um estado quiescente maior que a desnutrição por si só quando analisados no tempo de 48h. Isso pode ser observado nos resultados de todas as fases, onde verifica-se um aumento da frequência de células na fase G0/G1, e diminuição dessa frequência na fase S e G2/M. 48 Figura 14 - Cinética da distribuição nas fases do ciclo celular das células desnutridas e tratadas com retinol e palmitato de retinol. Fonte: 1 Os valores da figura representam a média ± E.P.M de cada fase do ciclo celular de células desnutridas tratadas com retinol ou palmitato de retinol. Grupos: Nutrido (Glu+, SFB 5%), Desnutrido (Glu-, SFB 0%). Tratamentos: desnutrido + tratamento com retinol (Des + Ret) ou palmitato de retinol (Des + P.Ret) (doses: 3.55, 6.3 ou 11.25µM). A análise estatística foi feito por ANOVA seguida do teste Bonferroni. Os valores significativos: *P<0,05 vs Controle Desnutrido, # p<0,05 vs Controle Nutrido. 49 5.4 Análise da diferenciação celular estimulada pelo tratamento com retinol e palmitato de retinol em células desnutridas. Mediante os dados anteriores e, visto que a diferenciação celular de cripta a vilos afeta o ciclo celular e a proliferação, ao suspender a sua progressão, foi avaliado a expressão dos principais mediadores relacionados à diferenciação celular. A figura 15 permite verificar que os tratamentos com retinol e palmitato de retinol aumentaram a transcrição de todos os genes avaliados quando comparados ao controle desnutrido. Nos genes FABP e IAP os grupos tratados com retinol e palmitato de retinol tiveram uma expressão significativamente maior que no grupo desnutrido (TABELA 4). Tabela 4 – Valores das médias ± E.P.M das análises da transcrição dos genes relacionados à diferenciação em células desnutridas tratadas com retinol ou Palmitato de retinol. PALMITATO DESNUTRIDO NUTRIDO FABP 1,27±0,42 0,60 ±0,10 5,72±0,70 ** 4,22±0,75 * IAP 1,28±0,37 0,29±0,08 5,54±0,93 ** 5,82±1,04 * DE RETINOL RETINOL Legenda: FABP - Proteína De Ligação ao Ácido Graxo; IAP - Fosfatase Alcalina Intestinal. A análise estatística foi feito por Teste T seguido do pós-teste Mann-Whitney. Os valores significativos: **P<0,01 vs Controle Desnutrido, *P<0,05 vs Controle Desnutrido. 50 Figura 15 – Expressão dos principais genes relacionados com a diferenciação celular nas células desnutridas tratadas com retinol e palmitato de retinol. Os valores da figura representam a média ± E.P.M da expressão de cada gene relacionado a diferenciação celular em células desnutridas tratadas com retinol ou palmitato de retinol. Grupos: Nut Nutrido (Glu+, SFB 5%), Des - Desnutrido (Glu-, SFB 0%). Tratamentos: desnutrido + tratamento com retinol (Ret) ou palmitato de retinol (P.Ret) na dose 11.25µM e no tempo de 48h. A análise estatística foi feito por Teste T seguido do pós-teste Mann-Whitney. Os valores significativos: **P<0,01 vs Controle Desnutrido, *P<0,05 vs Controle Desnutrido. 51 5.5 Análise das vias de sinalização desencadeadas pelos tratamentos com retinol e palmitato de retinol em células desnutridas. Para avaliar como e por quais vias o tratamento com o retinol e palmitato de retinol exerceu efeito anti-apoptótico demostrado, repressor do ciclo celular na fase G0/G1 e promotor de diferenciação celular foram analisados os principais genes de cada via de sinalização ativadas por receptores acoplados à proteínas G. Conforme apresentado na figura 16 e 17, a transcrição dos genes SRF, ELK-1, c-JUN, FOXO, STAT3, ATF2, GLI3 e NF-kB se mostrou aumentada nos grupos tratados com as substancias teste em relação ao controle desnutrido. O grupo nutrido também desencadeou um aumento da transcrição dos genes c-JUN (Figura 16), STAT3, MEF2 e ATF2 (Figura 17) em relação ao desnutrido. Entretanto, se mostrou diminuído nos genes c-FOS e GLI3. O tratamento com retinol e palmitato de retinol não diferiu em relação ao desnutrido nos genes MEF2c e c-FOS. Contudo, nesses 2 genes, o grupo nutrido se mostrou diminuído e elevado, respectivamente, comparado ao controle desnutrido. 52 Figura 16 - Efeito do retinol e do palmitato de retinol sobre a transcrição genica de mediadores das vias de sinalização celular em células IEC-6 desnutridas. Os valores da figura representam a média ± E.P.M da expressão de cada gene relacionado a vias de sinalização celular em células desnutridas tratadas com retinol ou palmitato de retinol. Grupos: Nut Nutrido (Glu+, SFB 5%), Des - Desnutrido (Glu-, SFB 0%). Tratamentos: desnutrido + tratamento com retinol (Ret) ou palmitato de retinol (P.Ret) na dose 11.25µM e no tempo de 48h. A análise estatística foi feito por teste T seguido do pós-teste Mann-Whitney. Os valores significativos: *P<0,05 vs Controle Desnutrido. 53 Figura 17 - Efeito do retinol e do palmitato de retinol sobre a transcrição genica de mediadores das vias de sinalização celular em células IEC-6 desnutridas. Os valores da figura representam a média ± E.P.M da expressão de cada gene relacionado a vias de sinalização celular em células desnutridas tratadas com retinol ou palmitato de retinol. Grupos: Nut Nutrido (Glu+, SFB 5%), Des - Desnutrido (Glu-, SFB 0%). Tratamentos: desnutrido + tratamento com retinol (Ret) ou palmitato de retinol (P.Ret) na dose 11.25µM e no tempo de 48h. A análise estatística foi feito por teste T seguido do pós-teste Mann-Whitney. Os valores significativos: *P<0,05 vs Controle Desnutrido. 54 6 DISCUSSÃO A digestão e absorção de nutriente são funções primordiais do trato intestinal e, para exercer isto, a sua mucosa tem altas taxas de renovação celular comparadas a outros tecidos. Sua integridade é dependente da homeostase das taxas de proliferação, migração e apoptose (BHATTACHARYA; RAY; JOHNSON, 2005). A capacidade proliferativa das criptas se deve à presença das células tronco intestinais, responsáveis por essa renovação epitelial (VAN DER FLIER; CLEVERS, 2009). Sabe-se que durante a desnutrição a absorção intestinal encontra-se afetada (LUNN, 2000), resultante de uma atrofia da mucosa gástrica e intestinal, diminuição das criptas, vilosidades e microvilosidades intestinais (MOLINA; PELISSARI; FEIRHMANN, 2009). No presente estudo foi demostrado que a desnutrição alterou a proliferação e retardou o ciclo celular. A inserção do tratamento com o palmitato de retinol modulou a taxa proliferativa, apoptose e o ciclo celular em células IEC-6 desnutridas. Além disso, o tratamento com retinol, também apresentou aspectos moduladores sobre os parâmetros do ciclo celular e fatores de diferenciação nesta linhagem de células. Tais efeitos parecem estar relacionados com a ativação gênica de ATF2, ELK1, SRF, FOXO, c-Jun, STAT3, GLI3 e NF-κB. De acordo com Ortiz e Betancourt (1984), os tecidos que normalmente têm uma alta taxa de renovação celular tendem a apresentar uma diminuição da proliferação celular quando submetidos à desnutrição. Os dados do presente trabalho demonstram que a desnutrição prejudicou a proliferação celular de células de cripta intestinal a partir do tempo de 6h, estendendo-se até o tempo de 48h. Este resultado corroborou com outros estudos, onde foi verificado uma diminuição da proliferação em células intestinais desnutridas (UENO et al., 2011). Além disto, estudos in vivo também verificaram uma diminuição da taxa proliferativa das criptas durante a desnutrição (CHAUDHARY et al., 2000; GOODLAD; WRIGHT, 1984; HOLT; KOTLER, 1988). A suplementação com retinoides é um fator que influencia na reprodução celular, podendo ter um efeito pró- ou anti-proliferativo (ZANOTTO-FILHO; SCHRÖDER; MOREIRA, 2008). Neste trabalho, a cinética do tratamento com palmitato de retinol em todas as doses, mas não com retinol, mostrou uma diminuição 55 da proliferação celular a partir do tempo de 24h. Resultados semelhantes também foram observados em células de epitélio mamário bovino na ausência de soro fetal bovino (SFB), onde o tratamento com retinoides (retinol e ácido retinoico) inibiu parcialmente a proliferação celular independente da dose de Vitamina A (CHELI et al., 2003); e o ácido retinoico também agiu diminuindo a proliferação experimental no hipocampo de animais (GOODMAN et al., 2012). A apoptose (morte celular programada) é um evento de fundamental importância para a regulação do número celular do organismo, com grande relevância para a homeostase do epitélio gastrointestinal (BHATTACHARYA et al., 2003). Em condições normais, a taxa de proliferação coincide com a taxa de apoptose, o que mantém a integridade fisiológica do intestino. No entanto, a apoptose é também um mecanismo de defesa, ativado sempre que ocorre uma invasão por agentes patogênicos, ou ainda quando o DNA for lesado (ELMORE, 2007; GRIVICICH; REGNER; ROCHA, 2007). Neste estudo, foi observado que no maior tempo de analise, 48h, a percentagem de células apoptóticas no grupo desnutrido se encontrava mais baixa que no grupo nutrido. Dentre os tratamentos utilizados com retinoides, o tratamento com palmitato de retinol diminuiu o percentual de apoptose com relação à desnutrição, enquanto que o tratamento com retinol não apresentou modificação quando comparado ao controle desnutrido. Nos outros tempos, e na análise de necrose celular não foi verificada diferença entre os grupos. Os retinoides, são por vezes descritos como agentes pró-apoptóticos, sendo inclusive testados para o tratamento do câncer (TYKWINSKA et al., 2013). Entretanto, há relatos de seus efeitos anti-apoptóticos, tais os efeitos encontrados para o ácido retinoico e o β-caroteno, que diminuíram a apoptose em células mesangiais (KITAMURA et al., 2002; MORENO-MANZANO et al., 1999), em células de cumulus (PU et al., 2014), em células hepáticas em estresse oxidativo causado pelo excesso de etanol (PENG et al., 2013) e em células de hepatocarcinoma desprovidas de SFB (WANG et al., 2013). Quanto ao grupo nutrido, o percentual de apoptose se apresentou mais elevado do que o grupo desnutrido no tempo de 48 h. Este fato pode ser talvez explicado em virtude de uma maior confluência das células nos poços do grupo nutrido, haja visto que as mesmas mantiveram proliferação não retardada pela desnutrição. 56 Estudos sugerem que as células desnutridas geralmente tornam-se quiescentes, ou seja, saem do ciclo celular e entram na fase G0 como uma forma de prevenir alguma possível lesão ao DNA e, assim, se proteger contra a apoptose (AGARWAL et al., 2006; SCHAFER, 1998). Sugerimos então que a diminuição da proliferação e da apoptose estejam relacionadas com a fase do ciclo celular. Sabe-se que a taxa proliferativa está diretamente relacionada à progressão do ciclo celular. Desse modo, a diminuição da proliferação pela desnutrição é apoiada pelo resultado do ciclo celular, onde as células desnutridas apresentaram um aumento na percentagem da fase G0/G1, quando comparadas ao grupo controle nutrido. Além disso, o aumento da fase mitótica (G2/M) ocorreu apenas no tempo de 48h, se equiparando ao grupo nutrido. Isso revela um retardo no tempo de replicação das células IEC-6, as quais em condições normais de nutrição ocorreu em menor tempo, variando entre 19-22h (QUARONI et al., 1979). O resultado do presente estudo está de acordo com os resultados encontrados por Borelli (2009), nos quais animais com desnutrição proteica apresentaram maior percentagem de células (de medula óssea) na fase G0/G1 e menor percentagem nas fases S/G2/M com relação ao controle nutrido. Isso sugere que a desnutrição proteica diminui a capacidade proliferativa das células (BORELLI et al., 2009) devido a dificuldade que as células desnutridas têm de transpor a fase G1 em consequência da falta de nutrientes necessários para a progressão do ciclo (GÓMEZ et al., 1996; ORTIZ; BETANCOURT, 1984). Já foi descrito que a interrupção do ciclo na fase G0/G1 em células desnutridas da medula óssea é mediada pelo aumento da expressão das proteínas supressoras da progressão do ciclo celular (p21 e p27) e, redução da expressão de proteínas que induzem o ciclo celular (ciclina D1) (NAKAJIMA et al., 2014). Essa suspensão ou prolongamento do ciclo celular na fase G0/G1 ou S parece ser necessário nos casos de desnutrição, uma vez que visa prevenir o dano ao DNA e apoptose (AGARWAL et al., 2006). As constatações experimentais do presente estudo indicam que o declínio da taxa proliferativa de células IEC-6, quando desnutridas, podem ser causados pelo prolongamento do ciclo celular. Isso demonstra que a nutrição é um fator importante, que determina se a célula progride no ciclo e em qual taxa isto ocorre (SCHAFER, 1998). Os retinoides parecem desempenhar um papel na interrupção do ciclo celular mediante à diferenciação celular (MCKENNA, 2012). Resultados semelhantes 57 ao do presente estudo foram encontrados por Ribeiro (2013) em células de melanoma, onde o ácido retinoico diminuiu a proliferação celular, porém não aumentou a apoptose. Além disso, ocorreu um bloqueio da progressão do ciclo celular na fase G1, ou seja, aumentou a percentagem de células na fase G1 e diminuiu na fase S e G2/M (RIBEIRO et al., 2013). Outros resultados também descreveram a estagnação do ciclo celular em G0/G1 mediante tratamento com ácido retinoico, ocorrido através do aumento de p27 (um inibidor de quinase dependente de ciclina) e diminuição da expressão de c-Myc e ciclina-E (envolvidos na proliferação e ciclo celular) (DIMBERG, 2002), impedindo que a célula entrasse no ciclo e se proliferasse, à medida que também mostrou ter efeito pro-diferenciativo (NICHOLLS et al., 2013). Os retinoides são bem conhecidos como agentes propiciadores da diferenciação celular (SHI et al., 2013; TRAVERS et al., 2013; YANG; SHINKAI, 2013). Embora a maioria dos estudos revelem uma completa diferenciação celular induzida por ácido retinoico, o trabalho de Niu e colaboradores (2010) sugeriu que o ácido retinoico sozinho não conseguiu levar as células tronco de tumor cerebral a uma completa diferenciação, permanecendo apenas parcialmente diferenciadas. Dentre os dos principais marcadores de diferenciação nas células intestinais, estão a enzima IAP (“intestinal alkaline phosphatase” – fosfatase alcalina intestinal) (BALTES; NAU; LAMPEN, 2004) e a proteína FABP (Fat acid binding protein - Proteína de ligação de ácidos graxos) (ADRIAANSE et al., 2013; PELSERS et al., 2003). As expressões de IAP, enzima presente na borda em escova, e de FABP, proteína citosólica dos enterócitos, estão restritas às células diferenciadas no intestino delgado e, desde então, são consideradas excelentes marcadores da diferenciação das cripta/vilos (BRESSENOT et al., 2012; DUBÉ et al., 2001; GOLDBERG et al., 2008). Já foi relatado o aumento de IAP induzido por ácido retinoico em células Caco-2, inclusive em cultura com privação de SFB, demonstrando assim a diferenciação celular (BALTES; NAU; LAMPEN, 2004). Além disso, o receptor retinoide RXR, juntamente como receptor do hormônio da tireoide, parecem participar da ativação de IAP (MALO et al., 2004). Do mesmo modo, estudos ainda descreveram a relação dos retinoides com o aumento dos níveis da transcrição de FABP em diferentes tipos celulares, mostrando assim que os retinoides são capazes de ativar FABP (LARSEN; VOORHEES; ASTRÖM, 1994; POIRIER et al., 1997). 58 Neste contexto, as células tratadas no presente estudo com retinol ou palmitato de retinol apresentaram níveis elevados de IAP e FABP com relação aos controles nutrido e desnutrido. Desta forma, sugere-se que o tratamento com retinol e palmitato de retinol levam a uma diferenciação das células IEC-6. No entanto, necessita-se investigar ainda quais são os mecanismos celulares pelos quais os retinoides testados realizam estes efeitos. Os dados deste trabalho demostram que a desnutrição alterou a transcrição de c-Jun, c-Fos, STAT3, MEF2C, ATF2 E GLI3, enquanto o tratamento com os retinoides induziu o aumento da transcrição gênica de ATF2, ELK1, SRF, FOXO, cJun, STAT3, GLI3 e NF-κB. Já é conhecido por outros estudos que os retinoides atuam sobre a via das MAPKs. A ação do ácido retinoico em células intestinais, tal como nas células caco-2, tiveram efeito na diminuição da proliferação e aumento da diferenciação celular através da ativação da p38 MAPK, provavelmente através do mecanismo mediado por RAR (GRENIER et al., 2007). O ácido retinoico foi descrito como inibidor da proliferação de fibroblastos através de um mecanismo associado com a modulação de ERK1/2 e ativação JNK (c-Jun), em um mecanismo dependente da estimulação de RAR (HUO et al., 2013). Estudos sugerem que a ativação transiente de ERK1/2 esteja envolvida na proliferação celular, enquanto a ativação sustentada resulta na diferenciação dos enterócitos, uma vez que ERK1/2 também está envolvida na regulação da expressão de outro marcador de diferenciação de enterócitos, denominado SI (Sucraseisomaltase), em células Caco-2 (ALIAGA et al., 1999). O aumento de SRF (fator de resposta ao soro) tem sido associado ao desenvolvimento do sistema nervoso central (STRINGER et al., 2002) e na diferenciação de células do musculo liso vascular, do trato gastrointestinal e mesênquimal, relacionado a uma diminuição de ELK-1 que, por sua vez, está envolvido na proliferação (ALTHOFF et al., 2012; BROWNING et al., 1998; PARK et al., 2011). Entretanto, alguns outros estudos mostraram a participação de SRF juntamente com ELK-1 na indução da diferenciação de células hematopoiéticas (TOWNSEND et al., 1999) , estando de acordo com os achados do presente trabalho. 59 Além disso, estudos sugerem a participação de ELK-1 na diferenciação neuronal, na regulação da dinâmica do citoesqueleto (LAVAUR et al., 2007; SALINAS et al., 2004; VANHOUTTE et al., 2001) e no estímulo de efeitos neuroprotetores (ANGLADA-HUGUET et al., 2012). A via ERK-ELK-1 também foi referida com efeitos anti-apoptóticos (GONCHARENKO-KHAIDER et al., 2012), sendo mediadora dos efeitos da SOD3 (enzima superóxido dismutase-3), juntamente com a AKT, na sobrevivência celular e diminuição da apoptose em células induzidas a um estresse oxidativo (LAATIKAINEN et al., 2011). Mostrando assim, a participação desses fatores na diferenciação e sobrevivência celular. Além disso, SRF e ELK-1 também estão envolvidos com a transcrição de c-Fos (JANKNECHT et al., 1993), embora seja proposto que esta transcrição exija uma interação com mais fatores além de SRF e ELK-1 (MARAIS; WYNNE; TREISMAN, 1993). C-Fos age conjuntamente com c-Jun atuando como um dimero, mas c-Jun pode, por si só, atuar na ativação de fos/jun. Este fato já foi relatado e associado com a diferenciação de células precursoras mieloides normais. Porém, apenas c-jun atuou em mieloblastos leucêmicos (LORD; ABDOLLAHI; HOFFMANLIEBERMANN, 1993). A ativação sustentada de c-Fos e c-Jun também foi descrita na diferenciação de células de feocromocitoma (PC12) (ERIKSSON; TASKINEN; LEPPÄ, 2007) e c-jun na diferenciação endodérmica (BJERSING; BRORSSON; HEBY, 1997). Embora c-Jun seja referido como indutor da apoptose em vários trabalhos (BAVARIA et al., 2014; BHATTACHARYA et al., 2003; HAM et al., 2000), ele também pode desempenhar um papel anti-apoptótico, auxiliando na sobrevivência (LEUNG et al., 2008; MA et al., 2012) e na diferenciação celular (LUO et al., 2014). Em concordância com o presente trabalho, na análise de células desprovidas de nutrientes foi verificado uma diminuição da expressão de c-jun (LI et al., 2013; YOGEV et al., 2010). Embora c-fos e c-jun atuem muitas vezes em conjunto, outros estudos também mostram que células desnutridas aumentam a expressão de c-fos, como uma forma de proteção ao estresse causado pela desnutrição (GARRETT et al., 2014; HENSEN et al., 2013; LEE et al., 2012). O c-Jun está envolvido na diferenciação de células F9, mas este processo parece ser mediado pela ativação de ATF2, que é induzida pelo tratamento com ácido retinoico, ou seja, o ácido retinoico induz diferenciação de células F9 através da ativação de ATF2/c-jun (KAWASAKI et al., 1998). Na realidade, c-jun e ATF2 agem 60 conjuntamente formando heterodímeros. Esta ligação evita o egresso de ATF2 do núcleo e deste modo permite que controlem a expressão de um conjunto de genes, incluindo do próprio c-Jun e de genes envolvidos na resposta ao estresse (LIU et al., 2006). Outro estudo também sugeriu que o ácido retinóico promove diferenciação de granulócitos através da ativação de ATF2 (HONG et al., 2004). Em discordância com os resultados deste estudo, outros trabalhos observaram que a desnutrição proteica levou a um aumento da ativação de ATF2, que por sua vez está envolvido com a transcrição de CHOP, gene cuja expressão está associada com a supressão de aminoácidos (AVEROUS et al., 2004; BRUHAT et al., 2000) e com a regulação do metabolismo energético (ROESLER, 2001). Já é conhecido que a ativação da PI3/AKT, principal via de fosforilação de FOXO (fator de transcrição da família Forkhead Box), promove a sobrevivência em vários tipos celulares, incluindo células epiteliais intestinais (FINNBERG; ELDEIRY, 2004; TRAN et al., 2002). Já foi relatado que o aumento da ativação de AKT em células intestinais, desprovidas de poliaminas, atua na ativação de NF-κB, que está relacionado com um decréscimo da apoptose por meio de um mecanismo que inibe a ativação da caspase-9 e caspase-3 (BHATTACHARYA; RAY; JOHNSON, 2005; ZHANG et al., 2004). Ressalta-se que em resposta a baixos níveis de estresse oxidativo, c-Jun pode fosforilar FoxO4 levando a uma relocalização das proteínas FoxO para o núcleo, com a função de controlar o estresse oxidativo através da indução da transcrição de enzimas antioxidantes, como SOD e catalase (ESSERS et al., 2004). A proteína FoxO1 também está relacionada com o metabolismo do retinol nas células hepáticas, desempenhando função importante durante a gliconeogênese hepática (SHIN et al., 2012). Outros estudos também apontam FoxO1 e FoxO3 como fatores de sobrevivência celular em células cardíacas, uma vez que podem diminuir o estresse oxidativo e a morte celular (SENGUPTA et al., 2011). Além disso FOXO4, juntamente com MEF2c também desempenham função no desenvolvimento cardiovascular (CREEMERS et al., 2006) e na longevidade de células com restrições dietéticas (GREER; BANKO; BRUNET, 2009; GREER; BRUNET, 2009). Os níveis de transcrição dos FoxOs se associam também com a nutrição e tratamentos hormonais, assim podem se encontrar elevados diante de uma dieta desprovida de proteína e tratamento com glicocorticoide (IMAE et al., 2003). 61 O fator de transcrição FoxO também pode levar ao bloqueio no ciclo celular, principalmente na fase G1/S devido a promoção dos inibidores de Cdk p27 e p21 (MEDEMA et al., 2000; SEOANE et al., 2004) e a repressão da expressão da ciclina D1 e D2 (SCHMIDT et al., 2002). Embora as proteínas FoxO tenham sido bastante associadas com a apoptose e bloqueio do ciclo celular, também já mostrou participar da diferenciação de mioblastos primários (BOIS; GROSVELD, 2003). Todos esses dados comprovam a ação das proteínas FoxO em diversas funções, por mais que sejam diversificadas e complexas. No presente trabalho, foi demonstrado o aumento da transcrição de Foxo3-4 que juntamente com os outros genes analisados em células IEC-6 desnutridas e tratadas com retinol e ácido retinóico, foram os possíveis responsáveis pelos resultados do tratamento destas substancias, tais a diminuição da proliferação, a apoptose, bloqueio do ciclo celular na fase G1 e promoção da diferenciação celular. Outro estudo indicou que a localização nuclear de FoxO1a pode modular a atividade de IL-6- agindo como um coativator de STAT3 (KORTYLEWSKI et al., 2003). A ativação de STAT3 parece inibir a autofagia, processo de sobrevivência celular desencadeado pela desnutrição (SHEN et al., 2012). Desse modo estes dados corroboram com o resultado do presente trabalho, em que as células desnutridas diminuíram a transcrição de STAT3. Além disso, estudos demonstraram que a diferenciação de células neuronais mediante tratamento com ácido retinoico levou a uma ativação de STAT3 mediante ativação de RAR (HERRERA; CHEN; SCHUBERT, 2010). O tratamento com ácido retinoico também induziu o desenvolvimento de células dendríticas através da ativação de STAT3 (FENG et al., 2010). O fator de transcrição STAT3 tem sido reportado como detentor de função na diferenciação de vários tipos celulares, tais como células dendríticas (PARK et al., 2004), células de leucemia mieloide (MINAMI et al., 1996), na diferenciação de gliomas, como uma forma de tratamento de supressão de tumor, através da ativação da via IL-6/JAK2/STAT3, conhecida como via de sobrevivência (SHU et al., 2011) e no bloqueio da proliferação e diferenciação de célula de carcinoma medular da tireoide (PARK et al., 2005) e de células leucêmicas (NAKAJIMA et al., 1996). Além disso, foram observados efeitos anti-apoptóticos, uma vez que a sua inibição foi associada ao aumento da morte celular (SHIM et al., 2009) e uma associação entre a sobrevivência de células desnutridas e a ativação de STAT3 62 induzida por tratamento com IL-22 (LIU et al., 2012). A sobrevivência celular desencadeada por STAT3 parece estar relacionada com a inibição da abertura do poro de transição de permeabilidade (PTP) da mitocôndria e consequente inibição da apoptose (BOENGLER et al., 2010). No intestino, sua ativação também foi relacionada com a sobrevivência celular (GRIVENNIKOV et al., 2009) e na proteção contra infecção (GUO et al., 2014). A transcrição de MEF2c neste trabalho se apresentou diminuída no grupo desnutrido quando comparado ao nutrido. Do mesmo modo, a desnutrição de células do músculo esquelético e a atrofia muscular também demonstrou uma supressão da transcrição de MEF2c (SHUM et al., 2012; YOGEV et al., 2013). Embora a expressão de MEF2c no intestino participe diretamente do metabolismo na vitamina A, ela está principalmente relacionada com a promoção da expressão da BCMO1 (enzima que cliva o β-caroteno a retinal) (GONG et al., 2006). Assim, os retinoides testados no presente estudo não mostraram uma alteração estatística da transcrição de MEF2c com relação ao controle desnutrido, em parte também devido a alta variabilidade dos grupos, principalmente do retinol. A ativação de MEF2c através de MAPk além de aumentar a transcrição de c-Jun (expresso em células quiescentes em resposta a mitógenos) (KATO et al., 1997, 2000; MCKINSEY; ZHANG; OLSON, 2002) ainda parece desempenhar um papel importante na sobrevivência de células endoteliais (OLSON, 2004), células musculares (DEVAKANMALAI; ZUMRUT; OZBUDAK, 2013) e células neuronais (AKHTAR et al., 2012). Também destaca-se que MEF2c é uma proteína reguladora da transcrição do transportador de glicose (THAI et al., 1998). É possível que isto explique o fato de apenas o grupo nutrido apresentar aumento significativo de MEF2c. Na maioria das células o NF-κB se encontra inativo no citosol, retido em um estado latente através da interação com a proteína IκB, a qual existe em 3 isoformas (IκBα, IκBβe IκBε). Na presença de um sinal, essa interação é desfeita e NF-κB pode migrar para o núcleo e se ligar à sequencias específicas do DNA (sítios κB), onde pode promover inflamação, sobrevivência ou divisão celular (GERONDAKIS et al., 2014; VAYSBERG et al., 2008). A via de sinalização NF-kB desempenha um papel central na ativação de respostas pro-inflamatórias mediante presença de agentes patogênicos. Como 63 exemplo temos o LPS (lipopolissacarídeo), presente na membrana de bactérias gramnegativas estimula significativamente NF-kB (WANG; GAO; HARDWIDGE, 2012). Entretanto, outros estudos também observaram a participação do fator de transcrição NF-kB na promoção da sobrevivência celular (CARGNELLO; ROUX, 2011), diminuindo a apoptose, com o aumento da transcrição de proteínas anti-apoptóticas e diminuição das pro-apoptóticas (HOMAIDAN; CHAKROUN; EL-SABBAN, 2003). Estudos também demonstram a importância dessa via para a manutenção da homeostase e integridade intestinal (PASPARAKIS, 2008, 2012). Experimentos knockout, mostraram a relevância do NF-κB na proteção intestinal (CHEN et al., 2003) e na regulação da transcrição de genes codificadores de peptídeos antimicrobianos (NENCI et al., 2007), além da sobrevivência celular através da inibição da apoptose nas células intestinais (BURDELYA et al., 2008). Desse modo, o aumento da transcrição de NF-κB neste trabalho pode estar associado ao efeito dos retinoides na diminuição da apoptose. A via Hedgehog (Hh) é necessária para a formação adequada das vilosidades, regulação da migração celular e para a contenção da proliferação das regiões intervilos dentro do epitélio intestinal. O bloqueio da via Hedgehog leva a uma completa ausência de vilosidades, a persistência de um epitélio altamente proliferativo, um déficit de células devidamente diferenciadas (CROSNIER; STAMATAKI; LEWIS, 2006) e conduz a um aumento da morte celular por apoptose (TANG et al., 2006b). Os fatores de transcrição Gli-Kruppel (GLI 1, 2 e 3) são os principais mediadores da via de sinalização hedgehog/patched (RUPPERT et al., 1988; YANG et al., 1997). Dos 3 tipos dos fatores de transcrição GLI, o GLI3 é o mais abundantemente expresso tanto no íleo quanto no estômago (TANG, 2006) . O tratamento de células com retinoides mostrou ter efeito na via Hh, regulando os níveis de GLI2 e GLI3 (GOYETTE et al., 2000; MAYNARD et al., 2013), entretanto essas funções ainda não foram vistas em células intestinais. A transcrição de GLI3 desempenha funções no desenvolvimento embrionário e sua alteração ou mutação pode levar a malformações do trato gastrointestinal (KOLTERUD et al., 2009). A expressão de GLI3 parece estar envolvido na diferenciação celular (YANG et al., 1997) e na formação do eixo criptavilos, através da transcrição dos genes Foxf1 e Foxl1 (MADISON et al., 2009). Os 64 efeitos de diferenciação celular não estão restritos ao intestino, mas também são importantes na diferenciação dos condrócitos (PROBST; ZELLER; ZUNIGA, 2013) e na diferenciação neuronal (MIYAHARA et al., 2014). Durante a diferenciação dos mioblastos regula fatores pró-angiogênicos (RENAULT et al., 2013) e em células endoteliais promove a migração celular (RENAULT et al., 2009). Destaca-se, além do exposto, que estímulos estressantes, neste caso a desnutrição, pode desencadear, dentre outros efeitos, a diferenciação celular, de uma forma reversível (PROSKURYAKOV; KONOPLYANNIKOV; GABAI, 2003). Assim, podemos sugerir que este fator, juntamente com a adição dos retinoides, pode facilitar a diferenciação das células IEC-6. Desse modo, a partir dos resultados mostrados neste trabalho, pode-se propor que os genes ATF2, ELK1, SRF, FOXO, c-Jun, STAT3, GLI3 e NF-κB agem em conjunto para a realização dos efeitos dos retinoides na apoptose, no ciclo celular e na diferenciação em células IEC-6 desnutridas. 65 Tabela 5: Resumo dos resultados da transcrição gênica para as vias analisadas em comparação ao grupo desnutrido. Table 1 GENE NUTRIDO FABP − IAP PALMITATO DE RETINOL RETINOL FUNÇÃO é é DIFERENCIAÇÃO CELULAR − é é DIFERENCIAÇÃO CELULAR ELK1 − é é SRF − é é FOS ê − − PROTEÇÃO AO ESTRESSE JUN é é é DIFERENCIAÇÃO CELULAR PROLIFERAÇÃO/DIFERENCIAÇÃO ANTI-APOPTÓTICO DESENVOLVIMENTO DO SNC DIFERENCIAÇÃO CELULAR SOBREVIVÊNCIA E ANTI-APOPTÓTICO FOXO3-4 − é é ANTI-APOPTÓTICO DIFERENCIAÇÃO CELULAR DIFERENCIAÇÃO E STAT3 é é é SOBREVIVÊNCIA CELULAR ANTI-APOPTÓTICO MEF2C é − − ATF2 é é é GLI3 ê é é NFk-B − é é SOBREVIVÊNCIA CELULAR RESPOSTA AO ESTRESSE DIFERENCIAÇÃO CELULAR FORMAÇÃO EIXO CRIPTA-VILOS MIGRAÇÃO/DIFERENCIAÇÃO SOBREVIVÊNCIA CELULAR ANTI-APOPTÓTICO Legenda: SNC – Sistema Nervoso Central. ( é ) aumento de transcrição; ( ê ) diminuição da transcrição; ( - ) transcrição não alterada 66 7 CONCLUSÃO Os resultados do presente trabalho nos permitem concluir que a desnutrição afetou a proliferação celular, retardando o ciclo celular. O tratamento com o palmitato de retinol, mas não o retinol, diminuiu a taxa proliferativa e a apoptose. Ambos os tratamentos com os retinoides retardaram o ciclo celular quando comparados ao controle desnutrido e estimularam a diferenciação celular possivelmente por mecanismos associados com as vias moleculares do ATF2, MAPK/ERK/JNK, IL-6, Hedgehog, PI3K/AKT e NF-κB. 67 8 PERSPECTIVAS Embora muito já tenha sido investigado, ainda necessita-se de mais estudos para melhor elucidação da hipótese proposta. Assim, experimentos com métodos de supressão gênica e utilização de bloqueios farmacológicos serão necessários a fim de investigar se os efeitos dos retinoides nas vias propostas devem-se a ativação dos receptores acoplados à proteínas G, ou dos receptores retinoides RAR/RXR. Além disso, as vias também podem ser investigadas mais detalhadamente, através de suas inibições, com o intuito de verificar o real efeito de cada via nas células intestinais tratadas com retinoides. Os experimentos de análise proteica dos genes analisados já foram iniciados. Entretanto por motivos de problemas metodológicos esses experimentos foram temporariamente adiados, sendo necessário sua retomada. Contudo os dados apresentados no presente estudo direcionam e norteiam as futuras pesquisas na identificação do mecanismo de ação modulatório dos retinoides nas células intestinais. 68 9 BIBLIOGRAFIA ADRIAANSE, M. P. M. et al. Serum I-FABP as marker for enterocyte damage in coeliac disease and its relation to villous atrophy and circulating autoantibodies. Alimentary pharmacology & therapeutics, v. 37, n. 4, p. 482–90, fev. 2013. AGARWAL, M. K. et al. Macrophage inhibitory cytokine 1 mediates a p53dependent protective arrest in S phase in response to starvation for DNA precursors. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, v. 103, n. 44, p. 16278–83, 31 out. 2006. AHMED, T.; RAHMAN, S.; CRAVIOTO, A. Oedematous malnutrition. 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