Evidenciação dos ativos e passivos dos contratos de concessão: o caso da PPP-MG050 Autoria: Maria Elisabeth Moreira Carvalho Andrade, Vinicius Aversari Martins Resumo: Nas últimas décadas surgiram novos arranjos institucionais, com o objetivo de suprir a falta de investimentos públicos em setores essenciais para o desenvolvimento de qualquer país, como, água e saneamento, energia, infraestrutura, telecomunicações, educação, saúde e segurança. Atualmente, no Brasil os modelos mais utilizados são as concessões. A legislação em vigor prevê três modalidades, uma denominada como concessão ‘comum’ (regida pela Lei n° 8.987/95) e em 2004 houve a introdução de mais duas modalidades de concessão (regida pela Lei n° 11.079/04), que instituiu as denominadas parcerias públicoprivadas – PPPs, nas modalidades patrocinada e administrativa. Neste contexto, a contabilidade se insere no sentido de evidenciar (disclosure) a substância econômica desses contratos nos demonstrativos contábeis dos parceiros público e privado, com o objetivo de fornecer informações úteis aos seus diversos usuários. Dessa forma, o presente trabalho tem por objetivo principal analisar as alternativas possíveis de contabilização dos ativos e passivos dos contratos de concessão nos parceiros privados e públicos. E um objetivo secundário que é analisar se as despesas com PPPs são apenas comprometimento de fluxo de caixa ou um endividamento disfarçado que pode vir a impactar o equilíbrio das contas públicas. Após a fundamentação teórica, apresentando pesquisas que representam o ‘estado da arte’ sobre o tema e uma breve análise dos normativos contábeis emitidos pelos órgãos internacionais (IPSASB e IASB), adotou-se a estratégia de pesquisa de Estudo de Caso, investigado por dados primários, e pesquisa documental. O contrato analisado foi o da Parceria PúblicoPrivada – PPPMG-050. Conclui-se que as características de controle, propriedade e risco influenciam na contabilização e evidenciação das demonstrações contábeis dos parceiros. Espera-se que, com a recente normatização para o parceiro privado e a que está por vir para o parceiro público, esses contratos que são de grande relevância social, apurem um resultado econômico mais próximo da realidade, proporcionando uma informação de qualidade, para tomada de decisão, aos diversos usuários da contabilidade. Quanto às despesas de PPPs, apesar de não ser um endividamento ‘direto’, se não forem celebradas com planejamento e controle podem vir a impactar as contas públicas a longo prazo. As parcerias com o setor privado são de suma importância para o desenvolvimento econômico e social de um país. Por isso antes de serem outorgadas, estudos da viabilidade e oportunidade devem ser realizados e metodologias de análise devem ser desenvolvidas com base na experiência internacional. 1 1 INTRODUÇÃO As concessões, visando parcerias com o setor privado, já existem há séculos, sendo que nas últimas décadas surgiram novos arranjos institucionais, com o objetivo de suprir a falta de investimentos públicos em setores essenciais para o desenvolvimento de qualquer país, como, água e saneamento, energia, infraestrutura, telecomunicações, educação, saúde e segurança. Atualmente a legislação brasileira prevê três modalidades, uma denominada como concessão ‘comum’ (regida pela Lei n° 8.987/95i) e em 2004 houve a introdução de mais duas modalidades de concessão (regida pela Lei n° 11.079/04ii), que instituiu as denominadas parcerias público-privadas – PPPs, nas modalidades patrocinada e administrativa. As principais diferenças entre as PPPs e a concessão ‘comum` são: o compartilhamento de risco e a obrigatoriedade de haver uma contraprestação pecuniária por parte do Estado. Com esses novos arranjos institucionais, que são celebrados das mais variadas formas, o Estado mudou a sua postura de empresário para regulador. Neste contexto, a contabilidade se insere no sentido de evidenciar (disclosure) a substância econômica desses contratos nos demonstrativos contábeis dos parceiros público e privado, com o objetivo de fornecer informações úteis aos seus diversos usuários. Mas, devido à diversidade de eventos contábeis advindos desses arranjos, surgiram inúmeras divergências quanto à contabilização. E a fim de suprir essa lacuna regulatória, o International Accounting Standards Board - IASB, em 2006, com a colaboração do International Financial Reporting Interpretations Committeeiii, emitiu a IFRIC 12 - Service Concession Arrangements (interpretação que tem o mesmo poder de aplicabilidade das IAS e IFRS), que trata da contabilização dos contratos de concessões pelo parceiro privado. Como o Brasil está adotando as International Financial Reporting Standards - IFRSs, emitidas pelo IASB, a Comissão de Valores Mobiliários – CVM, em 22 de dezembro de 2009, publicou a Deliberação n° 611 que “Aprova a Interpretação Técnica ICPC 01 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis - CPC, que trata de contratos de concessão”. A ICPC 01 tem correlação direta à IFRIC 12, e sendo obrigatória às companhias abertas a partir de 2010. Portanto, neste artigo as análises realizadas em relação à IFRIC 12, também são aplicáveis à ICPC 01. Quanto ao setor público, a Secretaria do Tesouro Nacional - STN emitiu a Portaria n°: 614/06, que estabeleceram normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de PPP. No âmbito internacional está em audiência pública, desde fevereiro de 2010, minuta de interpretação, Exposure Draft - ED 43 - Service Concession Arrangements: Grantor, proposta pelo International Public Sector Accounting Standards Board – IFAC, através de seu comitê emissor de normas públicas, o International Public Sector Accounting Standards Board – IPSASB, que é o espelho da IFRIC 12, mas ainda não foi emitido o normativo final. O setor público, no Brasil, também está em processo de convergência às normas internacionais do aplicadas ao setor público emitidas pelo IPSASB, assim espera-se que em breve também será emitida a norma para o parceiro público. Os contratos de concessão são de longo prazo e não padronizados, ou seja, são celebrados das mais variadas formas. Também envolvem ativos específicos, que em sua maioria são bens públicos pertencentes (ou que vão pertencer) ao patrimônio público. O que ocorre é apenas a transferência temporária daquele bem ao parceiro privado durante o prazo do arranjo, embora o Poder Público, mesmo durante o contrato, possua determinado controle, como fixação de preços, medição do índice de desempenho, direito residual sobre a propriedade, entre outros. Esses arranjos são expostos a incertezas, garantias e riscos, por isso a evidenciação desses ativos e passivos nas demonstrações contábeis pode ser relevante, contribuindo para uma visão patrimonial justa e verdadeira (true and fair view). 2 Diante do exposto, o problema de pesquisa é: Como e por que o controle, propriedade e risco implicam na contabilização dos contratos de concessão? Uma questão secundária, mas não menos importante, no cenário brasileiro atual, as despesas de PPPs assumidas pelo poder concedente, em sua totalidade, possuem característica econômica de despesas de caráter continuado? Assim, aventa-se a hipótese de que controle, risco e propriedade são características que alteram a contabilização dos contratos de concessão. O artigo possui dois objetivos: i) analisar as alternativas possíveis de contabilização dos ativos e passivos dos contratos de concessão nos parceiros privados e públicos; ii) analisar se as despesas com PPPs são apenas comprometimento de fluxo de caixa ou um endividamento disfarçado que pode vir a impactar o equilíbrio das contas públicas. Para o alcance desses objetivos foram realizadas: revisão teórica sobre o tema; análise dos normativos contábeis e estudo de caso da Parceria PúblicoPrivada - PPPMG – 050, que está em vigor desde 2007, no Estado de Minas Gerais. Além desta introdução, o artigo conta com mais cinco seções. A segunda contém a fundamentação teórica. Na terceira são analisados conceitualmente os ativos e passivos dos contratos de concessão. Na quinta os procedimentos metodológicos. E a sexta relatada o estudo de caso do contrato da PPP MG050. E a última seção traz as considerações finais. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Nesta seção, após uma revisão da conceitual sobre o tema, fundamentou-se o estudo em dois tópicos. O primeiro tópico contextualiza as concessões no Brasil. No segundo tópico é exposta a necessidade da normatização das concessões. 2.1 Concessões no Brasil Tendo em vista os diferentes tipos de parcerias existentes em todo o mundo, com legislações diversificadas é necessário contextualizar os contratos de concessão no Brasil. O Brasil adotou o modelo inglês, sendo que as PPPs no Reino Unido são mais abrangentes que as concessões previstas no Brasil. No Reino Unido, elas são qualquer colaboração entre o setor público e privado, inclusive com entidades do terceiro setor. Nesse sentido, a parceria que mais se assemelha ao modelo brasileiro é o Private Finance Iniciative (PFI), que engloba as concessões ‘comuns’ e as modalidades de PPP (VILLEGAS FERNÁNDEZ, 2006; PECI e SOBRAL, 2007; GRILO, 2008). Conforme já destacado na introdução a legislação brasileira em vigor prevê três modalidades, uma denominada como concessão ‘comum’ (regida pela Lei n° 8.987/95) e em 2004 houve a introdução de mais duas modalidades de concessão (regida pela Lei n° 11.079/04), que institui as denominadas parcerias público-privadas – PPPs, nas modalidades patrocinada e administrativa. Portanto, neste artigo o termo concessões engloba as modalidades de concessão comum, e as parcerias público-privadas que em comparação ao Reino Unido são os contratos de PFI. O que importa não é a modalidade que se vai adotar e sim o que está estabelecido contratualmente, ou seja, a essência econômica do contrato, o compartilhamento de risco, características de controle da infraestrutura, reversão de bens ao final do arranjo, entre outros. 2.1.1 Concessão de Serviço Público (concessão ‘comum’) A Lei n° 8.987/95 define, em seu art.2°, inciso II, a concessão de serviço público (neste artigo concessão ‘comum)’ como “a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado”. Trata-se do conceito legal, entretanto o artigo não menciona a forma de remuneração a ser contratada com o parceiro privado, que geralmente é através da cobrança de tarifa, além da possibilidade de subsídio governamental, desde que disposto em lei, diferente da contraprestação prevista nas PPPs. 3 Para melhor entendimento, buscou-se a definição de concessão de serviço público da professora Di Pietro (2009, p.75), a qual conceitua: Contrato administrativo pelo qual a Administração pública delega a outrem a execução de um serviço público, para que o execute em seu próprio nome, por sua conta e risco, mediante tarifa paga pelo usuário ou outra forma de remuneração decorrente da exploração do serviço. (DI PIETRO, 2009, p.75) 2.1.2 Parcerias público-privada – PPPs Segundo a Lei n° 11.079/04, as parcerias público-privadas (PPPs) podem ser de dois tipos: patrocinada e administrativa. A PPP na modalidade patrocinada, (art. 2°, §1°), é semelhante a uma concessão ‘comum’. A principal diferença é que existe a contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado. A contraprestação, na modalidade patrocinada, tem por objetivo suprir a receita insuficiente a ser auferida com a prestação de serviços, ou seja, o projeto não é autosustentável. Com isso, tem-se a necessidade de uma complementação de recursos por parte do poder concedente para a remuneração dos investimentos a serem realizados pelo parceiro privado. Tal fato não ocorre na concessão ‘comum’, na qual o parceiro privado recebe uma licença para explorar um serviço público e é remunerado exclusivamente com a cobrança de tarifa dos usuários. Somente em casos excepcionais e autorizados por lei específica pode ocorrer a contraprestação em forma de subsídios. A lei limita a contraprestação pecuniária na modalidade patrocinada em até 70% da remuneração total a ser paga ao parceiro privado, salvo se houver autorização legislativa (art. 10, §5°). Di Pietro (2009, p. 147) enumera algumas diferenças entre a concessão patrocinada e a concessão comum: (i) quanto aos riscos que, nas PPPs, são repartidos com o parceiro público; (ii) quanto às garantias, que o poder público presta ao parceiro privado e ao financiador do projeto; (iii) quanto ao compartilhamento entre os parceiros de ganhos econômicos decorrentes da redução do risco de crédito dos financiamentos utilizados pelo parceiro privado. Já a modalidade administrativa ocorre quando há uma prestação de serviços em que a Administração Pública é usuária direta ou indireta, mesmo quando há investimentos a serem realizados, não existindo receitas de tarifas (art. 2° §2°). Há que se diferenciar a concessão na modalidade administrativa dos contratos de serviços que trata a lei de licitações (Lei n° 8.666/93iv), que são os serviços contratados por empreito. Uma diferença é o prazo, que pela lei de licitações em regra geral, fica adstrito a vigência dos créditos orçamentários, ou seja, ao ano civil. Admitem-se exceções, mas mesmo assim, considera-se que contratos de empreitada são de curto prazo e na Lei de PPP os contratos são de no mínimo cinco anos. Segundo Di Pietro (2009), a concessão administrativa é um misto de empreitada e de concessão de serviço público. Exemplifica que a construção de um hospital ou uma escola, por meio de um contrato de PPP na modalidade administrativa, deve vir seguida também de prestação de serviços pelo parceiro privado, com a Administração Pública sendo usuária direta ou indireta, caso contrário, será um contrato administrativo regido pela Lei n° 8.666/93. Destaca-se o art. 28 da Lei n° 11.079/04, alterado pela Lei n° 12.024/09, estabelece um limite para o total das despesas de caráter continuado com as PPPs, em 3% (três por cento) da receita corrente líquida do exercício. Ou ainda, se a soma das despesas anuais dos contratos vigentes dos próximos dez anos também ultrapassarem esse limite da receita projetada para os períodos subsequentes. E para a aplicação desse limite são computados todos os contratos de PPPs celebrados pela administração direta e indireta, exceto as empresas estatais não dependentes. Até maio de 2010, foram celebrados 11 (onze) contratos de PPPs no Brasil, há vários outros em estudos, mas ainda não concretizados. A tabela 01 contém os contratos assinados; a modalidade; prazo e valor da contraprestação. 4 Tabela 01: Valor Total dos contratos de parceria público-privada (PPP) até maio de 2010 Unidade Federativa São Paulo Pernambuco Rio Claro SP Minas Gerais São Paulo Bahia Brasília Brasília Minas Gerais Pernambuco União Federal Projeto Metrô Linha 4 Amarela Complexo Viário da Praia do Paiva Esgotamento Sanitário do Município de Rio Claro Rodovia MG-050 Sistema Produtor Alto Tietê Sistema Disposição Oceânica do Jaguaribe Conjunto Habitacional Mangueiral Centro Administrativo do Distrito Federal Complexo Penal Centro Integrado de ressocialização do Itaquitinga Datacenter do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal Modalidade Prazo (anos) Contraprestação(*) Patrocinada 32 120 milhões Patrocinada 33 44,1 milhões Administrativa 30 80 milhões Patrocinada 25 189,6 milhões Administrativa 15 997,4 milhões Administrativa 18 619,5 milhões Administrativa 15 904,2 milhões Administrativa 22 2,4 bilhoes Administrativa 27 2 bilhões Administrativa 33 2 bilhões Administrativa 15 1 bilhão (*) valores aproximados Fonte: Adaptado de Gustavo Eugenio Rocha e João Carlos Mascarenhas Hortav Dos 11 (onze) contratos, observou-se que a maioria foi celebrado na modalidade administrativa, em não há cobrança de tarifas, ou seja, o pagamento é realizado exclusivamente pelo poder concedente. Por isso a importância de se analisar o comprometimento de caixa com as despesas de PPPs, que será discutido ao longo deste artigo. 2.2 Necessidade da normatização contábil das concessões Desde o surgimento das PPPs no Reino Unido, em 1990, vários estudos discutem o tratamento contábil a ser adotado pelos parceiros público e privado, a fim de evidenciar a substância econômica desses arranjos (BENITO ET AL., 2008; HEALD, 2003; HEALD; GEAUGHAN, 1997; HODGES; MELLET, 2002; LEWIS, 1992). Esses arranjos inicialmente não eram contabilizados (off-balance sheet), ou se contabilizados não estavam evidenciando a substância dos mesmos, pois, os que apareciam nos balanços eram classificados como arrendamento mercantil. Um ponto de divergência é quanto aos passivos e contingências assumidos no momento da celebração dos contratos, que não estavam sendo evidenciados nos balanços. Os contratos eram tratados como arrendamento mercantil, independente das características de controle e risco, o que não retrata a substância sobre a forma (HODGES e MELLETT 1999; 2002 e 2005; MAYSTON, 1999; WALKER, 2003). Um ponto de destaque está associado à contabilização da infraestrutura, ou seja, em qual balanço a infraestrutura deve ser reconhecida, concessionária ou poder concedente. Benito et al. (2008, p. 977) resumem esses problemas contábeis em: a) se as propriedades envolvidas nos contratos de concessão são ativos e se os montantes a pagar aos operadores são passivos do poder concedente; ou se o governo apenas recebe um serviço e paga por ele; b) se o operador possui um ativo para prestar um serviço, ou se ele tem um ativo financeiro que representa o montante a ser pago pelo poder concedente. Dewatripont e Legros (2005, p.132) citam que as PPPs podem ‘maquiar’ os balanços públicos: “é claro que as PPPs têm sido atrativas para os governos tentando fazer suas contas ‘parecerem boas’, assim (ab)usando das regras da contabilidade pública não demonstrando o valor adequado dos ativos e passivos”. Se os arranjos de concessão não forem evidenciados nos balanços públicos não é possível analisar a situação patrimonial do poder concedente, pois, não demonstrará o déficit público, bem como os ativos envolvidos, sendo necessário contabilizar a essência sobre a forma jurídica desses contratos (BENITO ET AL., 2008; HEALD, 2003; WALKER, 2003). Torres e Pina (2001) destacam que iniciativas de contabilização dos contratos de PPP têm como objetivo dar transparência a este tipo de prestação de serviço público. E também divulgar as despesas que não estão incluídas nos balanços públicos, pois são relevantes para a sustentabilidade da política fiscal e a qualidade da prestação dos serviços públicos. 5 Diante desses questionamentos e diferentes pontos de vista, de diversos setores envolvidos nos contratos de concessões, o Accounting Standard Board – ASB – órgão emissor de normas contábeis no Reino Unido, publicou o normativo Financial Reporting Standard 5 FRS 5 - Reporting the Substance of Transactions, em 1998, que trata da contabilização dos contratos de PFI e outros contratos similares, que são um subconjunto das Public PrivatePartnerships - PPPs. A FRS 5 define que a parte exposta aos maiores riscos e benefícios é quem deve reconhecer a infraestrutura e, se necessário, um passivo relacionado. Não leva em consideração quem possui o controle sobre a propriedade e preço, se o parceiro privado suportar os maiores riscos, como por exemplo, financeiro, operacional, de construção, a infraestrutura deverá ser contabilizada em seu balanço e não do poder concedente. E posteriormente, em 2006, veio a IFRIC 12 (normativo para parceiro privado) e o ED 43 (normativo para o parceiro público) que ainda está em discussão. Então, atualmente no contexto brasileiro, tem-se para a contabilização dos contratos de concessão a ICPC 01 (que tem correlação direta com a IFRIC 12) para o parceiro privado. Já para o parceiro público, em 2006, a Secretaria do Tesouro Nacional - STN emitiu as Portarias n°s: 614/06 e 632/06vi, que estabeleceram normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de PPP. A portaria cita que a classificação contábil deve observar a essência das transações sobre seus aspectos formais, mas na prática, não está sendo evidenciada. 3 ATIVOS E PASSIVOS ENVOLVIDOS NOS CONTRATOS DE CONCESSÃO Os ativos físicos envolvidos em um contrato de concessão são aqueles já existentes e que são realizadas melhorias e/ou ampliação e os construídos pelo parceiro privado. Ressaltase que os contratos de concessão sempre além da construção ou ampliação vêm seguidos de prestação de serviços pelo parceiro privado, caso contrário seria uma obra realizada por empreito. Segundo Martins e Andrade, (2009, p. 19), à primeira vista, esses ativos são dos parceiros privados, pois aparentemente eles o controlam. Entretanto, ao se analisar com mais cuidado esses ativos físicos (infraestrutura), nota-se que esses são controlados exclusivamente pelo concedente (parceiro público) que, adicionalmente, também tem direito aos benefícios residuais sobre o ativo ao final do contrato. Pela substância econômica, o parceiro público concede o direito de administração do ativo físico (infraestrutura) para o parceiro privado. E este irá obter benefícios futuros (fluxos de caixa) através da administração (uso) da infraestrutura. Dessa forma, chega-se à conclusão de que os ativos físicos (construídos ou não pelo parceiro privado) não são ativos do parceiro privado. Ele somente os administra com a intenção de, através dessa atividade, obter benefícios futuros, que por sua vez, contêm a substância econômica que irá caracterizar os ativos efetivos do parceiro privado. Para melhor compreensão esta seção está subdivida em dois tópicos: i) ativos e passivos do parceiro privado; ii) ativos e passivos do parceiro público. 3.1 Ativos e passivos do parceiro privado (tendo por base a IFRIC 12) A IFRIC 12 aplica-se às entidades privadas somente se o poder concedente possuir controle ou regulamentar os serviços a serem prestados, a quem e a que preço e ainda tiver o controle em qualquer participação residual na infraestrutura ao final do prazo de concessão. Determina que se o contrato possuir essas características de controle a infraestrutura a ser construída e/ou ampliada, deve ser contabilizada no balanço público, ou seja, nenhuma infraestrutura deverá ser contabilizada pelo parceiro privado. Antes da IFRIC 12 entrar em vigor as concessionárias contabilizavam a infraestrutura em seu imobilizado, até o final do arranjo, ou de acordo com os riscos assumidos pelas partes (a parte que assumia maior risco, contabilizava a infraestrutura em seu balanço. 6 Sendo assim, se o contrato de concessão possuir as características de controle já mencionadas, os ativos do parceiro privado serão aqueles, que de alguma forma, culminarão em geração de fluxos de caixa futuro, de acordo com a remuneração pactuada no contrato. Poderão ser de dois tipos: ativo financeiro e/ou intangível, dependendo dos riscos suportados pelo parceiro privado. Será um ativo financeiro se a remuneração a ser recebida pela construção e/ou operação da infraestrutura for um direito incondicional de receber caixa, ou seja, quando o poder concedente garante o pagamento, e o mesmo é executável por Lei, mesmo se estiver condicionado a performance. O risco neste caso, de não receber caixa é exclusivo do parceiro privado, por exemplo, se não atingir os índices de desempenho constantes no contrato a remuneração pode sofrer variações. Assim, a substância econômica desse ativo implica no reconhecimento de um ativo financeiro, semelhante a um contas a receber decorrente de faturamento. Nota-se que, contratualmente, esse direito incondicional de recebimento de caixa futuro é constituído em função das atividades desempenhadas pelo parceiro privado, que podem ser da construção da infraestrutura e/ou da operação da infraestrutura (Martins e Andrade, 2009). Será um ativo intangível quando a remuneração estiver vinculada ao risco de demanda, ou seja, não será o parceiro público o responsável principal pelo pagamento, e sim o usuário final do serviço. Essa expectativa de fluxo de caixa futuro não representa um direito incondicional de receber caixa, pois, está vinculado à utilização do serviço pelos usuários. Sendo assim, deverá ser classificado como um ativo intangível, que representará o direito (licença) para cobrar os usuários do serviço público. Assim, à medida que o parceiro privado cumpre com as suas obrigações contratuais, um ativo intangível deverá ser contabilizado, inicialmente pelo seu custo. E se durante a fase de construção, se forem realizados empréstimos, os custos dos mesmos devem ser capitalizados até o término da edificação. Esse intangível começará a ser amortizado somente quando a infraestrutura se tornar fruível (quando entrar em operação), e pelo prazo contratual restante. Por exemplo, um contrato celebrado por 25 (vinte e cinco) anos, e torna-se fruível a partir do ano 03 (três), o ativo intangível deve ser amortizado pelo prazo restante do contrato, ou seja, 23 (vinte e três) anos. No Brasil, as concessões comuns são contratos em que o risco de demanda é totalmente suportado pelo parceiro privado, sendo um ativo intangível. Já os contratos de PPP celebrados na modalidade patrocinada prevêem dois tipos de remuneração, uma contraprestação pecuniária (direito incondicional de receber caixa) sendo contabilizado um ativo financeiro; e o direito de cobrar tarifas diretamente dos usuários dos serviços (fluxo de caixa incerto) será reconhecido um ativo intangível. Já a PPP na modalidade administrativa sempre será um ativo financeiro, pois, não existe a cobrança de tarifa, existe o direito incondicional de receber caixa vinculado a índices de desempenho. Quanto aos passivos, geralmente, nos contratos de concessão, o parceiro privado assume obrigações que precisam ser analisadas em sua substância antes de sua contabilização, como por exemplo, manutenção e restauração da infraestrutura durante a vigência do arranjo. Em alguns casos essas obrigações não aumentam o valor da infraestrutura, ou seja, não há serviço de melhoria (upgrade). Assim devem ser reconhecidas na melhor estimativa das despesas que seria necessária para resolver a obrigação na data do balanço (provisões e passivos contingentes). 3.2 Ativos e passivos do parceiro público (tendo por base o ED 43) 7 Como já discutido anteriormente, a infraestrutura construída e/ou reformada, objeto do contrato de concessão. Sendo que esse contrato possui as características de controle já mencionadas, esse ativo deve ser contabilizado no balanço público. A terminologia utilizada no ED 43 (que é o espelho da IFRIC 12) para infraestrutura é ativo de serviço de concessão (Service Concession Arrangements – SCA). O ativo de serviço de concessão deve inicialmente ser mensurado pelo valor justo. Se os pagamentos a serem efetuados ao operador puderem ser segregados, pela construção e pelos serviços, considera-se a parcela referente à construção o valor justo da propriedade. Se não for possível a segregação deve-se chegar ao valor justo por meio de técnicas de estimativas. Esse ativo deve ser depreciado pela sua vida útil econômica a partir do momento que se tornar fruível. As despesas efetuadas para a construção do ativo foram suportadas pelo parceiro privado, que deverá ser compensado pelo serviço de construção. Assim, concomitantemente ao reconhecimento da infraestrutura no balanço público um passivo relacionado também ter que ser registrado, no mesmo montante, que representa a obrigação do parceiro público de reembolsar a concessionária pelo ativo construído. Esse passivo pode ser de dois tipos: passivo financeiro (monetário) e/ou passivo não financeiro (não monetário), dependendo do tipo da remuneração celebrada no contrato (cobrança de tarifa e/ou pagamento efetuado pelo Estado). O ED 43 denomina o passivo não financeiro, como passivo de performance. Se no contrato, o poder concedente, garantir o pagamento, e o mesmo é executável por Lei, mesmo se estiver condicionado a performance. Nesse caso, será reconhecido um passivo financeiro. Se a remuneração da concessionária for o direito de cobrar tarifas dos usuários, a parcela referente à construção do ativo de serviço de concessão deverá ser reconhecido um passivo não monetário que representa a obrigação do Estado em cumprir a licença concedida ao parceiro privado para que obtenha o retorno pela construção do ativo. 3.3 Despesas de PPP (tendo por base a Portarias n° 614/06) A concessão ‘comum’ não traz comprometimento de desembolso para o Estado, pois, o risco é totalmente do parceiro privado, mas a infraestrutura que na maioria dos contratos ao final é revertida ao parceiro público, antes da emissão dos normativos, está contabilizada no balanço do parceiro privado. Já as PPPs podem vir a ter grande impacto nas contas públicas, pois, existe a contraprestação pecuniária a ser paga pelo poder concedente. E essa evidenciação nos balanços públicos é de fundamental importância para a análise quanto ao impacto dessas parcerias nas contas públicas, não se esquecendo também da evidenciação da infraestrutura. O parceiro público transfere o risco de financiamento para o setor privado, mas não exime o Poder Público de outras obrigações que não estão sendo evidenciadas nos balanços públicos. Atualmente, as despesas com PPP são consideradas despesas de caráter continuado, ou seja, não há registro de passivo nas contas públicas, ou seja, a contraprestação fixa, não está sendo contabilizada no balanço público. As garantias assumidas nas PPPs na modalidade administrativa estão sendo contabilizadas no passivo compensado. O Estado de Minas Gerais, que possui dois contratos de PPP, um na modalidade patrocinada (PPPMG-050) e outro na modalidade administrativa (PPP Sistema Prisional) em seu balanço patrimonial de 2009, evidenciou as garantias do contrato da PPP – Complexo, em seu ativo e passivo compensado. Não foi possível visualizar as garantias do contrato da PPP MG-050. Isso pode ser porque a Portaria n° 614/06 estabelece algumas exceções decorrentes de garantias em concessões patrocinadas. E atendendo a LRF em seu Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO) 8 demonstra as despesas de PPP de 2009 até 2019, e o percentual utilizado em comparação a receita corrente líquida. O quadro 01 contém as despesas de PPP do Estado de Minas Gerais. Quadro 01 - Relatório Resumido da Execução Orçamentária - Demonstrativo das PPPs 1 Bimestre - JAN/FEV -2010 DESPESAS DE PPP Do Ente Federado Contrato 007/2007 - Concessionária Nascentes das Gerais Contrato 336039.54.1338.09 -Gestores Prisionais Associados Das Estatais Não-Dependentes TOTAL DAS DESPESAS RECEITA CORRENTE LÍQUIDA - RCL TOTAL DAS DESPESAS /RCL 2009 8.177.526,65 8.177.526,65 8.177.526,65 29.118.469.548,08 0,03% 2010 2011 2012 9.700.000,00 60.430.806,11 96.986.749,47 9.700.000,00 9.252.485,40 9.252.485,40 51.178.320,71 87.734.264,07 9.700.000,00 60.430.806,11 96.986.749,47 30.157.998.910,95 31.234.639.472,07 32.349.716.101,22 0,03% 0,19% 0,30% Fonte: www.sef.mg.gov.br Pelos dados do quadro 01, o Estado de Minas, está longe de atingir o limite de 3% (três por cento) da Receita Corrente Líquida com despesas de caráter continuado de PPP. Apesar dos contratos de PPP estarem sendo evidenciados no balanço patrimonial, não representa a essência econômica desses arranjos, pois, o ativo e o passivo compensados têm característica extra-contábil, não integram o patrimônio. O grupo do compensado é representado por Bens, Valores, Obrigações e outras situações não abrangidas no ativo, mas que podem vir a afetar o patrimônio. De acordo com o relatório contábil de 2009, do Estado de Minas Gerais, o seu ativo compensado em 31/12/2009, representou 58,45% do Ativo Total, 6,21% desse percentual são os contratos e garantias das PPPs. Conclui-se que essa forma de evidenciação dos contratos de PPP não está capturando a essência econômica dos contratos. Apesar das despesas de PPPs não serem um endividamento ‘direto’, se não forem celebradas com planejamento e controle podem vir a impactar as contas públicas a longo prazo. 4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para alcançar os objetivos desta pesquisa: i) analisar as alternativas possíveis de contabilização dos ativos e passivos dos contratos de concessão nos parceiros privados e públicos; ii) analisar se as despesas com PPPs são apenas comprometimento de fluxo de caixa ou um endividamento disfarçado que pode vir a impactar o equilíbrio das contas públicas, adotou-se a estratégia de pesquisa de Estudo de Caso (YIN, 2005). Ainda segundo Yin, (2005, p.28), justifica-se o estudo de caso quando uma pergunta do tipo “como” ou “por que” está sendo feita sobre um conjunto contemporâneo de acontecimentos, sobre o qual o pesquisador tem pouco ou nenhum controle. Trata-se de um tema contemporâneo, que foi investigado com dados primários, sendo utilizada a pesquisa documental que é utilizada para análise de materiais não editados, como os contratos, sendo semelhante à pesquisa bibliográfica (MARTINS, 2008). 5 ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DO CONTRATO DE PARCERIA PÚBLICOPRIVADA – PPP MG 050 O contrato escolhido, por conveniência, para a análise foi o contrato da PPP MG050, celebrado pelo Estado de Minas Gerais em 21 de maio de 2007 - Contrato SETOP (Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas) 007/2007, após a concorrência pública 070/06 – DER/MG (Departamento de Estradas e Rodagem de Minas Gerais). O objeto desta PPP é a exploração, pelo prazo de 25 (vinte e cinco) anos, da Rodovia MG – 050, trecho entroncamento BR 262 (Juatuba) - Itaúna - Divinópolis - Formiga - Piumhi - Passos São Sebastião do Paraíso, o trecho Entrº MG-050/Entrº BR-265, da BR-491 do km 0,0 ao km 4,65 e o Trecho São Sebastião do Paraíso - Divisa MG/SP da Rodovia BR-265, mediante concessão, na modalidade patrocinada. Foram analisados os seguintes documentos da PPP MG-050: i) Edital de Concorrência para Concessão Rodoviária 070/06; 9 ii) Contrato SETOP (Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas) 007/2007 na íntegra, ou seja, com os seus anexos; iii) Plano de Negócios elaborado pela concessionária quando da concorrência, conforme exigido no edital (cedido pelo Departamento de Estradas e Rodagem de Minas Gerais - DER/MG, para o estudo). O primeiro passo adotado foi analisar se a IFRIC 12 e o ED 43 são aplicáveis ao contrato da PPP MG050. O contrato possui as características de controle de uso pelo poder concedente, pois, o parceiro privado deverá atingir os índices de desempenho estipulados; as tarifas são fixadas pelo poder concedente e ao final a infraestrutura retorna ao poder público. Conclui-se que o contrato possui as características de controle dispostas na IFRIC 12 (parágrafo 5) e ED 43 (parágrafo 10), então o arranjo está dentro do escopo das normas. Em seguida, buscou-se a remuneração pactuada, para definir os ativos do parceiro privado. O contrato estabelece dois tipos de remuneração ao parceiro privado: (i) contraprestação pecuniária a ser paga mensalmente, a partir do 13° mês do início do contrato, ou seja, 288 parcelas, condicionadas a avaliação de desempenho. (ii) licença para cobrar tarifa de pedágio, a partir do ano 02, até o final do contrato. O desempenho é avaliado de acordo com a nota do QID – Quadro de Indicadores de Desempenho. Se e o parceiro privado atingir nota entre 9,5 e 10 máxima do nível de desempenho estipulado no QID, a parcela da contraprestação será recebida integralmente. Caso contrário, o pagamento pode sofrer variações, proporcionais a nota de QID. Por exemplo, se nota de QID for entre 6,5 e 7,0, a concessionária fará jus a 70% da contraprestação. As características da contraprestação pecuniária são de um ativo financeiro. Assim, contabiliza-se um ativo financeiro, à medida que a infraestrutura estiver sendo construída. Em outras palavras, o parceiro privado, cumprindo a sua obrigação de construção fará jus a uma receita de construção e em contrapartida uma parcela dessa receita é um ativo financeiro. Não é foco deste artigo a contabilização de receitas e despesas (contas de resultado), por isso, não foi discutido o reconhecimento das mesmas. Por outro lado, a segunda remuneração que é a licença para cobrar tarifa, não é um direito incondicional de receber caixa, pois está atrelada a demanda, dependendo do usuário utilizar o serviço, existe assim alto risco de demanda. Neste caso, contabiliza-se um ativo intangível. Então, em um único contrato tem-se um ativo financeiro e um intangível devendo ser contabilizados em separado, e mensurados inicialmente pelo seu valor justo recebido ou a receber. Após ter definido a natureza dos ativos partiu-se para a mensuração. Para a mensuração dos ativos é necessário o cálculo da receita de construção. Com os dados disponibilizados no plano de negócios mensurou-se a receita de construção que teve por base o custo de construção evidenciado no fluxo de caixa livre, sendo acrescida de uma margem de lucro de 10% (dez por cento), por premissa. E a contrapartida desta receita é o ativo financeiro e o intangível, no mesmo montante. Para a segregação dos valores a serem contabilizados, como o contrato já possui o valor da contraprestação fixa; o valor da taxa utilizada para se chegar ao Valor Presente Líquido (12%) e o PMT de R$ 7.900.000 (sete milhões e novecentos mil reais), utilizou-se a porcentagem para se realizar o ativo financeiro ao final dos 25 (vinte e cinco) anos, que foi de 16,7% (dezesseis vírgula sete por cento) da receita de construção. Por diferença, 83,3% (oitenta e três vírgula três por cento) da receita de construção é o ativo intangível. O ativo financeiro vai sendo atualizado por uma taxa de juros de 12% a.a (doze por cento ao ano) que é a mesma taxa utilizada no contrato para se chegar ao Valor Presente 10 Líquido – VPL da proposta econômica, representando a remuneração do dinheiro no tempo e gerando as receitas financeiras. Ressalta-se que o total do ativo financeiro, R$ 123.838.000 (cento e vinte e três milhões, oitocentos e trinta e oito mil reais), mais o total das receitas financeiras R$ 65.762.000 (sessenta e cinco milhões, setecentos e sessenta e dois reais), perfazem o valor nominal da contraprestação fixa, ou seja, R$ 189.600.000 (cento e oitenta e nove milhões e seis mil reais). O Gráfico 01 mostra a segregação da contraprestação pecuniária. Gráfico 01: Segregação da contraprestação pecuniária Fonte: elaborado pelos autores E ao mesmo tempo esse ativo financeiro vai sendo amortizado com o recebimento das contraprestações devidas pelo Estado e a cada ano aumenta com o reconhecimento de mais receitas de construção, pois, realizam-se investimentos ao longo dos 25 anos do arranjo gerando ‘novos’ ativos financeiros e intangíveis. E no ano 25 esse ativo financeiro é totalmente amortizado. O Gráfico 02 mostra a evolução do ativo financeiro. Gráfico 02: Evolução do ativo Fonte: elaborado pelos autores O ativo intangível representa o direito de o parceiro privado explorar a rodovia para que a parcela dos investimentos que não está sendo remunerada pela contraprestação fixa venha a ser recuperada com a cobrança de pedágio. A esse ativo a cada ano é adicionada, ao 11 custo do intangível, a parcela das receitas de construção relacionadas ao mesmo e se houver os custos de empréstimos devem ser capitalizados (neste estudo não foi abordada a estrutura de capital somente a parte operacional). Cada parcela é amortizada, a partir do ano 02, que é quando a rodovia começa a operar, pelo mesmo prazo do contrato, por isso ao final do contrato o ativo intangível estará totalmente amortizado que está representado no gráfico 03, que mostra o ativo intangível e sua amortização. Gráfico 03: Evolução do ativo intangível Fonte: elaborado pelos autores O gráfico 04 evidencia os ativos do Parceiro Privado, representando o direito da concessionária de receber pela infraestrutura construída. Gráfico 04: Ativos do Parceiro Privado Fonte: elaborado pelos autores Quanto aos passivos, geralmente, nos contratos de concessão, o parceiro privado assume obrigações que precisam ser analisadas em sua substância antes de sua contabilização. Analisando o contrato e a projeção dos custos e despesas da concessionária, constantes do plano de negócios, percebe-se que os desembolsos projetados são custos relativos à operação, isto é, custos operacionais, portanto neste caso específico, não há provisões e passivos contingentes. 12 São essas as análises realizadas quanto aos ativos e passivos da concessionária. Agora serão analisados os ativos e passivos do poder concedente. Quanto à infraestrutura, como foi possível segregar a remuneração a ser paga pela construção e pelos serviços, considerou-se o valor justo da infraestrutura o montante relacionado à construção, que é o mesmo do total dos ativos financeiro e intangível registrados no balanço da concessionária. E a partir do ano 02 quando o ativo de serviço de concessão torna-se fruível, deve-se amortizá-lo de acordo com a sua vida econômica. Sendo que ao final do arranjo o Estado continua com a infraestrutura, depreciada, lógico, mas em condições de operação. O gráfico 05 mostra o imobilizado do poder concedente e a sua respectiva depreciação, sendo que neste estudo foi considerada uma vida útil econômica de 50 (cinqüenta) anos. Gráfico 05: Imobilizado do parceiro público Fonte: elaborado pelos autores Ao mesmo tempo em que reconhece-se o imobilizado, um passivo deve ser evidenciado no mesmo montante que representa a obrigação do poder concedente de reembolsar a concessionária pelo ativo construído. E no caso estudado, como existem dois tipos de remuneração tem-se um passivo financeiro tendo em vista a contraprestação pecuniária (que é o mesmo valor do ativo financeiro) e um passivo de performance (que é o mesmo valor do ativo intangível) que representa a obrigação do parceiro público conceder a licença para explorar a rodovia, durante o período contratual (não monetário). O gráfico 06 evidencia esses passivos, destacando que atualmente esses passivos não estão sendo evidenciados no balanço público. Somente as garantias são contabilizadas como passivo compensado. 13 Gráfico 06: Passivos do Parceiro Público Fonte: elaborado pelos autores Após a aplicação das normas no contrato da PPP MG 050, conclui-se com base neste caso estudado, que a essência econômica dos contratos está sendo evidenciada, proporcionando uma representação patrimonial mais próxima da realidade. Entende-se que o desenho do contrato foi bem elaborado, e se concretizar as projeções realizadas a parceria é vantajosa tanto para o Estado quanto para a concessionária. Para o Estado, pois, vai disponibilizar serviços de qualidade aos usuários das rodovias envolvidas a um preço acessível, que inicialmente a tarifa foi de R$ 3,00 (três reais) e em 2010 foi reajustada para R$ 3,50 (três reais e cinqüenta centavos), e ao final dos vinte e cinco anos terá uma infraestrutura com condições de continuar operando. E a concessionária pelas análises realizadas terá o retorno do investimento, pois, o resultado operacional é positivo, sendo que o resultado final dependerá da estrutura de capital adotada (que neste estudo não foi analisada). Mas, como esses contratos são de longo prazo, expostos a diversos riscos, esse cenário pode ser alterado. Se, por exemplo, a demanda projetada não se concretiza, ocasionando um desequilíbrio econômico financeiro. Assim, será necessária uma renegociação contratual que poderá alterar as projeções dos ativos e passivos efetuados. Pelo contrato considera-se mantido o equilíbrio econômico financeiro as variações de receita na faixa entre 10% (dez por cento) para mais ou para menos, será totalmente suportado pelo parceiro privado. Ou seja, este suporta o risco de uma demanda menor, mas também se ocorrer o contrário, a receita a maior dentro desta faixa é 100% (cem por cento) do parceiro privado. Mas, se ocorrer uma variação da receita de pedágio a menor, além da faixa de 10% (dez por cento) o contrato prevê algumas alternativas para recompor o equilíbrio econômico financeiro do parceiro privado: (i) prorrogação ou redução do prazo da concessão patrocinada; (ii) revisão do cronograma de implantação das intervenções obrigatórias; (iii) adequação dos indicadores de desempenho para compatibilização da oferta do serviço com a demanda de tráfego na rodovia; (iv) revisão da tarifa do pedágio, para mais ou para menos; (v) combinação das modalidades anteriores. Não foi previsto no contrato aumento da contraprestação pecuniária, que poderia impactar as contas públicas, mas o aumento da tarifa do pedágio quem irá arcar são os usuários, ou seja, a sociedade. O contrato garante a recomposição do equilíbrio econômico financeiro através do VPL (Valor Presente Líquido) do fluxo de caixa constante na proposta econômica com uma taxa de desconto de 12% a.a (doze por cento) ao ano. 14 Uma hipótese para diminuir o impacto da tarifa seria aumentar o prazo da concessão que pode ser de até mais dez anos, pois, as PPPs podem ser celebradas até 35 anos e o contrato foi assinado para 25 anos. Também conforme previsto no contrato pode-se revisar algumas intervenções obrigatórias e alterar os indicadores de desempenho. Portanto, se as projeções realizadas no plano de negócios não vierem a se concretizar, ou ainda, se vier a ocorrer problemas na construção (risco de construção); alteração na legislação (risco regulatório); não concretização da demanda projetada (risco de demanda), entre outros, impactando os benefícios econômicos futuros, ajustes na contabilização deverão ser realizados, devendo ser reconhecidos no resultado. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo principal deste artigo foi de analisar as alternativas possíveis de contabilização dos ativos e passivos dos contratos de concessão nos parceiros privados e públicos. Assim para nortear a pesquisa levantou-se o seguinte questionamento: Como e por que o controle, propriedade e risco implicam na contabilização dos contratos de concessão? Como demonstrado no estudo às características de controle, propriedade e risco influenciam na contabilização e evidenciação das demonstrações contábeis dos parceiros. Espera-se que com a recente normatização para o parceiro privado esses contratos que são de grande relevância social, apurem um resultado econômico mais próximo da realidade, proporcionando uma informação de qualidade aos diversos usuários da contabilidade. O Estado terá informações com confiabilidade que auxiliarão nas revisões contratuais, evitando ganhos exorbitantes dos parceiros privados e ainda disponibilizando à sociedade serviços com qualidade a preços mais justos. O objetivo secundário foi de analisar se as despesas com PPPs são apenas comprometimento de fluxo de caixa ou um endividamento disfarçado que pode vir a impactar o equilíbrio das contas públicas. Atualmente como esses contratos estão sendo contabilizados, são apenas despesas de caráter continuado, tendo em vista que o ativo e o passivo compensados é um controle extracontábil. A LRF quando exige a demonstração das despesas de PPP no Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO), auxilia no controle desses arranjos, mas não demonstra a verdadeira situação patrimonial do Estado. Observa-se que é necessário que o imobilizado construído e/ou ampliado pelo parceiro privado deve constar no imobilizado do balanço público e no passivo a obrigação do parceiro público de remunerar a concessionária pela construção e operação da infraestrutura. As PPPs transferem o risco de financiamento ao parceiro privado, mas não exime o poder concedente de outras obrigações, pois, a concessionária tem que ser reembolsada pelo investimento realizado. Assim, apesar das despesas de PPPs não serem um endividamento, podem vir a impactar as contas públicas, por isso é importante o controle desses gastos. Conclui-se que apesar das despesas de PPPs não serem um endividamento ‘direto’, se não forem celebradas com planejamento e controle podem vir a impactar as contas públicas a longo prazo. As parcerias com o setor privado são de suma importância para o desenvolvimento econômico e social de um país. Por isso antes de serem outorgadas, estudos da viabilidade e oportunidade devem ser realizados e metodologias de análise devem ser desenvolvidas com base na experiência internacional. Espera-se ainda que a lacuna regulatória existente para o parceiro público venha a ser suprida o mais breve possível. Com isso os balanços públicos poderão evidenciar a situação patrimonial do Estado com a celebração desses contratos de longo prazo, contribuindo para a transparência das contas públicas. 15 A principal limitação desta pesquisa é quanto aos contratos de concessão que não são padronizados. Por isso, para a contabilização deve-se analisar caso a caso, ou seja, os resultados obtidos não podem ser generalizados devido aos diversos tipos de contratos de concessão. No entanto, esse estudo pode ser ampliado em pesquisas posteriores. REFERÊNCIAS ANDRADE, M.E.M.C., MARTINS, V. A. (2009). Análise dos Normativos de Contabilidade Internacional sobre Contabilização de Contratos de Parcerias Público-Privadas. Revista Contemporânea de Contabilidade – RCC, UFSC, Florianópolis, ano 06, v.1, n°11, p. 83107, Jan./Jun., 2009. ASB. FRS 5 - Reporting the Substance of Transactions. Private Finance Initiative and Similar Contracts. Accounting Standards Board. 1998. Disponível em <http://www.frc.org.uk/images/uploaded/documents/frs_5_amendment.pdf >. Acesso em 30 mai. 2010. BENITO, B.; MONTESINOS, V.; BATISDA, F. An example of creative accounting in public sector: The private financing of infrastructures in Spain. Critical Perspectives on Accounting, 19, 963–986, 2008. BRASIL. 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